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SMAD. Revista eletrônica saúde mental álcool e drogas

versão On-line ISSN 1806-6976

SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. (Ed. port.) vol.17 no.2 Ribeirão Preto abr./jun. 2021

https://doi.org/10.11606/issn.1806-6976.smad.2021.173655 

ARTIGO ORIGINAL

 

Distanciamento social e COVID-19: estratégias adotadas por estudantes de Enfermagem

 

Distanciamiento social y COVID-19: estrategias adoptadas por estudiantes de Enfermería

 

 

Flávia Batista Portugal; Kallen Dettmann Wandekoken; Renata Santos de Souza; Elaine da Rocha Souza; Letícia do Nascimento Rodrigues

Universidade Federal do Espírito Santo, Departamento de Enfermagem, Vitória, ES, Brasil

Autor Correpondente

 

 


RESUMO

OBJETIVO: identificar quais estratégias de enfrentamento foram adotadas por estudantes de Enfermagem de uma universidade pública perante as dificuldades vivenciadas no decorrer do distanciamento social e da pandemia da COVID-19.
MÉTODO: estudo transversal, realizado com 148 estudantes, a partir de questionário on-line. A análise estatística foi realizada por meio de análise descritiva dos dados, apresentando os resultados por frequências absolutas e relativas e medidas de tendência central.
RESULTADOS: constatou-se que uma pequena parcela foi infectada por SARS-CoV-2 (6,1%). Em contrapartida, 39,9% relataram que algum familiar foi infectado. Em relação aos que utilizaram estratégias de enfrentamento (91,2%), destacam-se a adoção de hobbies (49,3%) e a realização de atividades físicas (26,4%). Nota-se que ambas estiveram relacionadas também a meios para o afastamento da situação vivida e/ou na tentativa de fuga de pensamentos negativos.
CONCLUSÃO: os resultados apontam ser necessário o apoio da universidade, a partir de ações com enfoque na saúde mental dos estudantes de Enfermagem, potencializando as estratégias que sejam eficazes na melhoria do bem-estar e na diminuição do estresse dos alunos, suscetíveis ao adoecimento psíquico, a partir das vivências e receios do meio universitário.

Descritores: Saúde Mental; Estudantes; Estudantes de Ciências da Saúde; Infecções por Coronavírus; Distanciamento Social; Adaptação Psicológica.


RESUMEN

OBJETIVO: identificar qué estrategias de afrontamiento fueron adoptadas por estudiantes de enfermería en una universidad pública en vista de las dificultades experimentadas durante la distancia social y la pandemia de Covid-19.
MÉTODO: estudio transversal, realizado con 148 alumnos, utilizando un cuestionario en línea. El análisis estadístico se realizó a través del análisis de datos descriptivos, presentando los resultados por frecuencias absolutas y relativas y medidas de tendencia central. Para el análisis de asociación, se utilizó la prueba de chi-cuadrado, adoptando un nivel de significación del 5%.
RESULTADOS: se encontró que una pequeña porción estaba infectada con SARS-CoV-2 (6.1%). En contraste, el 39.9% informó que algún miembro de la familia estaba infectado. Con respecto a quienes usaron estrategias de afrontamiento (91.2%), se destaca la adopción de pasatiempos (49.3%) y actividades físicas (26.4%). Cabe señalar que ambos también estaban relacionados con formas de eliminar la situación experimentada y/o en un intento de escapar de los pensamientos negativos.
CONCLUSIÓN: los resultados apuntan a la necesidad de apoyo universitario, basado en acciones enfocadas en la salud mental de los estudiantes de enfermería, lo que permite mejorar las estrategias que son efectivas para mejorar el bienestar y reducir el estrés de los estudiantes, previamente susceptibles a enfermedades psíquico basado en las experiencias y temores del entorno universitario.

Descriptores: Salud Mental; Estudiantes; Estudiantes del Área de la Salud; Infecciones por Coronavirus; Aislamiento Social; Adaptación Psicológica.


 

 

Introdução

Em 2019, uma nova cepa de Coronavírus começou a gerar preocupações na China. Notava-se um crescimento considerável de casos de pneumonia na cidade de Wuhan. Posteriormente, em 30 de janeiro de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) decretou Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional e, rapidamente, casos foram identificados em praticamente todos os continentes. Em fevereiro de 2020, essa nova cepa foi denominada como Síndrome Respiratória Aguda Grave do Coronavírus 2 (SARS-CoV-2), responsável pela doença do Coronavírus (COVID-19)(1).

Mundialmente, medidas foram adotadas para conter o avanço da doença de forma a interromper a alta transmissibilidade do vírus, como a higiene das mãos, a etiqueta respiratória, o uso de máscaras faciais de uso não profissionais e o distanciamento tanto social quanto físico(2) - este realizado por meio de estratégias como distanciamento e quarentena(3). Neste ponto, considerando a transmissão, o distanciamento social torna-se importante ao diminuir a propagação do vírus, principalmente em locais onde a transmissão comunitária é presente, ou seja, onde as conexões entre os casos não são claras(3-4).

Dentre as ações que visam ao distanciamento social, destacam-se o fechamento de escolas e universidades(3-4). Para tanto, no Brasil, cada Estado adotou medidas específicas para minimizar o impacto da COVID-19. Em especial, no Espírito Santo, o fechamento total das unidades de ensino ocorreu no dia 23 de março de 2020(5).

Toda essa situação impacta diretamente a saúde da população. Qualquer processo de adoecimento, que atinja um grande contingente populacional, gera consequências psicossociais, especialmente no contexto de uma pandemia como a desencadeada pelo SARS-CoV-2(6). Assim, alterações psicossociais são esperadas, podendo ser vistas como reações a uma situação incomum vivenciada. Entretanto, estima-se um aumento de casos novos de transtornos mentais segundo a magnitude do evento e o acesso a ações psicossociais(6). O medo de adoecer ou morrer, de perder algum ente querido, de transmitir o vírus para algum familiar, o medo de acessar os serviços de saúde por receio de contaminação e de perder os meios de subsistência são questões que influenciam diretamente a saúde mental da população durante a pandemia(7). Não obstante, medidas que visem a uma diminuição da interação social - estratégia essencial para diminuir a transmissão do vírus - contribuem para o adoecimento psíquico(8-10). A limitação do ir e vir, a possibilidade de alterações dos planos futuros e a separação brusca do círculo social e familiar podem ser associadas a casos de ansiedade e depressão(9-10).

O distanciamento familiar, a pressão por um bom desempenho acadêmico, o relacionamento com pessoas com formações distintas e a possível breve inserção no mercado de trabalho são fatores que podem desencadear adoecimento psíquico nos estudantes universitários. Com a pandemia, esses receios e sentimentos já existentes podem ser potencializados, contribuindo para esse adoecimento. Frente ao exposto, este artigo objetivou identificar as estratégias adotadas pelos estudantes de Enfermagem no enfrentamento à medida de distanciamento social durante a pandemia da COVID-19.

 

Método

Trata-se de uma pesquisa descritiva, com abordagem quantitativa, de caráter transversal, realizada com estudantes de Enfermagem matriculados em uma universidade do Espírito Santo - Brasil. No momento da pesquisa, havia 240 estudantes matriculados no curso em questão. Para tanto, adotou-se, como critério, o cálculo de amostra no software Epi Info, com nível de confiança de 95%, precisão de 5% e prevalência de 50%, resultando em 148 estudantes que responderam ao questionário e aceitaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Foram incluídos estudantes de Enfermagem devidamente matriculados e que, no momento da pesquisa, apresentavam 18 anos ou mais. Como critério de exclusão, adotou-se o preenchimento incompleto do questionário.

A sensibilização dos estudantes foi realizada via on-line, com convites enviados pelo colegiado do curso e divulgação da pesquisa e seus objetivos em mídias sociais do centro acadêmico livre de Enfermagem, sendo o convite reforçado algumas vezes para o alcance de estudantes que não o haviam respondido. A coleta dos dados foi realizada no período de três semanas, de 29 de junho a 10 de julho de 2020, quando os estudantes preencheram um questionário on-line semiestruturado que contemplava questões como informações sociodemográficas, situação de saúde, formação acadêmica, infecção por SARS-CoV-2 e estratégias de enfrentamento perante as dificuldades vivenciadas no decorrer do distanciamento social durante a pandemia. O link do questionário foi enviado aos acadêmicos, juntamente com o TCLE para preenchimento conjunto, por meio do e-mail institucional, tendo em vista a suspensão das atividades presenciais.

A análise estatística foi realizada pelo software Statistical Package for Social Science, versão 22, por meio de análise descritiva dos dados. Os resultados foram apresentados por meio de frequências absolutas e relativas e medidas de tendência central.

Para a realização deste estudo, foram seguidas as exigências éticas estabelecidas pela Resolução nº 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, com a aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Espírito Santo com CAAE 30847420.6.0000.5060 e Parecer nº 4.029.745. Além disso, todos os participantes concordaram com o TCLE.

 

Resultados

Participaram da pesquisa 148 estudantes de Enfermagem, correspondendo a 61,7% dos alunos regularmente matriculados. Entre os pesquisados, a maioria é do gênero feminino (89%), com média de idade de 22,9 (DP=4,9), residente na capital do Estado (Vitória - 39,2%), não possui atividade laboral (89,9%) e relata ter religião (80,4%) (Tabela 1).

 

 

Quanto a questões relacionadas à universidade, 56,1% estão satisfeitos com a escolha do curso e 62,8% realizam atividades extracurriculares, tais como monitorias e participação em projetos de pesquisa e/ou extensão. Ao se analisar as respostas por período, observa-se certa homogeneidade, com ligeiro predomínio do sexto período, com 16,9% do total de respostas (Tabela 2).

 

 

Ao se observar os aspectos relacionados à saúde dos estudantes, nota-se que uma parcela relata ter sido infectada por SARS-CoV-2 (6,1%) e uma parcela ainda maior relata infecção de familiares (39,9%). No entanto, não se obteve informação sobre a confirmação da infecção por meio de exames laboratoriais. Em relação à presença de problemas físicos crônicos, 9,5% assinalaram de forma positiva. Quanto ao relato de problemas psicológicos, 50,7% afirmaram possuí-los e 63,5% mencionaram demandas oriundas de períodos anteriores. Cabe ressaltar que, neste item, não foi informado, aos estudantes, o que seriam os “problemas psicológicos” e, assim, a compreensão do termo deu-se de forma subjetiva. Já ao final dos itens relacionados aos aspectos de saúde, quanto ao uso de substâncias psicoativas, houve um predomínio do uso de álcool (53,4%) em relação ao relato do uso de tabaco (6,1%) (Tabela 3).

 

 

A maioria dos estudantes relata ter realizado alguma estratégia para enfrentar as dificuldades vivenciadas no decorrer do distanciamento social e da pandemia da COVID-19 (91,2%, ou seja, 135 estudantes). Em várias situações, foi adotada mais de uma estratégia de forma concomitante. Entre as principais estratégias relatadas na pesquisa, destacam-se (Tabela 4): a realização de hobbies diversos (49,3%), por exemplo a leitura, ouvir música e os jogos de computador; a realização de atividades físicas (26,4%); a manutenção de contatos sociais via on-line (14,9%); a adoção de hábitos saudáveis (12,8%), como a regulação do sono e mudança nos hábitos alimentares.

 

 

Discussão

Diante da intensificação da pandemia em todos os países e da necessidade prolongada do distanciamento social, é possível notar que, com a disseminação do vírus, ocorre a propagação do medo coletivo e de sentimentos negativos, que podem ter caráter passageiro, mas também permanecer após o período pandêmico(14). É nesse contexto que os acadêmicos adotaram meios de lidar com esses sentimentos, utilizando estratégias de enfrentamento tanto para o momento vivenciado quanto para as consequências geradas por ele.

Nas últimas décadas, a escuta qualificada tem sido muito almejada para lidar com situações estressoras, haja vista que ela consiste em uma preocupação com o que é exposto pelo indivíduo, por meios verbais e não verbais e, assim, contribui no desenvolvimento de mudanças de atitude, tanto no âmbito individual quanto interpessoal(15). Por isso, as intervenções psicológicas, como o acompanhamento realizado por profissional de nível superior, desempenham um papel fulcral na adoção de estratégias para minimizar as implicações na saúde mental durante a pandemia da COVID-19(16-17). Nesse sentido, no dia 26 de março de 2020, foi publicada a Resolução CFP n° 4/2020, que regulamenta o atendimento psicológico por meio de Tecnologias da Informação e da Comunicação (TICs), suspendendo, assim, os Art. 3°, 4°, 6°, 7° e 8° da Resolução CFP n°11/2018 e facilitando o acesso a esse tipo de apoio, uma vez que o atendimento presencial está dificultado devido à situação atual(18-19). Neste estudo, uma pequena parcela dos estudantes relatou estar em acompanhamento profissional durante a pandemia e tal fato pode ser explicado pelo difícil acesso a profissionais qualificados por essa população. Independentemente do período da pandemia, o número de atendimentos psicológicos ofertados pela universidade aos estudantes é muito inferior à demanda, assim, poucos estudantes realizavam acompanhamento antes da pandemia. Além disso, o distanciamento social dificultou ainda mais esse processo de forma que pode comprometer o acompanhamento de casos de transtornos já diagnosticados e ocasionar a ausência de oferta do cuidado necessário àqueles que se encontram em sofrimento psíquico durante a pandemia. Cabe ressaltar ainda a importância da utilização da escuta ativa não somente pelos profissionais da Psicologia, mas por toda a equipe multiprofissional, sobretudo o enfermeiro, visto que essa metodologia se configura como uma importante ferramenta para um processo de Enfermagem eficaz.

O período vivenciado trouxe mudanças nas rotinas e nos hábitos diários das pessoas, incluindo alterações no sono. Sabe-se que o sono desempenha um papel fundamental no sistema imunológico e na regulação emocional, e que as alterações e distúrbios produzidos em decorrência da pandemia da COVID-19 podem acarretar consequências diretas para a saúde mental e, de igual forma, para a saúde física(20). Alguns estudantes participantes da pesquisa relataram que dormir os auxilia no enfrentamento da pandemia e do distanciamento social. No entanto, quando o ato de dormir está relacionado com uma irregularidade no padrão de sono, a estratégia pode ser considerada negativa, considerando os fatores fisiológicos e emocionais já citados. Por outro lado, quando associada a uma mudança de hábitos a fim de regular o sono e melhorar a qualidade do mesmo, conforme exposto por alguns estudantes, pode ser considerada como uma estratégia de enfrentamento positiva.

Alguns estudantes adotaram mecanismos de enfrentamento mais ativos, relacionados à prática de atividades físicas, que podem ser entendidas como a realização de movimentos com a utilização do sistema musculoesquelético que demande gasto de energia além do basal(21). A literatura aponta a prática de atividade física como meio de prevenção de agravos e tratamento não farmacológico de uma série de doenças, além de proporcionar a sensação de bem-estar físico e mental(21). Durante a pandemia, a prática de exercícios em ambiente domiciliar pode ser uma forma de reduzir os impactos negativos do distanciamento social até porque a prática dessas atividades é considerada capaz de contribuir para a diminuição de sintomas de depressão e ansiedade(22). Neste ponto, as atividades e os exercícios físicos utilizados pelos acadêmicos (atividades domésticas, rotinas de exercícios, caminhadas e outros), embora distintos, seguem propósitos similares no contexto da pandemia. A utilização de atividades físicas como estratégia de afastamento e/ou de fuga de pensamentos negativos já é descrita e estudada. Além disso, os resultados posteriores à prática, como a sensação de capacidade de realização e orgulho, podem ser responsáveis por melhorias na autoconfiança e no humor(23).

Já as estratégias relacionadas à alimentação podem ser consideradas como positivas ou negativas, uma vez que impactam diretamente a saúde do indivíduo(24). Assim, quando associada a uma mudança nos hábitos de forma a tornar a alimentação mais saudável, pode ser considerada uma estratégia de enfrentamento positiva em razão dos benefícios para a saúde física e mental. No entanto, em período de pandemia, estudos indicaram um aumento nos casos de ansiedade em estudantes universitários(25) de forma, que quando a alimentação está associada a essa ansiedade, há um aumento no consumo diário de calorias(26-27) e a desassociação a hábitos saudáveis - como apresentado na maioria dos relatos desta pesquisa.

Assim como as atividades físicas, a realização de Práticas Integrativas e Complementares (PIC) também foi adotada pelos acadêmicos. Essas práticas são elementos da chamada medicina complementar ou medicina alternativa. Essa forma de intervenção pode ser descrita como um grupo de atividades de cuidado de saúde alternativo, ou seja, não configuram o quadro de práticas da medicina convencional e, embora tenham crescido exponencialmente nos últimos anos nos sistemas de saúde, ainda não são totalmente integradas a eles e geralmente são usadas de maneira intercalada ou concomitante com a medicina tradicional(28). Desde o reconhecimento das PIC como meio de promoção da saúde, diversos estudos têm sido realizados com o objetivo de descrever os ganhos no bem-estar advindos da adesão a essas práticas e vêm comprovando sua eficácia. A Ioga, por exemplo, é descrita como atividade potencialmente atuante na diminuição de sintomas de ansiedade que pode ser utilizada como meio não farmacológico de tratamento(29).

Adotada por uma parcela dos estudantes, a religiosidade pode ser considerada fator importante para rever, reinventar e reorganizar as relações e experiências em tempos pandêmicos(30) de forma a impulsionar a busca por um sentido ou significado para a circunstância vivenciada e favorecer seu enfrentamento(31).

Outra estratégia de enfrentamento amplamente aderida pelos acadêmicos foi a utilização de hobbies como meio de distração. Atualmente, na literatura científica(32), essas atividades que são agradáveis ao indivíduo já são descritas como associadas à melhoria do bem-estar, à promoção da saúde mental e à diminuição do estresse, além de proporcionar a sensação de satisfação. Alguns hobbies já são amplamente utilizados com intenção terapêutica, como ouvir a música. A musicoterapia vem comprovando sua eficácia na promoção da saúde, bem como na prevenção e no tratamento de agravos relacionados à saúde mental(33).

Ao longo da vida, pode-se notar que, cada vez mais, o ser humano busca meios de proteger a si mesmo, e a adoção de estratégias de enfrentamento também é uma forma de proteção, sendo, nesse caso, com foco na saúde mental. Contudo, nem todos os mecanismos adotados serão eficientes em longo prazo. Como exemplo, tem-se a estratégia de evitar notícias e/ou discussões sobre a pandemia, de forma a se afastar da situação estressora, que se pode visualizar na resposta de alguns estudantes. Se, por um lado, o afastamento do problema pode ajudar momentaneamente a reduzir a ansiedade ou sentimentos negativos, por outro, essa estratégia impede que os sentimentos e os impulsos venham à tona, sendo suprimidos e podendo ter a situação agravada. Além disso, quanto maior for a fuga, menor será a capacidade de resolução do estresse(34-35).

Enquanto se tem a fuga como estratégia potencialmente negativa, há as relações interpessoais seguindo no sentido oposto. Embora a situação de pandemia exija um distanciamento físico, interagir e trocar experiências com outros indivíduos que passam por situações semelhantes já têm provado efeito benéfico à saúde mental(36). Dessa maneira, o uso de TICs e a convivência com pessoas residentes no núcleo familiar têm sido meios utilizados para suprir a necessidade humana de interação, reduzindo o distanciamento social. As relações humanas podem ser benéficas no enfrentamento a situações ruins e as interações podem ser potencialmente redutoras dos níveis de estresse(36).

Na universidade em que foi realizada esta pesquisa, os alunos de Enfermagem necessitam cumprir 105 horas em atividades extracurriculares(37). Dessa forma, durante a graduação, os alunos envolvem-se em atividades de pesquisa, extensão, estágios voluntários, realização de cursos on-line e outras atividades. Assim, apesar da suspensão das aulas durante o período de pandemia, muitos estudantes encontram-se envolvidos em atividades da universidade que não foram suspensas, utilizando, em alguns casos, a realização dessas atividades como estratégia de enfrentamento à pandemia. No entanto, quando associadas aos sentimentos presentes durante a pandemia de não conseguir fazer as coisas como planejado, não ter capacidade para lidar com os desafios e não ter o apoio necessário das pessoas próximas, a participação nessas atividades pode acarretar um sentimento de sobrecarga(38), criando, assim, uma linha tênue entre ser uma estratégia negativa ou positiva, já que surge também o sentimento de produtividade e de ser útil. Esses sentimentos podem ser vivenciados de igual forma por quem utiliza a atividade profissional como estratégia de enfrentamento.

Quanto às limitações deste estudo, encontra-se a dificuldade na obtenção de respostas dos alunos sem acesso à internet, tendo em vista que a entrevista foi realizada por meio de questionário on-line. No entanto, é importante ressaltar que, apesar de ser um fator limitador, não impossibilitou a realização do estudo, apenas prolongando o período de coleta de dados, e tornou-se a estratégia necessária a ser adotada em razão da suspensão das atividades presenciais.

 

Conclusão

A realização deste estudo foi capaz de reafirmar que, perante situações estressoras, os indivíduos tendem a criar meios de adaptação e superação. A grande maioria dos acadêmicos de Enfermagem participantes relatou ter adotado estratégias para o enfrentamento da situação atual da pandemia da COVID-19. Entre as principais, destacam-se a adoção de hobbies e a prática de atividades físicas, sendo que ambas estiveram relacionadas também a meios para o afastamento da situação vivida e/ou na tentativa de fuga de pensamentos negativos.

Assim, cabe ressaltar que a adoção de medidas de enfrentamento não significa sucesso no processo, haja vista que as estratégias podem ter impacto positivo ou negativo à saúde mental, dependendo não somente da estratégia adotada, mas também da forma como ela está sendo aplicada e gerenciada pelo estudante. De modo geral, pode-se definir que estratégias de enfrentamento são amplamente utilizadas e necessárias para a superação de situações desagradáveis e podem ser potencialmente benéficas para a promoção da saúde mental quando utilizadas de forma orientada por profissionais qualificados. Assim, faz-se necessário o apoio da universidade, a partir de ações com enfoque na saúde mental dos estudantes de Enfermagem, objetivando potencializar estratégias que sejam eficazes na melhoria do bem-estar e na diminuição do estresse dos alunos, que já são previamente expostos a situações com potencial para gerar adoecimento psíquico no que diz respeito às vivências e receios do meio universitário.

 

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Autor correpondente:
Flávia Batista Portugal
E-mail: flavia.portugal@ufes.br

Recebido: 14.08.2020
Aceito: 07.11.2020

 

 

Contribuição dos autores
Concepção e desenho da pesquisa: Flávia Batista Portugal, Kallen Dettmann Wandekoken, Renata Santos de Souza. Obtenção de dados: Flávia Batista Portugal, Kallen Dettmann Wandekoken, Renata Santos de Souza, Elaine da Rocha Souza, Letícia do Nascimento Rodrigues. Análise e interpretação dos dados: Flávia Batista Portugal, Kallen Dettmann Wandekoken, Elaine da Rocha Souza, Letícia do Nascimento Rodrigues. Análise estatística: Flávia Batista Portugal. Obtenção de financiamento: Flávia Batista Portugal, Kallen Dettmann Wandekoken, Renata Santos de Souza. Redação do manuscrito: Flávia Batista Portugal, Kallen Dettmann Wandekoken, Elaine da Rocha Souza, Letícia do Nascimento Rodrigues. Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Flávia Batista Portugal, Kallen Dettmann Wandekoken, Renata Santos de Souza, Elaine da Rocha Souza, Letícia do Nascimento Rodrigues.
Todos os autores aprovaram a versão final do texto
Conflito de interesse: os autores declararam que não há conflito de interesse.

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