EDITORIAL

 

 

Vera Barros de Oliveira¹

Cad. nº 35 "Elsa Barra"

 

 

Em consonância com sua publicação anterior, e a bem dizer, com sua filosofia editorial, este Boletim persiste atento à problemática social atual, em que estamos mergulhados, a qual, por sua extensão e gravidade supõe e espera uma visão aprofundada da Psicologia, muito particularmente em relação à sua íntima relação com a ética. Em decorrência deste vínculo, supõe o olhar e a reflexão dos psicólogos sobre situações que envolvem e expõem sérios riscos à integridade das pessoas. Sob essa ótica, inicia-se este Boletim com profundoartigo teórico sobre a Ética da Misericórdia e suas associações com a Psicologia, o qual, após discussão filosófica sobre a terminologia envolvida, considera como a Misericórdia, como comportamento, ao envolver percepção, emoção, sentimento e atitude, exige mudanças estruturais sociais, inclusive no papel da Universidade. A seguir, artigo sobre as relações de justiça e igualdade reveladas por pesquisa em comunidades indígenas, conduz a uma análise de questões éticas, envolvendo território, saúde, educação, gênero, entre outras, concluindo pela necessidade da consciência dos princípios fundamentais da ética, por pesquisadores, entre outros, no que diz respeito à cultura indígena, em sua riqueza e diversidade, e que se crie melhores condições para que sua reintegração seja encaminhada de forma igualitária e justa.

Em continuidade, pesquisa sobre a dinâmica psíquica e as estruturas defensivas da mulher vítima de violência doméstica, considerada pelos autores como um fenômeno multifatorial que assume proporções exponenciais no cenário nacional e internacional, constata na amostra pesquisada, fragilidade do ego, imaturidade e vulnerabilidade emocional da mulher frente às tensões do meio, assim como, isolamento e depressão, inclusive em relações violentas de namoro, fatores que contribuem para a proliferação do problema. Artigo sobre a importância e a especificidade da psicologia clínica em abordagem do sofrimento social, por meio de modalidade denominada Ser e Fazer, propõe, fundamenta e ilustra um atendimento que favorece experiências de integração como superação de interações patológicas despersonalizantes, as quais podem expressar discriminação, exclusão e opressão social.

Pesquisa sobre crianças e adolescentes vítimas de violência doméstica, física e/ou sexual que se utilizou do Teste Desenho da Figura Humana junto a 634 participantes de ambos os sexos, de 6 a 16 anos, descreve e analisa indicadores de dificuldades emocionais, sinais de impulsividade e insegurança, ansiedade e dificuldades de estruturação da personalidade junto a essa população. A seguir, na área voltada à Educação, revisão de literatura sobre a inclusão de alunos com deficiência e as representações sociais de professores a respeito, aponta para a resistência e a falta de formação dos mesmos e alerta para o fato de que a inclusão como lei não foi ainda completamente formalizada e redigida.

Ao constatar que o mercado de jogos eletrônicos se encontra em plena expansão, atendendo a enorme público de diversas idades, nacionalidades e classes sociais, pesquisa teve por objetivo verificar se os mesmos promovem violência durante o julgamento moral das crianças e adolescentes. O artigo contém, inicialmente, consistente exposição teórica sobre moral e ética. Os resultados obtidos na pesquisa não constataram indícios teóricos desses jogos serem causa suficiente de atos violentos na vida real, assim como, foi verificado que a preferência pelo jogo não vem a ser violência, mas o grau de desafio do mesmo. Além disso, verificou-se que jogos que priorizam decisões grupais promovem ações de respeito mútuo e cooperação entre os pares.

Na sequência, artigo apresenta e discute ideias preliminares sobre a percepção da luz e o insight, as quais esboçam, segundo os autores, uma teoria sobre a percepção visual e seus processos subjetivos. Tais considerações visam identificar fatores que contribuem para o aprimoramento do ensino em Comunicação, vista como uma experiência coletiva, que possibilita e favorece a conectividade entre o relacionamento humano e a criatividade. O texto ressalta como os efeitos da luz influenciam o cérebro e estimulam percepções relativas a antigas memórias cujas conexões mentais podem favorecer interpretações criativas, ou seja, conteúdos com significados novos em uma configuração original, antes inexistente.

Na área da saúde, considerando como algumas características do médico são importantes para a qualidade da relação com o paciente, foi realizado estudo preditivo em estudantes de medicina, sobre possível associação entre traços de personalidade e habilidades empáticas dos mesmos, o qual verificou que determinados fatores da empatia são capazes de predizer fatores da personalidade específicos. Os resultados indicaram também uma associação positiva entre empatia e sexo feminino. A seguir, na área sociocognitiva, ao revisar a literatura sobre a Teoria da Mente em adultos, expõe a capacidade de compreender e atribuir estados mentais, tais como crenças, emoções e intenções a si mesmo e aos outros e relata estudos sobre sua aquisição e desenvolvimento na infância, diferentes da encontrada nos adultos.

Finalizando, são apresentadas duas resenhas: uma sobre o livro "Misericórdia e Vida Acadêmica", organizado por Jarbas Vargas Nascimento, e outra sobre a publicação "As múltiplas faces do self", de Walter Trinca.

Concluindo, notifica-se que faz parte deste Boletim matéria divulgada pela Vetor Editora Psico-Pedagógica, fundada por nosso prezado acadêmico José Glauco Bardella, a qual completou seus 50 anos, ano passado, e que, ao longo do tempo vem dando provas da qualidade de suas publicações, assim como nos favorecendo com sua inestimável contribuição.

 

 

1 Secretária Geral da Academia Paulista de Psicologia (APP). Profª Livre Docente pela Universidade de São Paulo. Profª Titular da Universidade Metodista de São Paulo (19942014). Contato: vera.barros.oliveira@terra.com.br.