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Revista Brasileira de Orientação Profissional
versão On-line ISSN 1984-7270
Rev. bras. orientac. prof vol.14 no.2 São Paulo dez. 2013
ARTIGO
Relação entre vivência acadêmica e os indicadores de desenvolvimento de carreira em universitários
Relations between academic experience and career development indicators in college students
Relación entre la experiencia académica y los indicadores de desarrollo de carrera en universitarios
Jocemara Ferreira Mognon; Acácia Aparecida Angeli dos Santos
Universidade São Francisco, Itatiba, São Paulo, Brasil
RESUMO
Este estudo investigou a associação entre vivência acadêmica e desenvolvimento de carreira, bem como possíveis diferenças relativas às variáveis sexo, idade e etapa do curso. Participaram 208 universitários, de duas universidades particulares dos estados de São Paulo e de Minas Gerais, com idades entre 18 e 51 anos, sendo 62,5% homens. Foram utilizados o Questionário de Vivência Acadêmica - versão reduzida (QVA-r) e as Escalas de Desenvolvimento de Carreira. Os resultados indicaram correlações positivas, com magnitudes variando de fraca a moderada entre a vivência acadêmica e o desenvolvimento de carreira, mas apenas as dimensões carreira e pessoal do QVA-r mostraram-se preditoras do desenvolvimento de carreira. Foram identificadas diferenças estatisticamente significativas referentes à idade e à etapa do curso nos dois instrumentos.
Palavras-chave: estudantes universitários, desenvolvimento profissional, formação profissional
ABSTRACT
This study investigated the association between academic experience and career development as well as possible differences related to gender, age and stage of the course. Participants were 208 university students from two private universities in the states of São Paulo and Minas Gerais, aged 18 to 51 years, 62.5% men. The Academic Experience Questionnaire - reduced version (QVA-r) and Career Development Scales were used in this study. The results indicated weak to moderate positive correlations between academic adjustment and career development, but only the career and personal dimensions of QVA-r were predictive of career development. Statistically significant differences were observed regarding age and period of the course in both instruments.
Keywords: university environment, professional development, vocational training
RESUMEN
Este estudio investigó la asociación entre experiencia académica y desarrollo de carrera, así como posibles diferencias relativas a las variables sexo, edad y etapa del curso. Participaron 208 universitarios de dos universidades particulares de los estados de São Paulo y de Minas Gerais con edades de entre 18 y 51 años, con un 62,5% de hombres. Se empleó el Questionário de Vivência Acadêmica - versión reducida (QVA-r) y las Escalas de Desarrollo de Carrera. Los resultados indicaron correlaciones positivas con magnitudes variando de baja a moderada entre la experiencia académica y el desarrollo de carrera. Sólo las dimensiones carrera y personal del QVA-r se mostraron vaticinadoras del desarrollo de carrera. Se identificaron diferencias estadísticamente significativas referentes a la edad y a la etapa del curso en los dos instrumentos.
Palabras clave: estudiantes universitarios, desarrollo profesional, formación profesional
A entrada na universidade é considerada uma grande realização para muitos estudantes (Almeida & Soares, 2004). No entanto, Santos, Polydoro, Teixeira, e Bardagi (2010) destacam que alguns aspectos podem ser estressantes, pois para alguns envolve a saída de casa, o distanciamento do ambiente familiar, a necessidade de estabelecimento de uma nova rede social, o aumento das responsabilidades acadêmicas, financeiras e pessoais. Em razão disso, a adaptação à vida acadêmica é caracterizada como um processo complexo e multifacetado, influenciado por fatores pessoais do aluno e do contexto no qual está inserido (Almeida & Soares, 2004). Simultaneamente, como assinala Polydoro (2000), o ensino superior favorece o desenvolvimento de atividades acadêmicas em relação à escolha da carreira, os relacionamentos interpessoais e a construção da identidade do estudante.
Considerando a importância da adaptação e integração acadêmica por ocasião da entrada no ensino superior, alguns estudiosos brasileiros têm se debruçado sobre questões envolvidas nesse processo. Dentre as publicações brasileiras dos últimos anos, Schleich (2006) teve como objetivo explorar a adaptação e a satisfação acadêmica de 311 universitários de diversos cursos de uma instituição particular de ensino superior. Os participantes eram do primeiro e quarto anos, todos do período noturno, sendo 196 ingressantes e 115 concluintes, 55% do sexo feminino, com idades entre 16 e 47 anos. Os instrumentos utilizados foram o Questionário de Vivência Acadêmica (QVA-r) e a Escala de Satisfação com a Experiência Acadêmica (ESEA). Os resultados indicaram que os estudantes ingressantes estavam mais integrados com a vida acadêmica que os concluintes, visto que obtiveram médias significativamente maiores nas dimensões carreira e institucional do QVA-r. Na comparação entre os sexos houve diferenças estatisticamente significativas, apontando que os homens apresentaram maiores médias nas dimensões carreira e pessoal. Já em relação à idade foram encontradas diferenças estatisticamente significativas, sendo que os ingressantes da faixa superior a 26 anos apresentaram maiores médias na dimensão institucional, enquanto que os concluintes desta mesma faixa etária apresentaram médias menores na dimensão pessoal.
Utilizando os mesmos instrumentos, Santos e Suehiro (2007) analisaram relações entre os instrumentos e interferências de variáveis como idade, sexo e etapa do curso tanto na adaptação como na satisfação acadêmica. Foram avaliados 247 estudantes de Psicologia, com idades entre 17 e 61 anos, de uma universidade particular do Estado de São Paulo. Os resultados indicaram correlações positivas, com magnitudes variando de fraca a moderada, em praticamente todos os fatores dos instrumentos, o que indica, segundo as autoras, que ambas as escalas estão medindo construtos semelhantes. Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas para a variável sexo. Para a idade foram encontradas correlações significativas e positivas, de magnitude fraca, nas dimensões pessoal e estudo do QVA-r. Com relação ao período do curso, os ingressantes apresentaram média significativamente maior na dimensão institucional do QVA-r e, os concluintes, maior na dimensão interpessoal.
Apesar do instrumento QVA-r ter dimensões com boa abrangência dos aspectos da vida universitária, Teixeira, Castro, e Piccolo (2007) buscaram aplicá-lo juntamente com outras medidas de variáveis acadêmicas consideradas importantes, como a participação em atividades extracurriculares, interação com professores, percepção de apoio recebido dos pais e amigos e comportamento exploratório vocacional. Participaram do estudo 342 estudantes de uma universidade pública do sul do Brasil, do 1º ao 5º ano, com idades entre 18 e 29 anos, sendo 55% mulheres. Entre os resultados principais, os autores verificaram que as variáveis comportamento exploratório vocacional e nível de interação extraclasse com professores foram as que se correlacionaram positivamente e de forma fraca com todas as cinco dimensões do QVA-r. Houve ainda uma correlação negativa, também de magnitude fraca, entre o ano de curso e a dimensão carreira, indicando que os ingressantes no ensino superior tenderam a ter escores mais altos do que os veteranos.
Com base nas pesquisas anteriores verifica-se que há muitos aspectos a serem estudados no contexto universitário que podem contribuir para a boa adaptação acadêmica. Sob essa perspectiva, Igue, Bariani, e Milanesi (2008) levantaram a hipótese de que as expectativas iniciais referentes ao curso escolhido são relevantes. Participaram 203 universitários do 1º e 5º ano do curso de Psicologia, com idades entre 16 a 46 anos, sendo 82,5% do sexo feminino. Foi aplicado, além do QVA-r, uma questão sobre as expectativas iniciais ao ingressar no curso. Os resultados indicaram que os ingressantes apresentaram média significativamente maior na dimensão institucional, enquanto que os concluintes nas dimensões interpessoal e carreira. Diante dos resultados, os autores enfatizaram a importância das expectativas, mostrando que os ingressantes basearam-se nas expectativas anteriores ao ingresso na universidade, enquanto que os concluintes valeram-se de aspectos que lhes foram favoráveis de sua própria vivência acadêmica.
Com o intuito de comparar os interesses profissionais e integração acadêmica, Noronha, Martins, Gurgel, e Ambiel (2009) pesquisaram 159 universitários, com idades entre 17 e 51 anos, sendo 53,7% do masculino, alunos nos primeiros e últimos semestres. Os instrumentos utilizados foram a Escala de Aconselhamento Profissional (EAP) e o QVA-r. Os principais resultados mostraram média significativamente maior na dimensão estudo para as mulheres. Na comparação relativa às idades, o grupo acima de 26 anos obteve média significativamente maior na dimensão carreira. Não foram encontradas diferenças significativas na adaptação acadêmica entre os ingressantes e os concluintes.
Com base nas pesquisas relatadas, verifica-se que as dimensões das vivências acadêmicas aparecem associadas à satisfação acadêmica (Santos & Suehiro, 2007), maior comportamento exploratório vocacional (Teixeira et al., 2007) e à interação com professores (Teixeira et al., 2007). Além disso, os resultados de algumas delas evidenciam a importância de variáveis pessoais e contextuais no processo de adaptação à universidade, como as ligadas ao sexo (Noronha et al., 2009; Schleich, 2006), idade (Santos & Suehiro, 2007; Schleich, 2006) e etapa do curso (Igue et al., 2008; Noronha et al., 2009; Santos & Suehiro, 2007; Schleich, 2006; Teixeira et al., 2007). Apesar de essas pesquisas explorarem aspectos relevantes da vivência acadêmica, no levantamento de literatura realizado até o momento, não foi identificado nenhum estudo focalizando especificamente a relação entre a vivência acadêmica e o desenvolvimento de carreira nos universitários.
A esse respeito Silva, Coelho, e Teixeira (2013) salientam que as vivências acadêmicas são muito importantes para o desenvolvimento de carreira, visto que durante a formação os estudantes têm oportunidade de conhecer melhor a profissão, adquirir conhecimentos, desenvolver competências necessárias à profissão e repensar a escolha do curso. No entanto, apesar de a universidade ter como principal função favorecer o desenvolvimento de carreira nos estudantes, ainda surge algumas indagações: após os vários anos de formação universitária, os jovens saem preparados para ingressar no mundo do trabalho? As vivências acadêmicas na universidade contribuem com o desenvolvimento de carreira dos estudantes? Em resposta a esses questionamentos, Oliveira e Dela Coleta (2008) afirmam que a universidade não tem oferecido aos estudantes suporte para o desenvolvimento de carreira, o que favorece a ocorrência de imaturidade profissional, uma vez que os universitários não adquirem, em sua formação, as competências básicas necessárias, o que afeta o ingresso posterior no mercado de trabalho.
Existem algumas universidades preocupadas com esses aspectos, e que têm implantado projetos para promover o desenvolvimento de carreira em universitários, como relatado por Pinto e Castanho (2012). Os autores analisaram as percepções de 88 estudantes que participaram de uma disciplina que tinha como objetivo reavaliar a escolha do curso, da profissão e do percurso acadêmico, bem como o planejamento das perspectivas profissionais. Segundo os estudantes, esse projeto contribuiu tanto para as escolhas acadêmicas como para a elaboração de projetos para o futuro profissional. No estudo longitudinal e quase-experimental de Koen, Khlehe e Van Vianen (2012) foi realizado um programa de adaptabilidade de carreira, sendo os estudantes separados em um grupo de treinamento (n = 32) e um grupo controle (n = 24) e avaliados em três momentos (pré-formação, pós-treinamento e acompanhamento seis meses depois). Os resultados indicaram que os recursos de adaptabilidade de carreira podem aumentar as chances dos estudantes encontrarem emprego após a formatura e obterem maior satisfação com o trabalho.
Com isso, verifica-se que o desenvolvimento de carreira é um processo que influencia mudanças sistemáticas que podem ser observadas no comportamento vocacional ao longo do tempo (Crites, 1974). A teoria de desenvolvimento de carreira de Super é considerada uma das principais influências neste âmbito, em razão de seus conceitos (Oliveira, Melo-Silva, & Dela Coleta, 2012). Para Super (1980) o desenvolvimento de carreira ocorre por meio de cinco grandes estágios, crescimento, exploração, estabelecimento, manutenção e desengajamento. Esses estágios também ocorrem em miniciclos, principalmente em momentos de transições profissionais. Contudo, cada vez mais a relação do indivíduo com sua carreira mostra-se instável, devido às modificações importantes na relação homem-trabalho, o que faz com que o desenvolvimento de carreira dependa cada vez mais da capacidade de cada um para adaptar-se a essas mudanças e exigências (Savickas, 2005).
Segundo Ourique e Teixeira (2012), é difícil determinar o conjunto de variáveis que compõe o desenvolvimento de carreira, mas cada vez mais novos conceitos são acrescentados para favorecer a compreensão desse processo. Com base na multiplicidade de aportes teóricos e na importância de se avaliar o comportamento vocacional, Teixeira (2010) construiu um instrumento composto por indicadores do desenvolvimento de carreira como o comprometimento com a carreira, a decisão de carreira, a exploração de carreira, lócus de controle profissional e a autoeficácia profissional, descritos a seguir.
O indicador comprometimento com a carreira refere-se ao grau de incorporação de aspectos profissionais e se reflete na motivação, no envolvimento e na satisfação da escolha profissional (Teixeira, 2010). Por sua vez, a decisão de carreira diz respeito à clareza que o indivíduo tem sobre seus objetivos, interesses e talentos profissionais (Teixeira & Gomes, 2005). Para os autores, a decisão de carreira não se limita à escolha de uma profissão, mas implica também na busca de ações, realizadas pelo indivíduo, para alcançar os seus objetivos.
Outro aspecto que contribui para o desenvolvimento de carreira é a exploração de carreira, entendido como um processo psicológico complexo que inclui a autorreflexão sobre habilidades e interesses, a busca ativa de informações, a monitoração constante da carreira e a construção de redes de contatos (Ourique & Teixeira, 2012). O lócus de controle é mais um indicador e diz respeito às crenças que fornecem ao indivíduo informações de que tanto o desenvolvimento de sua carreira, como o sucesso profissional, dependem exclusivamente de seus esforços e não de fatores externos, tais como a sorte ou ao destino (Trice, Haire, & Elliott, 1989).
Por fim, a autoeficácia profissional é o último indicador mencionado e exerce um importante papel no processo de desenvolvimento de carreira, sobre as escolhas e no estabelecimento de metas profissionais (Lent, Brown, & Hackett, 1994). Vale lembrar que a autoeficácia, tal como proposta por Bandura (2008) se refere à percepção do indivíduo quanto às próprias capacidades para alcançar seus objetivos, que envolve a motivação para realizá-los e também o planejamento. Especificamente, a autoeficácia profissional consiste na crença do indivíduo em sua capacidade para desempenhar, com sucesso, as atividades relativas à sua profissão.
Considerando a importância da autoeficácia profissional, o estudo de Ourique e Teixeira (2012) se propôs a analisar o papel da autoeficácia e da personalidade no planejamento de carreira de universitários. Participaram 213 universitários, de ambos os sexos e com predominância de mulheres (70,9%), de diversos cursos de graduação de uma universidade pública do sul do Brasil. Os resultados obtidos com a aplicação das Escalas de Desenvolvimento de Carreira e da Bateria Fatorial de Personalidade (BFP) indicaram correlações de magnitude fraca, identificando correlações negativas entre o fator neuroticismo e as demais escalas (decisão de carreira, autoeficácia profissional e planejamento de carreira) e correlações positivas dessas últimas escalas e mais a de exploração com o fator realização do BFP. Por fim, encontraram correlações positivas entre abertura e extroversão com exploração e planejamento de carreira e entre socialização com autoeficácia profissional. A análise de regressão indicou que a autoeficácia profissional e os fatores de personalidade, realização e abertura, contribuem de forma específica na predição da exploração e da decisão de carreira.
Com o propósito de investigar as relações entre experiências de estágio e os indicadores de desenvolvimento de carreira, Silva et al. (2013) investigaram 131 universitários, com idade média de 25 anos, do curso de Engenharia Civil em uma universidade pública do sul do Brasil. Os instrumentos utilizados foram um questionário desenvolvido para coleta de informações sociodemográficas, estágios, carreira, mercado de trabalho e as Escalas de Desenvolvimento de Carreira. Os resultados indicaram que as avaliações otimistas em relação ao mercado de trabalho estiveram relacionadas com maior lócus de controle interno para as tarefas de inserção profissional e com o comprometimento de carreira. Os autores verificaram que as experiências de estágio mais satisfatórias estiveram associadas a maiores níveis de autoeficácia profissional, decisão de carreira e exploração, bem como com a percepção de desenvolvimento de competências técnicas, conhecimento do campo profissional, resolução de problemas e maior organização.
Com base na literatura recuperada nota-se que a vida acadêmica é um construto complexo, multifatorial que influencia e é influenciado por inúmeras variáveis que contribuem para o desenvolvimento de uma profissão e também para o amadurecimento pessoal dos estudantes. Com isso, a primeira hipótese proposta é de que os diversos fatores da vivência acadêmica estão associados positivamente ao desenvolvimento de carreira e que alguns deles podem explicar o desenvolvimento de carreira. Uma segunda hipótese é a de que existem diferenças significativas relativas às variáveis sexo, idade e período do curso tanto para a adaptação universitária, avaliada pelas vivências acadêmicas, como nos indicadores de desenvolvimento de carreira. Para testar tais hipóteses, a presente pesquisa teve como objetivos explorar as relações existentes entre as dimensões da vivência acadêmica e os indicadores de desenvolvimento de carreira, bem como verificar quais dimensões da vivência acadêmica contribuem na explicação do desenvolvimento de carreira; por fim, pretendeu verificar as possíveis diferenças, em ambos os construtos, considerando as variáveis sociodemográficas apontadas.
Método
Participantes
Participaram do estudo 208 universitários de duas universidades particulares, uma localizada no interior do estado de São Paulo (n = 133) e outra no interior do estado de Minas Gerais (n = 75). As idades dos estudantes variaram entre 18 e 51 anos (M = 23,53; DP = 7,49), sendo 36,5% do sexo masculino e 62,5% do feminino, 1,1% não forneceram essa informação. Quanto ao período do curso, 38,5% frequentavam o início do curso, 33,2% o meio, e 26,4% eram finalistas, ainda, 1,9% não responderam o período frequentado. Os estudantes eram provenientes de diversos cursos (Arquitetura, Administração, Pedagogia, Psicologia, Engenharia de Produção e Educação Física). Todos os voluntários frequentavam o curso no período noturno, 82,7% trabalhavam no momento da avaliação e 93,8% pretendiam continuar o curso que frequentavam. As escolhas quanto às universidades e cursos foram feitas por conveniência.
Instrumentos
Questionário de Vivência Acadêmica, versão reduzida - QVA-r (Almeida, Soares, & Ferreira, 2002, adaptado para o para o Brasil por Granado, Santos, Almeida, Soares, & Guisande, 2005). É um instrumento de autorrelato, constituído, na versão brasileira, por 55 itens que se referem ao pensamento e sentimento dos alunos em relação à universidade. No estudo de adaptação do instrumento no Brasil, Granado et al. (2005) verificaram evidências de validade relativas à estrutura interna dos itens. Os valores para a consistência interna mostraram-se adequados, com alfas de Cronbach para as dimensões variando de 0,71 a 0,91 e para a escala geral de 0,88.
O aluno deve assinalar uma opção por item, em uma escala com pontuações do tipo Likert variando de 1 (nada a ver comigo) a 5 (tudo a ver comigo). A escala possui cinco dimensões: Pessoal (bem estar físico e psicológico, equilíbrio emocional, estabilidade afetiva, otimismo e autoconfiança); Interpessoal (relações com colegas, competências de relacionamento em situações de maior intimidade, estabelecimento de amizades e procura de ajuda); Carreira (sentimentos relacionados com o curso, perspectivas de carreira e projetos vocacionais); Estudo (hábitos de estudo, gestão do tempo, utilização dos recursos de aprendizagem no campus e preparação para os testes) e Institucional (apreciação dos alunos face à instituição de ensino que frequentam, desejo de permanecer ou mudar de instituição, conhecimento e apreciação das infraestruturas existentes). A pontuação mínima é 55 pontos e a máxima a ser obtida é de 275 pontos. Embora não haja normas estabelecidas, quanto maior a pontuação, mais integrado à universidade estaria o estudante.
Escalas de Desenvolvimento de Carreira de Universitários (Teixeira, 2010). O instrumento possui 41 itens e utiliza como opções de resposta uma escala Likert com cinco pontos, variando de 1 (a frase é totalmente falsa a respeito) a 5 (a frase é totalmente verdadeira a seu respeito). Resultados iniciais de estudo de validação do instrumento, obtidos mediante processos de análise semântica por juízes e análises fatoriais, indicaram a sua validade de construto, bem como bons índices de fidedignidade com alfas de Cronbach entre 0,75 e 0,90 (Teixeira, 2010).
As escalas são reunidas em apenas um instrumento e foram utilizadas para avaliar as variáveis de interesse relacionadas à carreira. O instrumento avalia cinco dimensões, como o Comprometimento com a carreira (que refere ao grau de incorporação do aspecto profissional refletindo-se na motivação, no comprometimento e na satisfação com a escolha profissional); a Decisão de carreira (envolve a certeza que tem dos seus objetivos profissionais); a Autoeficácia profissional (crença que tem na sua capacidade para exercer adequadamente suas atividades profissionais); o Lócus de controle de sucesso profissional (refere à crença de que o sucesso profissional depende mais do seu esforço pessoal que das circunstâncias ambientais ou casuais) e a Exploração (que se refere a reflexão sobre si mesmo e busca por informações sobre o mundo profissional).
Vale ressaltar que segundo Teixeira (2010) essas escalas não foram desenvolvidas conceitualmente como facetas de um construto mais amplo, e sim como medidas independentes de algumas variáveis do âmbito vocacional, consideradas relevantes para o desenvolvimento de carreira. A pontuação mínima é de 41 pontos e a máxima a ser obtida é de 205 pontos. Embora não haja normas estabelecidas, pontuações mais elevadas indicariam um desenvolvimento de carreira mais consolidado.
Procedimentos
Após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade São Francisco (CAEE n° 0191.0.142.000-09), da autorização dos coordenadores de cada curso, foram combinados os dias e horários da aplicação dos instrumentos com os professores. Foram explicados os objetivos da pesquisa aos estudantes, o caráter voluntário da participação e o sigilo de suas respostas e identidades. Os que aceitaram participar da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e os instrumentos foram aplicados em sala de aula, de forma coletiva, levando em média 40 minutos.
A análise dos dados consistiu na obtenção das relações entre as variáveis realizadas por meio da correlação de Pearson. Realizou-se ainda, análises de regressão linear múltipla, com o método stepwise, a fim de verificar as contribuições específicas da vivência acadêmica na predição do desenvolvimento de carreira. Os pressupostos necessários foram testados e atendidos tais como a multicolinearidade, a singularidade, a homogeneidade nas variâncias, a normalidade e a linearidade (Tabachnick & Fidell, 2001). As diferenças de médias para a vivência acadêmica e o desenvolvimento de carreira, quanto à variável sexo, foram analisadas por meio do teste-t de Student, enquanto que para as variáveis idade e etapa do curso pela análise de variância (ANOVA) e a separação dos grupos verificada por meio da prova post-hoc de Tukey. O nível de significância estatística adotado nas análises foi de 5% (p < 0,05).
Resultados
Inicialmente será apresentada a correlação entre os construtos do QVA-r e das Escalas de Desenvolvimento de Carreira e, posteriormente, a análise de regressão para verificar quais variáveis do QVA-r contribuem na predição do desenvolvimento de carreira. Por fim, são trazidas as análises das diferenças de médias no QVA-r e nos indicadores das Escalas de desenvolvimento para as variáveis sociodemográficas.
Verificam-se, na Tabela 1, correlações estatisticamente significativas e positivas, variando em intensidade (de baixa a moderada), de acordo com Dancey e Reidy (2006). Pode-se citar que a mais baixa correlação foi entre a dimensão estudo e a autoeficácia profissional e a mais alta foi entre a dimensão institucional e a escala de exploração.
A fim de se verificar as contribuições específicas da vivência acadêmica na predição do desenvolvimento de carreira foi realizada a análise de regressão. O procedimento utilizado foi uma análise de regressão múltipla, onde foram incluídas como variável independente as cinco dimensões do QVA-r e como variável dependente o total das Escalas do desenvolvimento de carreira. Os resultados indicaram que a dimensão Carreira do QVA-r explica 25,5% da variância do desenvolvimento de carreira. Ao ser acrescentado ao modelo a dimensão Pessoal, o percentual explicativo dessa variável sobre o desenvolvimento de carreira passou para 29,0% e, ao ser inserida a dimensão Institucional, o percentual explicado aumentou para 30,7%, um acréscimo de 1,7%. De modo geral, verifica-se que as dimensões Carreira e Pessoal contribuem de forma mais específica na explicação do desenvolvimento de carreira, como pode ser observado na Tabela 2.
O último objetivo deste estudo foi verificar possíveis diferenças nas médias do QVA-r e das Escalas de desenvolvimento de carreira em razão das variáveis sociodemográficas. Quanto a variável sexo, não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas em ambos os instrumentos. Para a variável idade, os participantes foram agrupados em faixas etárias, com base em estudos nacionais com universitários (Schleich, 2006). Classificam-se como acadêmicos tradicionais aqueles com idade até 21 anos (32%), os intermediários que são os estudantes entre 22 e 25 anos de idade (30%) e, por fim, estão aqueles acima de 26 anos, considerados maduros (28%). Os resultados indicaram diferenças estatisticamente significativas, com médias maiores para os estudantes com idades entre 22 e 25 anos, na dimensão Interpessoal do QVA-r [F(2,205)= 3,164; p=0,040] e nas Escalas de desenvolvimento de carreira - Lócus de controle [F(2,205)= 3,401; p=0,035] e Exploração [F(2,205)= 6,663; p=0,002]. Em relação ao período do curso, os resultados são apresentados na Tabela 3.
Foram identificadas diferenças estatisticamente significativas nessa análise, sendo que os resultados por meio da prova post-hoc de Tukey indicaram maiores médias para os estudantes de início de curso nos indicadores das Escalas de desenvolvimento de carreira - comprometimento com a carreira e autoeficácia profissional. Os estudantes classificados como de meio do curso apresentaram média estatisticamente maior na dimensão institucional do QVA-r, enquanto os de meio de curso e os concluintes apresentaram médias significativa e estatisticamente maiores na escala de exploração. Já os concluintes obtiveram médias significativa e estatisticamente maiores na dimensão interpessoal do QVA-r e na escala lócus de controle das Escalas de desenvolvimento de carreira.
Discussão
A vivência acadêmica inicia-se com a entrada do estudante na universidade e requer adaptação, dentre outros aspectos, a um novo modelo de educação que exige maior autonomia por parte dos alunos na construção do seu conhecimento e formação profissional. No entanto, a universidade também tem a responsabilidade de fornecer oportunidades de amadurecimento pessoal aos estudantes e de capacitação adequada para o mercado de trabalho. Esse desenvolvimento de carreira deve ocorrer na universidade como um processo contínuo e não somente no momento da conclusão do curso e, para que isso ocorra, os estudantes precisam de vivências acadêmicas positivas. Assim, o primeiro objetivo deste estudo foi verificar a relação entre vivência acadêmica e o desenvolvimento de carreira. Os resultados indicaram diversas correlações estatisticamente significativas entre as dimensões do QVA-r e os indicadores das Escalas de desenvolvimento de carreira, tais resultados sugerem relações de interesse teórico e com potencial para instigar novas pesquisas e são discutidas a seguir.
As dimensões pessoal e carreira correlacionaram-se de forma positiva, com magnitude de fraca a moderada com todos os indicadores das Escalas de desenvolvimento de carreira. Com base na composição de cada dimensão e das escalas, tais resultados indicam que o bem estar físico e psicológico do estudante, a sua estabilidade emocional, otimismo e autoconfiança, bem como sentimentos de satisfação com o curso e o planejamento de metas em relação à profissão relacionam-se com desenvolvimento de carreira. Não há resultados de muitas pesquisas que permitam a discussão desses achados, mas, Teixeira et al. (2007) também encontraram correlações estatisticamente significativas no que tange à carreira e à exploração vocacional. Para os autores, a exploração do ambiente permite ao estudante ampliar a sua visão da profissão, aumentando as suas possibilidades de construir um projeto profissional mais adequado a suas habilidades, valores e história de vida. Também, como verificado no estudo de Silva et al. (2013), o otimismo em relação à profissão e ao mercado de trabalho está relacionado com maior lócus de controle interno para as tarefas de inserção profissional e com o comprometimento de carreira.
O fator interpessoal do QVA-r correlacionou-se com lócus de controle e exploração, com magnitude variando de fraca a moderada. Esses achados são indicativos de que o estabelecimento de amizades, bem como a ação de procurar ajuda de professores ou colegas estão relacionadas com a crença do estudante de que o sucesso profissional depende muito mais do seu esforço pessoal que das circunstâncias ambientais, e ainda, que a interação com os pares contribuem também com o autoconhecimento e a obtenção de informações sobre o mundo profissional. Teixeira et al. (2007) já discutiam a importância das amizades estabelecidas no meio universitário para a carreira. Os autores ressaltavam que os elos afetivos estabelecidos com os pares no âmbito do curso possibilitam maior identificação mútua entre os estudantes e favorecem a formação ou consolidação no desenvolvimento de carreira.
A dimensão estudo do QVA-r, por sua vez, apresentou correlação fraca com comprometimento de carreira, lócus de controle, autoeficácia profissional e exploração. Assim, hábitos de estudo, incluindo a gestão do tempo e preparação para as avaliações, apresentam relação com a satisfação com a escolha profissional, com as crenças pessoais do estudante sobre o seu papel ativo em sua qualificação e ainda, sobre as suas competências para exercer adequadamente as atividades de sua área profissional, e na busca pela exploração de suas habilidades e exigências do mercado de trabalho. No estudo de Teixeira et al. (2007) a dimensão estudo também apareceu correlacionada de forma fraca com a exploração de si e do ambiente e ainda, com a dimensão carreira do QVA-r. Assim, segundo os autores, infere-se que os estudantes com maior exploração de si e do ambiente tendem a ter maior envolvimento com as exigências acadêmicas e capacidade de gerir essas responsabilidades. Consequentemente, esses universitários podem estar mais propícios ao desenvolvimento de perspectivas de carreira.
Outras correlações encontradas foram entre a dimensão institucional do QVA-r, de magnitude moderadas, com lócus de controle e exploração. Com isso, supõe-se que os alunos com maior conhecimento sobre a instituição de ensino superior (IES), ou que desejam permanecer na instituição e curso, tendem a acreditar que são os responsáveis pelo seu sucesso profissional e, assim, buscam conhecer mais sobre suas habilidades e informações sobre sua profissão no mercado de trabalho. No estudo de Teixeira et al. (2007) a dimensão institucional também apareceu correlacionada de forma fraca com a exploração de carreira. Para os autores, os comportamentos de exploração contribuem com sentimento de satisfação com a instituição, pois possibilitam ao aluno um maior envolvimento com a mesma. Na medida em que este envolvimento resulta em consequências percebidas como positivas pelo indivíduo, seu nível global de satisfação com a instituição aumenta ainda mais.
Apesar de terem sido encontradas diversas correlações entre os instrumentos utilizados neste trabalho, com magnitude variando de fraca a moderada, apenas as dimensões pessoal e carreira mostraram-se capazes de predizer o desenvolvimento de carreira. Portanto, o bem estar físico e psicológico, o otimismo e a satisfação com o curso e os planos profissionais são essenciais para o desenvolvimento de carreira do universitário. Verificou-se também que a dimensão institucional explica pouco do desenvolvimento de carreira, apenas 1,7% e ainda, a direção encontrada por meio da regressão, mostrou-se negativa. Indicando que quanto menor a apreciação do estudante frente à instituição maior tende a ser o desenvolvimento de carreira.
Saber que a consolidação de carreira depende pouco da apreciação que os alunos fazem da IES em que estudam, não é um resultado de todo ruim, sabendo-se que muitos dos universitários brasileiros estudam em instituições educacionais com infraestrutura muitas vezes insuficiente para o atendimento ideal de suas necessidades enquanto estudantes. Entretanto, mesmo com o resultado encontrado na presente pesquisa, a instituição não é isenta do seu papel na formação dos estudantes, já que pode ajudá-los na exploração de suas habilidades, aproximá-los da realidade profissional por meio da estimulação dos estágios (Silva et al., 2013) e projetos de planejamento de carreira (Koen et al., 2012; Pinto & Castanho, 2012).
Quanto à análise das variáveis sociodemográficas, verificou-se não haver diferenças estatisticamente significativas para o sexo em ambos os instrumentos. Este resultado, quanto ao QVA-r, assemelha-se ao encontrado na pesquisa de Santos e Suehiro (2007). Entretanto, na pesquisa de Schleich (2006) foram verificadas diferenças para os homens nas dimensões carreira e pessoal e, na de Noronha et al. (2009), as mulheres apresentaram médias estatisticamente maiores na dimensão estudo. Em relação ao desenvolvimento de carreira não foram encontrados estudos que permitam a comparação dos resultados encontrados. Pode-se ponderar, a partir dos resultados encontrados na presente pesquisa, que as mulheres estão conseguindo desenvolver suas carreiras, ultrapassando os estereótipos quanto ao sexo no mercado de trabalho. Mas, dada a não confirmação da hipótese de que haveria diferenças significativas para a variável sexo em ambos os instrumentos, da inconstância nos resultados de outras pesquisas referente à vivência acadêmica e da importância desta variável para ambos os construtos, são necessários novos estudos.
Para a idade, verificou-se que os estudantes na faixa etária de 22 a 25 anos, considerados intermediários, obtiveram médias estatisticamente superiores que os demais nas dimensões interpessoal, lócus de controle e exploração. Assim, esses estudantes buscam, com mais intensidade, fazer novos amigos, sinalizaram acreditar mais que o seu sucesso depende de si mesmo e buscam mais conhecer suas habilidades, além de maiores informações sobre a sua profissão no mercado de trabalho. Diferindo dessa direção, o estudo de Santos e Suehiro (2007) apontou que quanto maior a idade dos estudantes, maior as médias nas dimensões pessoal e estudo. Por sua vez, Noronha et al. (2009) encontraram que os estudantes com idades acima de 26 anos apresentaram média estatisticamente maior na dimensão carreira.
O resultado encontrado para os estudantes considerados intermediários pode estar sendo influenciado pelo período do curso, já que geralmente, alunos nesta idade estão mais próximos do fim do curso, o que pode significar maior confiança em suas habilidades, busca maior por rede de contatos e inserção no mercado de trabalho. Esses resultados encontrados na presente pesquisa, quanto à idade, diferem dos demais estudos, suscitando a necessidade de futuras pesquisas a fim entender se de fato é a idade ou, a etapa do curso, ou os dois que estão relacionados com as experiências na universidade, como já hipotetizado por Noronha et al. (2009). Essas variáveis podem ser controladas em pesquisa futuras para verificar o efeito que exercem sobre os resultados.
No que se refere à variável etapa do curso, os resultados indicaram que os estudantes ingressantes apresentaram médias maiores e estatisticamente significativas nas escalas comprometimento com a carreira e autoeficácia profissional. Isto é, esses estudantes sinalizaram estar mais satisfeitos com suas escolhas profissionais, acreditando mais em suas habilidades para exercer a profissão, comparativamente aos universitários do meio de curso e concluintes. Teixeira et al. (2007), encontraram no seu estudo, que os iniciantes tenderam a ter maiores perspectivas de carreira que os veteranos. O autor sugere que no início do curso, escores elevados em relação à carreira podem significar uma expectativa positiva, mas menos realista. Como possivelmente esses estudantes ainda não tentaram ingressar no mercado de trabalho, também não se defrontaram com possíveis dificuldades para a inserção profissional, mas eventualmente, com a experiência real de busca de emprego e as possíveis frustrações podem fazer com que tais avaliações acabem sendo revistas e tornem-se mais ajustadas à realidade (Silva et al., 2013).
Ainda em relação à variável etapa do curso, os estudantes classificados como os de meio do curso apresentaram média estatisticamente maior na dimensão institucional, indicando maior apreciação face à instituição de ensino que frequentam e desejo de permanecer na instituição. Diferentemente Igue et al. (2008), Santos e Suehiro (2007), e Schleich (2006) encontraram, em suas pesquisas, maiores médias nessa dimensão para os ingressantes. Os resultados encontrados na presente pesquisa, também mostraram, que os estudantes do meio do curso e os formandos apresentaram média maior e estatisticamente significativa na dimensão exploração. Assim, esses estudantes declararam maior exploração de suas habilidades e das características exigidas no ambiente profissional. Resultado similar foi encontrado na pesquisa de Igue et al. (2008). O que possibilita inferir que quanto mais se aproxima o final do curso universitário, mais o estudante sente necessidade de pensar na sua colocação profissional após a universidade e, para tanto, é preciso conhecer em quais áreas o seu perfil se encaixa e buscar essas oportunidades. Pois, como ressalta Silva et al. (2013) com a conclusão do curso superior usualmente há expectativas de ingresso no mercado de trabalho na área profissional relacionada à formação e, segundo Koen et al. (2012), a tomada de consciência das escolhas a serem feitas, a exploração de opções e o planejamento da carreira, possibilitam que os estudantes consigam lidar de forma mais adequada com a transição universidade-trabalho.
Por fim, os resultados da presente pesquisa indicaram que os concluintes apresentaram médias estatisticamente maiores na dimensão interpessoal do QVA-r e na escala de lócus de controle. Com isso, esses estudantes relataram maior vinculação social e maior crença de que seu sucesso profissional depende mais de si que de variáveis externas a ele, como sorte ou destino. Assemelhando-se a este resultado estão outras pesquisas (Igue et al., 2008; Santos & Suehiro, 2007; Schleich, 2006) que também verificaram média estatisticamente maior para os concluintes na dimensão interpessoal do QVA-r. Assim, parece que há uma maior busca por amizades no período de conclusão do curso, que pode significar busca por redes de contato que são importantes para a inserção profissional. Agregado a isso, um maior amadurecimento dos estudantes sobre o seu papel ativo na carreira.
Considerações Finais
A partir dos dados encontrados, constatou-se que os construtos vivência acadêmica e o desenvolvimento de carreira possuem relações positivas, de modo que se pode inferir que às experiências vivenciadas na universidade estão associadas com os indicadores de desenvolvimento de carreira. No entanto, os resultados indicaram que o bem estar físico e psicológico, bem como perspectivas sobre o curso e a carreira são os aspectos que exercem efeito mais expressivo no desenvolvimento de carreira. Vale ressaltar ainda, que a satisfação com o curso aparece muito relacionada com os indicadores de desenvolvimento de carreira. Esses achados podem fornecer subsídios para a atuação na área de orientação profissional, visto que mostram aspectos que poderão ser abordados nos programas de planejamento de carreira com os universitários e até mesmo anteriormente à entrada na universidade, com a escolha adequada do curso. Do mesmo modo, estimulam a realização de novos estudos a respeito da relação entre os construtos aqui avaliados especialmente com a população universitária.
No que se refere à amostra estudada, constatou-se que não houve diferenças estatisticamente significativas entre homens e mulheres para os construtos focalizados. Para faixa etária, verificou-se que os estudantes considerados intermediários declararam maior anseio em fazer novos amigos, manifestaram a crença que o sucesso depende de si mesmos e buscam maior autoconhecimento e informações sobre a carreira profissional. Quanto ao período do curso, os estudantes ingressantes sinalizaram maior satisfação com suas escolhas profissionais, bem como maior crença em suas habilidades para exercer a profissão, enquanto os estudantes do meio de curso são os que mais expressaram o desejo de permanecer na instituição. Além disso, os estudantes de meio do curso e os formandos foram os que apresentaram maior exploração de suas habilidades e das características exigidas no ambiente profissional. Verifica-se com isso, que as variáveis sociodemográficas precisam ser consideradas no processo de adaptação acadêmica e para o desenvolvimento de carreira. No entanto, muitos dos resultados encontrados neste estudo diferem da literatura, indicando a necessidade de novas investigações sobre as questões aqui abordadas.
Salienta-se, também, a necessidade de novos estudos com um número maior de estudantes, comparando instituições públicas e privadas, e diversos cursos. Sugere-se ainda, a investigação das variáveis sociodemográficas como sexo, idade, curso, semestre, notas e a participação em atividades extracurriculares na predição do desenvolvimento de carreira, possibilitando maior conhecimento nessa área.
Algumas limitações desta pesquisa precisam ser consideradas. A primeira, consideração que deve ser feita, são os resultados encontrados na presente pesquisa, para as magnitudes das correlações que variaram de baixas a moderadas. Se, por um lado, essas correlações indicam que as vivências acadêmicas estão associadas aos indicadores de desenvolvimento de carreira, também sugerem que outros fatores, não investigados aqui teriam mais a explicar sobre esses aspectos. Outra consideração deve ser feita quanto aos resultados encontrados por meio da regressão para fins de predição. Tais resultados devem ser considerados com cautela, visto que a escolha da amostra foi por conveniência, de apenas duas universidades, ambas privadas, de estados diferentes e de diversos cursos. Dessa forma, deve-se levar em conta que, há múltiplos fatores que são associados à adaptação à universidade, e que podem ter interferido nos resultados.
Por fim, vale ressaltar o papel que a universidade tem no desenvolvimento de carreira dos estudantes. Dessa forma, deve ser enfatizada a importância da implantação de projetos que desenvolvam reflexões nos estudantes sobre si mesmos e sobre o mercado de trabalho, além de buscar maneiras de promover a autoeficácia profissional e o comprometimento com a carreira.
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Endereço para correspondência:
Acácia Aparecida Angeli dos Santos
Universidade São Francisco
Programa de Pós-Graduação em Psicologia
Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45, 13251-040
Itatiba-SP, Brasil
E-mail: acacia.angeli@gmail.com
Recebido 24/04/2013
1ª Revisão 29/07/2013
2ª Revisão 01/10/2013
Aceite Final 15/10/2013
Sobre as autoras
Jocemara Ferreira Mognon é Psicóloga. Mestre e doutoranda em Psicologia na Universidade São Francisco. Bolsista CAPES.
Acácia Aparecida Angeli dos Santos é Psicóloga. Doutora em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento pela USP. Docente da graduação e do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco.