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versão impressa ISSN 0101-3106
Ide (São Paulo) vol.37 no.58 São Paulo jul. 2014
EM PAUTA - O DINHEIRO
Considerações sobre o dinheiro na psicanálise1
About money in psichoanalysis
Alejandro L. Viviani*
Editor da revista Textura
RESUMO
Neste texto o autor considera diferentes perspectivas de abordagem do dinheiro como pagamento da sessão de Psicanálise. Começa definindo o dinheiro dentro dos três registros: Real, Simbólico e Imaginário; aborda a seguir sua relação com as pulsões e as equivalências simbólicas; com o Outro e a constituição subjetiva, para terminar elaborando considerações sobre os aspectos aparentemente formais do pagamento na prática clínica.
Palavras-chave: Dinheiro, Pulsões, Equivalências simbólicas, Sujeito, Objeto, Fantasia, Pagamento.
ABSTRACT
The author discusses varied approaches regarding the use of money for the payment of psycoanalysis sessions. The article initially defines money according to three different perspectives: Real, Symbolic and Imaginary; it then addresses the relation between money and personal pulsions, along with its symbolic representations; with the Other and the subjective constitution; finally, it elaborates considerations about the apparently formal aspects of the act of payment for the clinical practice.
Keywords: Money, Pulsions, Symbolic equivalencies, Subject, Object, Fantasy, Payment.
Ao tratar o dinheiro como pagamento da sessão podemos considerá-lo segundo várias perspectivas.
Podemos começar tentando defini-lo dentro dos três registros:
1. O Real: esse papel ou moeda que é presença em si;
2. O Simbólico: presença que representa o Real que o sustenta, o Tesouro Nacional;
3. O Imaginário: a presença do papel ou moeda que diz que essa nota ou moeda vale isso, nem mais nem menos.
Real, Simbólico e Imaginário
Mantendo a metapsicologia freudiana, Lacan propõe ler a realidade psíquica com três registros: Real, Simbólico e Imaginário.
Os três têm a mesma consistência e têm seu limite. São categorias equivalentes e diferentes (Lacan, 1974)2.
Se situarmos uma criança com idade entre seis e 18 meses em frente a um espelho plano, ela verá uma imagem completa, embora sua experiência nesse período seja de fragmentação corporal. A criança não tem a ideia de totalidade. Há, nessa experiência de fragmentação corporal, o autoerotismo, um campo de parcialidades. Encontramos as pulsões, sempre parciais, que se satisfazem no mesmo lugar em que se originam. Do "outro lado" do espelho, temos a imagem completa. A ideia de tudo, de unificação, de Uno, é uma falsa unidade. A criança antecipa, frente ao espelho, uma completude que ela não tem. A partir dessa imagem no espelho, da identificação com essa imagem, dessa gestalt, a criança pode ter uma ideia de si mesma como completa, ponto de partida da constituição do Eu. Se o Eu se constitui a partir da imagem, o Eu será uma formação basicamente imaginária. E a completude é uma ilusão, uma miragem, um engodo. É uma experiência de unificação antecipada na qual se passa da fragmentação à unificação do corpo na imagem. Esse movimento é marcado por uma tensão libidinal e agressiva. Passagem do autoerotismo ao narcisismo.
Essa relação do Eu com o outro vai dar origem à disputa: ou "ele" ou Eu.
Situada essa criança frente ao espelho, ela está com seu corpo fragmentado. Isso é o Real. Nesse lugar temos um ser que existe, uma existência, algo que está aí, uma vida, isso é Real.
Do "outro lado" do espelho, está o campo da imagem. Esse campo da imagem é o lugar chamado Imaginário.
O espelho, enquanto tal, é aquilo que estabelece a diferença entre o Real e o Imaginário. O espelho é o lugar do Simbólico.
O Simbólico é o lugar onde se estabelecem as diferenças. É a presença do espelho que diferencia os dois lugares, o Real e o Imaginário.
Nesse lugar do Simbólico, encontramos a linguagem, constituída por significantes. Lembremos que a rede dos significantes que governa o significado é a estrutura sincrônica da linguagem, e cada elemento está em uma posição diferencial respondendo à lei de ordem fechada. Um significante remete a outro significante. O significante é a presença de uma ausência; onde o significante está, o objeto falta. O significante mata a coisa. O significante existe porque remete a qualquer significação. No Real temos a vida, no Imaginário, o corpo, e no Simbólico, a morte.
Outra perspectiva seria o dinheiro dentro da teoria das pulsões.
Pulsão e significante fálico
Lembremos o que o próprio Freud diz sobre a problemática do ser e do ter na criança. Primeiro a criança é o objeto, não há diferença entre ela e o seio que chupa: ela é o seio que chupa. No Édipo a identificação primária é com o objeto. Para ela ter o objeto, precisa perdê-lo. O ter vai na contramão do ser. Se tenho o objeto, então não o sou.
Nessa linha, Freud elabora o conceito de pulsão que, à diferença do instinto, é um conceito limite entre o psíquico e o somático. A pulsão está constituída pela "fonte", lugar onde surge a excitação. As fontes são zonas erógenas, têm características de bordas; o "impulso" é a exigência de trabalho que se impõe ao psiquismo para procurar um "objeto" – que é contingente e, diferentemente do instinto, não é predeterminado, dependerá da constituição do sujeito – para a obtenção de uma "finalidade ou alvo" que sempre é a satisfação. A pulsão se inscreve no psiquismo por representação ou representantes (significantes) pulsionais e é qualificada pelo afeto. Dessa maneira, teremos a constituição de um corpo erógeno, corpo impresso no corpo biológico sem que um coincida totalmente com o outro. Temos aqui outro status do corpo.
Qualquer parte do corpo pode ser zona erógena, desde a pele até os órgãos internos (são bordas) e os objetos pulsionais são destacáveis do corpo.
Estabelecer-se-á um catálogo de objetos pulsionais: o seio, as fezes, o falo. Esse catálogo é ordenado pelo falo, símbolo, elemento simbólico significante que não se limita ao pênis, priapo, adorado na tradição greco-romana também por sua função apotropaica, fascinum. O falo, enquanto premissa universal, dará nome à fase fálica, na qual se instaurará junto com ele o complexo de castração. Nessa fase surgirá a oposição fálico / castrado. Ser masculino ou feminino será uma decisão edipiana. Lacan incluirá nesse catálogo o olhar e a voz. Cinco objetos pulsionais: seio, fezes, falo, olhar e voz. Na oralidade situa a demanda feita à mãe e na analidade há uma inversão e a demanda é da mãe. A mãe demanda da criança as fezes. As fezes é o presente que a criança dá à mãe, o dom como metáfora do amor. Mediado pelo dom a criança estabelece com o Outro um ato social. Neste intercâmbio, na defecação, como dizia Freud, a criança tem que decidir entre o narcisismo e o amor objetal, entre entregar as fezes, sacrificá- -las ao amor ou mantê-las para uma satisfação autoerótica como afirmação. Com esta decisão fica constituído o desafio a partir de uma tenacidade narcísica do erotismo anal. Lembremos que a questão com o objeto é também uma questão de identidade.
Equivalências simbólicas
Freud estabelece uma relação entre o caráter e as zonas erógenas quando investiga as fontes pulsionais de determinadas características subjetivas. Ordenado ([Ordentlich] também significa metódico, honrado, decente), poupador (o caso extremo a avareza) e pertinaz são qualidades que descobrirá ter relação com sujeitos nos quais na sua infância a região anal teve grande importância. Pessoas com dificuldades em dominar a incontinência fecal (incontinentia alvi) chegarão posteriormente à obtenção de um ganho de prazer com a recusa à defecação. Freud encontra uma conexão entre o caráter e o erotismo anal. Considerará que o desenvolvimento do sujeito e sua entrada na cultura incidirão para fazer deste prazer erótico formações reativas (formação substitutiva da mesma intensidade e sentido contrário ao desejo inconsciente) ou sublimações (pulsões inibidas na sua finalidade e orientadas a um fim socialmente aceito), como as qualidades já citadas. Nesta linha também entrará a limpeza como substituto da sujeira.
Portanto, o carácter é a expressão da fixação pulsional.
Interessante Freud afirmar que a psicanálise tem efeito nos problemas de constipação rebelde dos neuróticos quando é tocado o complexo relativo ao dinheiro. O interesse pela defecação cederá o lugar ao interesse pelo dinheiro.
Outro ponto interessante encontramos quando Freud diz que a neurose obedece ao uso linguístico e toma as palavras em sentido originário, ou uma expressão figural restabelece seu significado.
A relação entre fezes e dinheiro se estenderá à de presente, pelo fato da criança considerar as fezes como o presente que da à mãe e também o único dinheiro que conhece é aquele que recebe como presente. Este deslocamento de sentido também se estende ao desejo de ter filho: "ganhou neném", os filhos se ganham como os presentes, dar/receber um filho como prova de amor pode ser considerado um presente. Pelas teorias sexuais infantis (como negação da castração) as crianças nascem pelo ânus, isto é, são equiparadas às fezes, portanto os homens podem parir. Além disso, as crianças são o equivalente do falo faltante nas meninas quando no Édipo elas esperam a restituição fálica (falo não dado pela mãe) na forma de um filho do pai.
Temos o falo como ordenador das equivalências fezes=dinheiro=presente= criança, etc.
Freud diz que porque uma lei, a lei contra o incesto, está operando, um objeto se perde (objeto perdido, a coisa); no seu lugar se colocará uma série interminável de objetos substitutivos (objetos pulsionais), todos estes produzirão prazer, mas nenhum produzirá tanto quanto produziria aquele que está perdido.
Em termos lacanianos, o objeto perdido é chamado causa do desejo, objeto "a", real cuja forma imaginária encontramos na castração imaginária simbolizada como - φ (menos phi), e os objetos pulsionais também chamados "a", neste caso mais-de-gozar simbolizados como φ (phi).
O Outro e a constituição do sujeito
Do que se trata na chamada fase do espelho é da relação da criança com a mãe. Quem está no lugar do Simbólico, quem está no lugar do espelho é o chamado Outro primordial, a mãe. A criança, olhando para a mãe, vê uma imagem que retorna a ela como imagem completa. O olho, do Outro, é um espelho. Outro primordial, por quê? Porque o chamado Outro é um lugar. Lugar simbólico, da linguagem, dos significantes. É um lugar que, nesse momento de constituição da criança, está ocupado pela mãe. Um lugar a partir do qual surgirá, pelo olhar, pelo toque, pelos cuidados, diria Freud, a "erogeneização" do corpo, consequentemente, significantes que atingem o corpo da criança. A partir daí, surgirá o corpo erógeno e uma significação para a criança. A mãe fala algo para a criança, ela manda uma mensagem, na qual se inclui a seguinte ideia: "você é o objeto do meu desejo". Esse objeto de desejo que é inculcado simbolicamente é o que se chama significante falo, falo enquanto imaginário. A criança será tomada pelo significante falo e ocupará o lugar do objeto que falta ao desejo materno. Então, é a mãe que atribui a significação de falo à criança.
E será a Lei, o significante do Nome do pai, que tirará a criança dessa posição, consequentemente a fará perder essa definição do seu ser. Essa é a falta em ser. Fundando o desejo e o sujeito.
Neste momento, a criança enfrentada com a falta da definição de seu ser se pergunta e lhe pergunta ao Outro: que desejo?, quem sou?, que sou para o Outro? Outro que não responde, portanto o sujeito cria uma resposta que será seu fantasma ou fantasia inconsciente. Esta fantasia será uma tentativa de recuperação da posição perdida na busca de um gozo impossível. Interessante quando Lacan diz que se sabemos alguma coisa dos perversos é pela fantasia dos neuróticos, justamente por essa posição de objeto.
Fantasia inconsciente, cena, a ser construída na análise (diz Freud, uma fantasia não se interpreta, se constrói), na qual o sujeito, ocupando um lugar, define a organização libidinal que o caracteriza, cena onde o desejo se realiza e por este ser incestuoso, a forma de união com o Outro, invoca a defesa. Entre desejo e defesa há um conflito "solucionado" pelo sintoma. O sintoma é uma formação substitutiva que tem prazer e sofrimento.
Quando o sujeito não sabe que fazer com seu sofrimento pode ir para uma análise na procura desse saber.
Outra perspectiva pode ser a das aparentes formalidades.
Na situação analítica, o dinheiro, o que é que paga? Paga uma escuta sustentada a partir de uma posição, a posição de semblante de objeto a (aparência, simulacro do objeto causa do desejo). Posição incalculável sob o aspecto de quantia.
Há outro cálculo possível. Este cálculo é feito em função dos lugares e posições na cena analítica. O analisante, na situação analítica, tenta restabelecer uma totalidade imaginária onde espera reproduzir uma proposta de gozo (impossível). A proposta seria: que o Outro, lugar atribuído ao analista, goze ao ser completado pelo significante de objeto, falo, que o analisante tenta ser para esse lugar transferêncial. Agora, enquanto o analista sustenta a posição de semblante de objeto a, esta mesma posição concerne ao analisante dado que é a partir dali que se re-situa em relação à sua própria falta:
Poderia também formular-se assim: tomando a unidade entre o ser (S) e o Outro como Uno (I) da totalidade, a perda do ojeto a possibilita a emergência da singularidade (1) do sujeito desejante ($). I = 1+a.
Ao pagar por esta posição, o analisan deixa algo de si, algo da ordem do ter. Há uma perda que não é recompensada pela doação de uma significação: trata-se de uma troca de dinheiro por uma escuta a partir da posição de semblante. A sustentação desta situação possibilita a produção de um discurso cujo efeito é a significação. O cálculo a ser estabelecido é a proporção na qual a manutenção da falta por parte do analista permite que do lado do analisante a resposta não seja a partir do narcisismo, e sim a partir da sua própria cisão. Isto permite que se mantenha o discurso analítico.
Num primeiro momento, o analisante se oferece como objeto para ser amado, o analista precisa realizar uma manobra para ele se posicionar como aparência de objeto causa do desejo, assim ele será o amado e o analisante o amante na transferência onde o inconsciente se põe em ato.
Sabemos que o caminho mais simples seria estabelecer um preço por tempo de trabalho que valesse para todos os analisantes por igual, mas todos os analisantes são diferentes.
Outra forma tradicional de cobrar é por mês vencido. Esta é uma forma de gerar uma dívida que eventualmente pode levar a um calote. Cobrando no final da sessão não se geraria dívida e o analisante voltaria só porque deseja voltar.
Outra situação que provoca questionamentos é o fato de cobrar em dólares quando há uma crise econômica ou uma inflação galopante. Nesse caso, alguns analistas deixam de receber por mês para receber por quinzena ou sessão. Portanto, tomam uma decisão que não leva em consideração as determinantes que estamos assinalando, e esta decisão fica por conta do ministro de economia ou do plano econômico.
Acho que a maneira como tratamos a relação do analisante com o dinheiro nos permitirá fazer sobre ela uma intervenção analítica, a partir do cálculo proposto. Se podemos fazer deste cálculo uma intervenção, isto só pode operar na singularidade de cada discurso.
Podemos acrescentar, por outra parte, o que Lacan dizia: que o analista também paga, com sua pessoa sendo o suporte da transferência e com suas palavras quando se dimensionam em interpretação. Não é demais dizer que o silêncio do analista também conta, ou, melhor dizendo, entra na conta.
Uma pessoa, no primeiro encontro com o analista, diz que acha ridículo ter que pagar para ser escutada, pois ela acredita que sempre tinha que ser escutada por amor. Se ela quer ser escutada por amor, ela se coloca na posição de objeto desejado e aquele que a escuta fica na posição de desejante. Quando o analista diz os seus honorários, ela responde que vai ter que barganhar: "eu tenho que barganhar porque todos barganham comigo, eu contrato o serviço de alguém e sempre termino pagando o que o outro me pede". Com este argumento ela tenta negociar com o analista porque os outros, que ela contrata, negociam com ela e ela lhes paga. Algo é tirado dela e o fato de ela pagar deixa-a numa posição de falta. Na ideia de barganhar, ela se identifica com a posição dos outros na tentativa de recuperar o que lhe foi tirado. Neste sentido, aceitar a barganha seria pagar para seu narcisismo, escutando-a por amor, reafirmando, assim, sua posição de objeto de desejo. Considero que essa diferença entre o que ela queria pagar e o que o analista determina gera um excedente, um plus (a -mais) que tem que ficar do lado do analista. Entendo este cálculo como o que permite decidir uma resposta em função de manter a cena analítica. Neste sentido, fixar o valor da sessão é uma decisão como o é qualquer intervenção do analista.
De fato, quando o analisante não paga ou obtém um desconto, quem paga é o analista. Paga com o que faz diferença. Com certa frequência, esta situação faz com que o analista pague com o saber para o haver do narcisismo do analisante. O saber que é suposto do analista, mas a ser produzido pelo analisante, acaba sendo doado pelo analista. O analista doa significações para que o analisante goze. A bondade pode tomar o caminho da perversão, obviamente como situação, não como estrutura. O analista fica como instrumento do gozo do analisante. Isto no limite pode lhe provocar angústia. Vemos que neste ponto é fundamental a análise do analista, tanto quanto o é para a relação que ele estabeleça com o dinheiro e a dívida. O fato disto ter sido parte da experiência em análise será mais uma situação onde o analista expressará a singularidade do seu estilo.
Por que gerar uma dívida quando já há uma dívida simbólica? A dívida não é posta em jogo a partir do momento em que o analista aceita que lhe devam. Em geral, o analisante põe em jogo esta dívida sozinho, de uma maneira singular, dependendo de cada estrutura. O analisante pode criar dívidas em diferentes circunstâncias da vida, incluindo a análise. Pode pagar todos os seus compromissos no prazo, e às vezes pagando demais; pode esperar que sempre apareça alguém que pague suas dívidas; ou pode ainda pensar que não tem dívida alguma.
Visto que há uma dívida simbólica pela "sexuação", o sujeito, com o que perdeu, pagou pela operação de proibição do incesto, operação da função paterna. As formas antes mencionadas são expressões de não querer saber nada sobre isto, ou seja, sobre a dívida pela sexuação e filiação. O sujeito tem uma dívida simbólica e não sabe o que fazer com ela.
O dinheiro entra nas equivalências fálicas freudianas, apontadas anteriormente, como aquilo que a criança recebe que lhe é dado, como os presentes, ou como o filho; ao ser dado, restitui imaginariamente o narcisismo a partir da falta. Pagar é manter o sistema de intercâmbio fundado na analidade.
Lembremos que as equivalências simbólicas se estabelecem nas diferentes estruturas existenciais, logo, o dinheiro fará parte da composição erótica de todo sujeito, quer dizer que não é prerrogativa dos neuróticos obsessivos.
O pagamento é essa forma de perda do narcisismo onde o sujeito paga com o que tem para dar lugar à falta em ser. O muito pouco que cobremos pode ser o muito caro que o analisante pague.
Considerando o dinheiro dentro deste circuito simbólico, parece-me que o escambo (troca direta de mercadorias sem intervenção do dinheiro) seria uma maneira falha de instituir uma metalinguagem, tentativa de estabelecer o Simbólico do Simbólico. Outra situação similar é quando o analista diz que vai cobrar um valor simbólico, mas qualquer valor é simbólico.
Não é estranho ouvir relatos de situações onde o analista diz que ele cobra x, dez reais, por exemplo, "mas vou te cobrar oito reais"; como dizíamos antes, a diferença de dois reais é paga pelo analista, ou podemos acrescentar que é um presente que o analista dá ao analisante. Por que daria esse presente a ele? Lembremos quando Freud diz que quem duvide dessas equivalências recorra a sua experiência clínica e investigue, estude os presentes que recebe e considere "as tormentas de transferência que pode provocar no paciente mediante um presente" (Freud, 1917/197bi, p. 121). É importante ter alguma clareza sobre as consequências clínicas quando se aceita um presente como quando se dá, caso alguém, eventualmente, pense que tem que dar.
Se alguém quer pagar com um quadro ou um bolo, seria melhor que trate de vendê-lo e pague em dinheiro.
Se não ter dinheiro apresenta uma falta na ordem do ter, é necessário perguntar-nos de que forma, ou através de que manobra, seria possível operar sobre essa falta para ordenar o dispositivo analítico e poder re-situar a falta em ser. Dito de outra forma, dar lugar ao sujeto desejante como produtor de significantes que articulam o saber inconsciente como verdade, possibilidade de fazer outra coisa com a fixação pulsional que dá gozo ao sintoma.
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Endereço para correspondência
ALEJANDRO L. VIVIANI
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E-mail: alviviani@uol.com.br
Recebido: 05/05/2014
Aceito: 16/05/2014
* Psicanalista. Editor da revista Textura. Coordena grupos de estudo de teoria freudiana e lacaniana e seminários clínicos.
1 Texto baseado em "Sobre o dinheiro" publicado em "Sobre o dinheiro na clínica psicanalítica". Scalise de Viviani, María Luisa e Pennacchi, Rosely F. S. 1994. São Paulo.