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Revista Polis e Psique
versão On-line ISSN 2238-152X
Rev. Polis Psique vol.11 no.2 Porto Alegre maio/ago. 2021
ARTIGOS
Processos grupais com adolescentes em situação de vulnerabilidade social
Group processes with social vulnerability teenagers
Procesos grupales con adolescentes en situación de vulnerabilidad social
Paulo Ricardo de Araújo Miranda; Andréia Isabel Giacomozzi; Juliana Gomes Fiorott
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis, SC, Brasil
RESUMO
O presente relato de experiência visa problematizar a prática com grupos de adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Realizou-se cinco grupos entre agosto e dezembro de 2019. Os grupos eram fechados e com duração de 1 hora e 40 minutos cada. Como método e forma de manejo grupal utilizou-se a estratégia de coordenação cartográfica. Os resultados e discussão apontam rizomaticamente para diferentes direções: a alta disponibilidade dos adolescentes em participar dos grupos; a importância do delineamento e da sensibilização ao setting grupal; o modo como os vetores macropolíticos e institucionais incidem nos processos grupais; os efeitos da sub-apropriação da língua formal na dinâmica dos grupos e na circulação social; a importância de dar lugar ao que não tem lugar; e, o mapeamento de expressões com camadas de sentido. Por fim, aponta-se o grupo como dispositivo potente para a instauração de novas formas de vida.
Palavras-chave: Grupo; Adolescentes; Situação de vulnerabilidade social; Cartografia.
ABSTRACT
The present experience report aims to problematize the practice with groups of adolescents in situations of social vulnerability. Five groups were held between August and December 2019. The groups were closed and lasting 1 hour and 40 minutes each. As a method and as a form of group management was used the strategy of cartographic coordination. The results and discussion indicate rhizomatically to different directions: the high availability of adolescents to participate in groups; the importance of design and sensation by the participants of the group setting; the macro-political and institutional vectors converging on group processes; the effects of the sub-appropriation of formal language in the groups dynamics and social mobilities; the importance of step up a place for what has no place; and, the mapping of expressions with layers of meaning. Finally, the group is pointed out as a powerful device for the creation of new forms of life.
Keywords: Group; Adolescents; Situation of social vulnerability; Cartography.
RESUMEN
El presente informe de experiencia tiene como objetivo problematizar la práctica con grupos de adolescentes en situaciones de vulnerabilidad social. Se realizaron cinco grupos entre agosto y diciembre de 2019. Los grupos fueron cerrados y ocurrieron durante 1 hora y 40 minutos cada uno. Como método y forma de seguimiento grupal se utilizó la estrategia de coordinación cartográfica. Los resultados y la discusión apuntan rizomaticamente a diferentes direcciones: la alta disponibilidad de adolescentes para participar de los grupos; la importancia del diseño y de la sensibilización del espacio grupal; los vectores macropolíticos y institucionales en los procesos grupales; los efectos de la sub-apropiación de la lengua formal sobre la dinámica grupal y la circulación social; la importancia de producir lugar para lo que no tiene lugar; y, el mapeo de expresiones con capas de sentido. Finalmente, se señala el grupo como un fuerte dispositivo para la producción de nuevas formas de vida.
Palabras-clave: Grupo; Adolescentes; Situación de vulnerabilidad social; Cartografía.
Introdução
O presente manuscrito visa problematizar, a partir de uma experiência de estágio em psicologia, a intervenção com grupos de adolescentes em situação de vulnerabilidade social em uma instituição do terceiro setor. De acordo com Foucault (2004), o exercício da problematização busca colocar questões não diretamente aos sujeitos, mas sim a um determinado ordenamento institucional ou a um conjunto de práticas sociais. No caso da configuração resultante da intersecção entre adolescência e situações de vulnerabilidade social, diversos estigmas são recorrentemente reproduzidos por diferentes setores da sociedade civil, do Estado e das instituições.
Em muitos contextos em que são aplicadas, as concepções hegemônicas sobre o fenômeno da adolescência não correspondem à realidade brasileira. A despeito das autoras Papalia e Feldman (2013, p. 386) apontarem a adolescência como período de transição da infância para a vida adulta que, por convenção, vai dos 11 aos 19 ou 20 anos e cujo "início da vida profissional ocorre mais tarde", tal definição de adolescência desconsidera, por exemplo, a experiência de jovens estruturalmente empobrecidos em países de capitalismo periférico. Além disso, ainda que as pesquisadoras reconheçam que a adolescência é uma construção social, Papalia e Feldman (2013) ao sinalizar que existem diferenças na experiência do "adolescer" entre diferentes culturas, esquecem de apontar que dentro de uma mesma cultura, os marcadores sociais (classe, gênero, raça-etnia, deficiência, entre outros) são fundamentais para a reflexão interseccional da vivência (ou não) da adolescência.
Para além de uma construção social, o período de quase uma década de transição da infância à fase adulta não ocorre, ou ocorre parcialmente, para uma parcela significativa de jovens de classes sociais empobrecidas (Costa, 2012). Enquanto que para adolescentes de classes A e B a experiência da adolescência é marcada por grupos transitórios cuja valorização do eu aparece desimplicada da sociedade, nos adolescentes de classes C, D e E o período da adolescência remete à grupos mais fixos de pertencimento associados a um fator protetivo à sobrevivência, além de ser um processo em que os riscos de gravidez precoce, exposição à violência física/simbólica e a necessidade de inserção no mercado de trabalho para complementar a renda familiar são mais prevalentes (Ozella & Aguiar, 2008; Guimarães & Romanelli, 2002).
Nesse sentido, as concepções de desenvolvimento sobre a adolescência, tal como definida pela literatura clássica estadunidense, desconsideram a especificidade das desigualdades e violências estruturais no contexto brasileiro. Portanto, neste artigo usa-se paradoxalmente o conceito-enquadramento "adolescente", pois ao mesmo tempo que esta aplicação constitui-se como ato normativo socialmente reiterado, este uso também busca considerar aqueles que o conceito-enquadramento deixa de fora, colocando, deste modo, o próprio campo de normatividade da adolescência em questão (Butler, 2017).
Como é descrito pela Política Nacional de Assistência Social (PNAS), a expressão multidimensional "situação de vulnerabilidade social" avança no sentido de superar as concepções essencializantes e centradas somente no acesso a renda, as quais marcaram o pensamento precedente sobre a pobreza e a falta de direitos (Brasil, 2004). De acordo com Carmo e Guizardi (2018, p. 2), "a concepção de vulnerabilidade denota a multideterminação de sua gênese não estritamente condicionada à ausência ou precariedade no acesso à renda, mas atrelada também às fragilidades de vínculos afetivo-relacionais e desigualdade de acesso a bens e serviços públicos". Contudo, ainda que supere certos reducionismos que marcaram a compreensão do fenômeno de empobrecimento estrutural, a noção de "vulnerabilidade" também é atravessada por uma imprecisão que pode dificultar ou facilitar os processos de mediação social realizados pelas políticas públicas e/ou pelo terceiro setor, o que varia, portanto, de acordo com os princípios éticos, epistemológicos, técnicos e políticos de determinada gestão, serviço e/ou profissionais (Carmo & Guizardi, 2018).
Tendo em vista que o presente trabalho se desenvolveu em uma instituição do terceiro setor, em face ao questionamento "como as organizações não-governamentais [terceiro setor] podem atuar no sentido de empoderar sujeitos sociais?", Scherer-Warren (2006) sinaliza três direções: (I) Atuação orientada no resgate da dignidade dos sujeitos e grupos socialmente marginalizados, pois sem a superação das discriminações não há luta por direitos; (II) Promoção de ações coletivas com as comunidades excluídas, criando novas conexões sociais e fortalecendo vínculos; e (III) Associação à outras experiências de redes e mobilizações de base. A inserção do estágio em psicologia na dinâmica institucional da ONG realizou-se nas direções "I" e "II", em que foram promovidos trabalhos grupais cuja função era a de mapear as principais demandas que atravessavam os sujeitos do grupo ao mesmo tempo em que se desenvolviam os processos grupais, objetivando, com isso, superar discriminações e fortalecer vínculos.
Tendo em vista que os grupos não são ilhas isoladas dos contextos onde eles ocorrem, faz-se importante contextualizar a instituição na qual os processos grupais aconteceram (Fernandéz, 2006). Vinculada ao Ministério do Trabalho e Emprego, a Organização Não-Governamental na qual o estágio foi realizado é responsável por qualificar jovens de 14 a 18 anos que tenham interesse ou necessitem ingressar no mercado de trabalho (Martins & Schefer, 2018). Como assegura o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), as condições de trabalho do adolescente em profissionalização devem garantir um caráter educativo no processo de trabalho e, ao mesmo tempo, respeitar "à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento" (Lei n. 8.069, 1990). Nesse sentido, na instituição onde foram executadas as atividades são desenvolvidas ações que qualificam os adolescentes para rotinas administrativas e, além disso, são aplicadas metodologias de avaliação e capacitação que buscam ampliar o leque de possibilidades dos jovens na inserção no mundo do trabalho (Martins & Schefer, 2018).
Entretanto, é necessário complexificar esta questão de inserção precoce no mundo do trabalho pois, ainda que seja uma necessidade concreta para uma parcela significativa de jovens, esta é também uma forma de manutenção da condição de empobrecimento estrutural, visto que o ingresso precoce no mundo do trabalho impacta as condições de estudo, lazer e convívio familiar/comunitário destes sujeitos (Costa, 2012). Doravante, tal processo de iniciação profissional precoce aponta para a lógica da "dialética da inclusão perversa", a qual se realiza na medida em que inclui-se uma parcela da população no circuito reprodutivo das atividades econômicas e, ao mesmo tempo, exclui-se essa mesma população do acesso à participação ativa na vida social (lazer, cultura, estudo, política, entre outros), ou seja, através da reificação de insuficiências e privações (Sawaia, 2001a).
Partindo-se do pressuposto de que questões estruturais-macropolíticas de ordem econômica, social e cultural atravessam os sujeitos com os quais a psicologia se encontra, cabe a pergunta, qual o papel da psicologia nas suas práticas profissionais em contextos grupais com adolescentes em situação de vulnerabilidade social? Com base em uma epistemologia empirista e pluralista, articulações micropolíticas se mostraram potentes ao apostar na insistência da possibilidade de diferir como coextensiva a qualquer campo social. Nessa perspectiva, o acompanhamento dos fluxos de intensidades associados à atenção cartográfica dos coeficientes de transversalidade produz as condições de possibilidade para a experimentação de acontecimentos (Neto, 2015). Enquanto exercício clínico e ético-político na prática profissional com os sujeitos, buscou-se a diminuição da potência de padecimento e a expansão da potência de ação a partir da produção de bons encontros em que a afetividade foi mediadora das relações (Sawaia, 2001b). Para tanto, o trabalho cartográfico com grupos se evidencia importante ao possibilitar um setting que parte de um certo "comum" para colocar em tensão as lógicas hegemônicas e a capacidade de diferir pela criação de novos possíveis.
Compreende-se o dispositivo grupal como um novelo composto por linhas de visibilidade, enunciação e força (Barros, 1996). Nesse sentido, o conceito de grupo-dispositivo caracteriza-se como um conjunto complexo e multilinear cujo movimento é conectado por processualidades rizomáticas que descentram os lugares de sujeito-objeto (Deleuze, 1988). O grupo então se desenvolve a partir de um emaranhado de linhas que no encontro grupal se cruzam pelas histórias que nele se compõem (Barros, 2007). Assim, a forma como o processo grupal foi manejado está associado aos marcos teóricos e epistemológicos de grupo dispositivo cuja coordenação se caracteriza como cartográfica por acompanhar processos de subjetivação e dessubjetivação (Pelbart, 2016).
Dada essa perspectiva sobre o grupal, como dizer destes corpos grupais? e mais, como definir o que é um corpo? Para Latour (2007, p. 39),
Podemos procurar definir o corpo como um interface que vai ficando mais descritível quando aprende a ser afectado por muitos mais elementos. O corpo é, portanto, não a morada provisória de algo superior - uma alma imortal, o universal, o pensamento - mas aquilo que deixa uma trajectória dinâmica através da qual aprendemos a registrar e a ser sensíveis àquilo de que é feito o mundo.
Nesse sentido, pode-se delinear o estar-em-grupo como uma corporeidade provisória dinâmica e singular. Isto significa pensar o "corpo grupal como essa variação contínua entre seus elementos heterogêneos, como afetação recíproca entre potências singulares, numa certa composição de velocidade e lentidão" (Pelbart, 2008, p. 2). Considerando que cada um dos cinco grupos foi a expressão de uma corporeidade e tendo em vista que descrever cada uma das mais de duas dezenas de encontros é inviável às possibilidades deste manuscrito, buscou-se: (1) relatar questões transversais aos diferentes corpos grupais; (2) descrever as estratégias de manejo da coordenação-cartográfica apreendidas no decorrer do processo grupal, e (3) problematizar os vetores de força, visibilidade e enunciabilidade que se agenciaram nos corpos grupais. Objetivou-se, portanto, traduzir em corpo textual a trajetória dinâmica que compôs as singularidades nas multiplicidades dos corpos grupais.
Método
Local
Realizado em uma Organização do Terceiro Setor localizada no Estado de Santa Catarina, o trabalho com grupos foi feito em uma sala de convivência da instituição. A sala continha diversos puffs, alguns bancos, um teclado, um violão, uma janela e uma estante de livros. A sala não dispunha de recursos audiovisuais e sonoros. Antes do início dos grupos o ambiente era organizado de modo circular a fim de criar um setting grupal e ampliar a interação entre os participantes. Salienta-se, entretanto, que a organização circular do espaço grupal não horizontaliza as relações entre as pessoas, mas sim possibilita a emergência de certa tensão produtiva que atravessa as marcas de força, enunciabilidade e visibilidade, isto é, de olhar para todos e de ser olhado por todos (Fernández, 2006).
Participantes
Realizado por meio de inscrição espontânea, participaram ao todo 42 adolescentes distribuídos nos cinco grupos que ocorreram (A, B, C, D e E). Os grupos ocorreram em dois ciclos distintos em consonância com o calendário da instituição. No primeiro ciclo ocorreram grupos A e B, ambos com 16 participantes no início. No segundo ciclo abriu-se novas inscrições e optou-se por colocar os membros que permaneceram dos grupos A e B em um mesmo grupo (C), enquanto que o grupo D seria de adolescentes que ainda não haviam participado dos processos grupais. Em função do esvaziamento do grupo C, decidiu-se juntá-lo ao grupo D durante o segundo ciclo formando, portanto, o grupo E.
No que se refere à dimensão étnico-racial, a maioria dos participantes se autodeclarou preta e/ou parda sendo que compunham também o grupo pessoas brancas e indígenas. Quanto à questão de gênero, nos grupos A, B e C a maioria dos membros eram mulheres, enquanto que nos grupos D e E os homens eram maioria no espaço grupal. Situações de violência familiar, escolar e comunitária, imigração, sofrimento psíquico grave, intolerância religiosa, gravidez na adolescência, constrangimentos de base racial, sexual e de gênero, suicídio, negligência do Estado no acesso aos direitos, uso/abuso de álcool e outras drogas relacionamentos amorosos e dificuldades em expressar sentimentos foram os temas mais comuns e transversais aos cinco grupos.
Instrumentos e Procedimentos
Só é possível delinear um dispositivo a partir da análise do campo de problemáticas que ele busca responder e/ou se agenciar. Assim, não há uma fórmula universal que sustente uma teoria única sobre o "grupo", senão modos locais de produção de espaços potencialmente intensivos aos processos de subjetivação e dessubjetivação (Fernández, 2006; Pelbart, 2008). Isto é, para propor um dispositivo grupal foi necessário considerar os sujeitos e suas características em comum a fim de que o dispositivo comporte a produção de agenciamentos. Portanto, compreende-se que agenciar o setting grupal corresponde a um processo de composição na medida em que parte do reconhecimento e acompanhamento dos planos de consistência que vão se configurando ao longo dos encontros nos grupos.
Na tentativa de buscar um plano de consistência em que as práticas grupais pudessem se desdobrar, os grupos eram fechados, com duração de 1 hora e 40 minutos, realizados uma vez por semana e ao longo de 7 semanas (primeiro ciclo) e 6 semanas (segundo ciclo). Os grupos eram coordenados por um estagiário de psicologia e por uma psicóloga voluntária da instituição. Em função do curto espaço de tempo que compreendeu o exercício de estágio, de agosto a dezembro de 2019, o uso de dinâmicas teve a função de catalisar processos grupais de acordo com as temáticas sugeridas pelos próprios adolescentes nos primeiros encontros. Sendo assim, para cada dia se organizava previamente uma dinâmica associada a uma das temáticas ou às necessidades que o grupo manifestava em seus planos de consistência, ora exercícios de expressão corporal, ora atividades que ampliassem as participações, ora dinâmicas que misturassem os sujeitos, entre outras. Tais necessidades eram mapeadas no decorrer do próprio processo grupal e nas trocas de afetações entre o coordenador-estagiário e a psicóloga.
Como forma de manejo partiu-se de uma perspectiva cartográfica que acompanha processos e conhece a realidade ao mesmo tempo que a transforma (Passos & Barros, 2015a). Nesse sentido, a atenção curiosa da coordenação-cartográfica é imprescindível, visto que se configura pela busca de signos com camadas espessas de sentido contextualizadas nas linhas de força que, ao mesmo tempo que articulam movimentos maquínicos, deixam pontas soltas às intervenções da coordenação-cartográfica (Kastrup, 2015). Além disso, após os grupos eram "feitos relatos regulares (...) que reúnem tanto informações objetivas quanto impressões que emergem no encontro com o campo" (Barros & Kastrup, 2015, p. 70), ou seja, registrou-se desde os principais pontos de discussão com seus diferentes efeitos produzidos nos participantes, como também, o detalhe, o equívoco, o aparentemente sem sentido. Ainda, a coordenação-cartográfica não pode prescindir de se orientar a uma posição lateralizada no plano grupal, a qual parte do reconhecimento da força das afecções para se colocar em composição com o campo (Alvarez & Passos, 2015). Como sinaliza Kastrup (2015, p. 48), "a cartografia não é uma competência, mas uma performance".
Resultados
Os resultados estão descritos de modo transversal e rizomático aos corpos grupais, isto é, atravessando suas fronteiras e apontando para diferentes direções, são elas: a alta disponibilidade dos adolescentes em participar dos grupos; a importância do delineamento e da sensibilização ao setting grupal; o modo como os vetores macropolíticos e institucionais incidem nos processos grupais; os efeitos da sub-apropriação da língua formal na dinâmica dos grupos e na circulação social; a importância de dar lugar ao que não tem lugar; e, por fim, o mapeamento de expressões com camadas de sentido.
Como forma de convidar os adolescentes para o primeiro ciclo grupal, o coordenador e a psicóloga passaram em todas as quatro salas divulgando a abertura de inscrição aos grupos junto com a antiga coordenadora de grupos da instituição. Foi perceptível como a antiga coordenadora exerceu uma função de referência e auxiliou na receptividade à proposta de realização dos grupos. Ao todo foram 32 adolescentes inscritos nos grupos A e B. Logo nos primeiros encontros se evidenciou uma ampla disponibilidade e abertura de muitos adolescentes em participar ativamente do processo grupal. Seja pelo compartilhamento de questões pessoais logo nos primeiros encontros, seja pela baixa resistência à figura do coordenador e da psicóloga, essa dimensão de abertura e disponibilidade pode estar associada ao estabelecimento, logo no primeiro encontro, de um contrato grupal que, entre outras coisas, co-responsabiliza os adolescentes pela manutenção do sigilo daquilo que é conversado no grupo. Apesar de parecer uma operação simples, há aí não só um descentramento da responsabilidade única pelo sigilo do coordenador e da psicóloga, como também uma construção discursiva da implicação pessoal como parte constitutiva da dinâmica grupal. Ou seja, para que esse espaço fosse de fato seguro, fez-se necessário a implicação de todos.
Mesmo que o fator implicacional dos adolescente ao processo grupal fosse bem perceptível, ainda assim, o grupo enquanto lugar de encontro que partilha um certo comum não é algo autoevidente, tampouco simples de se construir com os participantes. Dificuldades apareciam quando alguns membros ocupavam quase que totalmente os momentos de fala ou, ainda, nas situações em que o ponto em comum que enoda (faz "nós") o grupo se perdia e os participantes passavam a multiplicar os assuntos em falas dispersas, multifocalizadas, em que muitos falam mas poucos se escutam. Cenário frequente quando dinâmicas abertas eram construídas nos grupos em fase inicial de vinculação, o delineamento do setting grupal como espaço de fala e escuta, foi um processo de construção que, ainda que característico das fases iniciais de grupos fechados, demandou estratégias de manejo com dinâmicas que sensibilizassem os participantes ao corpo grupal.
A dimensão macropolítica dos processos de assujeitamento desses adolescentes se expressavam nos atravessamentos dos marcadores de gênero, raça-etnia, classe, geração, moradia, sexualidade, religiosidade, imigração (entre outros) que se pronunciavam, em maior ou menor grau, nas linhas de visibilidade, enunciabilidade e força dos grupos. Relatos de sofrimentos psíquicos cronificados como automutilações, diagnósticos pretéritos de depressão, isolamento, ideações e/ou tentativas de suicídio apareceram ao longo dos grupos principalmente entre as adolescentes mulheres. Apesar dos efeitos serem singulares à experiência de cada sujeito, casos de convívio diário com situações de violência familiar, escolar e comunitária, relatos de abuso sexual no espaço doméstico e intolerância social/familiar às sexualidades homossexuais e bissexuais se mostravam como os principais vetores de violência contra essas meninas. Por sua vez, era frequente nos grupos a dificuldade de alguns meninos em acessar e expressar seus sentimentos, cujos efeitos eram o de resistir e evitar dinâmicas que abordassem aberturas emocionais.
A perversidade da destituição material ao qual esses adolescentes foram estruturalmente submetidos também se realçava na dimensão simbólica, especificamente quanto à escrita. Nas poucas dinâmicas em que se propôs a escrita de pequenos textos ou frases longas como meio de agenciar o processo grupal, notou-se que haviam impedimentos na execução e nos usos da escrita. Embora as dinâmicas sejam apenas um meio (e não um fim em si mesmo) de agenciar as múltiplas linhas presentes no dispositivo grupal, a dificuldade nos usos da escrita como recurso de expressividade e comunicação chamou atenção. Ainda que os motivos sejam diversos e singulares a cada sujeito, aponta-se o ato de escrever como prática distanciada dos adolescentes, o que, considerando a centralidade da escrita na sociedade ocidental, pode ter efeitos na capacidade de circulação social desses jovens.
A atividade grupal realizada fora da instituição, em um espaço público da cidade, destacou-se pelas situações que fez emergir. Foi interessante notar a força daquilo que aparentemente não tem função ou relevância ao longo do percurso de ida até o espaço onde ocorreram os grupos. Tendo em vista que o processo grupal dá acesso a uma certa dimensão da singularidade dos sujeitos no grupo, a travessia pelo bairro possibilitou ao coordenador e à psicóloga se aproximarem dos adolescentes por outra configuração relacional. Nesse settingperambulante e transeunte pelas ruas da cidade, um dos adolescentes que se opunha insistentemente a muitos comentários realizados pelos membros do grupo, mas que quase nunca falava na primeira pessoa do singular sobre seus sentimentos, relatou que toma medicamentos para dormir pois tem dificuldade de relaxar. Uma outra menina que falava muito pouco no grupo comentou com o coordenador que tem muitas dificuldades em falar e expressar sentimentos, que prefere se isolar e que sente que sua história é pesada demais para ser socializada. Ainda que seja indimensionável o efeito para esses dois adolescentes desse momento de escuta peripatética o que se busca argumentar aqui é como muitas vezes se aprofundam vínculos e se criam possibilidades no estar-junto justamente em situações onde menos se espera que algo possa acontecer. Dar lugar ao aparentemente sem sentido e as trocas inesperadas também foi um exercício ativo no fazer da coordenação-cartográfica.
Como estratégia de manejo de coordenação em uma perspectiva cartográfica, inventada no curso do acompanhamento dos processos grupais, o estagiário-coordenador-cartógrafo buscava identificar e assinalar expressões com camadas espessas de sentido que emergiram na cena grupal. São alguns exemplos: "homem não chora", "toda piada é só uma piada", "ideologia de gênero", "masturbação é pecado", "só na violência que aprende", entre outras. Isto é, sentenças que comportam uma série de sentidos (explícitos ou implícitos) e que carregam vários não-ditos no próprio enunciado. Assinala-se que, se as frases não são homogêneas e nem tem a mesma potencialidade ao produzir efeitos nos grupos, tampouco as respostas dos coordenadores a essas sentenças foi padronizada ou uniforme. Ora se questionava um certo pressuposto socialmente naturalizado, ora se ecoava frases que exprimiam um sentimento difícil de verbalizar, ora se pedia para explicar o que significava aquilo que o sujeito estava dizendo. As variações eram necessárias pois consideravam as condições de emergência do discurso. Ainda que se aponte estratégias de manejo, não há uma regra ou receita universal a se seguir, por isso, a implicação na singularidade do emaranhado de linhas que compuseram o dispositivo grupal foi tão importante no fazer cartográfico. Em função disso, inclusive, que a coordenação-cartográfica não é uma competência mas sim uma performance.
Contrariamente às abordagens que, principalmente no encontro com pessoas em situação de vulnerabilidade social, somente trabalham sob o enfoque do sofrimento, daquilo que falta e da escassez, quase como velando um corpo cuja única possibilidade é a de padecer em paralisia frente às condições de possibilidade que o engendram, a perspectiva cartográfica na qual se localizou o presente trabalho aponta em uma direção radicalmente distinta. Sem abrir mão de acolher e buscar elaborar no bojo do corpo-grupo os elementos de dor e de tristeza que os adolescentes traziam, o enfoque do trabalho se dava justamente na tentativa de impulsionar e ampliar o conatus dos participantes do grupo. Tal movimento se configurava na medida em que se valorizava relatos que abordassem desejos, manifestações artísticas e de experimentação da poética do existir, ou ainda, na ruptura com estereótipos e preconceitos que os limitavam às rígidas fronteiras da forma-individuum e restringiam seus modos de pensar, sentir e agir. Transformar a realidade a partir da intensificação do coeficiente de transversalidade que escapa aos mecanismos molares de formatação das subjetividades, eis a aposta da coordenação-cartográfica no acompanhamento dos processos grupais com adolescentes em situação de vulnerabilidade social.
Discussão
Com base no que foi relatado e descrito nos resultados, a discussão visa problematizar os elementos apresentados das experiências nos corpos-grupais por meio da conjugação com marcos teóricos heterogêneos. Compreende-se o comum como cerne genealógico do termo "grupo", entretanto parte-se de um pressuposto que não compreende o comum como processo de homogeneização, consenso e estabilização (Fernández, 2006). Para Pelbart (2008) a noção moderna de "comunidade", como representação de uma totalidade harmônica, fusional e quase-divina na prática nunca existiu.
Pensar o "comum" da comunidade, e invariavelmente dos grupos, mostrou-se mais potente quando se reconhece o paradoxo inexorável que configura uma dada partilha do sensível. Segundo Rancière (2009, p. 15) partilha do sensível é "o sistema de evidências sensíveis que revela, ao mesmo tempo, a existência de um comum e dos recortes que nele definem lugares e partes respectivas". Isto é, o termo "partilha" revela um duplo, visto que significa, ao mesmo tempo, a divisão dos lugares e funções entre partes respectivas e, ao mesmo tempo, a possibilidade de tomar parte (participar) de uma dada configuração sensível que é comum. Nesse sentido, a consistência paradoxal do comum se dá precisamente pela sua condição dinâmica, heterogênea e plural (Pelbart, 2008). E é nessa micropolítica do grupal (que não se opõem à macropolítica como pares antinômicos, mas aparece justamente misturado a ela) que é possível acompanhar o composto heterogêneo de corpos, linhas, discursos, crenças e desejos que compõe os estratos subjetivos da sociedade brasileira (Neto, 2015).
Como desdobramento dessa compreensão sobre o grupal urge superar as noções de grupo-ilha e de grupo como local intermediário entre o indivíduo e a sociedade. Ao pressupor que o grupo está isolado dos marcadores sociais e da instituição em que se efetiva, a concepção de grupo-ilha é limitada visto que tende a desconsiderar, no decurso do processo grupal, os vetores macropolíticos e institucionais que emergem na cena grupal (Fernández, 2006). Isto é, o equívoco é a suposição de que o "psicológico" e o "social" são entidades completamente separadas e cujas dinâmicas não se influenciam no grupo. Nesse sentido, esvai-se também a possibilidade de compreensão do grupo como local intermediário entre indivíduo e sociedade, ideia que remete aos fundamentos renascentistas e antropocêntricos do mundo moderno cuja composição da forma-individuum se dá pelo descolamento do social. Em oposição à essas compreensões, partiu-se de uma perspectiva em que o social enoda e desenoda constantemente com o psicológico, sendo o grupo, portanto, local de produção intensiva (e não intermediária) de atravessamentos e misturas por linhas que não cessam de proliferar, povoar e contagiar (Fernández, 2006; Pelbart, 2006). Em função disso, talvez, que a maioria dos temas sugeridos pelos adolescentes estavam associados às questões macropolíticas de gênero, raça-etnia, sexualidade, relações familiares, religiosidade, violência na escola, entre outros.
Não dissociar em pares antinômicos indivíduo e sociedade significa pensar também a forma como aspectos macropolíticos incidem nos modos de subjetivação destes adolescentes, principalmente no que tange à dificuldade de fazer um uso instrumental da língua escrita. Como assinala um estudo de Cerutti-Rizzatti (2009) que também se desenvolveu com pessoas em situação de vulnerabilidade social no Estado de Santa Catarina, a dificuldade de apropriação da língua portuguesa em sua configuração formal e em sua diversidade de tipos de uso de acordo com diferentes contextos, pelo aspecto grafocêntrico da sociedade ocidental, limita a capacidade que os adolescentes têm de complexificar respostas simbólicas nas mediações estabelecidas com a sociedade. Contudo, é importante salientar aqui que não se busca minorar a apreensão singular da linguagem que caracteriza a fala e a escrita do sujeito falante. Trata-se, isto sim, de apontar que, sendo a língua uma instituição de poder, apropriar-se das modalidades de uso da língua formal amplia as possibilidades simbólicas de mediação social. Enquanto incidência macropolítica aponta-se, portanto, indícios de como a negligência do Estado na garantia do direito ao acesso à educação pública de qualidade reflete na manutenção e aprofundamento das desigualdades sociais (Costa, 2012).
Ora, se a prática cartográfica é um exercício de performance, tal como assinala Kastrup (2015), então, em certa medida ela se insere no regime estético das artes e se configura por uma certa "política da narratividade". Essa política da narratividade pode ser traduzida como "uma posição que tomamos quando, em relação ao mundo e a si mesmo, definimos uma forma de expressão do que se passa, do que acontece" (Passos & Barros, 2015b, p. 152). Nesse sentido, foi preciso estar atento aos enodamentos e desenodamentos que aconteceram nos grupos, dando lugar àquilo que não tem lugar e aparentemente "não tem função", "não é intervenção" ou que é "somente um detalhe". Por exemplo, nos comentários despretensiosos que eram feitos nos grupos, nas situações inusitadas, nas aproximações que foram possibilitadas pela circulação peripatética na cidade (Lancetti, 2008), ou seja, naquilo que aparentemente não correspondia ao setting grupal mas que era uma linha de força que se insistia nele (Barros, 1996). Mesmo que não houvesse um produto artístico específico em criação, aponta-se o regime estético das artes como uma postura ética dos coordenadores em relação ao processo grupal, na medida em que se acompanha e se intensifica movimentos de subjetivação e dessubjetivação heterogêneos que podem reconfigurar as formas sensíveis de pensar, sentir e agir (Rancière, 2009). Portanto, dar lugar àquilo que não tem lugar foi um modo de investir na potência desterritorializante e transversalizante de reconfiguração do sensível, o qual busca inventar, com esses deslocamentos subjetivos, novos modos de ser sujeito no grupo e fora dele (Rancière, 2010).
Como forma de proliferar as forças de germinação criadoras de sentido, uma das estratégias da prática cartográfica nos dispositivos grupais foi a de acompanhar e marcar os discursos com maiores espessuras nas camadas de sentido (Rolnik, 2006). Efeito da mistura entre lógicas macropolíticas e micropolíticas, os enunciados com espessas camadas de sentido sempre condensam diversos estratos de significação, os quais, em alguma medida, estão soterrados pelas linhas de visibilidade, enunciabilidade e poder à percepção dos membros do grupo (Barros, 1996). Não se trata, todavia, de afirmar que o coordenador-cartógrafo vê "além" ou "por trás" de tudo que foi dito pelos participantes, mas sim que frente a um discurso que estranha no momento em que foi enunciado, o coordenador-cartógrafo "pontua insistências, interroga estranhezas, ressalta sem-sentidos e paradoxos" (Fernández, 2006, p. 209).
Para além do cansaço e da paralisia produzido pelos vetores macropolíticos capitalísticos de gestão da vida e de antecipação da ação, a prática em coordenação-cartográfica buscou acompanhar os processos de esgotamento que pulsavam nos grupos e intensificar seus coeficientes de transvaloração. Interessava ao exercício cartográfico em grupo a instauração de novos modos de vida, formas de percepção, processos de subjetivação-dessubjetivação que permitissem ampliar as possibilidades de habitar o mundo por vetores que escapassem ao controle biopolítico de produção da passividade e resignação (Pelbart, 2016). Ao final dos grupos, fragmentos de relatos orais como "aqui foi um espaço onde foi possível falar de assuntos tabus sem que eu me sentisse julgado" ou então "quando eu participei dos encontros saí daqui me sentindo mais leve" denotam como, através da superação de certos discursos-sobre-si, o espaço grupal pode agenciar micropoliticamente um coeficiente de transvaloração heterotópico que redesenhasse os contornos de uma vida por vir.
Considerações finais
A experiência de coordenação-cartográfica nos processos grupais com adolescentes em situação de vulnerabilidade social tornou evidente a importância de se realizar grupos por profissionais da psicologia que não se orientem por práticas disciplinadoras, pedagogizantes e/ou moralistas. É necessário escutar esses sujeitos. Nesse sentido, entende-se a coordenação-cartográfica de grupos como um fazer clínico que, se por um lado não está descolado da sociedade e da política, tampouco atua de modo panfletário por meio de palavras-de-ordem ou alinhado à discursividade da política representativa. Não se trata de uma clínica derivada do termo grego klinikos, o qual significa leito, cama, superfície sobre a qual se deita, mas sim de uma clínica como clinâmen, isto é, como tentativa de produção de desvios que relancem os sujeitos a agir de formas distintas frente às circunstâncias que os agenciam.
Além disso, é importante ressaltar que a prática micropolítica (por exemplo, com grupos de adolescentes em situação de vulnerabilidade social) é uma das formas de atuação (e não a única) frente à cronificação dos efeitos das desigualdades e violências da sociedade brasileira. Nesse sentido, aponta-se a relevância da atuação macropolítica da psicologia em outros âmbitos institucionais da sociedade no sentido de promover de espaços para discussões democráticas e propor a construção ou complexificação de políticas públicas.
Dada essas considerações, por fim, tal como assinala Pelbart (2016) aponta-se o método cartográfico de intervenção e produção do conhecimento como aposta potente na produção de acontecimentos, os quais tensionem os regimes biopolíticos e transformem, subjetivamente e coletivamente, aquilo que antes era vivido como inevitável e agora aparece, abruptamente, como intolerável.
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Submissão: 25/05/2020
1° avaliação: 09/07/2020
2° avaliação: 22/09/2020
Aceite: 21/10/2020
Paulo Ricardo de Araújo Miranda é graduando em Psicologia na UFSC-Universidade Federal de Santa Catarina. Foi bolsista de intercâmbio pela AUGM no Uruguai e atualmente realiza estágio em um CAPS.
E-mail: pramiranda95@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9183-4948
Andréia Isabel Giacomozzi é graduada em Psicologia pela UFSC e possui mestrado e doutorado também na mesma área e pela mesma instituição. Atualmente é professora doutora no Programa de Pós-graduação em Psicologia e Departamento de Psicologia da UFSC- Universidade Federal de Santa Catarina.
E-mail: agiacomozzi@hotmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3172-5800
Juliana Gomes Fiorott é graduada em em Psicologia pelo Centro Universitário Fadergs. É também mestre e doutoranda pelo Programa de Pós graduação em Psicologia e Departamento de Psicologia da UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina
E-mail: juliana.gomesfiorott@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-6064-1593