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Revista Mal Estar e Subjetividade

versão impressa ISSN 1518-6148

Rev. Mal-Estar Subj. vol.9 no.4 Fortaleza dez. 2009

 

EDITORIAL

 

Da culpa, da desculpa e da ausência de culpa

 

 

A importância de pensarmos os elementos que causam as origens do mal-estar é de fundamental importância para uma compreensão da posição do sujeito que comparece na cena social do cotidiano.

Entre os elementos de origem, conhecemos um que serve - por excelência - de baliza dos atos do sujeito, no espaço subjetivo e sua posição no laço social: a culpa.

A culpa está na origem mítica e constitutiva da forma como um sujeito se posiciona, como Freud nos alerta em vários momentos de sua obra.

Em 1908, quando publica A moral sexual civilizada, destaca a sexualidade presa na lente do social e da normatividade. A posição sexual do sujeito alcança o laço seja qual for a perspectiva de análise aplicada. A consequência, é que o sujeito, iniludível portador de uma sexualidade diferenciada das demais espécies, se enreda nos gradientes formados pelo desejo e pela pulsão, pelas normas e pela transgressão, enfim, pela vida e pela morte. Dito de outra forma, o sexual, por ser tomado por uma moral, envolve escolhas, atos e culpa.

Como forma de sustentar a tensão gerada por esta constante - a posição subjetiva nunca satisfeita - as marcas da culpa se fazem presentes no retorno do ato. Como o que retorna de uma ação específica do sujeito, a culpa diz, sobretudo, do lugar ocupado pelo sujeito ante o outro e a sociedade. Mas, indica a forma como a baliza está sendo posta em cena em nome de quem representa o elemento regulador: o discurso.

Em 1910, em Totem e Tabu, Freud formaliza o tratado mítico pelo qual o sujeito há de se ater com a culpa dos seus atos. Curiosamente, este é um texto que articula desejo, amor, transgressão e culpa. De todos estes elementos a culpa será tomada como elemento motor e o que faculta a construção de uma sustentação para o sujeito, sobre o ato concretizado ou fantasiado.

A questão que nos ocupa tanto hoje é exatamente a pergunta pelo arrependimento. Esta ainda é uma matéria de preocupação do sujeito investido de cidadania? O que falta para lançar a centelha em uma cadeia que vai do ato ao arrependimento, da culpa à desculpa?

Em 1930, em o Mal-estar na Civilização o que fica claro, entre outras questões, é um descompasso entre a civilização e a força pulsional do sujeito para alcançar a satisfação diante do se que coloca como normativo. Enfim, há um descompasso, mas há a possibilidade de construção de saídas que envolvam a constante e as variáveis da arte de viver em laço social.

Com esta descrição entendemos que a arte de viver em laço está diretamente ligada à questão da falta-em-ser que representa uma constante a que nos referimos. Quando dissemos que o discurso é um regulador é porque também sabemos que agem de forma a permitir, proibir, limitar, e o fazem em função desta marca.

Assim, se perguntamos hoje pela culpa, não parece ser esta a pergunta mais adequada, pois é difícil que um sujeito possa existir sem ela, pelo fato de continuar a viver no plano do social. A pertinência seria maia consistente se esta pergunta se dirige ao discurso e sua inoperância para que ela seja outra vez tomada como um ponto da subjetividade a ser retificadora da posição ocupada diante do ato.

Este número está dedicado a esta questão. Que possamos avançar sobre o discurso da nossa época e identificar o que de moral subjaz, o que de mítico pode ser recuperado, o que de civilidade pode ser restaurada.

 

Henrique Figueiredo Carneiro
Editor e Organizador

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