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Junguiana

versão On-line ISSN 2595-1297

Junguiana vol.40 no.3 São Paulo  2022

 

Os complexos culturais e os artivismos

 

Los complejos culturales y los artivismos

 

 

Julia Péret

Psicóloga, arteterapeuta junguiana. Pesquisadora do Núcleo de Pesquisa e Extensão em Culturas, Gêneros e Sexualidades (NuCuS) vinculado ao HIAC da UFBA. Mestranda no Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade (IHAC - UFBA), sob a orientação do Prof. Dr. Leandro Colling. e-mail: juliaperet@hotmail.com

 

 


RESUMO

A partir da teoria dos complexos formulada por Jung este trabalho se propõe a fazer uma interlocução entre os estudos pós-junguianos sobre Complexos Culturais e as teorias decoloniais, utilizando como ponto de intersecção para esse diálogo os artivismos. Entende-se por artivismos toda produção artística que carrega em seu âmago a resistência e a subversão de quaisquer narrativas ou normas que colaborem ou promovam a opressão de um indivíduo e/ou grupo. Esse artigo tem o intuito de trazer a psicologia analítica para a arena dos debates contemporâneos na tentativa de ampliar a discussão entre indivíduo-grupo-sociedade, que podem contribuir para o desenvolvimento da psicologia analítica brasileira.

Palavras-chave: psicologia analítica, complexo cultural, complexo colonial, artivismo.


RESUMEN

A partir de la teoría de los complejos formulada por Jung, este trabajo propone establecer un diálogo entre los estudios pos-junguianos sobre los Complejos Culturales y las teorías decoloniales, utilizando el artivismo como punto de intersección de dicho diálogo. Se entiende por artivismo toda producción artística que lleve en su núcleo la resistencia y subversión de cualesquiera narrativas o normas que coadyuven o promuevan la opresión de un individuo y/o grupo. Este artículo tiene como objetivo traer la psicología analítica a la arena de los debates contemporáneos en un intento de ampliar la discusión entre individuo-grupo-sociedad, que puede contribuir en gran medida al desarrollo de la psicología analítica brasileña.

Palabras clave: psicología analítica, complejo cultural, complejo colonial, artivismo


 

 

Introdução

A teoria dos Complexos Culturais, ao mesmo tempo em que se baseia na teoria dos complexos formulada por Jung, também contribui para a sua própria ampliação. A seguir trago alguns conceitos-chaves importantes para o entendimento de ambas. Jung têm como uma das bases do seu pensamento o entendimento de que o inconsciente possui diferentes níveis ou camadas. Optou-se por chamar essas camadas de inconsciente pessoal e inconsciente coletivo. A respeito das suas características, Jung escreveu que:

Uma camada mais ou menos superficial do inconsciente é indubitavelmente pessoal. Nós a denominamos inconsciente pessoal. Este, porém, repousa sobre uma camada mais profunda, que já não tem sua origem em experiências ou aquisições pessoais, sendo inata. Esta camada mais profunda é o que chamamos inconsciente coletivo. Eu optei pelo termo "coletivo" pelo fato de o inconsciente não ser de natureza individual, mas universal; isto é, contrariamente à psique pessoal ele possui conteúdos e modos de comportamento, os quais são cum grano salis os mesmos em toda parte e em todos os indivíduos. Em outras palavras, são idênticos em todos os seres humanos, constituindo, portanto, um substrato psíquico comum de natureza psíquica suprapessoal que existe em cada indivíduo (2016, p. 19, par. 3).

Segundo Jung, o que "entendemos por 'arquétipos' é, em si, irrepresentável, mas produz efeitos que tornam possíveis certas visualizações, chamadas por ele de representações arquetípicas" (2014, p. 172, par. 417).

Embora os arquétipos em si sejam irrepresentáveis, conteúdos do inconsciente pessoal e coletivo podem ser acessados pela consciência por meio dos complexos.

Os complexos podem agir na consciência como "lentes" pelas quais o indivíduo tem a sua percepção distorcida pelo teor do complexo, podendo este ser positivo ou negativo para o indivíduo. Esta distorção "embaça" a consciência podendo provocar dificuldades (ou facilidades) no processo de adaptação do indivíduo. Os complexos agem quase como outras personalidades e interferem nas tomadas de decisões e nas relações interpessoais, por isso, diz-se que uma pessoa é tomada pelo complexo e não o contrário (JACOBI, 2016).

Jung comenta que, quando os complexos não são trabalhados na consciência pelo indivíduo, portanto permanecendo inconscientes, eles "nada perdem de sua carga afetiva original, embora suas manifestações externas possam modificar-se de forma quase ilimitada" (2020, p.106 par. 122). Isso significa que eles devem ser trazidos à luz da consciência para que assim o indivíduo se dê conta de como ocorre a atuação deles em sua vida, e a partir daí, confrontá-lo com o propósito de elaboração e integração.

 

Os complexos culturais

Ao longo dos seus escritos, principalmente nos volumes 10/2 e 10/3 das Obras Completas1, Jung vai dando pistas sobre a relação do inconsciente com a cultura sem nunca ter formulado um conceito que se dirija diretamente a ela. A ideia de Inconsciente Cultural foi formulada pela primeira vez, após a morte de Jung, pelo analista junguiano Joseph Henderson. Ao longo da sua trajetória Henderson produziu escritos que relacionavam o indivíduo, a psique e a cultura, passando pelas ideias de inconsciente cultural, arquétipos culturais e atitudes culturais (SILVA; SERBENA, 2021). Henderson (1990, p. 103, tradução livre) o descreve da seguinte forma:

O Inconsciente Cultural, no sentido que eu emprego, é uma área da memória histórica entre o Inconsciente Coletivo e o padrão manifesto da cultura. Pode ser incluso ambas as modalidades, consciente e inconsciente, além disso, tem algum tipo de identidade decorrentes dos arquétipos do Inconsciente Coletivo, que auxilia à formação de mitos e rituais, promovendo o desenvolvimento individual.

Sua maior contribuição foi localizar o inconsciente cultural entre o inconsciente coletivo e o pessoal. Sendo assim, os conteúdos coletivos necessariamente atravessam uma malha cultural antes de habitar o inconsciente pessoal. Thomas Singer e Samuel Kimbles (2004) desenvolveram melhor a ideia de Inconsciente Cultural, a partir da teoria dos complexos de Jung. Segundo os autores, o intento não era de descobrir a causa dos conflitos entre grupos, mas sim de ampliar a própria teoria analítica que permanece com lacunas. Baseado no princípio de seus antecessores, Thomas Singer (2021, p. 115) argumenta:

[...] um complexo cultural é definido como um agregado autônomo, em grande parte inconsciente e emocionalmente carregado de memórias, afetos, ideias, imagens e comportamentos que tendem a se agrupar em torno de um núcleo arquetípico e que são compartilhados por indivíduos dentro de um grupo. Os complexos culturais são ativos tanto na psique do grupo como um todo quanto no indivíduo, no que podemos pensar como sendo o nível grupal da psique do indivíduo.

Singer (2021, p. 116) continua sua definição elencando algumas características típicas dos complexos culturais: são autônomos e repetitivos; reúnem experiências e memórias que validam seu próprio ponto de vista; os pensamentos dos complexos culturais tendem a ser simplistas, têm fortes afetos ou emoções pelas quais se reconhece sua presença e, por fim, "nem todos os complexos culturais são destrutivos; nem todos os complexos culturais são egodistônicos para com a identidade cultural de um grupo ou indivíduo. De fato, alguns complexos culturais podem formar o âmago de uma identidade cultural saudável". Singer e Kimbles (2004) consideram que os complexos culturais começam a integrar a nossa psique quando entramos em contato com a vida coletiva e as estruturas públicas que nos cercam, como por exemplo, a comunidade em que estamos inseridos, as escolas, as mídias que nos envolvem etc.

Os autores destacam que os complexos culturais não se configuram em identidades coletivas nem nacionais. Apesar de essas ideias estarem entrelaçadas, analisar a identidade de grupos ou indivíduos apenas pelas lentes do complexo cultural seria perigoso, pois assim tenderíamos a uma universalização malfeita dos sujeitos - o que na prática não acontece. O que se pode argumentar é que os complexos culturais "podem servir para fornecer um forte senso de identidade cultural e pertença a um grupo que é essencial para uma sensação de bem-estar" (SINGER, 2022, p. 114).

Alguns pensadores junguianos estão explorando o campo da teoria dos complexos culturais e dedicaram-se a escrever sobre alguns dos complexos culturais que assolam não apenas uma cultura, mas o globo como um todo. Alguns desses complexos foram nomeados como: complexo racial (racial complex) (BREWSTER, 2020), complexo cultural do racismo (CARIBÉ, 2018), complexo heteropatriarcal (PESSOA, 2021).

O analista junguiano brasileiro Walter Boechat (2018), a partir das ideias de Leonardo Boff (2016), nomeou quatro grandes complexos culturais da nação brasileira, sendo eles: colonialismo, escravidão, extermínio indígena e corrupção. Adiante me aprofundarei no complexo colonial para posteriormente escrever sobre a sua relação com os artivismos.

 

Complexo cultural do colonialismo

O sociólogo Aníbal Quijano (2005), ao analisar o processo de colonização da América Latina, identifica três pontos básicos para a consolidação das estruturas coloniais de poder nas Américas: (1) o processo de classificação racial e universal em nome do capital; (2) o etnocentrismo colonial, assim como a invenção dos conceitos de modernidade e racionalidade como experiências e produções exclusivamente europeias e (3) o eurocentrismo - a Europa como centro da subjetividade, da cultura, do conhecimento e da produção do conhecimento - produzindo a narrativa de que os outros povos não possuem a capacidade intelectual de desenvolver-se como civilização.

Nelson Maldonado-Torres (2020) argumenta que para a colonialidade do poder se sustentar, é necessário também aniquilar a subjetividade (o ser) e o saber dos colonizados. Ou seja, é necessário tornar sua religião, cosmogonia, cultura, linguagem, símbolos, em suma, toda a sua humanidade em algo primitivo, inferior, não humano. Desta maneira é possível substituir a cultura dos colonizados pela cultura, linguagem, ciência e "modernidade" dos colonizadores. Sendo assim, o autor completa: "Não somente terras e recursos são tomados, mas as mentes também são dominadas por formas de pensamentos que promovem a colonização e a autocolonização" (MALDONADO-TORRES, 2020, p. 41).

Posteriormente outros autores desenvolveram a teoria decolonial e começaram a produzir conceitos como a colonialidade do gênero, formulado por María Lugones (2014; 2020). A autora argumenta que o sistema de gênero moderno/colonial não existe sem a colonialidade do poder, ou seja, o processo de colonização também importou uma série de normas e valores "formais-ideais". Algumas delas são: a ideia de biologia anatomicamente correta (homem/pênis e mulher/vagina), a hierarquização e o comportamento sexual adequado entre os gêneros - sendo a mulher inferior ao homem. E o modelo de família nuclear burguesa (pai, mãe, filhos) como a única configuração familiar aceitável. Viviane Vergueiro (2015) ainda complementa esse pensamento se referindo a uma ciscolonialidade que inventa a cisgeneridade2, a cisnormatividade3 e o cissexismo4, hierarquizando ainda mais os seres humanos como aceitáveis, inaceitáveis e não humanos.

A partir da leitura dessas autoras fica evidente que aqueles que ocupam o lugar de sujeitos-humanos são os europeus-homens/cis-brancos-heterossexuais e aquelus colocades5 no lugar de objetos-não-humanos foram os povos racializados como não brancos, sobretudo as mulheres. Krenak (2019, p. 70) chama esse processo de invenção da humanidade de criação do "clube seleto da humanidade", em que aqueles que não se encaixam no padrão imposto por esse clube são os "que insistem em ficar fora dessa dança civilizada, da técnica, do controle do planeta. E por dançar uma coreografia estranha são tirados de cena, por epidemias, pobrezas, fome, violência dirigida".

A ideia do complexo cultural do colonialismo é semelhante à ideia que Grada Kilomba (2019) desenvolve em seu livro Memórias da Plantação. No livro a autora discorre sobre o racismo se configurar como um trauma psíquico, a partir do conceito formulado por Freud, que gera uma série de sofrimentos para a população negra impactando diretamente na sua qualidade de vida. Apesar de possuir formação psicanalítica, Kilomba chega a citar o inconsciente coletivo quando diz:

Poderíamos dizer que no mundo conceitual branco é como se o inconsciente coletivo das pessoas negras fosse pré-programado para a alienação, decepção e trauma psíquico, uma vez que as imagens da negritude as quais somos confrontadas/os não são nada realistas, tampouco gratificantes (KILOMBA, 2019, p. 39, grifo da autora).

Apesar de se tratar de teorias psicológicas distintas, Jung teve um profundo vínculo com a psicanálise, que o enriqueceu para o desenvolvimento da sua própria teoria. Nesse exemplo que Kilomba traz seria equivalente a ação de um complexo cultural na psique individual que altera a percepção do sujeito enquadrando-a na sua narrativa inconsciente. Por conseguinte, o complexo cultural do colonialismo seria como um trauma implantado na alma do colonizado, uma vivência coletiva de exploração, dominação, expropriação, extermínio, naturalização da morte, tortura e estrupo (MALDONADO-TORRES, 2020).

A noção de trauma pensada através de uma perspectiva junguiana seria, de acordo com Kalsched (2013), qualquer experiência que cause uma dor ou ansiedade insuportáveis ou intoleráveis, que ameacem a personalidade humana ou o espírito pessoal. Esse trauma impede o sujeito de ter um desenvolvimento psíquico satisfatório e criativo, ativando o que ele chamou de "sistema de autocuidado arquetípico da psique". A psique está disposta a fazer qualquer coisa para proteger o espírito pessoal (sic) desse indivíduo fragilizado que não consegue se realizar socialmente, inclusive matá-lo (suicídio).

Os mecanismos que a psique individual produz para lidar com esse trauma podem ser negativos/autodestrutivos ou positivos/transformadores. Experiências como o racismo e LGBTQIAP+ fobia, por exemplo, encaixam-se perfeitamente nessa descrição de trauma.

A forma que esses complexos agem na psique individual dos descendentes dos povos não brancos fica bastante evidente quando se analisa o panorama da saúde mental no Brasil. As populações não brancas e LGBTQIAP+, devido ao racismo e à cisheteronormatividade estruturais, aparecem como as mais propensas a desenvolver transtornos psíquicos, como mostram as pesquisas de Ghorayeb (2007); Cardoso e Ferro (2012); Smolen e Araújo (2017) e Oliveira e Vedana (2020). Não é de se surpreender, inclusive, que essas mesmas populações são aquelas que possuem o maior risco de cometer suicídio, como mostram as pesquisas feitas pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2018) e pelo Observatório de mortes e violências LGBTI+ no Brasil (ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE TRAVESTIS E TRANSEXUAIS et al., 2021).

O livro Enfrentamento dos Efeitos do Racismo, Cissexismo e Transfobia na Saúde Mental, organizado por Neon Cunha (2021) e colaboradores, explora muito bem essas consequências. Por isso os psicoterapeutas Parise e Scandiucci (2021, p. 144) reiteram que "urge descolonizarmos a psique brasileira. Só assim elaboraremos nosso trauma fundante".

Diante do exposto fica um questionamento no ar. Antes da invasão europeia, Abya Yala6 já possuía na sua diversidade de povos sua própria diversidade de complexos culturais que organizavam a vida grupal das populações que aqui habitavam. Então questiono: o que aconteceu com os conteúdos desses complexos culturais que compunham a psique dos povos originários? E os complexos culturais trazidos pelos povos escravizados? Do ponto de vista junguiano, supõe-se que esses conteúdos foram relegados à sombra.

Quando se estuda o comportamento de um complexo e discute-se a sua autonomia, diz-se que um complexo não deixa de existir, ele apenas é "descarregado". Deste modo, a energia psíquica que estava disponível para um complexo pode ser redistribuída para outro. E quanto mais energia psíquica um complexo dispõe mais próximo do limiar da consciência ele fica (JUNG, 2014).

Em resumo, os complexos podem apresentar quatro comportamentos na psique individual: "completa inconsciência da sua existência, identificação, projeção e confrontação. No entanto, apenas essa última pode ajudar a lidar com o complexo e levar à sua resolução" (JACOBI, 2016, p. 28); e, segundo Boechat (2018, p. 82), "O primeiro passo para confrontar um complexo, tanto no indivíduo quanto na cultura, é reconhecer sua existência".

Ao se referirem as patologias geradas pelo complexo colonial, Parise e Scandiucci (2021, p. 145) sugerem que a alma brasileira precisa ser urgentemente "re-imaginada" e que para isso "precisamos recuperar e atualizar uma pluralidade que já existia antes mesmo da chegada dos invasores portugueses". Boechat (2018), ao formular uma resposta para a cura dessas patologias, nos dá algumas pistas de como isso pode ser feito:

O que fazer para tentar transformar esses graves complexos culturais enraizados em nossa própria origem como nação? A grande resposta para esse processo é a mesma que numa psicoterapia individual: a memória. [...] no confronto com os graves problemas culturais, faz-se necessário lembrar e não recalcar, esquecer, jogar para o fosso do passado (BOECHAT, 2018, p. 83-84, grifo do autor).

O movimento intelectual, social e artístico da descolonização7 seria como um processo de tomada de consciência e confrontação desse complexo colonial. Confrontação essa que esbarra em todas as estruturas de poder/saber/ser e nos indivíduos que as encarnam. Ao mesmo tempo, esse movimento faz um trabalho de resgate dos símbolos, linguagens e histórias que os colonizadores tentaram apagar. Sobre esse processo não se pode deixar de invocar Conceição Evaristo quando ela diz que "eles combinaram de nos matar, mas nós combinamos de não morrer" (informação oral)8. Não foram apenas almas que sobreviveram, mas toda uma cultura e sabedoria que a duras penas conseguiu se manter viva. Sem deixar, é claro, de sofrer severas mutilações.

Destaca-se, a partir da sessão seguinte, o papel importante que os artivismos desempenham nesse processo de confrontação (ou seria resistência?) do complexo colonial ou, como Singer (2022) chamou, das "defesas arquetípicas do espírito de grupo":

Quando um grupo é atacado no seu núcleo e nos seus valores [...] ou quando um grupo é corroído no seu núcleo e nos seus valores [...] acredito que as defesas arquetípicas do espírito de grupo são mobilizadas para proteger o espírito de grupo (que se encontra vulnerável e ferido) [...] Encaro essa resposta como uma reação automática, reflexa e, de certa forma, a maneira mais natural da psique do grupo reagir quando se encontra nas garras de um complexo cultural (p. 124-5)

 

Os complexos culturais encontram os artivismos

Como dito anteriormente, os complexos se expressam por meio de símbolos. E esses símbolos não estão imunes aos complexos culturais e pessoais que carregamos, eles falam através deles, contam histórias e carregam um pouco da nossa psique. Jung (2020, p. 152 par. 180) refere-se ao símbolo como "uma expressão indeterminada, ambígua, que indica alguma coisa dificilmente definível, não reconhecida completamente". Para que uma imagem se torne um símbolo é preciso que a consciência observadora crie com esta uma espécie de vínculo, uma troca que a envolva de sentido (RODRIGUES, 2019).

A linguagem simbólica consegue capturar, como um imã, aquele que a observa, sendo capaz de instigar a movimentação de aspectos psíquicos evitando assim uma estagnação da psique (JACOBI, 2016).

Essas imagens do inconsciente (pessoal, cultural e coletivo) são projetadas no "mundo real" através das artes sob a forma de símbolos. O artista, ao se apropriar de materiais naturais e/ou artificiais mesclando-os à sua criatividade, pode criar novas subjetivações, percepções e sentidos, bem como criar outras possibilidades e outros mundos capazes de dialogar com o espectador (ROLNIK, 2003).

Em seu livro Imagens do Inconsciente, a psiquiatra Nise da Silveira (2015) diz:

O processo psíquico desenvolve seu dinamismo por intermédio da criação de imagens simbólicas. "o símbolo é o mecanismo psicológico que transforma energia" [JUNG O.C. 8]. Assim, a objetivação9 de imagens simbólicas no desenho ou na pintura poderá promover transferências de energia de um nível para outro nível psíquico. A imagem não é algo estático. Ela é viva, atuante e possui mesmo eficácia curativa (p. 135).

Nise da Silveira (1905-1999) foi uma psiquiatra brasileira que desenvolveu seu pensamento e pesquisa no Centro Psiquiátrico Pedro II localizado no Rio de Janeiro. Responsável pela criação do Atelier de Pintura em 1946, Nise tinha como proposta criar uma alternativa terapêutica aos violentos "tratamentos" destinados aos doentes mentais da época. A expressiva melhora observada nos internos que espontaneamente frequentavam o atelier impulsionou Nise a iniciar a sua pesquisa.

Gustavo Barcellos (2006), em seu texto O sul e a alma, discorre sobre como os complexos culturais se manifestam e se atualizam nas artes. Para demonstrar sua perspectiva, ele utiliza a expressão artística do barroco colonial/tropical como exemplo de manifestação artística que confronta o complexo colonial. Ao longo do texto, ele argumenta que o barroco colonial se recusou a aceitar a expressão artística do barroco português como "pronta". Visto que, apesar do estilo barroco ser importado de Portugal, quando chega ao "Brasil", ele passa por uma série de transformações, engloba referências artísticas e culturais de outros povos e se transforma em um estilo diferente do original. Assume, assim, as suas próprias idiossincrasias que tanto o definem quanto o diferenciam.

Como ocorreria então essa confrontação entre os complexos e os artivismos? O primeiro passo desse diálogo seria definir o que são Artivismos. Raposo (2015, p. 5) o define como uma produção artística que:

Apela a ligações, tão clássicas como prolixas e polêmicas entre arte e política, e estimula os destinos potenciais da arte enquanto ato de resistência e subversão [...] A sua natureza estética e simbólica amplifica, sensibiliza, reflete e interroga temas e situações num dado contexto histórico e social, visando à mudança ou a resistência. Artivismo consolida-se assim como causa e reivindicação social e simultaneamente como ruptura artística - nomeadamente, pela proposição de cenários, paisagens e ecologias alternativas de fruição, de participação e de criação artística.

Em resumo, os artivismos são produções artísticas que carregam em seu âmago a resistência e a subversão de quaisquer narrativas ou normas que colaborem ou promovam a opressão de um indivíduo e/ou grupo. Em geral essas produções artísticas se referem a temáticas sociais e políticas emergentes.

É interessante ressaltar aqui que o próprio Jung, em seu texto Relação da psicologia analítica com a obra de arte poética (1922), se refere ao valor social que a arte possui e o papel do artista diante das insatisfações da sua época:

Este é o segredo da ação da arte. O processo criativo consiste (até onde nos é dado segui-lo) numa ativação inconsciente do arquétipo e numa elaboração e formalização na obra acabada. De certo modo a formação da imagem primordial é uma transcrição para a linguagem do presente pelo artista, dando novamente a cada um a possibilidade de encontrar o acesso as fontes mais profundas da vida que, de outro modo, lhe seria negado. É ai que está o significado social da obra de arte: ela trabalha continuamente na educação do espírito da época, pois traz a tona aquelas formas das quais a época mais necessita. Partindo da insatisfação do presente, a ânsia do artista recua até encontrar no inconsciente aquela imagem primordial adequada para compensar de modo mais efetivo a carência e unilateralidade do espírito da época. [...] o gênero da obra de arte nos permite uma conclusão sobre a característica da época na qual ela se originou (JUNG, 2013, p. 83, par. 130).

Ao analisar a cena artivista brasileira, Leandro Colling (2019, p. 29) observa o que parece ser uma grande mobilização em torno das temáticas que envolvem as dissidências sexuais e de gênero. Temática esta que se entrelaça com o pensamento decolonial exposto anteriormente.

Colling observa que a cena artivista das dissidências valoriza as identidades híbridas de gênero e sexualidade, opondo-se à ideia de identidade fixada em homem/pênis/heterossexual e mulher/vagina/heterossexual. Observa também a predominância de múltiplas linguagens artísticas e coletivos - não centraliza a produção em uma pessoa - que, muitas vezes, convocam o expectador a participar e intervir na obra.

A cena artivista faz coro contra qualquer tipo de preconceito e normatização de corpos e identidades e, neste ponto, ela é bem semelhante às ideias decoloniais. Colling (2019) também faz essa ponte e chega a citar alguns autores que pensam a produção artística da cena através da ideia da descolonização.

Ao que parece, ao produzir imagens que desconstroem a noção de identidade fixa e rompem com uma série de normatizações inventadas pela cultura, essa cena artística colide e ameaça diretamente os pressupostos que sustentam o complexo colonial, promovendo a "descarga", por assim dizer, e a circulação da energia psíquica para imagens e complexos outros que subvertem a imagem da colonialidade.

Além disso, o autor também percebe na cena artivista o que chamou de "uma felicidade de transgredir". Transgredir o que exatamente?

No artigo intitulado Fracasso, utopia queer ou resistência? Chaves de leitura para pensar as artes das dissidências sexuais e de gênero no Brasil, Colling (2021, p. 15) observa que "muitas pessoas e coletivos que integram essa cena artivista das dissidências sexuais e de gênero no Brasil da atualidade, dizem não à pulsão de morte, ao fracasso e à infelicidade. Nessa cena, desobedecer (OLIVEIRA, 2017), às vezes inclusive com alegria, é um verbo muito mais apropriado do que fracassar".

Seria essa uma defesa arquetípica do espírito do "grupo dos dissidentes"? Uma defesa (ou autodefesa?) criativa e positiva que engloba complexos culturais adormecidos e se recusa a operar nos moldes coloniais que produzem imagens de infelicidade e morte? Ou seria então um resgate/inflação dos complexos culturais pré-invasão colonial?

Os artivismos parecem confrontar as narrativas que sustentam o complexo colonial, fazendo-o através de imagens e cenas positivas e alegres que representam as pessoas não brancas e LGBTQIAP+ com dignidade, criatividade, força e liberdade. Essas imagens e cenas movimentam e direcionam a energia psíquica para outros complexos culturais que vêm confrontando e ameaçando o complexo colonial.

 

Considerações finais

Se tanto a arte como terapia quanto a Arteterapia têm o potencial de transformar as pessoas através da imagem e promover, como disse Nise da Silveira, uma autocura10 o que essas imagens artivistas conseguiriam fazer, mesmo que lentamente, com as coletividades?

Questionando isso me refiro aqui à subjetividade humana, que não está imune aos constantes bombardeios visuais que recebemos. Sejam essas imagens veiculadas pelos meios de comunicação e mídias sociais ou estampadas em outdoors e muros das cidades.

Impregnadas de uma narrativa que, como visto, perpassa pelos complexos culturais as imagens veiculadas pela mídia hegemônica nos ensinam, dentre tantas coisas, que: a família feliz é aquela que estampa as propagandas de margarina (branca, heterossexual e com prole); que índios no Brasil só existem em terras isoladas em algum lugar da Amazônia; que o agro é pop e que está tudo bem destruir o nosso planeta; e que negros e negras só ocupam os lugares subalternos da sociedade por que não se esforçaram o suficiente.

Por mais que tenhamos avançado muito com políticas públicas e pressão dos movimentos sociais nas últimas décadas, ainda há fragilidade nas conquistas políticas a favor das massas e da diversidade. É indiscutível que uma mudança a nível estrutural é necessária. Contudo, para que ocorra é necessário também uma mudança subjetiva e os artivismos demonstram ser um potente aliado para alcançá-la.

A arte tem o poder de chegar a lugares inimagináveis e não se cala diante da censura, pelo contrário, quanto mais se censura a arte mais transgressora ela se tornará. Finalizo esse artigo com uma frase muito pertinente da artista visual Elidayana Alexandrino (2022): "Precisamos entender as imagens como criadoras de mundos e realidades possíveis. Precisamos de uma nova cultura visual baseada no amor, amor no sentido político de ação e transformação!".

 

Referências

ALEXANDRINO, E. Que imagens ainda não foram criadas? @narrativaz_que_se_encontram, 17 set. 2022. Disponível em: <https://www.instagram.com/p/CinjV4mOVX7/>. Acesso em: 18 set. 2022.         [ Links ]

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Recebido: 02/08/2022
Revisado: 04/12/2022

 

 

1 As Obras Completas de C.G. Jung são divididas em 18 volumes, totalizando 35 livros. Os volumes 10/2 e 10/3 são respectivamente os livros intitulados: Aspectos do drama contemporâneo (2020) e Civilização em transição (2013).
2 A cisgeneridade, fundamentalmente, pode ser compreendida como a identidade de gênero 'típica', naturalizada. O termo "cisgênero" é um conceito que abarca as pessoas que se identificam com o gênero que lhes foi determinado quando de seu nascimento, ou seja, as pessoas não transgênero (VERGUEIRO, 2015, p. 192).
3 Podemos tomar a cisnormatividade como uma série de forças socioculturais e institucionais que discursivamente produzem a cisgeneridade como "natural" (VERGUEIRO, 2015, p. 68).
4 Semelhante à ideia de sexíssimo, o cissexismo se configura como uma serie de práticas discriminatórias que estabelece uma hierarquia entre pessoas cis e trans, estando a pessoa cis acima da pessoa trans.
5 Linguagem neutra utilizada para se referir a qualquer gênero, seja o masculino, o feminino ou o não binário.
6 Porto-Gonçalves (2009, p. 26, grifo do autor) define "Abya Yala, na língua do povo Kuna, significa Terra madura, Terra Viva ou Terra em florescimento e é sinônimo de América. [...] Pouco a pouco, nos diferentes encontros do movimento dos povos indígenas, o nome América vem sendo substituído por Abya Yala, indicando assim não só outro nome, mas também a presença de outro sujeito enunciador de discurso, até então calado e subalternizado em termos políticos: os povos originários".
7 O termo descolonização pode ser entendido como: "politicamente, o termo descreve a conquista da autonomia por parte daquelas/es que foram colonizadas/os e, portanto, envolve a realização da independência e da autonomia" (KILOMBA, 2019, p. 224).
8 Célebre frase de Conceição Evaristo, nacionalmente conhecida e propagada tanto pelos movimentos negros quanto pelos movimentos de mulheres negras.
9 Por objetivação a autora se refere ao processo de dar forma à imagem, transformá-la em uma criação, em uma obra palpável e observável.
10 Cura, no vocabulário analítico, significa transformação.

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