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Temas em Psicologia
versão impressa ISSN 1413-389X
Temas psicol. vol.19 no.2 Ribeirão Preto dez. 2011
Conflito de gerações nas organizações: um fenômeno social interpretado a partir da teoria de Erik Erikson
Conflict of generations in organizations: a social phenomenon interpreted by Erik Erikson's theory
Rafael Marcus ChiuziI; Bruna Ribeiro Gonçalves PeixotoII; Giovanna Lorenzini FusariIII
IUniversidade Metodista de São Paulo - São Bernardo do Campo, SP - Brasil. Psicólogo, Doutorando em Psicologia Social e do Trabalho pela USP, Mestre em psicologia pela Universidade Metodista de São Paulo. Professor de Psicologia organizacional e do trabalho e Gestão de recursos humanos na Universidade Metodista de São Paulo
IIUniversidade Metodista de São Paulo - São Bernardo do Campo, SP - Brasil. Estudante de graduação em Psicologia da Universidade Metodista de São Paulo
IIIUniversidade Metodista de São Paulo - São Bernardo do Campo, SP - Brasil. Estudante de graduação em Psicologia da Universidade Metodista de São Paulo
RESUMO
O presente artigo disserta sobre a teoria do ciclo vital de Erik Erikson e suas oito fases e crises vivenciadas (confiança básica vs. desconfiança, autonomia vs. dúvida, iniciativa vs. culpa, produtividade vs. inferioridade, identidade vs. confusão de papéis, intimidade vs. isolamento, generatividade vs. estagnação e integridade vs. desespero). Objetivando o estudo do fenômeno social das gerações e o conflito entre elas, à luz da teoria do desenvolvimento psicossocial humano postulada por Erik Erikson, foi realizado um estudo teórico com base em materiais bibliográficos publicados sobre tais temáticas, articulados ao conceito do ciclo vital humano e do desenvolvimento dinâmico e contínuo com o conceito de diferenciação dos perfis psicográficos das diferentes gerações mapeadas. A partir desta teoria são traçadas análises sobre o fenômeno social sobre as diferentes gerações atuantes no mercado de trabalho (veteranos, baby boomers, geração X e geração Y) e o conflito existente entre elas. Como considerações finais, o estudo aponta que é possível obter, com certas restrições, um arcabouço teórico consistente para o conflito de gerações nas organizações a partir da teoria de Erik Erikson, formulada na década de 1930.
Palavras-chave: Erik Erikson, Ciclo vital, Gerações, Conflito de gerações, Mercado de trabalho.
ABSTRACT
The following paper is a study of Erik Erikson's life cycle theory and the eight phases in which crisis are faced by human beings (basic trust vs. mistrust, autonomy vs. shame and doubt, initiative vs. guilt, industry vs. inferiority, identity vs. identity diffusion, intimacy and distanciation vs. self-absorption, generativity vs. stagnation and integrity vs. despair and disgust). Aiming at the study of the generations social phenomenon and the conflict among them, through the human psychosocial development theory proposed by Erik Erikson, a theoretical study was conducted among the active labor market generations focusing on individuals with ages between 18 and 60. Previously published bibliographical material about the theme was used, articulated to the human vital circle concept as well as the dynamic and continuous development regarding the differentiation of psychographic profiles of different mapped generations. Through this theory, analysis are made regarding the social phenomena of the new generations present in the work environment (veterans, baby boomers, gen X and gen Y) and the conflicts between them. As final considerations, the study points out that it is possible to obtain, with some restrictions, a consistent theoretical background to the generations conflict in organizations based on Erik Erikson's theory, formulated in the 1930´s decade.
Keywords: Erik Erikson, Life cycle, Generations, Generational conflicts, Work environment.
O discurso sobre gerações é uma constante desde os escritos de Platão que versam sobre as diferenças entre jovens e não jovens (Platão, 1994). Atualmente este novo discurso de conflito geracional ganha corpo em função de seu status pró-management. Assim, antes de mais nada, faz-se necessária uma primeira clarificação acerca da palavra geração. Segundo o Novo dicionário Aurélio da língua portuguesa (Ferreira, 2009) a palavrageração é definida como:
3. Cada grau de filiação de pai para filho; posteridade, descendência. 4. Linhagem, estirpe, ascendência, genealogia. 5. O conjunto dos indivíduos nascidos pela mesma época. 6. O espaço de tempo (aproximadamente 25 anos) que vai de uma geração (3) a outra (p.978)
Logo, a partir do compartilhamento do mesmo espaço de tempo de pessoas nascidas em uma mesma época, a convivência com diferentes gerações faz parte do cotidiano de todos, seja no contexto escolar, familiar, profissional ou social. Há diferenças e paridades entre tais gerações como: visão de mundo, de autoridade, limites de comportamentos e valores entre outros que afetam os indivíduos diretamente e indiretamente. Assim, para compreender como uma geração difere da outra, é preciso que se perceba como cada uma delas forma um conjunto de crenças, valores e prioridades, ou seja, paradigmas, consequências diretas da época em que cresceram e se desenvolveram e entendê-las de um ponto de vista sociocognitivo-cultural.
As gerações são produtos de eventos históricos que influenciaram profundamente os valores e a visão do mundo de seus membros. Um fenômeno social corresponde, em partes, a isso, ou seja, refere-se aos comportamentos, ações e situações observadas em determinadas sociedades, organizações e grupos em um momento ou período histórico específico. Nesta perspectiva, as abordagens são diversas e o indivíduo, em sua singularidade, é estudado pela Psicologia , enquanto a Sociologia tem uma base teórico-metodológica orientada para estudar os fenômenos coletivos sociais, tentando explicá-los, analisando os homens em suas relações de interdependência (Silva & Pinto, 2001).
Uma das áreas de pesquisa altamente interessada em estudos geracionais na atualidade é a área de Marketing. A partir do estudo do comportamento do consumidor, procura identificar como pessoas, grupos e organizações selecionam, compram, usam e descartam artigos, serviços, ideias ou experiências para satisfazer suas necessidades e seus desejos (Gade, 1998).
Estudar o cliente fornece pistas para o desenvolvimento de novos produtos, características de produtos, preços, canais de distribuição, segmentação, mensagens e outros elementos do mix de marketing (Kotler, 2000). Sendo assim, profissionais desta área sentiram a necessidade de mapear o público que consumia seus produtos, surgindo então os primeiros estudos sobre as gerações, contudo, esse interesse pelas interações humanas e as diferenças e conflitos advindos delas não são assuntos recentes (Karsaklian, 2000).
Ao longo dos séculos, além dos profissionais de Sociologia como Auguste Comte (1972) e John Stuart Mill (2000), que foram os precursores no estudo das gerações através de infindáveis tentativas de compreender a sociedade e os padrões das ações humanas, Gasset (2003), Neil Howe e William Strauss (2000) e Rudolf Steiner (1995), entre tantos outros, se empenharam em compreender o desenvolvimento humano e tentaram traçar um mapeamento cultural das gerações, dividindo a população por parcelas de idades. Isto ganhou a denominação informal, enquanto fenômeno social retratado especialmente em revistas de management, de "Teoria de Geração de Executivos".
Em uma perspectiva aproximada ao contexto aqui apresentado, em seu livro A arte da educação, Steiner (1995) disserta com propriedade sobre a teoria dos setênios, apregoando a ideia de que, a cada sete anos da vida de um indivíduo, novas e importantes contingências surgem em face ao necessário enfrentamento do indivíduo. Tais contingências propositadamente configuram-se como desafios e nos auxiliam rumo ao crescimento contínuo. Segundo Steiner (1995) "os setênios vêm marcados por períodos de mudanças físicas e emocionais que tendem a desencadear sensações do tipo o que fazer da vida?" (p.19).
Assim, a tarefa de traçar o perfil de diferentes gerações é demasiadamente arriscada, correndo-se o risco de, quando o caso, também ser extremamente funcionalista, pois inevitavelmente associa-se a isto o ideal de conduzir generalizações indevidas, extraindo o indivíduo de sua historicidade e culturalidade (Bauman, 2009). Contudo, há que se considerar que os modos culturais marcados pela geração podem exercer influências significativas no modus vivendi de indivíduos lá contidos, como um zeitgeist 1 circunscrito parcialmente na cultura mais holística.
É possível perceber que há grande quantidade de divisões e nomenclaturas para as gerações e que este assunto desperta curiosidade, principalmente no mercado de trabalho e nas organizações de negócios buscando compreender o funcionamento das novas gerações em função da alta quantidade de jovens agora sendo inseridos nas empresas.
Sobre a divisão entre as gerações, Washburn (2000) distingue cinco categorias diferentes (claro que imbuídas na cultura norte-americana) em seu artigo publicado na revista Pshysician executive:
Geração da infantaria - Nascidos entre 1901 até 1925 - Geração que sobreviveu à grande depressão e lutou na 2ª guerra; marcada por uma jornada heroica, esse grupo acredita na virtude do cidadão e na mobilidade social - o sonho americano - sendo que essa geração ficou marcada pelas características de cidadania e agrupamento fraternal/profissional.
Geração silenciosa - Nascidos entre 1926 até 1945 - Muito novos para lutar na 2ª guerra, admiravam a geração anterior, convivendo de perto com o senso de patriotismo e sacrifício próprio para o bem do comum. Herdaram um "mundo melhor", construído pela geração anterior e buscaram estender esse mundo ao invés de mudá-lo. A geração silenciosa se define pelos princípios de ordem, lei, fé e patriotismo.
Geração baby boomer 2 - Nascidos entre 1945 até 1964 - Representam a maior fatia de geração em termos de número - 76 milhões. São moralistas, porém não aceitam autoritarismo ou princípios institucionais sobre moral ou ética, não sacrificam prazeres pessoais em prol do grupo - individualistas.
Religiosamente a geração baby boomer mescla princípios para que estes se adéquem a seus hábitos, evitando dogmas e ensinamentos de qualquer religião específica.
Geração X - Nascidos entre 1965 até 1981 - Representa um corte de idade muito menor que as outras gerações, portanto, demograficamente foi menosprezada. Sentiu que iria receber muito menos do que a geração anterior em bens materiais e isso alterou a aproximação do materialismo que esta geração possuía, ficando muito mais próximos de valores familiares e círculo de amizades fortes. É marcada pela insegurança de um mundo que muda rapidamente e continuamente, valorizando a experiência, suspeitando de teorizações sob o argumento de que estas faltam em autenticidade ou até mesmo realidade.
Geração Y - Nascidos entre 1982 até 2003 - A geração Y cresceu em meio tecnológico, convivendo com computadores, correio eletrônico e programas de mensagens instantâneas da mesma maneira como a geração dos baby boomers cresceu com o telefone e a geração X com a televisão. Não possuem memória de um tempo em que a tecnologia não existia massivamente.
Já Martin e Tulgan (2006) optaram por classificar as gerações com um intervalo de idades diferente dos critérios utilizados por Washburn (2000), especialmente sobre as últimas duas gerações, denominadas igualmente de X e Y. Os autores utilizaram a denominação geração schwarzkopf para aqueles nascidos antes de 1946, geração baby boomer para os nascidos entre 1946 e 1964. Sobre a geração X e a geração Y, isto é, Martin e Tulgan (2006) atribuem características similares às de Washburn (2000) com diferenças apenas em relação aos períodos de nascimento.
Gravett e Throckmorton (2007) optam por nomenclaturas parcialmente diversas e as dividem em: geração radio babies (nascidos antes de 1945), geração Baby boomers (nascidos entre 1946 e 1964), geração X (nascidos entre 1965 e 1978) e geração Y (nascidos entre 1979 e 1990).
Independente da nomenclatura, algumas características comuns são compartilhadas em função precisamente de eventos históricos que moldaram padrões socioculturais dos indivíduos. O que se percebe é que a maioria dos estudos e registros históricos (senão todos) é oriunda da cultura norte-americana, realizados a partir de registros históricos especialmente em função da história de participação em guerras que, definitivamente geraram verdadeiras cicatrizes sociais em determinadas gerações, marcando-as de maneira bastante significativa.
Pode-se perceber, por exemplo, de acordo com a compilação de fatos, que os veteranos, nascidos antes da Segunda Guerra Mundial foram altamente marcados, imprimindo nestes valores como: respeito e lealdade aos direitos civis, pela autoridade, moralidade e pela família. Não obstante, tais características são também encenadas no ambiente de trabalho, fazendo dos veteranos detentores de princípio ético e da memória coletiva da empresa. Em função disto, tendem a crer mais no trabalho e na equipe, mas sob um prisma militar no qual sempre está presente a figura de comando pronta para declarar a palavra final. Buscam estabilidade e segurança em seus empregos, sendo assim, muitos veteranos optaram por trabalhar em empresas governamentais (Abrams, 1970).
A geração X não vivenciou uma situação de guerra, seu maior desafio foi superar os conflitos econômicos ocorridos entre os anos de 1970 e 1980. São filhos de pais que trabalharam em excesso em detrimento da família e, por isso, buscam equilíbrio entre o trabalho e a vida familiar. Frente a esta jornada de trabalho, inclusive de suas mães, o número de divórcios também aumentou, sendo muitos da geração X, filhos de pais separados. Aparentemente, os integrantes da geração X não querem viver o mesmo tipo de vida que seus pais.
Sobre a geração Y, os pertencentes declaram desejar ter uma carreira de sucesso, mas tal empenho ao trabalho deve respeitar limites estabelecidos (comumente embasados nos erros da geração anterior). Assim, podem desfrutar de sua família, filhos e amigos. Essa geração demanda das organizações maneiras mais flexíveis de incorporar o tempo destinado à vida familiar proporcionalmente ao nível de exigência de seu trabalho. Quando questionados sobre suas expectativas de carreira, esses jovens executivos respondem tranquilamente que, segundo suas previsões, deverão trabalhar em três ou cinco empresas durante toda a carreira. Por que tantas? Devido ao fato dos mesmos terem certeza de que, cedo ou tarde, serão demitidos (Conger, 1998). E assim eles utilizam suas carreiras como fonte para seu desenvolvimento, não nutrindo tanto compromisso às empresas que atuam.
Santana (2008), em sua análise sobre os profissionais da geração Y (em entrevista à revista Exame), retrata bem este fenômeno estereotipado nas organizações afirmando que eles querem tudo e agora, advertindo para características como impaciência na espera para a promoção, fidelidade a projetos em detrimento da organização empregadora em si além de prezar pela informalidade e contatos mais íntimos sem consideração a status hierárquicos historicamente construídos.
Portanto, em se tratando de um fenômeno social que envolve necessariamente ciclos vitais, em seguida é apresentada a teoria de Erik Erikson formulada a partir dos pressupostos psicanalíticos presentes na concepção de Erik Erikson.
A teoria de Erik Erikson
Erik Erikson (1902-1994), psicanalista nascido na Alemanha, era parte do círculo íntimo de Freud em Viena até fugir da ameaça do Nazismo e ir para os Estados Unidos em 1933. Sua ampla experiência pessoal e profissional o levou a modificar e desdobrar a teoria freudiana enfatizando a influência da sociedade sobre o desenvolvimento da personalidade. "Enquanto Freud sustentava que as experiências da infância moldavam permanentemente a personalidade, Erikson afirmava que o desenvolvimento do ego é vitalício" (Papalia, 2006, p. 71). Bee (1997) sobre a teoria eriksoniana afirma que
Erikson não deu tanta ênfase à centralização do impulso sexual, focalizando, em seu lugar, o surgimento gradativo de um senso de identidade. Segundo, embora ele concorde com Freud quanto à importância dos anos iniciais, defende que a identidade não está totalmente formada no final da adolescência, continuando, sim, a movimentar-se através de posteriores estágios desenvolvimentais na vida adulta .... Na visão de Erikson, a maturidade desempenha um papel relativamente insignificante na seqüência dos estágios. Muito mais importantes são as demandas culturais comuns às crianças de determinada idade, tais como a demanda de que a criança esteja já treinada quanto aos hábitos de eliminação por volta dos 2 anos, que ela aprenda as habilidades escolares por volta dos 6 a 7 anos ou que um adulto jovem forme uma parceria íntima. Assim, cada estágio está centrado em um determinado dilema, em uma determinada tarefa social. A seus estágios Erikson denomina estágios psicossociais ao invés de estágios psicossexuais ( p.62)
Sobre o desenvolvimento psicossocial, Erikson (1976) atribui oito estágios de passagem durante o ciclo vital completo. Segundo Papalia (2006), cada estágio envolve uma crise na personalidade - uma questão de desenvolvimento que é particularmente importante naquele momento e que continuará tendo alguma importância durante toda a vida. Em sua obra O ciclo de vida completo, Erikson (1998) apresenta a sequência dos estágios psicossociais e identifica as crises enfrentadas em cada um dos estágios, associando a resolução satisfatória destas crises com a maturação e desenvolvimento saudável do ego concomitante ao desenvolvimento de determinada virtude ou força.
Erikson (1976) identifica estágios evolutivos aos quais se inscreve um conflito predominante que tem sua origem nas forças psicossociais, dando ênfase especial ao estágio da adolescência, no qual, segundo sua visão, é negociado o senso de identidade, que irá influenciar diretamente os três estágios seguintes, juventude, maturidade e velhice.
A adolescência é vista como momento nevrálgico dentro desta edificação contínua que é o desenvolvimento, pois é nela que o indivíduo reorganiza os elementos identitários da fase infantil contrapondo-os ao mundo social encenado. Assim, busca a formação de uma identidade própria, uma vez que já tem um eu capacitado a incorporar papéis sociais, ideológicos, morais e profissionais (Erikson, 1956). Desta forma, no estágio da juventude os indivíduos devem posicionar-se aparelhados para vincular sua identidade a outras pessoas e esquadrinhar relacionamentos que abranjam intimidade e parceria verdadeira.
Segundo Erikson (1976), os adolescentes não constituem sua identidade imitando outras pessoas como modelo, mas sim modificando e sintetizando identificações anteriores para formar o que Kroger (1993) chama de "uma nova estrutura psicológica, maior do que a soma de suas partes" (p. 87). Erikson (1976) assinala também a existência de uma moratória psicossocial antecedente à entrada no cenário adulto, ou seja, resume-se a um período onde o indivíduo procura explorar as alternativas existentes e experimentar os diferentes papéis que permitam a ele o trabalho de elaboração interna, também influenciada pelas exigências e necessidades socioculturais. A identificação pessoal, então, aparece quando estes jovens elegem valores e pessoas às quais serão fiéis - virtude dilatada a partir da resolução desta crise - em vez de simplesmente consentirem com as escolhas realizadas pelos pais.
Esta parece uma, dentre as muitas, gêneses do início formativo do conflito entre as gerações, isto é, os pais em diferentes estágios do ciclo vital tendem a rejeitar, muitas vezes em função da alegação da maior experiência, como Erikson (1956) já apontava, ideias e atitudes dos mais jovens. Estes, por sua vez, enxergam como possível resposta ao movimento dos pais, o afastamento e alienação quanto a essas divergências entre ideais e valores, procurando assim autonomia e independência da família.
A partir do convívio em grupo, são elencados os valores e os comportamentos que serão aceitos, desejados ou rejeitados dentro de uma sociedade que compartilha uma mesma cultura. O convívio em grupo leva o homem a ter um papel e uma posição enquanto ser social, porém é necessário levar em conta as diferenças culturais que existem e também as mudanças que ocorrem ao longo do tempo. Hábitos e crenças estão diretamente ligados ao momento histórico vivido, portanto, é inevitável afirmar que existe uma transformação das subjetividades de uma geração para a outra.
Posto isso, objetivando o estudo do fenômeno social das gerações e o conflito entre elas, à luz da teoria do desenvolvimento psicossocial humano postulada por Erik Erikson, foi realizado um estudo comparativo entre as gerações que se encontram ativas no mercado de trabalho, focando nos indivíduos com idade entre 18 e 60 anos. Foram utilizados materiais bibliográficos previamente publicados sobre tais temáticas, articulados ao conceito do ciclo vital humano e do desenvolvimento dinâmico e contínuo com o conceito de diferenciação dos perfis psicográficos das diferentes gerações mapeadas. O objetivo específico deste estudo foi compreender as diferenças existentes entre alguns grupos de pessoas com idades diferentes que interagem e se relacionam, principalmente no âmbito profissional, e estudar este fenômeno a partir da teoria de Erik Erikson.
Método
Para o objetivo proposto, optou-se pela realização de um estudo exploratório sobre o conflito das gerações, pois o desejo é ampliar os conhecimentos sobre o tema. Segundo Gil (1999), esse tipo de pesquisa é realizado, sobretudo, quando o tema escolhido é pouco explorado e torna-se difícil formular hipóteses precisas e operacionalizáveis. Este é o caso aqui, pois a maioria dos estudos sobre o tema provém do Marketing e pouco da Psicologia. Ao estabelecer este método, busca-se proporcionar maiores informações sobre o assunto estudado, inclusive, para estudos posteriores a este (Andrade, 2002).
O estudo exploratório serve para nos familiarizarmos com fenômenos relativamente desconhecidos, geralmente determinam tendências, contextos e situações de estudos. Pesquisas teóricas, como esta, visam abordar um problema qualitativamente para conhecer a natureza de um fenômeno social (Gil, 1999).
Assim sendo, este trabalho foi embasado exclusivamente em levantamentos bibliográficos, que Cervo e Bervian (1983) definem como "uma forma de explicar um problema a partir de referenciais teóricos publicados em documentos" (p. 55). A partir de estudos e matérias científicas - algumas de cunho mercadológico estimulado e pesquisado por publicitários - este estudo foi constituído e embasado para propor uma discussão sobre o conflito de gerações. O objetivo é colocar o pesquisador em contato direto com o que há escrito sobre determinado assunto, com o intuito de refazer análises e reforçar informações.
Por fim, para fins de operacionalização, realizou-se um levantamento de grande parte da bibliografia publicada em forma de livros, revistas, publicações avulsas e imprensa escrita tais como jornais de grande circulação e circulação regional, sobre o tema. E analisaram-se qualitativamente os dados do fenômeno social apontado, propondo um estudo descritivo do tema Conflito de Gerações.
Discussão
A teoria do desenvolvimento psicossocial de Erikson abrange oito estágios durante o ciclo vital. Segundo Papalia (2006) cada estágio envolve uma "crise" (p. 71) na personalidade que nada mais é do que uma questão de desenvolvimento, particularmente importante naquele momento e que continuará tendo alguma importância durante toda a vida. As crises, oriundas de um cronograma de maturação, devem ser satisfatoriamente resolvidas para um saudável desenvolvimento do ego. O êxito na resolução de cada uma das oito crises exige que um traço positivo seja equilibrado por um traço negativo correspondente. Embora a qualidade positiva deva predominar, alguma medida do traço negativo é igualmente necessária, uma vez que o êxito na resolução de cada crise é o desenvolvimento de uma determinada virtude ou força e para isso tem-se que experienciar tanto os aspectos positivos, que devem prevalecer, quanto os aspectos negativos.
Apesar de somente ser de interesse direto ao tema da pesquisa os últimos estágios de desenvolvimento, optou-se aqui por explicá-los todos de maneira resumida, pois a obra de Erikson deve ser contemplada em sua totalidade, evitando assim uma fragmentação reducionista demasiada que pode comprometer o embasamento das fases posteriores.
O primeiro estágio é intitulado confiança básica versus desconfiança básica. Nesta idade, a criança vai aprender o que é ter ou não confiança a partir de sua relação com a mãe ou principal cuidador. A confiança básica é demonstrada pelo bebê na capacidade de dormir de forma pacífica, alimentar-se tranquilamente e excretar de forma relaxada. Devido à confiança do bebê e à familiaridade com a mãe ou principal cuidador, que é adquirida a partir de situações de conforto e acolhimento por ela proporcionadas, atinge uma realização social, que consiste na aceitação de que a mãe pode se ausentar, na certeza de que retornará. A partir do contato com os adultos, o bebê aprende a confiar e a depender deles, bem como confiar em si mesmo (Hall, Lindzey & Campbell, 1998). Segundo Bee (1997), "para que ocorra uma finalização bem sucedida desta tarefa, o genitor precisa amar com consistência e reagir de maneira previsível e confiante com a criança. Aqueles bebês cujos cuidados iniciais foram erráticos ou severos podem desenvolver desconfiança" (p 63).
O segundo estágio descrito é denominado autonomia versus vergonha e dúvida. Durante esse estágio, a criança vai aprender quais os seus privilégios, obrigações e limitações. Há uma necessidade de autocontrole e de aceitação do controle por parte das outras pessoas, desenvolvendo assim o senso de autonomia. Para que isso aconteça, é fundamental que o estágio anterior tenha sido elaborado satisfatoriamente, para que a criança tenha confiança em si própria e no mundo que a rodeia, permitindo-se assim ter uma opinião e fazer escolhas. É importante que seus pais ou cuidadores permitam que ela ande com seus próprios pés incentivando assim a autoconfiança. A vergonha e dúvida acontecem quando os pais fazem uso de humilhações e situações que causem embaraço à criança para repreenderem sua teimosia, expondo-a e fazendo com que perca o senso de autocontrole (Erikson, 1976).
O terceiro estágio é chamado iniciativa versus culpa e é caracterizado por uma crescente destreza e senso de responsabilidade. Nesta fase, a criança encontra-se nitidamente mais avançada mais organizada tanto em nível físico como mental. É introduzida neste estágio ao passo que inicia seu planejamento de tarefas e metas, tornando-se assim efetivamente autônoma. Neste estágio, Erikson realçava também os perigos existentes, pois a criança busca exaustivamente e de forma entusiasmada atingir suas metas, podendo fazer uso de meios agressivos e manipulativos para alcançá-las (Erikson, 1956).
O quarto estágio é denominado atividade (diligência ou indústria) versus inferioridade. Fase onde a criança necessita exercer maior controle sobre sua imaginação exuberante e dedicar mais atenção à educação formal. Ela não somente desenvolve um senso de aplicação, mas também compreende as recompensas obtidas pela perseverança da diligência. O prazer de brincar e o interesse, que antes era exclusivamente voltado a seus brinquedos, são gradualmente desviados para interesses por ações mais produtivas e ao aprendizado de habilidades sociais adequadas (Bee, 1997). O perigo eminente neste estágio se caracteriza pelo sentimento de inferioridade, que é vivenciado principalmente quando se mostra incapaz de dominar as tarefas que lhe são propostas por pais professores e pares (Franz & White, 2006).
O quinto estágio é intitulado identidade versus confusão. É neste estágio que o adolescente adquire senso de identidade psicossocial, isto é, compreende sua singularidade e seu papel no mundo. Neste estágio, os indivíduos estão recheados de novas potencialidades cognitivas, exploram e ensaiam estatutos e papéis sociais porque a sociedade fornece tal espaço de experimentação ao adolescente. Segundo Erikson (1956), todo adolescente que quiser alcançar uma identidade sexual madura e uma identidade ocupacional deverá reexaminar sua identidade e os papéis que deveria ocupar. Ele deve chegar a um senso reintegrado do self, daquilo que gostaria de fazer e ser e de seu papel sexual adequado. Ainda segundo Erikson (1959, citado por Papalia, 2006), "a identidade se forma à medida que as pessoas resolvem três questões importantes: a escolha da ocupação, a adoção de valores nos quais acreditar e segundo os quais viver, e o desenvolvimento de uma identidade sexual satisfatória" (p. 343). Os adolescentes que resolvem esta crise de maneira satisfatória desenvolvem a virtude da fidelidade - lealdade, fé ou sentimento de pertencer a algo ou alguém que se ama, ou identificação com um conjunto de valores, uma ideologia, um movimento político etc (Erikson, 1998).
Erikson diz que a principal tarefa da adolescência é confrontar a crise de identidade versus confusão de identidade (ou confusão de papéis), de modo a se tornar um adulto único com um senso de identidade coerente e um papel valorizado na sociedade. A crise de identidade raramente se resolve plenamente na adolescência; questões relativas à identidade aparecem repetidas vezes durante a vida adulta (Papalia, 2006, p.477).
Logo, a identificação pessoal brota quando os jovens escolhem os valores e as pessoas a quem serão leais, ao invés de simplesmente aceitar as escolhas de seus pais. Os adolescentes não cultivam sua identidade tomando outras pessoas como modelo, como fazem as crianças mais jovens, mas sim alterando e sintetizando identificações anteriores para formar uma nova composição psicológica, maior do que a soma de suas partes (Kroger, 1993).
Observando os jovens contemporâneos (a também chamada geração Y), em especial destaque o estágio de identidade vs. confusão, é possível vislumbrar o conflito postulado por Erikson. Como já foi apontado a priori, a geração Y tende a ter boa autoestima e a apresentar dificuldades de relacionamento com as figuras de autoridade - Essa dificuldade em aceitar e respeitar figuras de autoridade apenas pelo cargo ou posição que ocupam pode estar relacionada ao fato de que, segundo Erikson (1998).
Erikson (1998) alega ainda que a identificação pessoal passar a existir neste estágio quando os jovens escolhem os valores e as pessoas às quais serão fiéis, em vez de simplesmente aceitarem as escolhas de seus pais (ou chefes), isto é, cargos embasados em estruturas hierárquicas arbitrariamente definidas realmente podem não significar muito para esta população, a não ser que lhes sejam desvendados os méritos e conquistas obtidos por tais pessoas para que, então, o adolescente possa avaliar, a partir de seus valores pessoais, a maneira como lidar com tais figuras de autoridade.
Pelo mesmo motivo, o discurso atual também destaca que membros da geração Y tendem a ser muito curiosos, o que os faz pesquisar e buscar, por conta própria, novidades (Antunes, 2010). Essa característica da geração Y pode ser comentada pelo mesmo motivo explicitado acima - os jovens precisam conhecer e vivenciar situações e informações para poderem formar opiniões e conjunto de valores ao invés de simplesmente aceitar o que seus pais ou outros membros da sociedade acreditam e pregam (Erikson, 1998).
Sobre a caracterização desta população como uma geração impaciente e pouco leal à empresa para a qual trabalha, deve-se destacar aqui a dificuldade na resolução da crise identitária e seu comprometimento com tal objetivo. O grau de fidelidade dos jovens a esses comprometimentos influencia sua capacidade de resolver a crise de identidade. Jovens que resolvem essa crise de maneira satisfatória são mais aptos a desenvolvem também crenças e valores acerca da fidelidade, lealdade, fé ou sentimento de pertencer a alguém a quem ama ou a amigos e a companheiros. Fidelidade também pode significar identificação com um conjunto de valores, uma ideologia, uma religião, um movimento político, uma busca criativa ou grupo étnico (Erikson, 1998).
Em relação às tendências questionadoras e reivindicadoras de seus direitos, também há que se assinalarem tais características devidamente contextualizadas, onde é possível reconhecê-las como algo psicologicamente saudável tendo em vista que, em função de seu estágio de desenvolvimento psicossocial, os jovens ainda encontram-se em busca de sua identidade pessoal emancipatória (Erikson, 1956). Este é o momento em que refletem sobre tudo que já vivenciaram, as crenças que conhecem, os valores presentes na sociedade para assim formarem suas próprias crenças e valores, tornando-se indivíduos maduros, capazes de superarem as dúvidas quanto a quem são, formando assim sua identidade pessoal.
Durante o estágio intimidade versus isolamento, Bee (1997) afirma que "o jovem adulto se constrói sobre a base firmada na adolescência" (p.64). Por isso Erikson (1998) define a intimidade como "a capacidade de fundir sua identidade com a de outra pessoa sem receio de que você possa perder algo de si" (p. 45). Traz o amor como seu produto final, em uma vivência saudável. Isto pois, na idade adulta, é o momento no qual se busca um parceiro para a edificação de uma relação sólida e íntima, com devoção mútua entre parceiros que escolheram compartilhar suas vidas, ter filhos e ajudar esses filhos a conquistar seu próprio desenvolvimento saudável (Waterman, 2004). Contudo, nem todos trilham caminhos similares em direção ao mesmo desfecho acarretando no sentimento de isolamento (em oposição ao de intimidade). Segundo Erikson (1976), a verdadeira intimidade só acontece quando a formação da identidade está em pleno desenvolvimento. Sendo assim:
Quando um jovem não consuma essas relações íntimas com outros - e, acrescentaria eu, com os seus próprios recursos internos - no final da adolescência ou início da idade adulta ele poderá procurar relações interpessoais sumamente estereotipadas e acabar retendo um profundo sentimento de isolamento. Se os tempos favorecerem um tipo impessoal de padrão interpessoal, um homem pode ir longe na vida e, entretanto, albergar um grave problema de caráter, duplamente penoso porque ele nunca se sentirá realmente ele próprio, embora todos digam que ele é "alguém"(...) Assim a consequência duradoura da necessidade de distanciamento é a presteza em fortificar o território próprio de intimidade e solidariedade e em ver todos os estranhos com uma fanática "supervalorização das pequenas diferenças" entre o familiar e o desconhecido" (Erikson 1976, p.136).
Erikson (1976) também fiança que à medida que as áreas de responsabilidade adulta são gradualmente delineadas, o indivíduo acaba subsumindo-se a um sentimento ético, que é a marca do adulto. Esse sentimento é percebido como presente nos membros da geração X que, diferentemente de seus pais (geração baby boomers), anseiam por maior comedimento entre trabalho e vida familiar. Almejam uma carreira de sucesso, mas confiam que o empenho ao trabalho deve acatar um perímetro, demarcado pelo fato de poderem desfrutar e vivenciar o relacionamento íntimo com sua família e filhos.
O estágio da generatividade versus estagnação é o período mais longo na vida humana, momento no qual o indivíduo institui um compromisso de trabalho e começa efetivamente a constituição de sua família, passando a dedicar seu tempo e energia ao estabelecimento de um projeto de vida mais produtiva, centralizando a tarefa de cuidar da próxima geração (Waterman, 2004).
Durante esse período, o trabalho e os relacionamentos familiares confrontam a pessoa com os deveres de cuidador e uma crescente variedade de obrigações e responsabilidades, interesses e celebrações (Erikson, 1998). Esses desafios que a fase propõe são essenciais ao desenvolvimento humano saudável, e a ausência desses pode ser tomada por um sentimento de estagnação do ser. E, como Erikson (1998) insinua: "Afastar-se totalmente da generatividade, da criatividade, do cuidado e do convívio com os outros, seria pior que a morte" (p. 94).
Tal realidade é bastante nítida na geração baby boomer. No trabalho, buscam gerir pessoas por consenso e são preocupados com o bem-estar, com a participação e a justiça para com sua equipe, característica esta que também faz jus à teoria de Erikson, que reforça a importância do convívio com os outros nesta fase em particular indicando que
A evolução fez do homem um animal tanto ensinante como aprendiz, visto que dependência e maturidade são recíprocas; O homem maduro necessita ser necessitado e a maturidade é guiada pela natureza daquilo que deve ser assistido. A generatividade é, pois, de modo primordial, a preocupação em estabelecer e orientar a geração seguinte (Erikson, 1976, p. 138).
É a partir da capacidade de estabelecer relações íntimas com os outros, crise anterior à da generatividade, que o sujeito passa a sentir a necessidade de engendrar critérios de instrução às próximas gerações. Nem sempre essa tarefa encontra caminhos calmos devido às diferentes características que crivam cada geração tais como a velocidade de aprendizado e a importância dada a alguns tipos de ensinamentos, porém, essa necessidade em passar adiante seus conhecimentos é uma característica acentuada da geração baby boomer. Erikson (1976) entende que as instituições tendem a reforçar a generatividade visando a sucessão de seus trabalhadores. Contudo, por mais natural que possa parecer é fato que, enquanto seres humanos, há sempre a possibilidade do movimento contrário por parte de alguns em função de sentirem-se ameaçados pelos subordinados mais jovens e, muitas vezes de outra geração, e com isso optam por não dividir seus conhecimentos com receio da perda hierárquica. A este fato Erikson (1976) atribui uma falha na expansão de interesses do ego onde o indivíduo torna-se excessivamente preocupado consigo mesmo, ou ainda, sofre uma regressão e gera um sentimento de estagnação, tédio e invalidez.
Baseando-se em Erikson (1998), pode-se pensar que pessoas com mais idade talvez necessitem iniciar interações com maior frequência, pois outras pessoas podem ficar inseguras ou pouco à vontade, sem saber como quebrar o gelo e acrescentar que tal constrangimento, resultante da confusão sobre como interagir com alguém que não é como todo mundo pode privar muitos de relações potenciais e intercâmbios íntimos.
A reflexão acima remete ao fenômeno social das gerações. Um gestor fruto da geração baby boomer, por exemplo, que não resolveu sua crise da fase de generatividade versus estagnação, certamente terá dificuldades ao lidar com um subordinado da geração X. Tais diferenças são esperadas justamente em decorrência das diferenças características de cada geração. Entretanto, se entre essas duas pessoas a relação estabelecida for saudável, o produto dela será o amor mútuo, como aponta Erikson (1956) e a adaptação tomará seu curso natural. Conforme apresentado na teoria, a tendência apresentada é de que a geração mais sênior pode se isolar traduzindo assim, um conflito entre essas gerações.
O oitavo e último estágio do desenvolvimento psicossocial humano descrito por Erikson é o de integridade do ego versus desespero. Segundo Papalia (2006) a maior realização da terceira idade é um senso de integridade do ego, ou integridade do eu, baseado na reflexão das conquistas e situações diversas vivenciadas ao longo dos anos. Para Erikson (1998, p.112) essa "é a época de recapitular, avaliar e aceitar suas vidas, para que assim possam aceitar a chegada da morte". O autor afirma ainda que, com base nos efeitos impetrados pelas sete crises anteriores, o indivíduo será capaz de lutar para atingir um senso de coerência e integridade ao invés de se entregar ao desespero por estar em contato mais imediato com a finitude.
A virtude desta fase é a sabedoria que significa aceitar a vida que se viveu sem maiores arrependimentos, sem se apegar ao que deveria ter sido feito, ou ao que poderia ter sido (Erikson, 1976). "É a aceitação pela pessoa do seu único ciclo vital e daqueles que se tornaram significantes para ela como algo que tinha de ser e que, necessariamente, não permite substituição" (Erikson, 1976, p.110). Significa aceitar plenamente as situações que viveram, mesmo que não tenham sido as melhores, aceitar nossas imperfeições, dos que nos rodeiam e da vida, sabendo que a vida que cada um viveu é de sua própria responsabilidade.
Pessoas que não alcançam essa aceitação e que não aceitam a morte como um fim inevitável a todos os indivíduos são dominadas pelo desespero, compreendendo que o tempo que lhes resta é escasso para procurarem outros caminhos objetivando a integração do ego. Apesar de se esperar que a integridade prevaleça ao desespero, Erikson (1976) sustenta que certo desespero é inevitável, pois a lamentação é uma condição intrínseca humana. Outra característica importante citada por Erikson sobre esta fase é o fato de que, apesar de terem que refletir sobre o que viveram, é fundamental que haja uma estimulação presente, com desafios a serem encarados, através de trabalhos criativos, atividade política ou até mesmo o simples convívio com filhos e netos, mantendo-se assim envolvidos vitalmente na sociedade.
A tentativa de traçar um paralelo entre a oitava crise de Erikson e as características principais da geração de veteranos não é tarefa fácil, pois o arrolamento realizado sobre esta geração está baseado em suas ações e atitudes no mercado de trabalho, enquanto Erikson, apesar de explicitar a necessidade de envolvimento com desafios e estímulos para o presente e um futuro próximo, caracteriza esta fase como a última fase da vida de um indivíduo. Erikson não descarta as influências que este indivíduo exerceu nas instituições, porém, estas serão passadas às gerações futuras não diretamente por eles, mas sim pela forma como esses valores se instauraram nas mesmas.
Seja qual for o abismo a que as preocupações fundamentais possam conduzir os homens, (...) o homem, como criatura psicossocial, defrontar-se-á, no final de sua vida com uma nova edição da crise de identidade que poderíamos formular nas seguintes palavras: "Eu sou o que sobrevive de mim". Das fases da vida, portanto, disposições tais como fé, força de vontade, determinação, competência, fidelidade, amor, desvelo, sabedoria - tudo critérios de força vital individual - também fluem para a vida das instituições. Sem elas, as instituições definham; mas sem que o espírito das instituições impregne os padrões de desvelo e amor, instrução e treino nenhuma força poderia emergir da sequência de gerações (Erikson, 1976, p.141).
Considerações finais
Após cautelosa leitura interpretativa coadunada com as representações sociais expressas por meio de veículos de comunicação de massa, verifica-se que é possível estabelecer muitas relações entre a teoria de Erik Erikson e as gerações presentes no mercado de trabalho. Argumenta-se durante o texto que existem momentos (ou fases) do desenvolvimento humano que evocam padrões bastante similares entre pessoas que compartilham daquela construção histórica.
Sendo assim, é possível afirmar que as fases de Erikson podem prover embasamento suficiente para analisar determinada geração assim como suas interações sociais com as demais situações no recorte proposto por este estudo, restringindo apenas a indivíduos inseridos nas organizações de trabalho. Tal afirmação mostra o quão atual pode ser a teoria do Ciclo Vital, uma vez que seu foco principal é o humano e sua condição de existência.
O tema escolhido é circunscrito em relevância social e organizacional, contudo, é relativamente novo (conflito de gerações) e há extrema carência de estudos teórico metodológicos oriundos da Psicologia sobre esta temática. Tal escassez de bibliografias foi uma dificuldade encontrada na elaboração das ideias aqui apresentadas. Foi necessário recorrer aos estudos de Marketing existentes e fontes fidedignas, porém não científicas como, revistas conceituadas e reportagens. Por se tratar de um fenômeno ainda pouco vislumbrado por psicólogos, considera-se este trabalho como uma contribuição inicial para, ao menos, despertar o interesse e a possibilidade de estudos para profissionais da área.
Outro fator importante a ser considerado é a contextualização histórico-cultural da teoria que, elaborada por volta de 1930, possui lacunas fomentadas pela alta diversidade oriunda das mudanças sociais no contexto atual. Há que se considerar fatores como a elevação da expectativa de vida, cenários econômicos que dificultam a independência financeira de jovens (especialmente no Brasil) e outros fatores exógenos que acabam por alargar os períodos a priori definidos por Erikson (1956).
Há também que se ressaltar que questões mais atuais presentes no contexto de trabalho ainda não foram consideradas. Em um cenário onde o sistema capitalista praticamente força os mais velhos a serem retirados do sistema produtivo e reforça a entrada de jovens a fim de manter a própria lógica, como cita Antunes (2009), devem ser contempladas em estudos futuros uma vez que o cenário do trabalho e organizacional em sua volatilidade continua a desafiar os pressupostos outrora já investigados. É possível imaginar que esta lógica capitalista também influencie o fenômeno do conflito geracional, não somente em sua essência (da diferença psicossocial), mas também em questões periféricas tais como as motivações dos mais jovens em conflito com as motivações dos mais velhos em questões de segurança, empregabilidade e questões financeiras.
Contudo, ciente das limitações, ainda se crê na importância de novos estudos que abordem esta temática. Certamente tal preocupação será de grande valia para o universo acadêmico, assim como a práxis cotidiana organizacional. Sendo assim, este trabalho traçou descrição restrita sobre as diferentes gerações, mas não trata de temas como retenção dos profissionais da Geração Y nas empresas, projetos de vida da nova geração, ou lideranças Y (só para citar alguns).
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Endereço para correspondência:
Rafael Marcus Chiuzi
Universidade Metodista de São Paulo/Faculdade de Gestão e Serviços
Rua Alfeu Tavares, 149 Bairro Rudge Ramos
CEP: 09641-000. São Bernardo do Campo - SP
E-mail: rafael.chiuzi@metodista.br
Enviado em 15 de Dezembro de 2010
Texto reformulado em 10 de Maio de 2011
Aceite em 13 de Maio de 2011
Publicado em 31 de Dezembro de 2011
Sobre os autores:
Rafael Marcus Chiuzi - Psicólogo, Doutorando em Psicologia Social e do Trabalho pela USP, Mestre em psicologia pela Universidade Metodista de São Paulo. Professor de Psicologia organizacional e do trabalho e Gestão de recursos humanos na Universidade Metodista de São Paulo.
Bruna Ribeiro Gonçalves Peixoto - Estudante de graduação em Psicologia da Universidade Metodista de São Paulo.
Giovanna Lorenzini Fusari - Estudante de graduação em Psicologia da Universidade Metodista de São Paulo.
1 Termo alemão que traduz o espírito de uma época, movimentos intelectuais e culturais que traduzem comportamentos e ideais compartilhados. Para maiores informações ler "Fenomenologia do Espírito", de Hegel.
2 O termo baby boomer é uma referência à onomatopeia utilizada para descrever os nascidos no período pós Segunda Guerra Mundial. Período em que houve um boom de nascimentos em função da situação socioeconômica americana.