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Boletim de Psicologia
versão impressa ISSN 0006-5943
Bol. psicol vol.66 no.145 São Paulo jul. 2016
ARTIGOS ORIGINAIS
Avaliação da inteligência por meio do psicodiagnóstico miocinético - PMK
Intelligence assessment using myokinetic psychodiagnosis - PMK
Eni Ribeiro da SilvaI; Sabián J. M. RuedaII,*
IPontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - MG - Brasil
IIUniversidade São Francisco - SP - Brasil
RESUMO
Este artigo teve como objetivo verificar se o teste PMK poderia ser utilizado para avaliação da inteligência. A amostra foi composta por 128 sujeitos com idades entre 18 e 65 anos, homens e mulheres, com níveis de escolaridade variando desde o ensino fundamental até a pós-graduação, que foram submetidos ao PMK, individualmente, e ao Teste de inteligência (TI), de forma coletiva. Os itens do PMK foram avaliados qualitativamente por três juízes com expertise na interpretação do teste, considerando 15 itens descritos pela literatura como indicadores de inteligência. Nos resultados, as pontuações no TI foram correlacionadas ao total de pontos do PMK, verificando uma correlação negativa, significativa e de magnitude moderada (r= -0,462). Os itens mais presentes no PMK foram as irregularidades nas Escadas e nos Zigues-zagues, enquanto os itens menos frequentes foram o deslocamento serpenteante (Zigue-zagues) e os ângulos em guirlanda (Escadas). Discute-se a possibilidade do PMK ser um instrumento capaz de evidenciar o nível cognitivo.
Palavras-chave: PMK; validade, inteligência.
ABSTRACT
This article aims to determine if the PMK could be used to assess intelligence. The sample consisted of 128 subjects aging from 18 to 65, men and women, with educational levels ranging from elementary school to to postgraduate degree, who were submitted to the PMK, individually, and collectively to Intelligence Test (TI). The items of PMK were evaluated qualitatively by three judges with expertise in interpreting the test, considering 15 items described in the literature as intelligence indicators. Scores in TI were correlated in the results to the total score of the PMK, with a negative correlation, significant and moderate (r = -0.462). The most recurrent items on the PMK were irregularities in Stairs and Zigues-zags, while less frequent items were winding displacement and angles garland. We discuss the possibility of PMK as a tool to assess the cognitive level.
Key words: PMK; validity; intelligence.
INTRODUÇÃO
Desde os primórdios, o interesse por descrever ou caracterizar a inteligência é uma necessidade humana e encontra-se atrelado a uma necessidade científica de testar e identificar diferenças individuais (Anastasi & Urbina, 1997). De acordo com as autoras, no século XX, a inteligência era concebida de maneira ambígua, ora bidimensional, ora de forma multidimensional, impulsionando novas pesquisas para resolver tal dilema.
Por ser um fenômeno complexo, o construto inteligência é abordado sob vários ângulos e modelos diferentes. O modelo experimental procura compreender o funcionamento da inteligência por meio das operações do sistema cognitivo, como atenção e percepção, sem se preocupar com o número de aptidões que formam a inteligência, como ela se desenvolve ou é adquirida. O enfoque diferencial se interessa pela identificação das aptidões e capacidades cognitivas responsáveis pelas diferenças individuais em relação ao rendimento cognitivo, por meio do estudo da estrutura das aptidões, sem se deter em outros aspectos. Já o modelo evolutivo investiga a forma pela qual a inteligência se constitui em função do processo de crescimento e de desenvolvimento individual ontogenético, desenvolvendo-se no indivíduo desde seu nascimento até o final da juventude, por meio de estágios que demonstram o avanço da capacidade intelectual (Andrés-Pueyo, 2006).
Davidson e Kemp (2011) discutem que a inteligência é um dos poucos constructos com tantas controvérsias, pois o conceito existe há séculos, mas ainda assim há pouco consenso sobre seu significado aplicado, devido à heterogeneidade de concepções existentes. Os modelos advindos das concepções psicométrica, fisiológica e social partem de diferentes perspectivas no estudo e compreensão da inteligência, e um dos pontos de divergência se refere à ênfase na adaptabilidade dos processos mentais como um importante aspecto da inteligência.
De acordo com Gottfredson (1997), vários estudos já desvendaram e continuam a mostrar evidências sobre as origens da inteligência, seu desenvolvimento, processos mentais constituintes, níveis de flexibilidade, assim como o impacto no desempenho nas diversas áreas da vida e no treinamento em educação. De acordo com Colom (2006), estudos mostram que a inteligência está relacionada a mais de 60 fenômenos sociais, dentre eles ao rendimento acadêmico e no trabalho, à saúde, à resposta à psicoterapia, à longevidade, à sensibilidade emocional, à vulnerabilidade, aos acidentes, à capacidade de liderança e ao nível socioeconômico alcançado. Para o autor, esses dados mostram o quanto o construto é relevante em vários contextos da vida dos indivíduos.
Por se tratar de um tema complexo e de difícil conceituação, em 1994, um grupo composto por 52 peritos no estudo de inteligência e de áreas afins chegou a um consenso acerca do conceito, definindo-a como "uma capacidade mental muito geral que, entre outras coisas, envolve a capacidade de raciocinar, planejar, resolver problemas, pensar abstratamente, compreender ideias complexas, raciocinar rapidamente e aprender com a experiência" (Carroll, 1997, p. 123). De acordo com o autor, tal definição enfatiza que a inteligência representa, de modo geral, a capacidade de resolver problemas (incluindo problemas de compreensão) e de pensar.
A despeito das inúmeras definições de inteligência, neste trabalho o foco recai sobre o conceito de inteligência geral ou fator g, baseado no modelo psicométrico. A ideia de um componente principal, ou geral, do intelecto foi proposta no início do século XX por Charles Spearman (1863-1945), psicólogo pioneiro no estudo quantitativo da organização estrutural da inteligência (Andrés-Pueyo, 2006).
Em seu tempo, Spearman vivenciou uma controvérsia relacionada à compreensão teórica do construto inteligência, na qual a discussão se relacionava à existência de uma ou várias capacidades intelectuais (Andrés-Pueyo, 2006). Spearman (1927) desenvolveu o método da Análise Fatorial e, por meio deste método, avaliou e correlacionou dados obtidos entre vários testes utilizados com o objetivo de mensurar a inteligência. Os resultados mostraram correlações positivas para as várias medidas utilizadas, que avaliavam habilidades numéricas, espaciais e verbais.
Perante tal constatação, Spearman (1927) considerou a existência de um fator geral, comum a todas as habilidades intelectuais e, utilizando uma analogia política, denominou de monárquica a estrutura composta por este único fator, responsável por todos os tipos de capacidades. Uma segunda estrutura, nomeada oligárquica, foi relacionada a diferentes atributos, que Spearman (1927) nomeou de fator específico, ou fator e. Essa formulação ficou conhecida como teoria bifatorial da inteligência.
Arthur Jensen, psicometrista famoso do século XX, defendeu o fator geral enquanto sinônimo de inteligência, sendo que, para este estudioso, o fator g representa o mais geral na análise dos fatores independentes expressos em habilidades específicas (Andrés-Pueyo, 2006; Flores-Mendoza, 2000). Desse modo, o fator geral é considerado o mais amplo ao se investigar a capacidade intelectual. A inteligência, na perspectiva do fator g é considerada uma capacidade de processar informação muito geral, que facilita a resolução de problemas, o processo de raciocínio e a tomada de decisões, bem como outras habilidades de pensamento em nível superior (Gottfredson, 1997).
Atualmente existem no Brasil diversos instrumentos que objetivam investigar a capacidade intelectual (CFP, 2015) e que são embasados teoricamente no fator g, sendo que em todos eles o objetivo é identificar a resposta correta para um determinado problema apresentado. Diferentemente desta perspectiva, o teste Psicodiagnóstico Miocinético, ou PMK, consiste em uma técnica gráfica e expressiva, destinada à avaliação de características de personalidade, quais sejam, Tônus Vital, Agressividade, Reação Vivencial, Emotividade, Dimensão Tensional e Predomínio Tensional. Ainda, se aventa a hipótese de que o teste PMK possa identificar o potencial intelectual, a partir de uma avaliação qualitativa de traçados específicos do teste. Considerando a possibilidade de o teste PMK acessar o construto inteligência por meio da produção gráfica motora, trabalhos que busquem corroborar ou não tal hipótese devem ser realizados.
O autor do teste PMK, o psiquiatra Emílio Mira y López, realizava diagnósticos da capacidade intelectual por meio do instrumento, considerando a regularidade e o grau de perfeição na realização dos traçados mais complexos para verificar o grau de desenvolvimento intelectual dos avaliados (Galland de Mira, 1987). Contudo, devido às discussões emergentes acerca do conceito de inteligência, Mira y López optou por utilizar o termo "nível ideomotor" em substituição ao termo inteligência, e definiu o novo conceito como "grau de inteligência manifesta através da expressão motora, observando-se a capacidade do sujeito de orientar-se no espaço não visual" (Galland de Mira, 1987, p. 92).
Embora Mira y López acreditasse que por meio do PMK poderia se evidenciar o nível intelectual do sujeito, ele não realizou pesquisas com o intuito de verificar tal possibilidade. Ficou a cargo da psicóloga Dra. Maria Carbonel de Grampone, no ano de 1949, realizar uma pesquisa a fim de verificar os sinais de deficiência intelectual por meio do PMK. A pesquisadora considerou as configurações mais complexas do teste, realizadas sem controle visual, a saber: Zigues-Zagues, Escadas e Us sagitais. A amostra foi composta por 100 adolescentes de 13 a 18 anos, e classificados de acordo com os resultados de três baterias de inteligência espacial, abstrata e verbal, sendo 33 sujeitos com inteligência superior, 33 com inteligência média e 34 com inteligência inferior. Os resultados da pesquisa mostraram uma correlação significativa entre os resultados dos testes de inteligência e a elaboração das configurações mais complexas do teste. As correlações do PMK com os testes de inteligência espacial, abstrata e verbal, foram 0,65 com a média das três baterias, 0,64 com a espacial, 0,55 com a abstrata, 0,42 com a verbal e, finalmente, uma correlação de 0,73 com a média da bateria espacial e abstrata.
A partir desse estudo, Grampone (1949) elencou sete características encontradas nas configurações mais complexas (Escadas, Zigue-Zagues e Us sagitais), que foram denominadas "signos da inteligência" e que se tornaram referências para analisar o nível ideomotor dos sujeitos submetidos ao teste, sendo estes: 1) ausência de simetria nos Zigues-Zagues; 2) irregularidade nos lados do Zigue-Zague; 3) deslocamento serpenteante do Zigue-Zague; 4) alterações na forma e nos ângulos das Escadas; 5) irregularidades nos tamanhos dos traços que formam os degraus das Escadas; 6) desorientação geral na Escada; 7) desvio axial nos Us sagitais. Dessa forma, entende-se que a dificuldade apresentada pelo sujeito nas configurações mais difíceis do teste está diretamente relacionada ao seu grau de inteligência.
Outro trabalho com o objetivo de avaliar o nível intelectual por meio do PMK foi realizado por Esteves (2007), que investigou a relação entre 96 indicadores de baixo nível intelectual encontrados no PMK com o Teste Não Verbal de Inteligência R-1. A amostra foi constituída por 200 sujeitos com idades entre 19 e 56 anos. A correlação entre o total de indicadores do PMK e o R-1 foi de -0,592, indicando um coeficiente satisfatório. Como destaca o autor, o coeficiente foi negativo, porque os indicadores no PMK avaliam os déficits de inteligência. Os resultados mostraram correlações moderadas e maiores para os Zigue-Zagues, as Escadas e os Us, que são os traçados mais complexos do teste. Com isso, os resultados encontrados mostraram um adequado coeficiente de validade simultânea entre o PMK e o R-1.
Com exceção dos dois estudos citados, não foram localizados na literatura trabalhos publicados que discutam o PMK, enquanto possível instrumento para avaliação da inteligência. A partir disso, o objetivo deste trabalho foi investigar evidência de validade por meio de testes que avaliam construtos relacionados entre o PMK e o Teste de Inteligência (TI), no que se refere à capacidade intelectual.
MÉTODO
Participantes
A amostra foi composta por 128 sujeitos com idades variando entre 18 e 59 anos (M=26,05; DP=7,7), residentes na cidade de Belo Horizonte e região metropolitana, com níveis de escolaridade diversos (fundamental=4,7%, ensino médio=19,5%, superior incompleto=62,5%, superior completo=12,5% e pós-graduados=8%). Do total, 68,8% eram do sexo feminino.
Instrumentos
Psicodiagnóstico Miocinético - PMK (Galland de Mira, 1987)
Trata-se de um teste gráfico expressivo motor que se propõe a avaliar características de personalidade. Mensura características estruturais e reacionais dos sujeitos a partir do princípio da dissociação miocinética, postulado que afirma existirem diferenças entre os dois hemisférios cerebrais. A avaliação dos aspectos da personalidade e dos aspectos referentes ao nível ideomotor é realizada de maneira distinta, sendo a primeira mensurada por meio de medidas quantitativas no teste, enquanto o segundo consiste na verificação de aspectos qualitativos. O teste é realizado com lápis e papel, sendo necessária uma mesa específica para a aplicação do mesmo. Também são utilizados os cartões de cobertura e o anteparo que servem para cobrir a visão do sujeito durante sua aplicação. O teste pode ser aplicado em sujeitos de todos os níveis de escolaridade, inclusive analfabetos. O PMK avalia seis fatores, com polaridades distintas, sendo eles Tônus Vital (elação/depressão), Agressividade (hetero-agressividade/auto-agressividade), Reação Vivencial (extratensão/intratensão), Dimensão Tensional (excitação/inibição), Predomínio Tensional (impulsividade/rigidez) e, por fim, Emotividade. A execução do PMK requer que o sujeito trabalhe ora com a mão direita ora com a esquerda e, por vezes, com as duas mãos ao mesmo tempo. A normatização atual deste instrumento (Galland de Mira, 2014) contempla uma amostra de 1.493 sujeitos provenientes de três estados brasileiros e o Distrito Federal (São Paulo, Minas Gerais, Pernambuco e Brasília). As pesquisas de validade incluem a análise da estrutura interna, e a precisão foi pelo Alfa de Cronbach, com valores variando entre 0,60 e 0,80.
Teste de Inteligência - TI (Rueda & Castro, 2012).
Trata-se de um instrumento psicométrico de avaliação cognitiva baseado no modelo de inteligência geral de Spearman. Avalia pessoas com idades entre 18 e 67 e com nível de escolaridade entre ensino fundamental incompleto e pós-graduação. A aplicação pode ser coletiva ou individual, com um tempo limite de 20 minutos. O teste é composto por 30 itens além de dois itens de exemplo. Os estudos de evidência de validade tiveram como variável de critério a idade e a escolaridade. Em relação à variável idade foi encontrada uma correlação negativa e estatisticamente significativa (r=0,43, p<0,001), indicando que quanto maior a idade, menor a pontuação no TI. Para a variável escolaridade, os resultados também apontaram uma correlação negativa e estatisticamente significativa (r=-0,35, p<0,001). Em relação à validade convergente, foi investigada pela comparação com o Teste R-1, e os coeficientes encontrados foram todos positivos e estatisticamente significativos (variando de 0,44 a 0,58). Os estudos de precisão foram realizados pelo alfa de Cronbach e pelo método das duas metades de Spearman-Brown e Guttman. Os coeficientes variaram de 0,87 a 0,94.
Procedimento
Após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética da Universidade São Francisco (CAAE: 09550212700005514), os dados foram coletados nas dependências de uma universidade particular na cidade de Belo Horizonte e também na clínica de Psicologia desta instituição. Todos os aplicadores, que eram psicólogos ou estudantes de Psicologia, foram treinados previamente na aplicação e correção do teste PMK e do Teste TI, sendo o primeiro de aplicação individual e o último de aplicação coletiva. O tempo de duração para a coleta de dados foi de aproximadamente duas horas. Foram aplicadas as seis folhas do PMK numa única sessão. Os sujeitos foram convidados a participarem da pesquisa por meio de cartazes afixados na Instituição de Ensino e também por convite verbal em sala de aula. Após serem informados sobre os objetivos da pesquisa e seus direitos como participantes, os mesmos assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Em seguida foram submetidos ao teste de inteligência (TI) coletivamente e, finalmente, foram submetidos ao PMK, individualmente. O PMK foi avaliado qualitativamente, considerando 15 itens como indicadores de inteligência e estes valores foram correlacionados ao total de pontos obtidos no TI.
Análise dos dados
Os protocolos do PMK foram avaliados qualitativamente e os dados encontrados foram transpostos para uma planilha do SPSS, assim como os resultados brutos do teste TI. Os dados de ambos os instrumentos foram submetidos à correlação de Pearson, para verificar a associação dos resultados em ambos os testes. Realizou-se também uma análise de referência cruzada por meio do teste qui-quadrado, com a finalidade de comparar o desempenho no TI com o desempenho no PMK.
RESULTADOS
Para alcançar os objetivos propostos, primeiramente os protocolos do PMK foram avaliados qualitativamente, considerando-se a presença ou ausência dos critérios elencados por Esteves (2007) e Grampone (1949), referentes aos traçados das Escadas, Zigue-zagues e Us, como relevantes na avaliação da inteligência. Foram avaliados 15 itens, sendo sete referentes aos traçados dos Zigues-zagues, sete referentes às Escadas de ambas as mãos e um referente ao U sagital da mão dominada. Estes indicadores foram selecionados por se tratarem de alterações de configuração na realização dos traçados mais complexos do teste. Os indicadores avaliados nos zigues-zagues foram: 1. Ângulos irregulares, 2. Desvio lateral irregular, 3. Deslocamento serpenteante, 4. Ângulos arredondados, 5. Ângulos em guirlanda, 6. Avanço irregular geral, 7. Volta irregular. Nas Escadas: 1. Irregularidades nas formas: retos, agudos e obtusos, 2. Ângulos retos colocados em forma de zigue-zague, 3. Substituição dos ângulos retos por agudos, 4. Perda da forma, 5. Escada irregular (lados ora curtos, ora compridos), 6. Anulação dos ângulos nos movimentos descendentes, 7. Desorientação geral (franja de castelo). Por fim, nos Us sagitais foi avaliado o Desvio axial (torção axial) da mão dominada, incluído como sinal de déficit ideomotor por Grampone (1949).
A análise dos indicadores de inteligência no PMK foi realizada por três juízes com ampla experiência na aplicação e correção do teste. Os resultados foram submetidos à análise de concordância por meio das correlações entre os totais de pontos de cada juíz, verificando coeficientes de correlação superiores a 0,80. A análise da distribuição dos itens de avaliação da inteligência no PMK revelou a presença de alguns indicadores e ausência de outros, conforme Tabela 1.
A Tabela 1 mostra que a análise pormenorizada dos indicadores revelou que os itens mais pontuados foram os ângulos irregulares nos Zigues-Zagues (62%) e irregularidades nas formas, com presença de ângulos retos, agudos e obtusos nas Escadas (69%). Vale ressaltar que itens como Deslocamento serpenteante e Ângulos em guirlanda não foram pontuados.
A partir desses resultados, os valores brutos do TI foram correlacionados ao total de indicadores de inteligência no PMK, por meio da correlação de Pearson. A correlação entre o total de pontos no TI e o total de indicadores de inteligência no PMK foi de -0,462, estatisticamente significativa (p<0,01), revelando magnitude moderada (Dancey & Reidy, 2006). A correlação foi negativa, o que era esperado, visto que a análise do PMK obedece a um critério que aponta os indicadores de baixo nível ideomotor. Sendo assim, quanto maior o número de indicadores no PMK, menor a pontuação no teste de inteligência, e quanto menor o número de indicadores no PMK, maior a pontuação no Teste de inteligência. Pessoas com um melhor desempenho cognitivo tendem a não apresentar os indicadores classificados por Grampone (1949), considerados indicadores de baixo nível ideomotor. A partir dos resultados da presente pesquisa pode-se pensar na possibilidade dos traçados das Escadas e Zigues-Zagues serem indicadores adequados para avaliação da inteligência por meio do PMK, corroborando dessa forma os achados de Esteves (2007), em relação aos indicadores de nível ideomotor por ele verificados.
Num segundo momento, realizou-se um agrupamento das pontuações obtidas no TI considerando as normas de interpretação descritas no manual. Assim, foram formados cinco grupos (1=inferior, 2=média inferior, 3=média, 4=média superior e 5=superior). A Tabela 2 apresenta as freqüências absoluta e percentual das classificações obtidas no TI pela amostra.
Pela Tabela 2 pode-se notar que há uma maior concentração de participantes com desempenho no TI que se encontram nas classificações média superior e superior (69,6%). Este fato pode ser explicado pelo nível de escolaridade dos mesmos, que em sua maioria (72%), eram de nível superior incompleto. Apenas 8,6% da amostra ou 11 participantes apresentaram classificação inferior no TI.
Com a finalidade de se comparar o desempenho no TI com o desempenho no PMK, por meio do total de itens qualitativos, realizou-se uma análise de referência cruzada por meio do teste qui- -quadrado. Para isso, utilizou-se a classificação obtida no TI, enquanto que para o PMK os grupos foram separados conforme a distribuição dos indicadores de baixo nível ideomotor na amostra. Os resultados encontram-se na Tabela 3.
Pelo Teste de χ2; foi obtido um valor de 27,69, com 12 graus de liberdade (p = 0,006). A Tabela 3 mostra a classificação no TI, considerando o número de indicadores de baixo nível ideomotor. A distribuição da quantidade de indicadores no presente estudo teve como principal objetivo verificar, se o aumento dos indicadores no PMK se relacionava com o desempenho no teste de inteligência, e por isso, foi utilizada apenas uma distribuição lógica dos valores. Os dados revelam uma associação significativa entre o desempenho no TI e tais indicadores no PMK, com exceção apenas para sujeitos com classificação média superior, que apresentaram quatro a sete indicadores de baixo nível ideomotor. Nos demais itens houve uma associação coerente entre a pontuação no TI e a quantidade de indicadores de baixo nível ideomotor no PMK. Desse modo, os resultados da análise revelam que há uma relação estatística entre essa variável do PMK e a classificação da inteligência no teste TI.
DISCUSSÃO
A avaliação da inteligência tem sido muito discutida na atualidade e vários são os instrumentos que a avaliam. Porém, com raras exceções, tais instrumentos são testes objetivos, que apresentam respostas certas ou erradas e, portanto, podem ser aprendidos/ensinados. O advento da internet e a falta de compromisso de alguns profissionais psicólogos com a ética e com a responsabilidade social colocam em risco o uso destes instrumentos, uma vez que podem ser divulgados facilmente na mídia, podendo ser, inclusive, obtidos em sites que disponibilizam os testes para qualquer pessoa, independente de serem psicólogos.
Diante desta questão, a possibilidade de se avaliar a inteligência por meio de um instrumento que não pode ser treinado ou aprendido torna-se algo de imenso valor para a Psicologia. Por ser um teste expressivo no qual o candidato não tem controle na sua realização, o PMK se revela como uma técnica que pode auxiliar no diagnóstico da inteligência. Os resultados encontrados nesta pesquisa corroboram os achados de pesquisas anteriores (Esteves, 2007; Grampone, 1949), que consideram o PMK como um teste capaz de avaliar a inteligência por meio de dados qualitativos, especialmente referentes aos traçados das Escadas e Zigue-Zagues.
Assim, pode-se investigar a inteligência no PMK, não em todos os traçados do teste, mas naqueles mais complexos como Zigues-Zagues e Escadas. Nesta pesquisa especificamente, encontrou-se de forma mais sistematizada a presença de Irregularidades nos ângulos dos Zigues-Zagues e Irregularidades nos ângulos das Escadas como indicadores mais precisos e frequentes de baixo nível ideomotor. Os dados do estudo de Esteves (2007) apontaram associação expressiva dos ângulos irregulares das Escadas com os resultados do Teste R-1, na direção esperada, ou seja, correlação negativa, para a mão direita (-0,342, p<0,01) e associações negativas entre os ângulos irregulares dos Zigue-Zagues (entre -0,184 e -0,276, p<0,01) e os resultados do R-1. Deste modo, as irregularidades dos traçados mencionados parecem estar associadas à inteligência na perspectiva "psicométrica", ou seja, aquela mensurada por testes objetivos de raciocínio, especificamente, de edução de relações e correlatos, tais como o TI e o R-1.
Contudo, tais constatações sugerem cautela ao se referir apenas a estes itens como indicadores de baixo nível ideomotor, uma vez que foram elencados 15 itens e apenas dois foram mais frequentes. Deve-se ressaltar que segundo Galland de Mira (1987), quanto pior a configuração de um traçado do teste, mais baixo o nível intelectual (ou ideomotor) do sujeito. Ressalta-se que a quantidade de indicadores relacionados às alterações de configuração no teste PMK, especialmente nos traçados complexos, permite compreender com maior propriedade o baixo nível intelectual, de acordo com os estudos presentes na literatura (Esteves, 2007; Grampone, 1949).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Alguns comentários podem ser tecidos em relação à pesquisa apresentada e que poderão ser considerados em futuros estudos. Inicialmente, destaca-se que a amostra utilizada nesta pesquisa pode ter contribuído para o aparecimento de poucos indicadores de baixo nível ideomotor (inteligência), uma vez que a maioria dos participantes possuía nível superior incompleto (72%) e, possivelmente, apresentaram os indicadores mais comuns. Talvez uma amostra mais heterogênea, proporcional em relação à distribuição do nível intelectual, especialmente, contemplando um maior número de sujeitos com desempenho inferior ou médio inferior nos testes objetivos de inteligência, possa revelar a presença e frequência de outros indicadores além dos evidenciados neste trabalho. Como exemplo, pode-se citar os indicadores referentes ao deslocamento serpenteante nos Zigues-Zagues, ângulos em guirlanda nas Escadas, desorientação total ou até mesmo o desvio axial do U sagital, que foi um indicador pouco frequente neste trabalho.
Ainda, sugerem-se novas pesquisas com amostras maiores e com grupos distintos, inclusive clínicos, que possam trazer dados limítrofes acerca do nível intelectual, permitindo explorar as demais características indicadoras de baixo nível ideomotor no PMK. Propõe-se para futuras pesquisas, explorar habilidades específicas que poderiam estar associadas ao nível ideomotor, tal como inteligência espacial e abstrata.
REFERÊNCIAS
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Recebido em 19/07/16
Revisto em 6/01/17
Aceito em 08/01/17
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