Serviços Personalizados
Journal
artigo
Indicadores
Compartilhar
Revista Brasileira de Orientação Profissional
versão On-line ISSN 1984-7270
Rev. bras. orientac. prof vol.12 no.2 São Paulo dez. 2011
ARTIGOS ORIGINAIS
Vida ocupacional de pacientes sobreviventes ao transplante de medula óssea: estudo exploratório1
Occupational life of patients surviving a bone marrow transplantation: Exploratory study
Vida ocupacional de pacientes sobrevivientes a un transplante de médula ósea: Estudio exploratorio
Ana Paula MastropietroI; Érika Arantes de Oliveira-CardosoII; Manoel Antônio dos SantosII, 2
IHospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP, Brasil
IIFaculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto-SP, Brasil
RESUMO
O objetivo deste estudo prospectivo foi descrever a situação ocupacional de pacientes sobreviventes ao Transplante de Medula Óssea (TMO), comparando três grupos: G1 (até 18 meses após o TMO), G2 (de 19 a 48 meses após) e G3 (49 a 120 meses após). A amostra foi composta por 62 pacientes. Para a coleta de dados foram utilizados dois instrumentos: Questionário de Caracterização Sóciodemográfica e Clínica, e Questionário de Recuperação Pós-TMO. Os dados foram submetidos à análise de conteúdo temática. Os resultados mostram que os pacientes recém-transplantados (G1) enfrentaram mais dificuldades na retomada da vida produtiva, gerando tempo ocioso, déficit orçamentário e prejuízos no funcionamento social. Decorridos mais de quatro anos, apresentavam menos dificuldades na retomada do trabalho (G3). Constatou-se que muitos pacientes conseguiram se ajustar à nova realidade, formulando novos projetos ocupacionais. Os achados contribuem para embasamento da prática em reabilitação vocacional.
Palavras-chave: transplante de medula óssea, ocupação, reabilitação vocacional, terapia ocupacional
ABSTRACT
The aim of this prospective study was to describe the changes in the occupational status of 62 Bone Marrow Transplantation (BMT) survivors, comparing three groups: G1 (up to 18 months after the BMT), G2 (from 19 to 48 months after the BMT) and G3 (from 49 to 120 months after the BMT). To collect data we used two instruments: a Socio-demographic and Clinical Characteristics Survey and a Post-BMT Recovery Questionnaire. The data were submitted to thematic content analysis. The results showed that newly transplanted patients faced more difficulties reassuming productive lives, causing downtime, budget deficits and impairments in social functioning. Four years after BMT, they had less difficulties in reassuming work (G3). Nevertheless, it appears that many patients managed to adapt to their new reality, being able to design new occupational projects. The findings contribute to underpinning the practice in Vocational Rehabilitation in the field of Occupational Therapy.
Keywords: bone marrow transplantation, occupation, vocational rehabilitation, occupational therapy
RESUMEN
El objetivo de este estudio prospectivo es el de describir la situación ocupacional de pacientes sobrevivientes al Transplante de Médula Ósea (TMO), comparando tres grupos: G1 (hasta 18 meses después del TMO), G2 (de 19 a 48 meses después) y G3 (49 a 120 meses después). La muestra se compuso de 62 pacientes. Para la recolección de datos se utilizaron dos instrumentos: Cuestionario de Caracterización Sociodemográfica y Clínica, y Cuestionario de Recuperación Pos-TMO. Los datos se sometieron al análisis de contenido temático. Los resultados muestran que los pacientes recién transplantados (G1) enfrentaron más dificultades para retomar la vida productiva, generando tiempo ocioso, déficit presupuestario y perjuicios en el funcionamiento social. Transcurridos más de cuatro años, presentaban menos dificultades al retomar el trabajo (G3). Se constató que muchos pacientes consiguieron ajustarse a la nueva realidad, formulando nuevos proyectos ocupacionales. Los hallazgos contribuyen al basamento de la práctica en Rehabilitación Vocacional en el dominio Terapia Ocupacional.
Palabras clave: transplante de médula ósea, ocupación, rehabilitación vocacional, terapia ocupacional
O Transplante de Medula Óssea (TMO), indicado no tratamento de diversos tipos de doenças hematológicas, é um procedimento que visa a substituir a medula óssea doente ou deficitária por células normais de medula óssea de um doador sadio, com o objetivo de regenerar a medula do paciente (Mastropietro, Oliveira-Cardoso, Simões, Voltarelli, & Santos, 2010; Okane & Machado, 2009). O protocolo é dividido em três etapas denominadas: pré-TMO, TMO propriamente dito e pós-TMO (imediato, intermediário e tardio) (Oliveira, Santos, Mastropietro, & Voltarelli, 2009).
No presente estudo será enfocada a etapa pós-transplante, referida também como pós-TMO (Oliveira-Cardoso, Santos, Mastropietro, & Voltarelli, 2009). Com a alta, o paciente deixa o isolamento protetor e inicia o acompanhamento ambulatorial. Por aproximadamente três meses, terá retornos diários. Trata-se do pós-TMO imediato, período que compreende até 100 dias após a infusão da medula (Oliveira et al., 2009). Nessa fase do tratamento, o paciente vivencia várias restrições decorrentes dos rigores do procedimento, como ingestão exclusiva de alimentos cozidos, beber no mínimo três litros de água fervida por dia, usar constantemente a máscara de proteção devido à condição de imunossupressão, evitar contato com aglomeração de pessoas ou com aquelas que possam estar com algum quadro infeccioso, não se aproximar de animais domésticos, manter-se distante de crianças recém-vacinadas, não manter relacionamento sexual desprotegido, dentre outras prescrições restritivas (Mastropietro, Santos, & Oliveira, 2006).
Após o período de 100 dias, a maioria dos pacientes pode voltar para casa e passa a ser seguida em retornos mais espaçados, em média de dois em dois meses (pós-TMO intermediário). Com a melhora gradual da condição orgânica do paciente e o restabelecimento do sistema imunológico, esses retornos ambulatoriais tornam-se ainda mais espaçados, em geral, uma vez por ano no pós-TMO tardio (Oliveira, Santos, & Mastropietro, 2005).
Como se pode deduzir, considerando-se a alta complexidade do procedimento, a etapa pós-TMO representa um longo e árduo período de recuperação, atravessado por incertezas quanto à estabilidade dos resultados e o temor da recorrência da doença de base. A transição inicial é particularmente difícil porque os pacientes são forçados a abdicar do estado de extrema dependência em que se encontravam durante o período de isolamento protetor na enfermaria, devido aos cuidados intensivos que recebiam da equipe hospitalar (Mastropietro et al., 2010). Esse é um momento especialmente delicado, permeado por inúmeras vivências emocionais e, em alguns casos, por complicações físicas. Aliado a isso, os pacientes precisam enfrentar as limitações e alterações físicas, emocionais e psicossociais inerentes ao pós-transplante (Mastropietro et al., 2006; Oliveira & Santos, 2009; Silva, 2000) e à nova condição de vida como transplantado.
Com o passar do tempo pós-TMO, os pacientes mudam o foco de suas preocupações e retomam, gradativamente, os investimentos em seus projetos de vida, que até então permaneciam em suspenso. Nessa fase pós-TMO, o desejo de reeditar a vida profissional, que pode ser entendido como uma expressão da vontade de operar modificações na vida em geral, aparece documentado em vários estudos (Cruz, 2003; Hayden et al., 2004; Mastropietro, Oliveira, & Santos, 2009; Oliveira et al., 2009), que relatam que essa expectativa pode ser tanto desencadeadora de ansiedade e estresse, quanto funcionar como incentivo para o enfrentamento da situação de adoecimento e de tratamento prolongado. Esses autores salientam a importância de sistematizar um trabalho de reabilitação profissional para a melhora da qualidade de vida dos transplantados.
Para compreender o escopo do processo de reabilitação profissional é necesssário pensar no conceito de profissão, e as implicações que o adoecimento e o tratamento impõem na vida profissional de um indivíduo. Para Super, Savickas e Super (1996), a carreira profissional de um indivíduo é determinada tanto por fatores externos, como nível socioeconômico, oportunidades que lhe são oferecidas e facilidades de formação de competências, como por fatores internos, como aptidões mentais, educacionais e habilidades, características pessoais (valores, interesses e seu autoconceito). Um dos fatores importantes apontados pelos referidos autores é a capacidade que o indivíduo tem de fazer frente, a certa altura da vida, às exigências do seu ambiente, como no caso do paciente transplantado, que se vê obrigado a lidar com imposições e limitações decorrentes do quadro clínico e das consequências de um tratamento altamente agressivo e invasivo. Nesse contexto de busca não apenas da sobrevivência, mas também de qualidade de sobrevida, o paciente é obrigado a descobrir novas maneiras de realizar suas tarefas rotineiras ou definir novos desafios a serem superados no cotidiano. Por fim, deverá planificar a reforma de sua vida laboral e definir as novas atividades que constituirão, doravante, o núcleo de sua existência (Super et al., 1996).
Estudos prospectivos na área do TMO são escassos, especialmente quando se tratam de pesquisas que se propõem a acompanhar a evolução dos aspectos relativos à vida laboral dos pacientes transplantados, o que justifica a proposta da presente investigação. Assim, ao considerar que a readaptação necessária à nova condição de vida inclui a dimensão produtiva e laboral, e que esta se constitui em uma faceta importante da qualidade de vida, o objetivo do presente estudo foi descrever a situação ocupacional de pacientes sobreviventes ao TMO, comparando a fase anterior ao transplante, um ano e três anos após o procedimento.
Método
Trata-se de um estudo descritivo e exploratório, com recorte prospectivo, conduzido no contexto de um serviço hospitalar altamente conceituado no cenário brasileiro. Segundo Brewer e Hunter (1989), a pesquisa clínica emana da experiência clínica do pesquisador e a questão de estudo emerge do contato prolongado com o campo da investigação.
Participantes
A amostra foi composta por 62 adultos, 35 mulheres e 27 homens, pacientes que foram submetidos ao TMO e que estavam em acompanhamento no hospital-dia e ambulatório da Unidade de TMO do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (HCFMRP-USP), no período de um ano. Os participantes foram separados em três grupos: G1 (até 18 meses pós-TMO), G2 (de 19 a 48 meses pós-TMO) e G3 (49 a 120 meses pós-TMO). Os dados de caracterização sociodemográfica e clínica da amostra aparecem na Tabela 1.
Como pode ser observado na Tabela 1, foram incluídos pacientes na fase pós-TMO com idade igual ou superior a 21 anos; que tivessem pelo menos três anos de escolaridade formal; que fizeram o TMO na própria unidade e que estavam em seguimento desde então; que foram atendidos no hospital-dia e no ambulatório no período da coleta de dados e que mostraram ter disponibilidade para colaborar voluntariamente com a pesquisa. Foram excluídos portadores de transtornos psiquiátricos graves, nos quais o juízo crítico da realidade e/ou capacidade cognitiva estivesse(m) comprometido(s), prejudicando o entendimento dos objetivos da pesquisa e a aplicação dos instrumentos. O critério de escolaridade mínima foi aplicado para viabilizar a aplicação do instrumento de pesquisa.
Instrumentos
1. Questionário de Caracterização Sociodemo-gráfica e Clínica: elaborado especialmente para atender aos objetivos do presente estudo, inclui dados sociodemográficos e clínicos.
2. Questionário de Recuperação Pós-TMO: aplicado para obtenção dos dados referentes à percepção do indivíduo sobre seu momento de reestruturação da vida, ocupações atuais, satisfação com sua vida atual, limitações encontradas para a inserção ocupacional e planos futuros. Tal instrumento consiste em um questionário elaborado pelos pesquisadores, utilizado e testado em estudo anterior (Mastropietro et al., 2006).
Esse questionário foi desenvolvido com base nas proposições de Haberman, Bush, Young e Sullivan (1993) e aborda questões tais como: se o participante estava trabalhando atualmente e se desempenhava a mesma atividade que desenvolvia antes do TMO; se estava vivendo limitações para realizar suas atividades do dia a dia, em decorrência de alguma restrição ou problema físico ou emocional; se ele se sentia capaz de realizar suas atividades no dia a dia; se acreditava que as mudanças que ocorreram em sua vida pós-TMO foram positivas ou negativas; se estava satisfeito com sua vida atual; se tinha desejo de mudar seu cotidiano no presente; se tinha projetos para o futuro e quais eram suas perspectivas, seus planos.
Vários estudos no contexto nacional, como o de Almeida, Loureiro e Voltarelli (1998), Mastropietro et al.. (2009), Oliveira et al. (2009) e Souza et al. (2002), utilizaram do questionário com o objetivo de explorar o impacto específico do TMO na vida dos pacientes. Esses autores avaliaram que o Questionário de Recuperação pós-TMO permitiu conhecer o contexto de vida em que o paciente estava vivendo após o transplante, contribuindo para compreender como cada indivíduo descreve sua própria vida no presente.
Procedimento
Coleta de dados
O início e término da coleta de dados foram previamente estabelecidos. Delimitou-se o período de 1º de janeiro de 2005 a 31 de dezembro de 2005, ou seja, foram incluídos todos os pacientes que retornaram ao hospital-dia e ambulatório da Unidade nesse intervalo de tempo.
Foram aplicados os instrumentos previamente descritos, individualmente e em situação face a face em um consultório reservado exclusivamente para essa atividade, junto ao ambulatório da UTMO. As respostas foram gravadas em áudio mediante o consentimento do participante. A duração média de execução desse procedimento foi de, aproximadamente, 30 minutos.
Análise dos dados
As respostas obtidas no Questionário de Recuperação Pós-TMO foram transcritas de forma literal e na íntegra, constituindo o corpus da pesquisa. Os dados foram organizados de modo a facilitar a sistematização da análise. Para tanto, foi utilizado o procedimento de análise de conteúdo temática preconizado por Bardin (2002). Essa análise é composta das seguintes etapas:
1. Descrição ou preparação do material: Após a transcrição literal do conteúdo dos questionários, foram realizadas leituras exaustivas e flutuantes do material coligido, com formulação das hipóteses;
2. Inferência ou dedução: O texto foi desmembrado em unidades, visando a identificar os diferentes núcleos de sentido, que por sua vez foram reagrupados em categorias, seguindo os critérios de exclusão mútua, homogeneidade, pertinência e objetividade. Posteriormente, foram elaborados os indicadores, por meio da frequência de aparecimento das categorias encontradas;
3. Interpretação: Os dados das categorias, agora codificados quantitativamente, foram submetidos ao processo interpretativo, de acordo com o referencial teórico adotado.
Os conhecimentos resultantes dessa análise foram categorizados nas seguintes variáveis: sentir-se capaz de realizar suas atividades do dia a dia (sim ou não), vivenciando limitações para realizar suas atividades no dia a dia (sim ou não), satisfação com a vida atual (sim ou não), mudanças no cotidiano após o TMO (positivas ou negativas), planos futuros (projetos relacionados à saúde ou projetos ocupacionais), trabalhando atualmente (sim ou não).
Considerações éticas
Foram contemplados todos os preceitos éticos preconizados para inclusão dos sujeitos no presente estudo. Em primeiro lugar, observou-se o princípio básico de respeito à instituição e à autonomia dos participantes. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo, processo nº 10700.
Para cada participante tomou-se o cuidado de esclarecer antecipadamente os objetivos do estudo e as condições de sigilo profissional que envolvem os dados obtidos. Foram incluídos na investigação aqueles que concordaram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Foi também explicitado que a não-aceitação do convite para participação no estudo não acarretaria qualquer tipo de prejuízo em seu atendimento institucional.
Resultados
Questionário de Recuperação Pós-TMO x G1, G2, G3
A Tabela 2 apresenta as frequências relativas, obtidas no Questionário de Recuperação Pós-TMO para os Grupos 1, 2 e 3.
Sentir-se capaz de realizar suas atividades do dia a dia
Com relação a sentir-se capaz de realizar suas atividades diárias, responderam positivamente 62,5% dos participantes do Grupo 1, 50% do Grupo 2 e 70% do Grupo 3. Os participantes inseridos no Grupo 1 referiram que eram capazes de realizar as atividades que necessitavam desempenhar nesse momento de suas vidas, tais como: passar filtro solar três vezes ao dia, tomar dois litros de água diariamente, comparecer aos retornos médicos diariamente. Nota-se que são atividades relacionadas à manutenção das condições de saúde. No Grupo 2, como já tinham sido suspensas as drogas imunossupressoras para a maioria dos participantes, as atividades vinculadas às questões produtivas começavam a ser exigidas, como o retorno ao trabalho e a necessidade de assumirem novas atividades nesse estágio do pós-TMO. Já no Grupo 3 o momento era de manutenção e consolidação das atividades já adquiridas na etapa anterior; além disso, para muitos participantes observou-se o desejo de desenvolverem e ampliarem suas atividades.
Vivenciando limitações para realizar suas atividades no dia a dia
No que se refere a ter limitações para realizar atividades no cotidiano devido às restrições e/ou sintomas orgânicos, observou-se no Grupo 1 uma frequência de 100% dos participantes; no Grupo 2 foram encontrados 55,6% e no Grupo 3, 40%. Houve, portanto, um declínio acentuado na frequência de respostas positivas na variável em questão com o decorrer do tempo. Esse dado indica que, com o passar do tempo pós-TMO, os pacientes acabam vivenciando menos limitações para realizar suas atividades cotidianas.
Satisfação com a vida atual
Quando perguntados sobre a satisfação com sua vida atual, observa-se que no Grupo 1 todos os participantes (100%) referiram não estarem satisfeitos; no Grupo 2, a maioria (66,7%) referiu não estar satisfeita. Essa tendência se inverteu no Grupo 3, no qual a maioria dos participantes (65%) relatou estar satisfeita, mostrando que, com o passar do tempo pós-TMO, sentem-se mais satisfeitos com suas vidas.
Mudanças no cotidiano após o TMO
Com relação às mudanças ocorridas no seu cotidiano, comparado com o momento anterior ao TMO, a maioria dos participantes referiu que foram positivas: 70,8% no Grupo 1, 72,2% no Grupo 2 e 70% no Grupo 3. Considerando o total da amostra, as mudanças foram positivas para 71% dos participantes. Mesmo os componentes do Grupo 1, que por estarem nessa etapa vivenciavam uma série de restrições no cotidiano, interpretaram positivamente as mudanças ocorridas, o que sugere que foram capazes de perceber esse momento como significativo de uma nova oportunidade de vida.
Planos futuros
Quando questionados acerca de perspectivas para o futuro, todos relataram que tinham planos. Os tipos de projetos que apareceram foram separados em dois grupos, de acordo com o seguinte critério: as respostas que se referiram a projetos como: "voltar a trabalhar", "arrumar um novo emprego", "trabalhar mais", "voltar a desfrutar do lazer que tinha antes do TMO", "ter mais tempo para o lazer", "arrumar um novo lazer", "retomar os estudos", "fazer uma nova atividade", "fazer algum serviço voluntário", foram categorizadas como projetos ocupacionais, ao passo que outros projetos, tais como: "ficar boa", "parar de tomar tanto remédio", "não voltar a ficar doente", foram categorizados como projetos relacionados à saúde.
1. Projetos ocupacionais
Foram enquadrados nessa categoria de projetos ocupacionais: 37,5% dos participantes do Grupo 1, 100% do Grupo 2 e 85% do Grupo 3. Os participantes do G1 estavam ocupados com os projetos de sobrevivência. Já a totalidade dos participantes do G2 estava investindo em projetos de retomada da vida e desenvolvimento ocupacional, considerando que haviam acabado de sair da fase mais delicada do tratamento, podendo, nesse momento, pensar em novas possibilidades produtivas. Já para os participantes que compunham o G3 a condição ocupacional pareceu estar mais organizada; muitos já haviam conseguido se restabelecer do ponto de vista ocupacional, povoando seu dia a dia com atividades de seu interesse. Todavia, notou-se que ainda não havia aparecido o desejo de ampliar essas novas conquistas ou de recomeçar novos projetos.
2. Projetos relacionados à saúde.
No que diz respeito aos projetos relacionados à saúde, observou-se no Grupo 1 uma frequência de 62,5%; o Grupo 2 obteve frequência nula e no Grupo 3 apenas 15% dos pacientes mostraram esse tipo de preocupação. Esse dado indica que os participantes do G1 relataram ter maior preocupação com seu estado de saúde, quando comparados com os integrantes do G2, que não manifestaram preocupação quanto aos projetos relacionados à saúde, e com alguns do G3, que a relataram. Isso pode estar relacionado com a maior necessidade dos participantes do G1 realizarem diariamente atividades de autocuidado, enquanto que os do G2 parecem exauridos, ocupando-se com atividades ligadas apenas à sobrevivência, manifestando intenso desejo de retomarem outros tipos de atividades. Verificou-se que no G3 ainda existiam alguns participantes que relataram ter projetos relacionados à saúde, principalmente aqueles que haviam evoluído com alguma complicação tardia do TMO.
Trabalhando atualmente
No que concerne à condição de trabalho, 100% dos participantes do Grupo 1 relataram que não estavam trabalhando, 61,1% do Grupo 2 e 30% do Grupo 3. Esse achado sugere que, com o decorrer do tempo pós-TMO, aumenta o número de participantes que conseguiram reinserir-se no mercado de trabalho. Em relação à situação produtiva, a Tabela 3 ilustra a condição dos três grupos no pré-TMO e no momento atual.
Observa-se na Tabela 3 que a maioria dos participantes do Grupo 1 estava inserida no mercado de trabalho no momento pré-TMO, o que, em termos percentuais, corresponde a 92%; apenas dois, um estudante e uma dona de casa, não exerciam ocupação remunerada. Já no pós-TMO todos os participantes do Grupo 1 (100%) estavam afastados de suas ocupações anteriores ao transplante.
No Grupo 2 observa-se que quatro participantes, que até o pré-TMO exerciam atividades como trabalhadores rurais, não retomaram a mesma ocupação; dentre eles, uma voltou a estudar, referindo desejo de concluir os estudos para exercer a profissão de secretária, enquanto que os demais se mantinham afastados do trabalho. A única pessoa que exercera funções de empregada doméstica até o pré-TMO também não reassumiu essa ocupação, sendo que, no momento da avaliação, era dona de casa. O mesmo aconteceu com os três pedreiros: um passou a ser estudante (cursava supletivo) e tinha planos de fazer curso técnico para desenhista industrial, enquanto que os outros dois estavam afastados do trabalho. Nota-se, assim, que esses oito participantes mudaram completamente de ocupação no pós-TMO.
Dois vendedores voltaram a desempenhar a mesma ocupação. O mesmo aconteceu com o ajudante de serralheiro, mecânico, gerente de papelaria, cabeleireira e auxiliar de enfermagem, ou seja, sete trabalhadores reassumiram o mesmo posto de trabalho que ocupavam antes do TMO. Tratam-se de trabalhadores autônomos, com ocupações que não exigem muito esforço físico e exposição solar. A única manicure preferiu retomar os estudos que havia interrompido e projetava tornar-se advogada no futuro. A costureira, que trabalhava em uma indústria de sapatos, foi aposentada precocemente, não tendo tido oportunidade de se transferir de posto dentro da própria empresa. Essa participante associou esse impedimento à Doença do Enxerto contra o Hospedeiro - DECH, uma grave complicação que pode acometer o transplantado, pois a condição a que estaria exposta - inalar substâncias tóxicas - poderia prejudicar sua condição pulmonar.
No Grupo 3 observou-se que nenhum dos seis trabalhadores rurais do pré-TMO havia reassumido a mesma ocupação: uma participante passou a exercer atividades domésticas; outro passou a ganhar a vida como motorista; outro, como vendedor de roupas; um estava desempregado e os outros dois haviam se aposentado. Algo semelhante ocorreu com o pedreiro, que passou a trabalhar como vigia; o ajudante de pintor, que passou a ser motorista da prefeitura e uma empregada doméstica, que deixou o emprego para dedicar-se exclusivamente ao lar. Os dois bancários foram aposentados, porém no momento da avaliação encontravam-se profissionalmente ativos, um deles como secretário em escritório de contabilidade e a outra, como costureira. O gerente de produção de sapatos passou a atuar como vendedor na mesma indústria em que trabalhava; esse funcionário foi o único transplantado da amostra que obteve readaptação funcional dentro da própria empresa. Ele relatou que fora transferido de função porque, no antigo cargo que ocupava, tinha contato com produtos químicos com odor tóxico, como cola de sapateiro.
Uma diferença observada entre os três grupos foi o número de participantes afastados devido ao tratamento: 24 no Grupo 1, cinco no Grupo 2 e nenhum no Grupo 3. Essa distribuição mostra que, nesse aspecto, o G2 parece ser um grupo intermediário, sendo composto tanto por pacientes afastados da atividade produtiva (61,1%) como por outros já reinseridos no mercado de trabalho (38,9%). Outro achado relevante do presente estudo é que a maioria dos participantes que não estava inserida no mercado formal de trabalho era constituída de mulheres (74,2%).
No Grupo 2 e no Grupo 3 observou-se que 22 participantes mudaram de ocupação após o TMO. Dentre eles, alguns começaram a estudar (três), outros cinco ainda estavam afastados de suas funções laborais, três estavam aposentados e um desempregado; nove participantes estavam desempenhando outras atividades profissionais, a saber: dois eram vendedores, dois motoristas, um vigia, uma secretária, uma costureira e três do lar. É importante salientar que três pacientes voltaram a estudar, buscando aprimorar sua qualificação profissional.
No Grupo 2 e no Grupo 3 observou-se ainda que 15 participantes mantiveram-se na mesma ocupação que exerciam antes do TMO: sete vendedores, dois mecânicos, duas donas de casa, um eletricista, um gerente, uma cabeleireira e um aposentado. Vale destacar que a maioria dos participantes era composta por adultos jovens - lembrando que 51,61% da amostra era constituída por indivíduos entre 21 e 30 anos; portanto, estavam em plena vida produtiva quando adoeceram. Buscar a reinserção no mercado de trabalho configurava um dos maiores desafios que enfrentavam após o TMO.
Na amostra total observou-se que trabalhadores rurais (14), pedreiros (sete), vendedores (sete) e domésticas (quatro) foram as ocupações mais frequentes no pré-TMO, mostrando o baixo nível de qualificação profissional dos pacientes. Eram indivíduos que se ocupavam de atividades profissionais que exigem baixa qualificação e capacitação técnica para seu desempenho.
No pós-TMO o trabalho como vendedor foi o mais referido (sete pacientes). Já o trabalho rural e na construção civil (pedreiro) não apareceram entre os pacientes do pós-TMO. Houve também uma redução do trabalho doméstico; apenas uma participante se enquadrava nessa categoria. Assim, vendedor, trabalhador rural, pedreiro e trabalhador doméstico foram as ocupações que sofreram maior evasão, o que provavelmente está associado às restrições médicas impostas após o TMO, como evitar a exposição solar e o contato com substâncias tóxicas, como defensivos agrícolas e solventes, ou ainda às possíveis dificuldades dos pacientes pós-TMO de se inserirem em tarefas que exigem esforço físico permanente, uma vez que suas condições físicas, como vigor físico, força, coordenação e resistência, permaneciam reduzidas na etapa imediatamente após o TMO.
Cabe salientar ainda a baixa frequência de atividades laborais mais qualificadas, de nível técnico e superior, entre os pacientes de um modo geral. As atividades laborais referidas, antes e depois do TMO, eram em sua maioria relativas a alguma ocupação e não a uma profissão. Neste estudo considerou-se como "profissão" uma atividade para a qual o indivíduo vivenciou um momento de tomar decisão e fazer escolha por uma formação acadêmica, entrando em contato intelectual com um campo de conhecimento e de investigação científica específico.
Discussão
Como mostram os resultados do presente estudo, os participantes que passaram pela experiência radical do TMO apresentaram necessidade imperiosa de reconstruir seu cotidiano. drasticamente afetado pelo tratamento. A doença grave, potencialmente fatal, seguida de uma terapêutica baseada em um procedimento de alta complexidade, por vezes tão ou mais agressivo e invasivo do que a própria enfermidade, interrompe a linha de continuidade da existência, abrindo uma fenda profunda no sentimento de identidade pessoal e profissional, como teorizado por Super et al. (1996). Mas também é possível entrever que é justamente porque há uma ruptura brutal do cotidiano que se pode criar a possibilidade de uma nova construção, abrindo brechas para superar algumas das sérias dificuldades de ajustamento psicológico e reinserção social que desafiam o indivíduo transplantado de medula óssea.
Na medida em que avançam no tempo pós-TMO, os participantes parecem se dar conta de que a sobrevivência não é o único desafio que os aguarda, pois têm pela frente outras provações. Inúmeras demandas de ordem subjetiva precisam ser equacionadas a fim de garantir um reajustamento a essa nova vida que se conquista com a superação das complicações acarretadas pelo transplante e a tão almejada recuperação da condição de saúde. Na medida em que os benefícios do TMO se consolidam e a condição clínica do paciente se estabiliza, as questões relativas à vida ocupacional ganham relevo e requerem novos investimentos, com remanejamento de recursos já existentes ou desenvolvimento de novas competências, o que é fundamental para reduzir a vulnerabilidade psicossocial a que o paciente se encontra exposto.
O maior tempo decorrido da realização do TMO aparece relacionado com uma maior variedade de projetos para o futuro, uma vez que os participantes que estavam inseridos no grupo intermediário, na sua totalidade, relataram estar fazendo planos relacionados com projetos ocupacionais. Esse achado sugere que o desejo de reorganizar a vida produtiva aparece intensamente nesses pacientes. Para Cruz (2003) e Oliveira et al. (2009), esse desejo de reorganizar a vida profissional pode funcionar como incentivo para o enfrentamento da situação de adoecimento e dos desafios inerentes ao tratamento, que permanecem por tempo prolongado.
Araújo e Arraes (1998) salientam que esse desejo representa um indício de qualidade de sobrevivência, uma vez que esses pacientes buscam ir além da condição estagnada de sobreviventes de câncer, esforçando-se para não permanecer aprisionados pelo presente, mas se projetar no futuro, elaborando ou reelaborando seus projetos de vida. Esse resultado vai ao encontro das tendências apontadas pela literatura internacional (Bevans et al., 2006; Broers, Kaptein, Le Cessie, Fibbe, & Hengeveld, 2000; Hensel, Egener, Schneeweiss, Goldschmidt, & Ho, 2002; Schulz-Kindermann, Hennings, Ramm, Zander, & Hasenbring, 2002).
A maioria dos participantes que contavam com mais de quatro anos pós-TMO relatou ter planos futuros relacionados a ocupações. Esse grupo referiu a ampliação do que já vinham fazendo ou até mesmo o desejo de construir novas possibilidades produtivas. Já os planos referidos pelos pacientes recém-transplantados giravam exclusivamente em torno das atividades de sobrevivência. Os pacientes relataram desejo de restabelecer sua condição de saúde (ficar bom logo, parar de ter retornos médicos tão frequentes e de tomar tantos remédios).
A pessoa que atravessa as turbulências e incertezas do transplante necessita revisar seus valores e repensar seus interesses e planos de vida, além de redimensionar suas representações sobre o porvir. As situações com que se defronta ao longo do tratamento podem impactar sua autoestima e comprometer seu autoconceito, que são componentes básicos da personalidade (Peres & Santos, 2009). Esses elementos são cruciais para que a pessoa possa operar a reorganização de sua carreira, passo importante para sua reinserção social. Como teorizado por Super et al. (1996), o indivíduo, em circunstâncias adversas, é obrigado a descobrir novas maneiras de executar suas tarefas rotineiras ou definir as novas atividades que constituirão, doravante, o centro de sua existência. De fato, quase a totalidade dos participantes deste estudo necessitou realizar readaptação das funções laborais que exerciam previamente ao transplante.
Desse modo, torna-se imperioso implementar intervenções que contribuam para o fortalecimento de estrutura psicológica do paciente, estimulando a integração da imagem corporal modificada e a variabilidade do funcionamento defensivo. É preciso fornecer apoio ativo à adoção de estratégias de enfrentamento que mantenham acesa a esperança e fortalecida a confiança na possibilidade de recuperação frente às adversidades que, inevitavelmente, aparecerão no longo curso da recuperação da saúde. Nessa direção, os achados da presente investigação fornecem pistas importantes que respaldam o planejamento de intervenções da equipe multiprofissional de saúde, notadamente da terapia ocupacional, psicologia e psiquiatria (Oliveira-Cardoso, Santos, Mastropietro, Sponholz Jr, & Voltarelli, 2009; Peres & Santos, 2009), com foco na melhora da qualidade de vida dos pacientes (Oliveira & Santos, 2009).
Um dos maiores desafios dos profissionais que atuam junto a essa população, constituída de pacientes que efetivamente estão vivenciando uma oportunidade de reconstrução de seu projeto de vida, é favorecer um espaço no qual as pessoas consigam encontrar o seu próprio caminho, ao aprenderem a reconhecer suas habilidades. É preciso auxiliá-las a desenvolverem suas potencialidades e descobrirem rotas alternativas em relação às perdas acumuladas no percurso de busca de recuperação da saúde. O paciente que sobrevive ao TMO requer que os profissionais de saúde mental o ajudem a examinar a nova realidade em que está imerso, buscando entrar em contato com seus desejos e necessidades subjetivas, tentando ajustá-los ao possível de suas capacidades e circunstâncias de vida, permitindo-se inclusive romper com o esperado e programado, sem perder-se no vazio da dúvida (Lima, 2003). Para isso o paciente precisa ter conhecimento de seus próprios pontos fortes e fracos, e aceitar o confronto de suas expectativas com a realidade. Na medida em que o paciente conhece mais profundamente suas próprias fortalezas e fragilidades, abre-se a possibilidade de, em relação ao seu projeto vocacional, tomar decisões e/ou formular planos compensatórios de formação para desenvolver novas habilidades e competências necessárias à sustentação de projetos futuros. Se, em um primeiro momento, o que mais importa é assegurar uma perspectiva de futuro, posteriormente mostra-se necessário dar um passo além, buscando garantir a qualidade do existir.
Considerações finais
O TMO constitui um procedimento médico radical, que tem impacto acentuado na capacidade produtiva, ampliando assim suas ressonâncias adversas sobre a organização do cotidiano dos transplantados. O presente estudo, devido ao seu delineamento prospectivo, possibilitou demonstrar que as mudanças vivenciadas na vida laboral se revelaram uma importante dimensão a ser analisada na trajetória dos pacientes que sobreviveram ao TMO.
Os resultados evidenciaram que as necessidades subjetivas dos pacientes submetidos ao TMO, antes de serem identificadas e inseridas socialmente no circuito das trocas simbólicas que se estabelecem na relação com o outro, mediante o exercício de alguma atividade produtiva, assumem uma dimensão empobrecida. O paciente se esforça para ser capaz de reproduzir minimamente as exigências para a manutenção do corpo biológico. Frente a essa situação, a equipe multiprofissional enfrenta o desafio de auxiliá-lo a superar essa perspectiva que ameaça esmagar a subjetividade e estreitar os horizontes existenciais do transplantado. Esse desafio é particularmente presente para os profissionais que se ocupam com o cuidado da saúde mental desses pacientes. A psicologia e a terapia ocupacional têm uma contribuição relevante a oferecer nesse contexto, contribuindo para que o paciente se desenvolva e supere suas experiências de sofrimento e dor, encontrando novas possibilidades, de modo a aumentar sua autonomia e reduzir paulatinamente sua dependência.
As intervenções psicossociais no TMO são destinadas a restituir uma pessoa gravemente comprometida em sua autonomia a uma condição de atividade útil e construtiva. No momento imediatamente após o transplante, é preciso investir na recuperação de habilidades para o autocuidado, ou seja, competência para manter a higiene pessoal, alimentação, medicação, entre outros cuidados com a saúde. Nas etapas posteriores, o foco passa a ser a reabilitação vocacional, simultaneamente com o desenvolvimento de outras habilidades que permitirão a retomada da direção da própria vida, com relativa independência. A reabilitação vocacional consiste no planejamento e provisão de recursos e serviços necessários visando ao sucesso na recolocação profissional e subsequente ajustamento vocacional de pessoas com limitações físicas ou psicológicas.
Como ocorre após uma situação de catástrofe, é necessário, primeiramente, erguer-se sobre os escombros, rastrear e juntar as partes que restaram preservadas em meio aos destroços e, posteriormente, tentar reconstruir o cotidiano a partir dos aspectos saudáveis que restaram, empreendendo um processo ativo de apropriação criativa do viver. Nesse sentido, o paciente transplantado tem um caminho árduo pela frente. Para que seus esforços de enfrentamento obtenham êxito, além da reabilitação vocacional é necessário assegurar a humanização do tratamento no contexto hospitalar. Para tanto, é preciso que a equipe multiprofissional compreenda profundamente a necessidade de abordar o paciente de forma integral, reconhecendo-o em suas dimensões biopsicossociais. Só assim será possível ajudá-lo a construir um lugar singular a partir da otimização de seus próprios recursos, respeitando-se seu próprio tempo e ritmo, para que seu modo de ser singular possa acontecer de forma espontânea, tornando sua produção particular e única. O paciente necessita se apropriar dessa matéria-prima original para reconstruir seu cotidiano, após vivenciar uma situação-limite em que boa parte de sua espontaneidade ficou embotada pela imposição onipresente de uma rotina automatizada e pela racionalidade técnica que regula a instituição hospitalar.
Referências
Almeida, A. C., Loureiro, S. R., & Voltarelli, J. C. (1998). O ajustamento psicossocial e a qualidade de vida de pacientes submetidos ao transplante de medula óssea (TMO). Medicina (Ribeirão Preto), 31, 296-304. [ Links ]
Araújo, T. C. C. F., & Arraes, A. R. (1998). A sobrevivência em oncologia: Uma vivência paradoxal. Psicologia: Ciência e Profissão, 18(2), 2-9. [ Links ]
Bardin, L. (2002). Análise de conteúdo (L. A. Reto & A. Pinheiro, Trads.). Lisboa: Edições 70. [ Links ]
Bevans, M. F., Marden, S., Leidy, N. K., Soeken, K., Cusack, G., Rivera, P., et al. (2006). Heath-related quality of life in patients receiving reduced-intensity conditioning allogeneic hematopoietic stem cell transplantation. Bone Marrow Transplantation, 38, 101-109. [ Links ]
Brewer, J., & Hunter, A. (1989). Multimethod research: A synthesis of styles. Newbury Park: Sage. [ Links ]
Broers, S., Kaptein, A. A., Le Cessie, S., Fibbe, W., & Hengeveld, M. W. (2000). Psychological functioning and quality of life following bone marrow transplantation: A 3-years follow-up study. Journal of Psychosomatic Research, 48, 11-21. [ Links ]
Cruz, M. R. S. (2003). Pacientes oncológicos: Estudo da percepção das modificações de seu papel no grupo familiar. In E. R. Turato (Org.), Psicologia da saúde: Estudos clínicos-qualitativos (pp. 121-136). Taubaté: Cabral Editora e Livraria Universitária. [ Links ]
Haberman, M., Bush, N., Young, K., & Sullivan, K. M. (1993). Quality of life of adult long-term survivors of bone marrow transplantation: A qualitative analysis of narrative data. Oncology Nursing Forum, 20, 1545-1553. [ Links ]
Hayden, P. J., Keogh, F., Ni Conghaile, M., Carroll, M., Crowley, M., Fitzsimon, N., et al. (2004). A single-centre assessment of long-term quality-of-life status after sibling allogeneic stem cell transplantation for chronic myeloid leukaemia in first chronic phase. Bone Marrow Transplantation, 34, 545-556. [ Links ]
Hensel, M., Egerer, G., Schneeweiss, A., Goldschmidt, H., & Ho, A. D. (2002). Quality of life and rehabilitation in social and professional life after autologous stem cell transplantation. Annals of Oncology, 13, 185-186. [ Links ]
Lima, M. T. (2003). Diferentes olhares sobre a re-opção profissional. In L. L. Melo-Silva, M. A. Santos, J. T. Simões, & M. C. Avi (Orgs.), Arquitetura de uma ocupação: Orientação profissional, teoria e prática (pp. 61-68). São Paulo: Vetor. [ Links ]
Mastropietro, A. P., Oliveira, E. A., & Santos, M. A. (2009). Terapia ocupacional. In L. N. Machado, V. O. Camandoni, K. P. H. Leal, & E. L. M. Mascatello (Orgs.), Transplante de medula óssea: Abordagem multidisciplinar (pp. 337-346). São Paulo: Lemar. [ Links ]
Mastropietro, A. P., Oliveira-Cardoso, E. A., Simões, B. P., Voltarelli, J. C., & Santos, M. A. (2010). Relação entre renda, trabalho e qualidade de vida de pacientes submetidos ao transplante de medula óssea. Revista Brasileira de Hematolologia e Hemoterapia, 32(2), 102-107. [ Links ]
Mastropietro, A. P., Santos, M. A., & Oliveira, E. A. (2006). Sobreviventes do transplante de medula óssea: Construção do cotidiano. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, 17, 64-71. [ Links ]
Okane, E. S. H., & Machado, L. N. (2009). Introdução/Histórico. In L. N. Machado, V. O. Camandoni, K. P. H. Leal, & E. L. M. Mascatello (Orgs.), Transplante de medula óssea: Abordagem multidisciplinar (pp. 23-29). São Paulo: Lemar. [ Links ]
Oliveira, E. A., & Santos, M. A. (2009). Qualidade de vida de pacientes submetidos ao transplante de medula óssea. In S. R. Pasian, G. Romanelli, & M. V. Cunha (Orgs.), Investigação científica em psicologia: Aplicações atuais em saúde (pp. 155-182). São Paulo: Vetor. [ Links ]
Oliveira, E. A., Santos, M. A., & Mastropietro, A. P. (2005). Oficinas terapêuticas: Uma possibilidade de intervenção em saúde mental. In C. P. Simon, L. L. Melo-Silva, & M. A. Santos (Orgs.), Formação em psicologia: Desafios da diversidade na pesquisa e na prática (pp. 369-378). São Paulo: Vetor. [ Links ]
Oliveira, E. A., Santos, M. A., Mastropietro, A. P., & Voltarelli, J. C. (2009). Qualidade de vida pós-TMO. In L. N. Machado, V. O. Camandoni, K. P. H. Leal, & E. L. M. Mascatello (Orgs.), Transplante de medula óssea: Abordagem multidisciplinar (pp. 159-174). São Paulo: Lemar. [ Links ]
Oliveira-Cardoso, E. A., Santos, M. A., Mastropietro, A. P., Sponholz, A., Jr., Voltarelli, J. C. (2009). Intervenções da psicologia, psiquiatria e terapia ocupacional no transplante de células-tronco hematopoéticas. In J. C. Voltarelli, R. Pasquini, & E. T. T. Ortega (Orgs.), Transplante de células-tronco hematopoéticas (pp. 1099-1118). São Paulo: Atheneu. [ Links ]
Oliveira-Cardoso, E. A., Santos, M. A., Mastropietro, A. P., & Voltarelli, J. C. (2009). Qualidade de vida de sobreviventes do transplante de medula óssea (TMO): Um estudo prospectivo. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 25, 529-536. [ Links ]
Peres, R. S., & Santos, M. A. (2009). Aspectos psicossomáticos do transplante de medula óssea: Uma leitura psicanalítica pós-freudiana. In S. R. Pasian, G. Romanelli, & M. V. Cunha (Orgs.), Investigação científica em psicologia: Aplicações atuais em saúde (pp. 139-154). São Paulo: Vetor. [ Links ]
Schulz-Kindermann, F., Hennings, U., Ramm, G., Zander, A. R., & Hasenbring, M. (2002). The role of biomedical and psychosocial factors for the prediction of pain and distress in patients undergoing high-dose therapy and BMT/PBSCT. Bone Marrow Transplantation, 29, 341-351. [ Links ]
Silva, L. M. G. (2000). Qualidade de vida e transplante de medula óssea em neoplasias hematológicas. Dissertação de Mestrado não publicada, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP. [ Links ]
Souza, C. A., Durães, M. I. C., Vigorito, A. C., Penteado Aranha, F. J., Oliveira, G. B., De Brito Eid, K. A., et al. (2002). Quality of life in patients randomized to receive a bone marrow or a peripheral blood allograft. Haematologica, 87, 1281-1285. [ Links ]
Super, D. E., Savickas, M. L., & Super, C. M. (1996). The lifespan, life-space approach to careers. In D. Brown & L. Brooks (Orgs.), Career choice and development (pp. 121-178). San Francisco: Jossey-Bass. [ Links ]
Recebido:17/11/2010
1ª Revisão:21/03/2011
Aceite final:08/06/2011
Sobre os autores
Ana Paula Mastropietro é Terapeuta Ocupacional do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Doutora pelo Programa de Pós-graduação em Psicologia (FFCLRP-USP). Membro do Núcleo de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde - NEPPS (FFCLRP-USP-CNPq).
Érika Arantes de Oliveira-Cardoso é Psicóloga do Núcleo de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde - NEPPS (FFCLRP-USP-CNPq) e da Unidade de Transplante de Medula Óssea do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Mestre e Doutora pelo Programa de Pós-graduação em Psicologia (FFCLRP-USP).
Manoel Antônio dos Santos é Professor Associado da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FFCLRP-USP). Coordenador do Núcleo de Ensino e Pesquisa em Psicologia da Saúde - NEPPS (FFCLRP-USP-CNPq). Bolsista de Produtividade em Pesquisa 1-D do CNPq. Editor da Paidéia (Ribeirão Preto).
1 Trabalho derivado da tese de doutorado da primeira autora, sob orientação do terceiro autor.
2 Endereço para correspondência: Departamento de Psicologia, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo. Avenida Bandeirantes, 3900, Monte Alegre, 14040-901, Ribeirão Preto, SP, Brasil. Fone: 16 36023645. E-mail: masantos@ffclrp.usp.br