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Cadernos de psicanálise (Rio de Janeiro)
versão On-line ISSN 1413-6295
Cad. psicanal. vol.41 no.40 Rio de Jeneiro jan./jun. 2019
ARTIGOS
Alguns apontamentos acerca da função psicanalítica da personalidade no campo analítico. A narrativa do analista e a do escritor
A few considerations concerning the psychoanalytic function of personality in the analytic field. The narrative of the analyst and the writer
Marina F. R. Ribeiro*
Universidade de São Paulo - USP - Brasil
RESUMO
A partir do relato da experiência do escritor turco Orhan Pamuk (2010) com uma de suas leitoras, o artigo propõe uma analogia com o campo analítico, em que se faz presente a intersubjetividade analista-paciente. É apresentado o contexto teórico dos conceitos de reverie, função alfa e função psicanalítica da personalidade, criados por Bion e discutidos por autores contemporâneos. Compreendida na perspectiva de autores pós-bionianos como um campo do sonhar do analista e do analisando, a situação analítica é sempre complexa, nela podendo ser realizada a função psicanalítica da personalidade. O artigo finaliza considerando que tanto a experiência entre autor e leitor, como entre analista e analisando, em especial, a relação de intimidade e proximidade que acontece nesses dois diferentes contextos é favorecedora de transformações. Tais transformações se dão por meio da função psicanalítica da personalidade: a capacidade humana de transformar as experiências emocionais, inicialmente em estado bruto, em narrativas, a do analista e a do escritor, na busca humana incessante pela verdade e pelo sentido daquilo que é experienciado.
Palavras-chave: Reverie, Função alfa, Função psicanalítica da personalidade, Campo analítico.
ABSTRACT
Based on accounts of the experience of Turkish writer Orhan Pamuk (2010) with one of his readers, the article proposes an analogy with the analytic field, in which analyst-patient intersubjectivity is present. The theoretical context of reverie will be presented, as well as the alpha function and the psychoanalytic function of personality, created by Bion and discussed by contemporary authors. Understood from the perspective of Post-Bionian authors as a dreaming field of the analyst and the analysand, the analytic situation is always a complex one, where the psychoanalytic function of personality may be realized. The article ends by considering that both the experience between author and reader and between analyst and analysand, especially, the relation of intimacy and proximity happening between these two distinct contexts favor transformations. Such transformations take place by means of the psychoanalytic function of personality: the human ability to transform emotional experiences, initially in a raw state, into narratives, both the analyst's and the writer's, in the human's restless quest for the truth and the meaning of what is experienced.
Keywords: Reverie, Alpha function, Psychoanalytic function of personality, Analytic field.
Muito mais que um meio, a linguagem é algo como um
ser e por isso pode tão bem trazer-nos alguém à presença.
(MERLEAU-PONTY, 1980)
Penso que um psicanalista quando vai para o trabalho, deveria
pensar que está indo para seu atelier mais do que para um
consultório. Pois ele precisa considerar em primeiro lugar quais
os instrumentos dos quais dispõe. Que linguagem vai empregar e
em que língua a outra pessoa estará se comunicando.
(BION, 1972 apud CHUSTER, 2003, p. 171)
"Eu o conheço muito bem, o senhor ficaria surpreso".
Vamos começar1 com essa provocativa frase, que poderia ser de um analisando ao seu analista. Talvez muitos de nós ficássemos espantados ou até um pouco paranoicos, pensando: "o que deixei escapar e não percebi? O que esse paciente está querendo me dizer?". No entanto, a afirmativa foi dirigida ao escritor turco Orhan Pamuk, prêmio Nobel de Literatura em 2006.
A literatura tem sido um aliado importante de muitos psicanalistas, começando com Freud que dialogou textualmente com Shakespeare, Goethe, Schiller, Hoffmann, Thomas Mann, entre outros (MANGO; PONTALIS, 2013).
Seguindo essa inspiração literária, relato a experiência de Pamuk (2010) diante de uma leitora assídua de suas obras, que, penso, poderia ser, também, a experiência de um analisando com seu analista.
"Sr. Pamuk, eu li todos os seus livros", uma mulher me disse certa vez em Istambul. Ela devia ter a idade de minha tia e tinha toda a aparência de uma tia. "Eu o conheço muito bem, o senhor ficaria surpreso". Nossos olhos se encontraram. Um sentimento de culpa e um constrangimento tomaram conta de mim, e pensei que eu entendia o que ela queria dizer. O comentário daquela mulher vivida quase uma geração mais velha que eu, o constrangimento que senti naquele instante e as implicações de seu olhar ficaram em minha cabeça nos dias seguintes, enquanto eu tentava entender o que me perturbara. Quando aquela senhora que me lembrava minha tia disse que me conhecia, ela não estava dizendo que conhecia minha história de vida e minha família, que sabia onde eu morava, que escolas frequentei, os romances que escrevi e as dificuldades políticas que enfrentei. Nem que conhecia minha vida particular, meus hábitos pessoais ou minha natureza essencial e minha visão de mundo, que eu tentava expressar relacionando-as com minha cidade natal em meu livro Istambul. A velha senhora não estava confundindo minha história com as histórias de minhas personagens fictícias. Ela parecia falar de algo mais profundo, mais íntimo, mais secreto, e senti que a entendia. O que permitiu que a tia perspicaz me conhecesse tão bem foram minhas próprias experiências sensoriais, que inconscientemente eu colocara em todos os meus livros, em todas as minhas personagens. Eu projetara minhas experiências em minhas personagens: como me sinto quando aspiro o cheiro da terra molhada de chuva, quando me embriago num restaurante barulhento, quando toco a dentadura de meu pai depois de sua morte, quando lamento estar apaixonado, quando eu consigo me safar quando conto uma mentirinha, … Nunca me senti embaraçado quando meus leitores pensavam que as aventuras de meus heróis também haviam ocorrido comigo, porque eu sabia que isso não era verdade. ...
No entanto, quando uma leitora inteligente me disse que sentira, nos detalhes do romance, a experiência da vida real que "os tornavam meus", eu me senti embaraçado como alguém que confessou coisas íntimas a respeito da própria alma, como alguém cujas confissões escritas foram lidas por outra pessoa (PAMUK, 2010, p. 41-42).
Habitualmente, o analisando não tem nenhuma informação sobre o seu analista2, mas conhece bem como ele responde a um grande leque de situações e emoções, assim como a leitora de Pamuk. É como se a relação analítica fosse constituída por meio de um paradoxo: o analista parece ser um íntimo desconhecido. Penso que esse paradoxo favorece a possibilidade de uma intensa intimidade, dificilmente encontrada em outras situações humanas. Ogden (2010) diz que a grande invenção de Freud foi descobrir uma forma inédita de relação entre duas pessoas, sustentada e emoldurada pelo setting analítico. Chuster (2003, 2011, 2018) próximo ao mesmo pensamento, compreende a psicanálise como uma atividade inédita na história da humanidade.
Partindo da experiência de Pamuk (2010), da intimidade entre o escritor e sua leitora, e, por analogia, do analista e seu paciente, apresento aqui uma compreensão teórica do campo analítico como um campo do sonhar do analista e do analisando3, sempre em complexa interação. Trago a compreensão de Bion (1962) acerca da função psicanalítica da personalidade, de modo a refletir sobre o exercício dessa função na sala de análise, como também sobre a habilidade do escritor de literatura de construir uma narrativa a partir de suas experiências sensoriais.
A seguir, apresento o contexto teórico que sustenta a reflexão proposta.
Contexto Teórico
No livro A apreensão do belo, Meltzer (1995) celebra a beleza do método psicanalítico que capacita duas pessoas a terem a conversa mais interessante do mundo. Ogden (2014) dedica um de seus livros aos seus pacientes que lhe ensinaram que uma conversa sincera e verdadeira amplia os limites do possível. Como dito acima, o método psicanalítico é a grande invenção de Freud: colocar duas pessoas em uma atividade inédita na história da humanidade (CHUSTER, 2018) - relação que possibilita extrema intimidade e, justamente por isso, também temida. Como Bion (1992) diz, qualquer analista que vá encontrar um paciente amanhã deveria sentir medo, pois o encontro analítico, quaisquer que sejam as emoções presentes, implica o contato com turbulências emocionais4 e com aquilo que ainda não é conhecido para ambos.
Nessa direção, podemos pensar em um movimento cíclico ao longo da história da psicanálise: os textos que se referem ao que acontece na intimidade da sala de análise são colocados em evidência em alguns momentos, mas em outros entram em latência, para depois serem recuperados novamente.
Assim ocorreu com os textos de Ferenczi, que permaneceram por anos na "latência" da história da psicanálise, até serem novamente contemplados e nos servirem de referência. Ferenczi é, inclusive, precursor de várias ideias desenvolvidas por outros autores psicanalíticos que se dedicaram a compreender o que acontece entre analista e analisando, enfatizando, ao longo de toda a sua obra, que a relação analítica é, primordialmente, um vínculo entre duas pessoas em interação, tanto consciente, quanto inconsciente (GOLDSTEIN, 1999).
Em trabalho anterior (RIBEIRO, 2017a), apresento um recorte teórico da trajetória de algumas ideias psicanalíticas na compreensão da intersubjetividade entre analista e analisando. Retomo, sucintamente, o que foi desenvolvido no artigo supracitado. Como marco inicial, encontramos na obra freudiana (1915/2010) a comunicação entre inconscientes: "É muito digno de nota que o Ics de um indivíduo possa, contornando o Cs, reagir ao Ics de outro. Esse fato merece investigação mais aprofundada, em especial para saber se a atividade pré-consciente é aí excluída, mas como descrição é algo incontestável (p. 136)". Podemos considerar essa observação freudiana como o início de uma compreensão do campo intersubjetivo na análise. A partir de Klein (1946/1991), temos o conceito de identificação projetiva e, posteriormente, os trabalhos de Bion (1962), que marcam um vasto território de investigação e pesquisa clínica dos processos mentais entre analista e analisando - em outras palavras, como a dupla analítica pensa durante a sessão, em complexa interação.
A partir de Bion (1962), temos que a identificação projetiva é uma atividade básica da mente humana para comunicar emoções, passando a ser considerada como a origem do pensar5. Bion ressalta o aspecto de comunicação entre mentes presente no conceito de identificação projetiva, alocando-o, de forma evidente, no campo da intersubjetividade.
Os conceitos de continente e contido são abstraídos do conceito kleiniano de identificação projetiva (BION, 1962/1991). Há uma mente disponível, e com recursos (do analista), capaz de conter os elementos projetados, ainda não pensados, da mente do analisando. Bion (1959/1991, p. 106) escreve: "A identificação projetiva [do analisando] lhe possibilita investigar seus próprios sentimentos dentro de uma personalidade forte [do analista] o suficiente para contê-los". Bion descreve como pensamos através do contato com outra mente capaz de transformar, por meio da função onírica alfa6 (BION, 1992/2000), os pensamentos ainda não pensados.
Retomando, um elemento só se torna um contido se há outra mente capaz de transformá-lo e contê-lo. Um contido torna-se um elemento psíquico quando transformado pela função onírica alfa; ou seja, pensado/sonhado pelo analista. Em outras palavras, se tornou psíquico a partir da possibilidade de "habitar" outra mente. Se o termo identificação projetiva no texto kleiniano enfatiza o intrapsíquico, mas não se restringe a esse campo, os conceitos bionianos de continente e contido ressaltam o trânsito intersubjetivo entre as mentes - condição do pensar.
Ogden (2009b), em sua apresentação da teoria do pensar de Bion, destaca que são necessárias duas mentes para pensar pensamentos perturbadores. O pensamento perturbador é aquele que ainda não foi pensado, não encontrou um continente, uma outra mente que o contenha e possa torná-lo pensável. No entanto, podemos refletir que qualquer pensamento novo é perturbador, justamente por ser novo.
O pensamento perturbador passa a ser contido na mente do analista a partir de sua função onírica alfa, sendo que a reverie é um fator da função alfa (BION, 1962), ou seja, é como apreendemos a experiência, predominantemente, por meio de uma imagem e, posteriormente, através de uma possível narrativa da imagem. Para ficar mais claro, o elemento que foi contido pode se manifestar primeiramente por uma imagem na mente do analista, a reverie, o que significa que pensamos, inicialmente e predominantemente, mas não unicamente, por imagens, sendo que, para Bion, pensar é sonhar, o sonho é o pensamento inconsciente.
Chuster (2019) apresenta um detalhamento conceitual importante: compreende a reverie e a função alfa como polos de um espectro. O autor expõe que os conceitos de reverie e função alfa fazem parte da contribuição de Bion para a teoria dos sonhos. O sonho é uma função diuturna da mente para processar e metabolizar as experiências emocionais, o que foi denominado como pensamento onírico da vigília (day-dream). O autor, seguindo a descrição de Bion, compreende que a reverie diz respeito à díade mãe-bebê7 e a função alfa, à díade analista-analisando. A reverie é predominantemente sensorial, e a função alfa é predominantemente simbólica; ambas são compreendidas como polos de um espectro de infinitas possibilidades. Chuster enfatiza a ideia de Bion sobre a função alfa ser uma expressão epistemologicamente mais adequada para a observação da complexidade da vida mental, pois permite ampliações e aplicações detalhadas em vários níveis da experiência humana.
Retomando, o analista sonha a sessão, por meio de sua função onírica alfa, que é uma função transformadora da experiência em estado bruto: o elemento beta. Em espanhol, temos o expressivo termo ensoñación, um estado de "ensonhamento", de transformar em sonho a experiência vivida. Bion sugere algo que revela o sentido inverso da proposta freudiana, sem abrir mão do que Freud postula (tornar consciente o inconsciente); propõe que precisamos tornar inconsciente o vivido. A reverie e a função onírica alfa são constitutivas da capacidade de "ensonhamento" da experiência vivida em estado bruto.
A partir de Bion, a análise se oferece como um campo dos sonhos, um campo do sonhar (CASSORLA, 2019; KATZ, 2017), para que o paciente sonhe seus sonhos ainda não sonhados - em outras palavras, para que o analisando possa pensar/sonhar suas experiências por múltiplos vértices simultâneos, tanto conscientes como inconscientes. Segundo Chuster (2019), a partir dos livros Transformações (1965) e Atenção e interpretação (1970), Bion compreende a psicanálise como uma ciência da observação dos relacionamentos humanos pela ótica do inconsciente.
O pensamento inconsciente, o sonhar, é o que alimenta a mente de sentido, na busca humana pela verdade emocional da experiência e o conhecimento de si. Esse processo acontece por meio da transformação constante da experiência emocional, que primeiramente se apresenta em estado bruto8: o enigmático do elemento beta9 que é transformado pela função onírica alfa em uma imagem onírica e, posteriormente, em uma narrativa. Bion (1992/2000) escreve que os elementos alfa podem ser processados em forma narrativa, necessitando ter essa qualidade para serem compartilhados; utiliza-se então das expressões "forma narrativa" e "qualidade narrativa" (p. 158).
Posteriormente, Antonino Ferro (2011, p. 28) apresenta o conceito de derivado narrativo dos elementos alfa: "... não há nada do que é dito, narrado, desenhado na sala de análise que não possa ser considerado um 'derivado narrativo do pensamento onírico da vigília' ou do que restou dele". Narrativa é um termo amplo, que pode implicar diversas compreensões; por esse motivo, sigo a compreensão de Ferro (2000, p. 17) da narrativa do analista: "...falo daquela maneira de o analista estar na sessão, quando ele participa com o paciente da "construção de um significado" de forma altamente dialógica, sem grandes cesuras10 interpretativas.
A reverie, que podemos traduzir como um devaneio, um sonho acordado, é o modo como apreendemos o pensamento onírico da vigília. Para compreender melhor a reverie, Ogden (2009) usa uma metáfora: os pensamentos oníricos da vigília são como estrelas encobertas pela luz do sol, sempre presentes no céu, mas não conseguimos enxergá-los pelo excesso da luz da consciência. Precisamos de um "facho de intensa escuridão" (GROTSTEIN, 2010), a supressão das funções conscientes, para captar o pensamento onírico da vigília por meio da reverie. Como escreve de forma exitosa o poeta Mario Quintana11: "sonhar é acordar-se para dentro".
A experiência da reverie é quase sempre algo desconcertante para o analista, algo vivido como uma distração, desatenção, como uma falha na sua função analítica. Mas, se soubermos e tivermos a liberdade de usar a reverie como uma bússola na sala de análise, podemos considerá-la um importante instrumento técnico (OGDEN, 2013).
Para o casal Rocha Barros (2019), é necessário transformar a reverie do analista em uma forma simbólica passível de ser comunicada ao paciente. Trata-se, pois, do início de um processo de apreensão de uma experiência sensorial, podendo ter, predominantemente, um caráter imagético. Após um trabalho de reflexão autoanalítica, por parte do analista, é possível transformar a reverie em algo passível de comunicação; ou seja, o analista torna a experiência da reverie algo possível de ser pensado, transforma-a em uma comunicação que pode ser geradora de transformações da dupla analítica. Esse processo exige do analista uma grande habilidade e criatividade na construção de uma comunicação advinda da experiência da reverie e, além disso, uma comunicação que favoreça as transformações do campo analítico.
Os conceitos de reverie, função alfa, pensamento onírico de vigília, continente-contido, para citar apenas alguns postulados por Bion, instrumentalizam tecnicamente o analista a observar de forma mais acurada o que acontece no campo intersubjetivo da sessão. São conceitos que tornam a insígnia freudiana compreensível em sutis detalhes: à associação livre do paciente deve corresponder a atenção flutuante do analista, agora desdobrada em reverie e função alfa. Penso que estamos em um campo analítico transformado e expandido, com conceitos sofisticados, complexos e, evidentemente, intersubjetivos12.
O analista, além de ser um acurado observador das emoções que circulam na sala de análise, na intensa e turbulenta interação entre ele e o paciente, precisa ter a capacidade de se expressar por meio de uma narrativa que contenha, dê forma ao que inicialmente é apenas a emoção em estado bruto - o elemento beta. Em outras palavras, por meio da sua reverie e função alfa, o analista capta a emoção em estado bruto, constrói uma imagem e, posteriormente, necessita criar uma narrativa constituída a partir da reverie / função alfa13 - uma narrativa que promova uma experiência geradora de novos sentidos para o seu paciente14.
O ofício do analista, a partir de Bion, é comunicar e transformar as experiências emocionais. As imagens sonhadas por meio da reverie / função alfa são transformadas em interpretações narrativas15. A qualidade imagística dessas interpretações favorece, habilitam o paciente a sonhar o que até então eram experiências emocionais não sonháveis16.
Ogden (2007, 2009) compreende que, no setting analítico, ocorre uma sobreposição do sonhar do analista e o do paciente; sugere, assim, que a conversa analítica17 teria como característica um "falar-como-se-estivesse-sonhando" (talking-as-dreaming):
Eu vejo a psicanálise como uma experiência na qual o paciente e o analista se engajam em um experimento no interior do setting analítico que é desenhado para criar as condições nas quais o analisando (com a participação do analista) pode ser capaz de sonhar o que até então eram experiências emocionais não sonháveis (seus sonhos não sonhados). Eu vejo o "falar-como-se-estivesse-sonhando" como uma improvisação na forma de uma conversa sem uma estruturação rígida (podendo se tratar virtualmente de qualquer assunto) na qual o analista participa na capacitação do paciente para sonhar seus sonhos ainda não sonhados. Ao assim proceder, o analista facilita que o paciente possa, mais plenamente, se sonhar18 (OGDEN, 2009a, p. 17).
Podemos pensar que, quando tem essa qualidade onírica e de poiesis, a narrativa da dupla analítica possibilita pensar os pensamentos ainda não pensados, os elementos psíquicos em estado bruto, que ainda não encontraram uma mente para serem contidos; ou, em outras palavras, uma outra mente para "habitar". Como escreve Mia Couto (2012, p. 101) "... O segredo é estar disponível para que outras lógicas nos habitem, é visitarmos e sermos visitados por outras sensibilidades"; e construirmos uma narrativa inédita e transformadora, sonhando os sonhos ainda não sonhados na sala de análise.
Nesse sentido, o campo analítico é o campo do sonhar, um campo do modelo do funcionamento onírico da mente (CASSORLA, 2019; KATZ, 201719. O campo analítico consiste em considerar o encontro das duas subjetividades, analista e analisando, em constante interação. As duas subjetividades geram tanto novos pensamentos como, também, levantam defesas inconscientes, os denominados baluartes, formados a partir de uma fantasia inconsciente da dupla. Tudo o que acontece no campo analítico é fruto do funcionamento tanto da mente do analista como da mente do analisando em complexa interação (BARANGER, M.; BARANGER, W., 1961-1962/2010).
A partir desse contexto teórico apresentado, vamos pressupor que a capacidade de criar uma narrativa, ou de poiesis do analista, avizinha-o do escritor de literatura. Em outros termos, o escritor de literatura tem essa mesma capacidade: a de colocar em uma forma narrativa o pensamento onírico da vigília20. São hipóteses que abrem um campo de investigação e discussão, sem nenhuma pretensão de resposta21.
Desenvolvo a seguir a conjectura de que um texto literário22 pode ser compreendido como uma narrativa de um pensamento onírico da vigília, uma narrativa que ocorre fora do contexto de um setting analítico. Talvez um texto literário seja uma realização de uma capacidade e função da mente humana, denominada por Bion (1962) como função psicanalítica da personalidade. Em outras palavras, o escritor tem a habilidade de transformar em uma narrativa suas experiências sensoriais, seu pensamento onírico da vigília. Retomando o comentário de Pamuk (2010, p. 41-42) citado no início do artigo: "O que permitiu que a tia perspicaz me conhecesse tão bem foram minhas próprias experiências sensoriais, que inconscientemente eu colocara em todos os meus livros, em todas as minhas personagens".
A função psicanalítica da personalidade: a narrativa do analista e a do escritor
Eu creio que todos nós, poetas e ficcionistas, não deixamos
nunca de perseguir esse caos seminal. Todos nós aspiramos
regressar a essa condição em que estivemos tão fora de um
idioma que todas as línguas eram nossas. Dito de outro modo,
todos nós somos impossíveis tradutores de sonhos. Na verdade,
os sonhos falam em nós o que nenhuma palavra sabe dizer.
Mia Couto, 2012
No texto Escritores criativos e devaneios, Freud (1908/1980) levanta a questão: "Acaso é realmente válido comparar o escritor imaginativo ao 'sonhador em plena luz do dia, e suas criações com os devaneios?'" (p. 154). Bion (1962/1991), quase sessenta anos depois, escreve acerca do pensamento onírico da vigília, destacando que somos todos sonhadores em pleno dia, e criamos narrativas a partir do devaneio, da capacidade imaginativa da mente. Essa capacidade transformadora da mente humana, a reverie / função alfa, é a forma como se dá a ver a "função psicanalítica da personalidade"23.
O termo "função psicanalítica da personalidade" aparece na obra de Bion (1962/1991) em um único momento24, quando descreve o vínculo K25, o vínculo do conhecimento26. Zimmerman (2004) afirma que essa função representa uma atitude diante da verdade e do conhecimento de si; ou seja, o movimento da mente humana na busca do sentido e da verdade das experiências emocionais, próprio a cada um.
Para Ogden (2009b), a função psicanalítica da personalidade constitui um dos quatro princípios do funcionamento mental27 na obra de Bion, que são:
1-) O pensamento é impulsionado (driven) pela necessidade humana de conhecer a verdade, a realidade de quem somos nós e do que se passa em nossa vida. 2-) É necessária a presença de duas mentes para pensar os pensamentos mais perturbadores de uma pessoa. 3-) A capacidade de pensar é desenvolvida, para que uma pessoa se reconcilie com pensamentos que nascem de sua experiência emocional perturbadora. 4-) Existe, inerente à personalidade, uma função psicanalítica: o sonhar - ou a reverie - esse é o processo principal, através do qual esta função se manifesta (OGDEN, 2009b, p. 91)28.
O sonhar, por meio da reverie / função alfa29, é um dos principais processos por meio dos quais a função psicanalítica da personalidade se manifesta. Bion propõe que a mente é equipada com essa função geradora, criadora de sentido, no infindável processo de elaboração das experiências emocionais, e da necessidade humana de encontrar o sentido e a verdade, única a cada um.
Nos textos de Chuster (2011, 2014), encontramos a ideia de que a análise está dentro das pessoas como uma habilidade humana em potencial; ou seja, o processo analítico pode expandir uma função que é humana, a função psicanalítica da personalidade, que consiste no interesse e na ética do conhecimento de si, o conhecimento da verdade da experiência emocional, sustentado pelo setting analítico, como vimos com Ogden (2010) e também com Chuster (2003, 2011, 2014 e 2018), uma forma inédita de relacionamento humano criada por Freud.
Retomando a reflexão aqui proposta, penso que aquilo que avizinha o escritor criativo de literatura do psicanalista, ou de todos nós, como questionado por Freud no texto de 1908, é a capacidade de captar e narrar, de forma imaginativa e estética, as experiências emocionais vividas. O psicanalista, assim como o escritor, considerando a diferença dos contextos, precisa ter a mesma habilidade de expressar o vivido: transformar a experiência em estado bruto (elemento beta) em uma forma narrativa comunicável (BION, 1992/2000).
A narrativa do analista tem a intenção de gerar no analisando a abertura para novos sentidos, ainda não pensados, ainda não sonhados. Podemos pensar que a literatura, além da psicanálise, também desenvolve e revela essa habilidade humana - a função psicanalítica da mente. E, talvez por esse motivo, entre possíveis outros, a literatura sempre esteve presente na psicanálise, de diferentes maneiras.
Encontro no livro Freud e a literatura, escrito por Mango e Pontalis o seguinte:
A Dichtung30 parece designar um processo de elaboração psíquica que consiste em transformar as imagens sensoriais, os sentimentos e as afecções da alma humana em figuras de linguagem, um dizer poético que preserva em si mesmo o frescor das experiências primitivas e originárias (MANGO; PONTALIS, 2013, p. 18).
E mais à frente31,
Se o pensamento freudiano subsiste como obra, é pela força de suas descobertas intelectuais e por habitar poeticamente a língua. Habitar poeticamente uma língua significa que o pensamento encontra a poiesis das palavras, num abandono mútuo, numa fecundidade amorosa (...) (MANGO; PONTALIS, 2013, p. 23).
Quando é capaz de narrar de forma inédita uma experiência emocional vivida, o escritor se aproxima do analista, que precisa ter essa mesma habilidade: captar, conter, sonhar, transformar e narrar a experiência emocional vivida na sala de análise. Trata-se da manifestação princeps da função psicanalítica da personalidade. Quando essa experiência é compartilhada entre analista e analisando e talvez, também, entre escritor e seu leitor, cria-se uma área de intimidade; algo assustador, desconcertante, raro e gratificante: "Eu o conheço muito bem, o senhor ficaria surpreso". Tanto o analista, como o escritor, torna-se, de forma paradoxal, um íntimo desconhecido, como dito pela atenta senhora, leitora dos livros de Pamuk.
No entanto, essas duas duplas são diversas e pertencem a contextos próprios. O escritor compartilha essa experiência por meio dos seus livros, como relatou a leitora perspicaz de Pamuk. O analista constrói junto com o seu analisando uma narrativa que é transformadora, dentro do setting analítico, criando uma situação de intimidade inédita na história da humanidade - só passível de existir nesse contexto, no qual o analista se despe de si mesmo em um estado de disponibilidade mental32 para pensar os sonhos ainda não sonhados de seu paciente. Quando é capaz de sonhar, a dupla analítica tem a potência transformadora do encontro humano, da intimidade entre duas mentes, expandindo o campo daquilo que pode ser pensado.
Ogden e Ogden (2014), ao escreverem acerca da experiência da escrita, destacam:
...um escritor não consegue criar em sua escrita algo que é incapaz de vivenciar em sua própria vida - um autor, ele afirma, não pode escrever efetivamente sobre experiências emocionais, ele deve escrever a partir delas: elas precisam estar vivas no autor (OGDEN, B.; OGDEN, T., 2014, p. 39).
Essa observação me parece semelhante à de Pamuk, para quem o relato do escritor se dá a partir de suas experiências emocionais, de suas sensações. A narrativa do analista também é construída a partir da experiência de estar com aquele paciente, captando de forma imaginativa a experiência vivida no campo analítico, por meio da reverie / função alfa.
Como desenvolvido neste artigo, o escritor e o analista, resguardadas as diferenças, têm a habilidade de expressar e narrar o pensamento onírico da vigília, captado por meio da rêverie / função alfa; ou seja, da função psicanalítica da personalidade. Dessa forma, um leitor perspicaz e atento pode compartilhar da intimidade da experiência do escritor, como relatado no texto de Pamuk:
No entanto, quando uma leitora inteligente me disse que sentira, nos detalhes do romance, a experiência da vida real que "os tornavam meus", eu me senti embaraçado como alguém que confessou coisas íntimas a respeito da própria alma, como alguém cujas confissões escritas foram lidas por outra pessoa (PAMUK, 2010, p. 41-42).
À guisa de conclusão
O campo analítico, assim pensamos, é favorecedor da prática do encontro humano transformador, do exercício da função psicanalítica da personalidade. Função que é realizada na intimidade privilegiada da sala de análise, emoldurada pelo setting - a beleza do método freudiano, que criou uma relação inédita na história da humanidade.
A literatura, indubitavelmente mais antiga que a psicanálise, e fazendo parte desta desde os seus primórdios, talvez seja uma excelente forma de o analista exercitar a sua escuta analítica, e apurar sua função psicanalítica da personalidade, como ressaltam Ogden e Ogden (2014):
A pergunta "Como é ler esse poema?", enfoca a experiência de leitura, a experiência de como é ler, escutar, ter o orador/escritor falando (ou escrevendo) para você. Acredito haver uma sobreposição importante e interessante entre a pergunta "Como é ler esse poema?" e a questão "Como é estar com esse paciente?"
Finalizando, tanto a experiência entre o autor e seu leitor, como, por analogia, entre o analista e o analisando, a relação de intimidade e proximidade que acontece nesses dois diferentes contextos, é favorecedora de transformações. Tais transformações se dão por meio da função psicanalítica da personalidade: a capacidade humana de transformar as experiências emocionais, inicialmente em estado bruto, em narrativas, a do analista e a do escritor, na busca humana incessante pela verdade e pelo sentido daquilo que é vivido.
Referências
BARANGER, M.; BARANGER, W. (1961-1962). La situación analítica como campo dinâmico. In: BARANGER, M.; BARANGER, W. Problemas del campo psicoanalítico. Buenos Aires: Ediciones Kargieman, 1993. [ Links ]
BION, R. W. (1959). Ataques ao elo de ligação. In: SPILLIUS, E. B. Melanie Klein hoje: desenvolvimento da teoria e da técnica. Rio de Janeiro: Imago, 1991. v. 1, p. 95-109. [ Links ]
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Artigo recebido em: 15/01/2019
Aprovado para publicação em: 29/04/2019
Endereço para correspondência
Marina F. R. Ribeiro
E-mail: marinaribeiro@usp.br
*Psicanalista. Doutora em Psicologia Clínica pela Universidade de São Paulo (USP). Professora do Programa de Pós-graduação em Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IPUSP), São Paulo, SP, Brasil.
1Agradeço a colaboração de Júlio Fochtengarten, Elisa M. U. Cintra e Claudia M. Perrotta feitas ao manuscrito do texto. Uma primeira versão deste trabalho foi apresentada no Seminário Internacional Diálogos Psicanalíticos Contemporâneos Bion-Laplanche: do afeto ao pensamento que ocorreu no dia 31 de agosto de 2018 no IPUSP. Uma versão modificada e parcial foi apresentada no Congresso da FEBRAPSI em Belo Horizonte, junho de 2019.
2Atualmente é comum os analisandos buscarem informações na internet sobre seus analistas, mas são apenas informações, não é o conhecimento íntimo que se estabelece na sala de análise.
3Um campo baseado no modelo onírico (KATZ, 2017).
4Conceito de Bion, compreendido com um estado de perturbação mental, de turbulência, gerado no encontro com o outro.
5I am here supposing that projective identification is an early form of that which later is called a capacity for thinking (BION, 1962/1991, p. 37)
6O termo função onírica alfa aparece apenas no livro Cogitações (1992/2000), sendo que em outros textos, Bion usa a nomeação função alfa. A intenção de Bion era manter o conceito como uma incógnita, e não saturar de possíveis significados; por isso, o termo função alfa é o que predomina na sua obra.
7No dicionário de López Corvo (2008, p. 293) encontramos o verbete como reverie materna.
8Ferro (2017, p. 153) escreve: "El psicoanálisis es un proceso de terrible simplicidad: habla de cómo nosotros, estando juntos, podemos metabolizar la brutalidad de la realidad".
9A expressão "o enigmático do elemento beta" é usada no livro Bion em nove lições. Lendo transformações (FIGUEIREDO; TAMBURRINO; RIBEIRO, 2011).
10Cesura é um conceito de Bion, no entanto, no texto a palavra está sendo usada com o significando de uma narrativa do analista sem quebras ou cortes.
11<https://www.pensador.com/frase/MTE4MTg3Mg/>. Acesso em: 02 jan. 2019.
12Destaco que essa compreensão abre um vasto campo de discussão que foge do escopo deste artigo, como o fato de Bion ter proposto o redimensionamento da insígnia da atenção flutuante para sem memória, sem desejo e sem compreensão. Penso que a insígnia técnica de Bion é uma complexização da expressão atenção flutuante.
13Chuster (2019) passa a citar os conceitos como polos de um espectro: reverie / função alfa; estou adotando a mesma compreensão e apresentação.
14Podemos compreender essa narrativa transformadora a partir do que Bion (1970/2014) denominou "Linguagem de Êxito".
15Interpretação narrativa é um conceito usado por Antonino Ferro (2003), se refere a possibilidade de fazer uma interpretação por meio da narração de algo, uma história, uma cena, um filme, um texto, etc., a partir da reverie / função alfa que surge na sessão.
16A prosa poética, que tem a metáfora como um dos seus principais componentes, entre outros, é via régia para os elementos oníricos (SHARPE, 1937/1971).
17Ribeiro, M. F. R. (2003), A "conversa" analítica: as palavras são as pessoas que as pronunciam.
18Tradução livre.
19Segundo Katz (2017) podemos compreender o desenvolvimento do conceito de campo em três ondas: a primeira onda baseada no trabalho do casal Baranger, denominada de "modelo mitopoético"; a segunda, a partir dos trabalhos de Antonino Ferro, o "modelo onírico"; e a terceira, baseada no trabalho de psicanalistas americanos, o "modelo plasmático". O campo analítico aqui referido pertence ao modelo mitopoético do casal Baranger, acrescido da junção que Antonino Ferro faz do conceito de campo com o pensamento de Bion, construindo o que Katz denomina de modelo onírico do campo, ou seja, estamos trabalhando a partir das duas primeiras ondas conceituais.
20Chuster e colaboradores (2003, p. 170) escrevem: "Literatura e arte são como 'sonhos diurnos'", e desde Freud há poucos críticos literários que não empregam a psicanálise para interpretar obras de arte".
21Bion (2017, p. 49) escreve: "Lembro da citação de Blanchot, que conheci por intermédio de André Green: 'La réponse est le malheur de la question' (minha tradução, com a qual Green concordou, foi 'A resposta é a doença, ou desgraça da questão'). Em outras palavras, é isso que assassina a curiosidade.
22Ressalto que a discussão que levanto aqui é dentro do campo da psicanálise e não da literatura, ou da crítica literária.
23"I propose it as a term for use in the practice of "psycho-analytic function of the personality" but otherwise it should be designated simply "function" and given the sign Ψ. Alpha-function is a factor of Ψ ". (BION, 1962/1991, p. 89)
24Chuster (2018), comunicação pessoal.
25Bion propõe três vínculos: K (knowledge), L (love) e H (hate).
26Conceito que tem raízes na postulação do impulso epistemofílico feita por Melanie Klein.
27Ogden se inspira no texto de Freud (1911/1980). Os dois princípios do funcionamento mental, referência importante na obra de Bion.
28Tradução livre.
29"Nesse sentido, para Bion, o pensar é sonhar, a forma fundamental de processamento psíquico, que pode ser estudado desde o âmbito materno até sua extensão nas mais diversas relações. Para tal Bion ampliou o conceito de reverie dando a ele o estatuto constante de incógnita. Ele criou o termo função-alfa,..." (CHUSTER e cols., 2011, p. 99).
30"O termo Dichter, de uso corriqueiro na língua alemã, designa, em um sentido amplo, o escritor, o autor, o narrador, o dramaturgo, o criador de obras literárias; ou, num sentido mais específico, o poeta, o fazedor de poemas" (MANGO; PONTALIS, 2013, p. 13). O título original do artigo de Freud (1908) é Der dichter and das phantasieren.
31Scarfone, D. (2019), nos comentários aos textos de Cassorla e Coelho Júnior: "... o campo analítico, isto é, o sistema autopoético que chamamos psicanálise, existe por si mesmo. Foi necessário o gênio de Freud para descobri-lo, por tentativa e erro, através de método apropriado".
32Sem memória, sem desejo e sem necessidade de compreensão, como escreveu Bion (1967/2014).