Serviços Personalizados
Journal
artigo
Indicadores
Compartilhar
Pesquisas e Práticas Psicossociais
versão On-line ISSN 1809-8908
Pesqui. prát. psicossociais vol.15 no.1 São João del-Rei jan./mar. 2020
Estresse ocupacional em formadores de professores do ensino básico: estudo com profissionais do Instituto de Formação de Professores Primários de Nampula-Moçambique
Occupational stress in teachers of basic teachers: study with professionals of the Institute of Training Primary Teachers of Nampula-Mozambique
El estrés laboral en la formación los formadores de maestros básicos: estudio de profesional con el Instituto de Formación de Profesores de Primaria Nampula- Mozambique
Gildo AlianteI; Mussa AbacarII
IUniversidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Brasil. E-mail: aliantegildo@yahoo.com.br
IIUniversidade Rovuma, Moçambique. E-mail: abacarmussa@yahoo.com.br
RESUMO
Este artigo objetivou compreender os fatores do estresse ocupacional em formadores de professores do ensino básico em Nampula-Moçambique e as respectivas estratégias de enfrentamento ao estresse. Trata-se de um estudo exploratório, do cunho qualitativo, que envolveu 20 formadores de professores. A coleta de dados foi por meio de um guião de entrevista semiestruturada e analisados com o recurso da técnica de análise de conteúdo. Os resultados indicam que os formadores investigados sentem-se estressados pelo trabalho e tal estresse ocupacional percebido se deve à falta de material de apoio, à planificação de aulas, à elaboração de exercícios, ao pagamento irregular dos salários e à sobrecarga de tarefas. O estresse sentido pelos formadores gera consequências em nível pessoal, organizacional e familiar. Para fazer face a situações de estresse, os formadores recorrem essencialmente às estratégias paliativas. Esses resultados sugerem a concepção e implementação de programas preventivos e/ou interventivos sobre estresse no trabalho docente, com vista à melhoria e promoção de saúde e bem-estar no trabalho dos formadores.
Palavras-chave: Estresse ocupacional. Doenças profissionais. Saúde do trabalhador. Condições de trabalho.
ABSTRACT
This article aimed to understand the occupational stress factors in primary school teacher trainers in Nampula and their coping strategies to stress. This is an exploratory study, the qualitative nature involving 20 forming faculty. Data collection was via a semi-structured interview guide analyzed with the use of content analysis technique. The results indicate that the investigated trainers feel stressed at work, and such occupational stress perceived is due to lack of support materials (modules), planning lessons, the preparation exercises, the irregular payment of salaries and overhead tasks. The stress felt by trainers generates consequences both on a personal level, both organizational and family. To cope with stressful situations, trainers rely essentially palliative strategies. These results suggest the design and implementation of preventive and / or intervention programs on stress in teaching, with a view to improving and promoting health and quality of working life of the trainers.
Keywords: Occupational stress. Professional diseases. Worker's health. Work conditions.
RESUMEN
Este artículo tiene como objetivo comprender los factores de estrés en el trabajo en los formadores de profesores de la escuela primaria en Nampula y sus estrategias de afrontamiento al estrés. Este es un estudio exploratorio, la naturaleza cualitativa que implica 20 facultad de conformación. La recogida de datos fue a través de una guía de entrevista semiestructurada analizado con el uso de la técnica de análisis de contenido. Los resultados indican que los entrenadores investigados se siente estresado en el trabajo, y tal estrés laboral percibido es debido a la falta de materiales de apoyo (módulos), la planificación de lecciones, los ejercicios de preparación, el pago irregular de los sueldos y los gastos generales tareas. El estrés que sienten los entrenadores genera consecuencias tanto a nivel personal, tanto de organización y de la familia. Para hacer frente a situaciones de estrés, los entrenadores se basan esencialmente estrategias paliativas. Estos resultados sugieren que el diseño e implementación de programas de prevención y / o intervención sobre el estrés en la enseñanza, con el fin de mejorar y promover la salud y la calidad de vida de los entrenadores de trabajo.
Palabras clave: Estrés ocupacional. enfermedades profesionales. salud ocupacional. Condiciones de trabajo.
1 Introdução
As rápidas e contínuas mudanças sociais, econômicas e políticas que ocorrem na contemporaneidade, de modo especial no mundo do trabalho, têm gerado novos desafios de análise e intervenção. As formas de organização, as relações interpessoais e as condições de trabalho têm sido apontados como potenciais causadores de danos psicológicos, sociais e/ou físicos aos trabalhadores, por exemplo o estresse ocupacional.
O estresse ocupacional vem se tornando um problema cada vez maior nas organizações (Robbins, 2009) e constitui um dos temas que vêm ocupando espaço para discussões atuais nas diversas áreas do conhecimento, pois as condições de trabalho e as exigências impostas às pessoas pelas mudanças da vida moderna são geradoras de estresse. Estima-se que o estresse ocupacional esteja a afetar um em cada três trabalhadores em todo o mundo, sendo que é provável o agravamento da doença, caso não sejam realizados esforços visando à prevenção (Murphy, 2008).
No caso particular dos profissionais da Educação, os professores são considerados uma categoria de risco e mais vulnerável ao estresse no trabalho (Andrade & Cardoso, 2012; Carlotto, Braun, Rodriguez & Diehl, 2014; Kyriacou & Chien, 2004; Olaitan, 2009), ao desenvolvimento de burnout (Dalagasperina & Monteiro, 2014; Moreno-Jimenez, Garrosa-Hernandez, Gálvez, González & Benevides-Pereira, 2002), pois a atividade do professor é marcada por exigências múltiplas e precariedade das condições de trabalho, o que faz com que seja considerada extremamente estressante. Consequentemente, os professores enfrentam elevados níveis de estresse (Melo, Gomes, & Cruz, 1997), que podem comprometer o seu bem-estar, longevidade na profissão e qualidade de suas interações com os alunos (Lhospital & Gregory, 2009).
Em África, as classes numerosas, o fraco apoio administrativo, a preparação inadequada, a falta de materiais instrucionais, a sobrecarga de trabalho, as atividades extracurriculares, a política profissional inadequada, as poucas oportunidades de desenvolvimento profissional constituem fatores que levam os professores a sentirem-se impotentes e frustrados, o que provavelmente pode favorecer elevados níveis de estresse e de burnout (Assimeng-Boahene, 2003).
Por exemplo, estudos feitos na Argélia (Mokdad, 2005) e na Nigéria (Olaitan, 2009), revelaram níveis moderados e elevados de estresse ocupacional nos professores investigados. No contexto moçambicano, estudos realizados tanto com professores do ensino fundamental (Abacar, 2011; Abacar & Travasso, 2016) como do ensino secundário (Abacar & Aliante, 2016) revelaram a ocorrência do estresse e de burnout (Abacar, 2015) nos sujeitos estudados, causados por diversos estressores, entre eles baixos salários, más condições de trabalho, falta de recursos didáticos, sobrecarga de trabalho, pressão de tempo, fraco rendimento acadêmico dos alunos, falta de concentração dos alunos às orientações para as tarefas. Todavia, verificou-se a inexistência de estudos realizados com os professores formadores.
Outrossim, com base nas convivências diárias com os formadores, constatou-se que estes queixavam-se de dores de cabeça, irritação constante, algumas vezes de insônia, entre outros problemas que afetam o bem-estar. É nesse contexto que se delineou o presente estudo, norteado pela seguinte questão de partida: que elementos de trabalho docente podem gerar o estresse ocupacional em formadores de professores do ensino básico no Instituto de Formação de Professores Primários de Nampula?
De modo geral, o estudo objetivou compreender os fatores que contribuem para a ocorrência do estresse ocupacional em formadores de professores do ensino básico, bem como os respectivos sintomas e estratégias de enfrentamento utilizadas para minimizar os efeitos negativos do estresse.
A realização deste estudo se reveste de grande importância social, pois a compreensão dos níveis do estresse ocupacional e dos respectivos fatores psicossociais em formadores podem ajudar os gestores educacionais e fazedores de políticas públicas educativas a melhorarem as situações de trabalho geradoras do estresse, bem como na concepção de planos preventivos ou interventivos com vista à promoção do bem-estar e da qualidade de vida no trabalho dos formadores e, consequentemente, na melhoria da qualidade de ensino almejada.
2 Estresse ocupacional e atividade docente
Antes de descrever de forma detalhada a temática em destaque, importa conceituar os termos estresse e estresse ocupacional.
2.1 Conceituações de estresse e estresse ocupacional
Selye (1976), um dos primeiros pesquisadores a estudar o estresse, propôs o eustress como sendo euphoria + stress, daí eu-stress que significa o estresse saudável, o resultado positivo e construtivo de eventos estressantes e a resposta ao estresse. Esse autor define o estresse como um conjunto de reações fisiológicas ou psicológicas do indivíduo perante determinados estímulos estressores.
Para Lipp (2000), o estresse é uma reação normal do organismo e indispensável para a sobrevivência, caracterizando-se por ser um processo complexo, com componentes psicobioquímicos e que tem seu mecanismo desencadeado em resposta a uma necessidade significativa de adequação frente a um estímulo estressor. Em doses moderadas, fornece motivação e o aumento da produtividade, mas em doses excessivas resulta em destruição e desequilíbrio orgânico, prejudicando a qualidade de vida, atingindo as áreas social, da saúde e profissional.
Em termos gerais, o estresse pode ser analisado de vários modos: como resposta, como estímulo, como interação e como transação (Bicho & Pereira, 2007; Stacciarini & Troccoli, 2001). Ou seja, as diversas definições do estresse enquadram-se numas dessas vertentes e concepções.
O estresse não é necessariamente ruim (Robbins, 2009), isto é, o termo estresse pode ser utilizado tanto de forma positiva (eustress) quanto negativa (distress). A palavra distress contém o prefixo latino dis, que significa "mau" e refere-se à resposta ao estresse traduzida em resultados patológicos, negativos, destrutivos de eventos estressantes (Selye, 1976). Neste estudo, o termo estresse foi usado como sinônimo de distress, portanto, o estresse negativo.
No que diz respeito ao estresse ocupacional em professores, Kyriacou (2001) define como as experiências desagradáveis de um professor - traduzidas em emoções negativas como a raiva, a frustração, a ansiedade, a depressão e o nervosismo, resultantes de algum aspecto de seu trabalho e mediadas pela percepção de que as exigências profissionais são estressantes - constituem uma ameaça à sua autoestima ou bem-estar. Nesse contexto, um professor estressado é aquele que percebe que necessita de mais recursos do que aqueles que dispõe para enfrentar uma determinada tarefa ou missão que lhe é incumbida.
Para este trabalho, considera-se o estresse ocupacional do professor como aquele que é causado por fatores relacionados com as condições internas e externas do trabalho docente.
2.2 Fontes do estresse ocupacional
Existem diversos fatores que podem gerar o estresse ocupacional nos trabalhadores no geral e em professores em particular, entre eles os pessoais (biológicos) até os psicossociais. Este estudo levou em consideração os fatores psicossociais, por se aliar com a informação segundo a qual as causas de esgotamento físico e emocional localizam-se mais no ambiente do trabalho do que no indivíduo (Maslach & Leiter, 1999). Para esses autores, as causas do esgotamento profissional agrupam-se em: excesso de trabalho, falta de controle, remuneração insuficiente, colapso da união, ausência de equidade e valores conflituantes. Para Maslach, Schaufeli e Leiter (2001), há seis áreas de trabalho que englobam as relações centrais de trabalho, a saber: carga de trabalho, controle, recompensa, comunidade, justiça e valores. Assim, as autoras entendem que o esgotamento profissional surge de descasamentos crônicos entre as pessoas e seu ambiente de trabalho em termos de algumas ou todas essas seis áreas.
Portanto, parece haver consenso sobre a importância de seis fontes de estresse ocupacional do modelo proposto por Antoniou, Davidson e Cooper (2003).
1. Fontes intrínsecas ao trabalho (condições de trabalho, longas horas de trabalho, viajar, novas tecnologias e sobrecarga de trabalho).
2. Papel na organização (ambiguidade dos papéis, conflito de papéis e responsabilidades).
3. Relações interpessoais no local de trabalho (relação com o superior, relação com os subordinados e relação com os colegas).
4. Desenvolvimento na carreira (segurança no emprego, promoções, progressões, mudança na carreira e avaliação do rendimento profissional).
5. Clima e estrutura organizacionais (grau de participação na tomada de decisões e sentido de pertença).
6. "Interface" trabalho-família (interferência do trabalho na família e interferência da família no trabalho).
No caso concreto de docência, Farber (1991) diz que as causas do estresse e de burnout em professores são uma combinação de fatores individuais, organizacionais e sociais, sendo que essa interação produziria uma percepção de baixa valorização profissional. Como dito anteriormente, neste trabalho foca-se mais os fatores psicossociais do que os individuais. Nesse contexto, Melo, Gomes e Cruz (1997) apontam alguns aspectos negativos do exercício da profissão docente, como é o caso dos problemas disciplinares, o excessivo número de alunos por turma, a apatia dos alunos, as transferências involuntárias, docência longe da zona de residência dos familiares, o excesso de trabalho, os pais exigentes e críticos, a falta de condições e recursos materiais, como sendo certos fatores de estresse com que os professores se confrontam. Kyriacou (2001) apresenta 10 fatores de estresse dos professores que têm sido identificados em diversos estudos em nível internacional: a) o ensino de alunos com fraca motivação; b) a manutenção da disciplina; c) a pressão de tempo e a carga de trabalho; d) lidar com a mudança; e) a avaliação pelos outros; f) as relações com os colegas; g) a autoestima e o status; h) a administração e gestão; i) o conflito e a ambiguidade de papéis; e j) as inadequadas condições de trabalho.
2.3 Consequências do estresse do professor
O estresse ocupacional é, sem dúvida, um problema complexo que apresenta muitas implicações, tanto na área física, psicológica, familiar, social quanto na área profissional, tornando-se fonte de muitas pesquisas realizadas mundialmente, no sentido de procurar fornecer alternativas que auxiliem na administração dos problemas causados na vida das pessoas (Martins, 2005). Embora cada indivíduo tenha suas manifestações específicas de estresse, eis um panorama de possíveis mudanças que ocorrem, de acordo com Massola, (2007).
- Emocionais: entre as manifestações emocionais, podemos observar em algumas pessoas o aumento da ansiedade, o surgimento da depressão, o aumento de tensão e da irritabilidade.
- Cognitivas: pode ocorrer uma diminuição na concentração, dificuldades de memorização e de assimilação de um novo aprendizado, bem como diminuição do poder criativo e de tomada de decisões.
- Comportamentais: o estresse pode promover o início ou aumento do consumo de bebidas alcoólicas, início ou aumento do uso de tabaco, distúrbios alimentares e reações de agressividade.
- Físicas: são também extremamente comuns. Nas situações de estresse, podemos notar o surgimento ou aumento na intensidade das dores, principalmente as dores na coluna lombar, pescoço, ombros e abdômen. Isso ocorre porque nós comumente ficamos tensos e contraímos todas essas musculaturas em diversas situações. Pode-se observar também o aumento da frequência cardíaca (as chamadas "palpitações") e alterações na pressão arterial. Muitas outras manifestações físicas podem ser citadas, como veremos nos exemplos de sintomas.
O estresse do professor pode ter efeitos negativos não só sobre ele, mas também sobre os seus alunos e o ambiente de aprendizagem, fazendo com que os sentimentos sobre si mesmo, seus alunos e a profissão se tornem mais negativos ao longo do tempo. Professores em estado de estresse tendem a ter o estado de saúde degradado, reduzida autoconfiança e autoestima e deterioração das relações interpessoais (Howard & Jonhson, 2004). O estresse produz impacto negativo na retenção e recrutamento dos professores (Gold et al., 2010) e conduz à síndrome do burnout (Lambert, Mccarthy, O'donnell & Wang, 2009).
3 Metodologia
3.1 Método
Quanto à abordagem, trata-se de uma pesquisa qualitativa e, quanto aos objetivos, é de cunho exploratório. Os dados foram coletados por meio de um guião de entrevista semiestruturada, elaborado pelos autores mediante os objetivos da pesquisa. As entrevistas foram administradas em uma sala de aulas disponibilizada pela direção do Instituto e decorreram em dias letivos, em função da disponibilidade dos participantes.
Todas as entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas. A análise dos dados foi realizada com recurso da técnica de análise de conteúdo, que consiste em um conjunto de técnicas de análise das comunicações, visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores que permitem a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção ou recepção dessas mensagens (Bardin, 1977).
Considerando o universo semântico, as palavras e frases proferidas pelos sujeitos estudados foram organizadas em vista dos significados a elas atribuídos, possibilitando agrupamentos segundo as semelhanças ou similitudes encontradas. A análise de conteúdo foi marcada por três fases fundamentais propostas por Bardin (1977): pré-análise (identificada como uma fase de organização que envolve a leitura "flutuante" do material); exploração do material (que envolve a codificação, classificação e a categorização); e tratamento dos resultados - a inferência e a interpretação. Assim, para cada participante foi atribuída a letra F seguida do respectivo número (1, 2, 3 e assim sucessivamente), sendo que F significa formador participante. Portanto, os dados foram agrupados em três categorias, a saber: fontes do estresse ocupacional, sintomas e/ou manifestações do estresse, estratégias de enfrentamento ao estresse e foram submetidos a uma análise estatística descritiva (frequências absolutas e relativas).
3.2 Participantes
Foi investigada uma amostra de 20 formadores de professores do ensino básico. Destes, 11 foram do sexo masculino e 9 do sexo feminino, com idades compreendidas entre 34 anos ou mais. Em termos de habilitações acadêmicas, 17 são licenciados e três, mestres. No que se refere-se à experiência profissional, 50% tinha entre 16 e 20 anos, 30% tem experiência profissional entre 8 e 15 anos. Em termos de vínculo com o Estado, todos são nomeados definitivamente, ou seja, têm vínculos estáveis.
3.3 Procedimentos
Os dados foram coletados entre os meses de março e junho de 2017. Todos os participantes deram seu consentimento livre e informado relativo à sua adesão no estudo. Inicialmente, foram feitos contatos prévios com a direção do Instituto estudado por meio de uma carta de pedido de autorização para a realização do estudo, contendo objetivos e procedimentos do trabalho, anexada com o parecer de aprovação emitido pela Direção de Pós-Graduação, Pesquisa e Extensão da Universidade Pedagógica, Delegação de Nampula. Após a concessão da autorização, a equipe de pesquisadores apresentou-se aos professores e explicou as intenções do estudo e como seria a participação de cada um, caso consentissem. Foi salvaguardado o direito à privacidade, nomeadamente a confidencialidade e o anonimato em todo o processo da investigação, protegendo, desse modo, a identidade dos participantes.
4 Resultados
Os resultados obtidos foram agrupados em três categorias, nomeadamente: fatores do estresse, consequências do estresse e estratégias de gestão de estresse usadas pelos formadores e foram organizados em tabelas de frequências absolutas e relativas para permitir melhor compreensão.
4.1 Fatores de estresse ocupacional nos formadores
Para apurar as fontes de estresse no trabalho dos formadores, foi formulada a seguinte questão: Que situações de trabalho provocam estresse? Na Tabela 1 constam as respostas dos entrevistados para essa questão.
Observando a Tabela 1, é possível notar que diversos estressores estão presentes no trabalho docente dos formadores, destacando-se a pressão de tempo (planificação de aulas, elaboração e correção de exercícios e testes); a falta de material; seguido de sobrecarga de tarefas; o pagamento irregular de salários, ou seja, em datas não fixas. Desses fatores apontados, acrescentam-se os horários e turnos de trabalho, os problemas de aprendizagem dos formandos, a falta de participação no processo de correção dos exames de admissão.
4.2 Consequências do estresse ocupacional dos formadores
De forma a apurar as consequências do estresse ocupacional sentido pelos formadores, partiu-se da seguinte questão: Que consequências tem trazido o estresse do trabalho? Dessa questão, emergiram três categorias de respostas, nomeadamente: consequências em nível pessoal, em nível do trabalho e em nível familiar, conforme a Tabela 2.
De acordo com a Tabela 2, o estresse ocupacional percebido pelos formadores tem gerado diferentes agravos à saúde mental em nível individual (cansaço, dores de cabeça, má disposição), em nível organizacional (falta no serviço, fraco desempenho na realização de tarefas.) e em nível familiar (isolamento da família, falta de afeto e atenção com família).=
4.3 Estratégias de enfrentamento do estresse ocupacional usadas pelos formadores
Para identificar as estratégias de gestão de estresse no trabalho, fez-se a seguinte pergunta: O que você tem feito para ultrapassar ou reduzir o estresse gerado pelo trabalho? As respostas são apresentadas na Tabela 3.
Pode-se ver, na Tabela 3, que diversas estratégias são utilizadas pelos professores formadores para minimizar o estresse percebido por eles, destacando-se: conversar com amigos, conformar-se com a situação causadora de estresse, ouvir música, beber cerveja e ler livros.
5 Discussão de resultados
Os resultados obtidos neste estudo indicam que os formadores entrevistados sentem-se estressados com o trabalho. Diante disso, vários fatores foram apontados como estressores: a pressão de tempo (planificação de aulas, elaboração e correção de exercícios e testes), a falta de material, a sobrecarga de tarefas, o pagamento irregular de salários. Desses fatores apontados acrescentam-se os horários e turnos de trabalho, os problemas de aprendizagem dos formandos, a falta de participação no processo de correção dos exames de admissão. Alguns dos resultados (as pressões de tempo, o excesso de trabalho, as disparidades nas capacidades apresentadas pelos alunos) foram recorrentemente encontrados nos estudos com professores do ensino básico (Abacar, 2011), do ensino médio (Abacar & Aliante, 2016; Gomes et al., 2006), do ensino superior (Gomes, Esteves, Alvelos & Afonso, 2013) como fatores associados em níveis superiores de estresse.
Obviamente que o estresse no trabalho percebido pelos formadores tem gerado diferentes agravos à saúde mental em nível individual (cansaço, dores de cabeça, má disposição), em nível organizacional (falta no serviço, fraco desempenho na realização de tarefas.) e em nível familiar (isolamento da família, falta de afeto e atenção com a família). Robbins (2009) categoriza os sintomas de estresse em físicos, psicológicos e comportamentais. Os sintomas físicos referem-se às dores de cabeça, mudanças no metabolismo e ao aumento de ritmo cardíaco e respiratório. O autor sublinha que os sintomas psicológicos se revestem de maior importância, afirmando que o estresse pode causar insatisfação relacionado ao trabalho, tensão, irritabilidade, tédio, ansiedade. E, finalmente, aponta que os sintomas comportamentais do estresse incluem mudanças na produtividade, absentismo, rotatividade, bem como mudanças nos hábitos alimentares, aumento de consumo de álcool, tabaco, distúrbios de sono.
Em termos de estratégias de enfrentamento ao estresse, os professores formadores entrevistados recorrem às seguintes: conversar com amigos, ouvir música, beber cerveja, ler jornais, livros, incluindo os sagrados (bíblia ou alcorão), ouvir música religiosa. Kyriacou e Chien (2004) dividem as estratégias individuais de enfrentamento em duas categorias: técnicas de ação direta e técnicas paliativas. As técnicas de ação direta referem-se a coisas que um professor pode fazer para eliminar a fonte de estresse. E as técnicas paliativas não lidam com a fonte de estresse em si, mas sim visam diminuir o sentimento de estresse que ocorre. Portanto, os participantes deste estudo recorrem essencialmente às técnicas paliativas.
Considerações finais
Este estudo objetivou compreender os fatores psicossociais do estresse ocupacional, consequências do estresse, bem como estratégias de enfrentamento em professores formadores do Instituto de Formação de Professores de Nampula, em Moçambique. Os resultados obtidos permitem concluir que a pressão de tempo (planificação de aulas, elaboração e correção de exercícios e testes), a falta de material, a sobrecarga de tarefas, o pagamento irregular de salários, os horários e turnos de trabalho, os problemas de aprendizagem dos formandos, a falta de participação no processo de correção dos exames de admissão, são principais fontes de estresse no trabalho dos formadores estudados.
Como consequência do estresse percebido, este gera diferentes agravos à saúde mental em nível individual (cansaço, dores de cabeça, má disposição), em nível organizacional (falta no serviço, fraco desempenho na realização de tarefas.) e em nível familiar (isolamento da família, falta de afeto e atenção com a família).
Para minimizar os efeitos adversos do estresse sentido, os formadores entrevistados recorrem, basicamente, a técnicas paliativas de enfrentamento, tais como: conversar com amigos, ouvir música, beber cerveja, ler jornais; livros, incluindo os sagrados (bíblia ou alcorão), ouvir música religiosa.
As situações de estresse vivenciadas pelos formadores de professores investigados podem se tornar crônicas, evoluindo para a síndrome de burnout. É assim que, tal como outros autores, como Reinhold (2004), defende-se a necessidade de inclusão nos cursos de formação inicial e na capacitação de professores, de teorias e práticas de gerenciamento de estresse e burnout, conscientizando-os sobre os riscos profissionais da profissão docente.
Referências
Abacar, M. (2011). Stress ocupacional e o bem-estar de professores do ensino básico em escolas moçambicanas. Dissertação de mestrado, Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, Universidade do Porto, Porto. [ Links ]
Abacar, M. (2015). Burnout em docentes do ensino básico em escolas moçambicanas e brasileiras. Tese de doutorado, Universidade Federal de Pernambuco, Recife. [ Links ]
Abacar, M., & Aliante, G. (2016). Fontes de estresse ocupacional em professores moçambicanos do ensino secundário geral do 1º ciclo: caso da cidade de Nampula. [Comunicação oral]. Jornadas Científicas do MINEDH. Maputo-Moçambique.
Abacar, M., & Travasso, F. A. (2016). Trabalho, prazer e colapso do professor: estresse ocupacional e estratégias de gestão em profissionais do ensino primário público em Moçambique. [Comunicação oral]. Conferência sobre Educação para Todos. Maputo-Moçambique.
Andrade, P. S., & Cardoso, T. A. O. (2012). Prazer e dor na docência: revisão bibliográfica sobre a Síndrome de Burnout. Saúde Soc., São Paulo, 21(1), 29-140. [ Links ]
Antoniou, A. G., Davidson, M. J., & Cooper, C. L. (2003). Occupational stress, job satisfaction and health state in male and female junior hospital doctors in Greece. Journal of Managerial Psychology, 18(6), 592-621. [ Links ]
Assimeng-Boahene, L. (2003). Understanding and Preventingburnout among Social Studies Teachers in Africa. The Social Studies, 94(2), 58-62. [ Links ]
Bardin, L. (1977). Análise do conteúdo. Lisboa: Edições 70. [ Links ]
Bicho, L. M. D., & Pereira, S. R. (2007). Stress ocupacional. Coimbra, Instituto Politécnico de Coimbra, Instituto Superior de Engenharia de Coimbra. [ Links ]
Carlotto, M. S., Braun, A. C., Rodriguez, S. Y. S., & Diehl, L. (2014). Burnout em professores: diferença e análise de gênero. Contextos Clínicos, 7(1), 86-93. Doi: 10.4013/ctc.2014.71.08. [ Links ]
Dalagasperina, P., & Monteiro, J. K. (2014). Preditores da Síndrome De Burnout em docentes do ensino privado. Psico-USF, Bragança Paulista, 19(2), 265-275. Recuperado de http://dx.doi.org/10.1590/1413-82712014019002011. [ Links ]
Farber, B. A. (1991). Crisis in education. Stress and burnout in the american teacher. San Francisco: Jossey-Bass Inc. [ Links ]
Kyriacou, C. (2001). Teacher stress: directions for future research. Educational Review, 53(1), 27-35. DOI: 10.1080/00131910120033628. [ Links ]
Kyriacou, C., & Chien, P. Y. (2004). Teacher stress in Taiwanese primary schools. Journal of Educational Enquiry, 5(2), 86-104. [ Links ]
Gold, E., Smith, A., Hopper, I., Herne, D., Tansey, G., & Hulland, C. (2010). Mindfulness-Based Stress Reduction (MBSR) for Primary School Teachers. J. Child Fam. Stud., 19, 184-189. Retrieved from http://dx.doi.org/10.1007/s10826-009-9344-0. [ Links ]
Gomes, A. R., Silva, M. J., Mourisco, S., Silva, S., Mota, A., & Montenegro, N. (2006). Problemas e desafios no exercício da actividade docente: um estudo sobre o stress, "burnout", saúde física e satisfação profissional em professores do 3º ciclo e ensino secundário. Revista Portuguesa de Educação, 19(1), 67-93 [ Links ]
Gomes, A. R., Oliveira, S., Esteves, A., Alvelos, A., & Afonso, J. (2013). Stress, avaliação cognitiva e burnout: um estudo com professores do ensino superior. Revista Sul Americana de Psicologia, 1(1), 1-20. [ Links ]
Howard, S., & Jonhson, B. (2004). Resilient teachers: resisting stress and burnout. Social Psychology of Education, 7, 399-420. [ Links ]
Lambert, R. G., Mcarthy, C., O'donnell, M., & Wang, C. (2009). Measuring elementar teacher stress and coping in the classroom: validity evidence for the classroom appraisal of resources and demands. Psychology in the Schools, 46(10), 973-988. Retrieved from https://doi.org/10.1002/pits.20438. [ Links ]
Lhospital, A. S., & Gregory, A. (2009). Changes in teacher stress through participation in prereferral intervention teams. Psychology in the schools, 46(10), 1098-1112. Doi: 10.1002/pits.20455 [ Links ]
Lipp, M. E. N. (Org.). (2000). O Stress está dentro de você (2a ed.). São Paulo: Contexto. [ Links ]
Martins, M. G. T. (2005). Sintomas de stress em professores das primeiras séries do ensino fundamental: um estudo exploratório. Dissertação de mestrado, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Lisboa, Portugal. [ Links ]
Maslach, C., & Leiter, M. P. (1999). Trabalho: fonte de prazer ou desgaste? Guia para vencer o estresse na empresa. Campinas/São Paulo: Papirus. [ Links ]
Maslach, C., Schaufeli, W. B., & Leiter, M. (2001). Job burnout. Ann Rev. Psycholy, 52, 397-422. [ Links ]
Massola, R. M. (2007). Estresse "versus" Qualidade de Vida: uma abordagem para educadores. In R. Vilarta (Org.). Alimentação saudável e qualidade de vida. (Cap. 14, pp. 133-150), Campinas: IPES. [ Links ]
Melo, B. T., Gomes, A. R., & Cruz, J. F. A. (1997). Stress ocupacional em profissionais de saúde e do ensino. Psicologia: teoria e investigação, 2, 53-72. [ Links ]
Mokdad, M. (2005). Occupational stress among Algerian teachers. African Newsletter on Occupational Health and Safety, 15, 46-47. [ Links ]
Moreno-Jimenez, B., Garrosa-Hernandez, E., Gálvez, M., González, J. L., & Benevides-Pereira, A. M. T. (2002). A avaliação do burnout em professores. Comparação de instrumentos: CBP-REMBI-ED. Psicologia em Estudo, Maringá, 7(1), 11-19. [ Links ]
Murphy, L. R. (2008). Mental capital and wellbeing: making the most of ourselves in the 21st century. The Government Office for Science.
Olaitan, O. L. (2009). Prevalence of job stress among primary school teachers in south west, Nigeria. African Journal of Microbiology Research, 3(8), xxx-xxx. [ Links ]
Reinhold, H. H. (2004). O sentido da vida: prevenção de estresse e burnout do professor. Tese de doutorado, Centro de Ciências da Vida da PUC-Campinas, Campinas: Brasil. [ Links ]
Robbins, S. P. (2009). Fundamentos do comportamento organizacional. São Paulo: Pearson Prentice Hall. [ Links ]
Selye, H. (1976). Stress in health and disease. Boston: Butterworths. [ Links ]
Stacciarini, J. M. R., & Troccoli, B. T. (2001). O estresse na atividade ocupacional do enfermeiro. Revista Latino- Americana de Enfermagem, 9(2), 112-120. [ Links ]
Recebido em: 14/3/2018
Aprovado em: 18/2/2020