SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.6 número2Autoeficácia para Escolha Profissional: Teoria, Pesquisas e AvaliaçãoSomos o que Lembramos e Também o que Resolvemos Esquecer índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

artigo

Indicadores

Compartilhar


Psicologia em Pesquisa

versão On-line ISSN 1982-1247

Psicol. pesq. vol.6 no.2 Juiz de Fora dez. 2012

https://doi.org/10.5327/Z1982-12472012000200011 

http://dx.doi.org/10.5327/Z1982-12472012000200011

ARTIGOS

 

Resiliência Familiar e Desenvolvimento Humano: Análise da Produção Científica

 

Family Resilience and Human Development: Analysis on Scientific Production

 

 

Mayse Itagiba Rooke; Nara Liana Pereira-Silva

Universidade Federal de Juiz de Fora

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Estudos sobre resiliência familiar têm aumentado nos últimos anos, mas ainda são escassos. O objetivo do presente trabalho é apresentar um panorama geral a respeito da produção científica na área de resiliência familiar, tanto no âmbito nacional quanto internacional, a partir da análise dos resumos publicados entre 1990 e 2011, focalizando: assuntos investigados, tamanho da amostra, instrumentos/técnicas empregados para a coleta de dados. Realizou-se um levantamento nas bases de dados PsycInfo, SpringerLink, Wiley Online Library e BVS-Psi, tendo sido identificadas 140 publicações, sendo 43% artigos de pesquisa, 29% artigos teóricos/revisão de literatura, 18% livros/capítulos de livros e 10% dissertações/teses. Os resultados apontam para a necessidade de ampliar os estudos sobre resiliência familiar, utilizando maior número de participantes e instrumentos/técnicas combinados para a coleta de dados.

Palavras-chave: Resiliência familiar; família; pesquisa científica.


ABSTRACT

Studies on family resilience have increased in recent years, but they are still scarce. The main goal of this study is to present an overview of national and international scientific production in the area of family resilience by analyzing abstracts published between 1990 and 2011 according to the following criteria: research topics, sample size, instruments/techniques used for data collection. The databases PsycInfo, SpringerLink, Wiley Online Library and BVS-Psi were searched, and 140 publications were found, being 43% research articles, 29% theoretical papers/literature review, 18% books/book chapters and 10% theses/dissertations. The results suggest the need to expand the studies on family resilience, and to use a greater number of participants and of instruments/techniques combined for data collection.

Keywords: Family resilience; family; scientific research.


 

 

Os estudos sobre a família na perspectiva do desenvolvimento humano datam de 1950. No entanto, houve avanços, predominantemente nos últimos 16 anos, por pesquisadores da área, que pode ser considerada uma modalidade recente de pesquisa.

A literatura aponta que a família é um contexto de desenvolvimento humano, tanto podendo favorecer quanto dificultar e/ou impedir este processo (Cerqueira-Silva, Dessen & Costa-Júnior, 2011; Dessen & Braz, 2005; Pinheiro & Biasoli-Alves, 2008; Poletto & Koller, 2008; Weber, 2008). Dessen e Braz (2005) salientam que este processo deve ser considerado um fenômeno complexo, visto que é contínuo ao longo do tempo e composto por fatores individuais - traços de personalidade e características físicas - e ambientais, de acordo com o meio social em que a pessoa se insere. O indivíduo é um organismo vivo e ativo na interação com o ambiente, onde influencia e é influenciado, e os seus subsistemas — cognitivo, emocional, fisiológico, perceptual e neurobiológico — interagirem (Cerqueira-Silva et al., 2011).

As investigações acerca da relação entre desenvolvimento humano e família já têm privilegiado mais as interações do que os aspectos individuais do comportamento (Dessen, 1997). Além disso, esses estudos têm dado ênfase à influência recíproca entre os membros que não somente compõem as díades, mas também as tríades, tétrades, etc., o que possibilita melhor compreensão das relações familiares, bem como do estudo da resiliência familiar.

A resiliência vem sendo investigada na psicologia como área de interesse e pesquisa há aproximadamente 30 anos (Poletto & Koller, 2008; Rutter, 1981; 1985; 1993), com maior frequência de estudos publicados na última década (Morais & Koller, 2004). Destaca-se, entretanto, a escassez de trabalhos, especialmente no Brasil, evidenciando carência tanto empírica quanto de definição teórica (Yunes, 2003).

Souza e Cerveny (2006) apontam que os primeiros estudos sobre resiliência tiveram início com pesquisas sobre a superação de enfermidades, tendo enfoque em eventos não normativos do ciclo de vida. Posteriormente, alguns pesquisadores se dedicaram também ao estudo de eventos normativos, envolvendo a criança pré-escolar e o adolescente. O foco eram os modos de enfrentamento e superação dos desafios impostos pela convivência familiar, escolar e urbana.

É consenso na literatura que o conceito de resiliência está concatenado a duas condições básicas: de um lado, o enfrentamento de uma experiência adversa, tendo implicações negativas sobre a saúde e o desenvolvimento humano; de outro, uma resposta positiva diante do sofrimento e da agressão a que a pessoa está exposta (Charepe & Figueiredo, 2010; Poletto & Koller, 2008; Silva, Silva, Dias, Medeiros, Silva & Botelho 2009; Silva, Lacharité, Silva, Lunardi & Lunardi Filho, 2009; Yunes & Szymanski, 2001; Walsh, 1996, 2002). Além disso, a resiliência é entendida não somente como característica do indivíduo, uma capacidade inata, mas, sobretudo, a partir da interação dinâmica entre as características individuais e a complexidade do contexto social (Charepe & Figueiredo, 2010; Junqueira & Deslandes, 2003; Morais & Koller, 2004; Poletto & Koller, 2006; Seligman & Csikszentmihalyi, 2000; Silva, 2003; Yunes, 2003, 2006; Yunes & Szymanski, 2001). Nessa perspectiva, o foco não está no indivíduo apenas, mas no aspecto processual da resiliência, sendo esta compreendida sob as óticas sistêmica, ecológica e desenvolvimental (Carvalho, Morais, Koller & Piccinini, 2007; McCubbin & McCubbin, 1988; Walsh, 1996, 2002, 2005). Destaca-se, ainda, que, dependendo da etnia, há diferenciações na compreensão da resiliência. Assim, para os anglo-saxões é um fenômeno relacionado à resistência ao estresse, enquanto para autores de língua latina trata-se de um fenômeno relativo aos processos de recuperação e superação (Brandão, Mahfoud & Gianordoli-Nascimento, 2011).

Partindo da compreensão da resiliência como interação do indivíduo com o seu ambiente, Poletto, Wagner e Koller (2004) ressaltam a importância de considerar a multiplicidade e complexidade das variáveis nos estudos sobre o tema. No tocante à resiliência familiar, apesar de a literatura enfatizar os aspectos deficitários e negativos da convivência na família, esta é concebida como tendo potencialidades para promover o desenvolvimento e a saúde de seus membros (Black & Lobo, 2008; Charepe & Figueiredo, 2010; Masten, 2001; Silva, Lunardi, Lunardi Filho & Tavares, 2005; Yunes, 2003; Yunes & Szymanski, 2006; Walsh, 1996). Para Black e Lobo (2008), ela retrata o sucesso no enfrentamento de situações adversas pelos membros familiares. Nessa perspectiva, este construto está baseado na convicção de que todas as famílias têm pontos fortes e potenciais para o crescimento. Walsh (1996) defende ainda que estes membros são capazes de lidar de forma mais eficaz com períodos de crises ou tensões persistentes, englobando tanto o ambiente familiar quanto contextos fora dele.

É importante ressaltar que a resiliência familiar envolve mais do que a simples administração de situações de adversidades e sobrevivência (Walsh, 2002). A sua estrutura pode também ser uma valiosa forma de nortear esforços e intervenções no campo da prevenção da saúde, com o intuito de apoiar e fortalecer as famílias vulneráveis em crise (Walsh, 1996, 2002). Walsh afirma que a forma como uma família enfrenta e lida com uma situação adversa fará com que os seus membros e sua unidade sejam influenciados em suas adaptações imediatas e em longo prazo. Nesse sentido, a resiliência familiar tem efeito duradouro e prolongado, podendo gerar implicações no curso do desenvolvimento do grupo.

Segundo Walsh (2002), a resiliência familiar é mais bem identificada em famílias que apresentam cuidados constantes dos responsáveis pelas crianças, relacionamento de qualidade entre pais e filhos, dinâmica familiar flexível e com comunicação, coesão familiar, apoio mútuo, envolvimento paterno na educação das crianças, práticas educativas com afeto, reciprocidade, trabalho em equipe, estabilidade, confiança e liderança compartilhada. Além das características acima mencionadas, Black e Lobo (2008) incluem a adoção de uma perspectiva positiva da família diante dos eventos/desafios, a espiritualidade, a harmonia familiar, a boa gestão financeira e as redes de apoio.

Entende-se que é inegável a relação entre a resiliência familiar e o desenvolvimento humano, especialmente pelo fato de a primeira fortalecer potencialidades e recursos das famílias para superação de crises em desafios futuros, podendo ativar características da pessoa diante do contexto de risco ou de situação adversa. Nesse sentido, torna-se coerente entender o desenvolvimento humano como resultando da interação das características constitucionais da pessoa e do ambiente (Bronfenbrenner, 1999; Bronfenbrenner & Morris, 1998). Tendo em vista estes aspectos, o presente artigo objetiva apresentar um panorama geral a respeito da produção científica na área de resiliência familiar, tanto no âmbito nacional quanto no internacional, a partir da análise de resumos publicados entre 1990 e 2011 tendo como foco os temas mencionados, tamanho da amostra e instrumentos/técnicas empregados para a coleta de dados.

 

Método

Foi realizada uma pesquisa de levantamento bibliográfico mediante a busca eletrônica de artigos nas seguintes bases de dados: PsycInfo, SpringerLink, Wiley Online Library e BVS-PSI. O período abrangido foi de 1990 a 2011. O foco foi na produção a partir de 1990 por essa data ser um marco histórico para o início dos estudos sobre resiliência com enfoque na ciência psicológica (Yunes, 2003).

Este levantamento priorizou as palavras-chave família e resiliência; resiliência familiar; e family resilience, devendo elas estar presentes no título do trabalho e no objetivo. O critério foi utilizado para garantir que os estudos tivessem efetivamente a resiliência familiar como foco, e não apenas como um aspecto derivado da análise dos dados.

Depois de realizado o levantamento nas bases de dados, nas quais foram encontrados 140 trabalhos científicos especificamente sobre resiliência familiar, os respectivos resumos foram analisados. Deles extraíram-se informações e dados relevantes para a composição do artigo. Ressalta-se que não houve seleção de entrevistas, reportagens, revisões de livros e relatos de experiência.

Procedimentos

Inicialmente, foi realizada a seleção das publicações, segundo a busca nas bases citadas, que tratavam do tema resiliência familiar. Em seguida, procedeu-se à análise de concordância entre juízes no que se refere à seleção dos resumos. Houve comparação entre bancos de dados construídos por dois juízes, encontrando 98% de concordância. Seguindo-se este procedimento, foi construído um banco de dados com 140 resumos de trabalhos científicos sobre resiliência familiar.

Posteriormente, os resumos selecionados foram lidos e classificados em dois grupos: estrangeiros e nacionais. A investigação analisou as seguintes informações: 1) tipo de publicação: artigo de pesquisa, artigo teórico ou revisão de literatura, livros e capítulos de livros, teses e dissertações; 2) assunto investigado: a) resiliência familiar e vulnerabilidade, b) resiliência em famílias com necessidades especiais, c) resiliência familiar (RF) e desenvolvimento humano (DH), d) conceitos de RF; 3) instrumentos/técnicas de coleta de dados: entrevistas, questionários, observação, escalas; 4) tamanho da amostra.

No que tange aos temas investigados, foi realizada uma análise de conteúdo (Bardin, 2011) de cada trabalho para a construção das categorias e subcategorias de assuntos. Posteriormente, elas foram revisadas, efetuando-se, então, a concordância entre juízes.

 

Resultados

Foi encontrado um total de 140 trabalhos científicos na área de resiliência familiar. Destes, 91,4% (n=128) são investigações estrangeiras e 8,6% (n=12) nacionais. A Tabela 1 apresenta o tipo de publicação de acordo com a fonte: estrangeira e nacional. Os artigos de pesquisa foram mais frequentes (n=60, 43%), seguidos por artigos teóricos/revisão de literatura (n=41, 29%), capítulos/livros (n=25, 18%) e teses/dissertações (n=14, 10%).

No que tange à distribuição das investigações ao longo dos anos, a Tabela 2 apresenta sua distribuição. Verifica-se que, ao longo dos anos, há um aumento da produção, especialmente a partir de 2000. Os anos 2002 (n=23, 16,4%) e 2011 (n=26, 18,6%) foram os com maior frequência de trabalhos publicados.

 

 

Assuntos Investigados nos Trabalhos Científicos

Os textos encontrados foram agrupados por assunto investigado. A maioria é referente à "resiliência familiar e vulnerabilidade" (n=66, 51,6% – estrangeiros; n=6, 50% – nacionais), seguidos por trabalhos que focalizam a "resiliência em famílias com necessidades especiais" (n=38, 29,7% – estrangeiros; n=1, 8,3% – nacionais), "conceitos de RF" (n=20, 15,6% – estrangeiros; n=3, 25% – nacionais), "RF e DH" (n=4, 3,1% – estrangeiros; n=2, 16,7% – nacionais).

Cada trabalho, de acordo com a categoria geral dos assuntos acima mencionada, foi analisado segundo as subcategorias. Na categoria "resiliência familiar e vulnerabilidade", o assunto mais frequente refere-se a "famílias em situação de risco" (n=36, 50%), seguido por "estratégias de enfrentamento" (n=18, 25%).

Tanto no Brasil quanto no exterior, a subcategoria mais verificada trata das "famílias em situação de risco" (n=31, 47% – artigos estrangeiros; n=5, 83,4% – nacionais). O assunto "resiliência em famílias com necessidades especiais" foi mais frequente entre os estudos estrangeiros (n=38).

As subcategorias "doenças" (n=16, 42,1% – estrangeiros; n=0 – nacionais) e "deficiências" (n=14, 36,8% – estrangeiros; n=1, 100% – nacionais) são mais frequentemente investigadas. No que tange o assunto "resiliência familiar e desenvolvimento humano" são investigadas: "resiliência familiar e promoção de saúde" (n=3, 75% – estrangeiros; n=1, 50% – nacionais) e "contextos ecológicos e DH" (n=1, 25% – estrangeiros; n=1, 50% – nacionais). Já em relação aos "conceitos de RF", há estudos apenas sobre o "conceito geral da resiliência familiar", tanto no Brasil (n=3) quanto no exterior (n=20). A Tabela 3 apresenta as subcategorias considerando cada categoria geral de assuntos.

Tamanho da Amostra

Para a caracterização da amostra utilizada nos trabalhos empíricos foram consultados os resumos dos artigos de pesquisa e de teses/dissertações com característica também empírica. Identificaram-se estudos que empregaram uma família (estudos de caso; n=7 – estrangeiros) como os com mais de 1 mil famílias (n=3 – estrangeiros). No Brasil, há pesquisas com 2 (n=1, 16,7%), 3 (n=1, 16,7%), 4 (n=1, 16,7%) e 12 (n=3, 50%) famílias.

A média da dimensão das amostras foi 141,80; e o desvio padrão, 285,77. É importante destacar que não foram encontradas informações sobre a amostra em dez resumos.

Instrumentos/Técnicas de Coleta de Dados

Com relação aos instrumentos e técnicas para coleta de dados, verifica-se predominância da utilização de uma técnica/instrumento (41,9%; por exemplo: entrevista, questionário ou narrativas), seguida pela utilização de duas técnicas (11,5%; por exemplo: observações e entrevistas, entrevistas e escala). O uso de três ou mais técnicas é verificado em seis estudos (7,8%; por exemplo: questionário, entrevista e relatório). Quanto ao tipo de instrumento/técnica utilizado, houve grande variedade, como pode ser observado na Tabela 4.

 

Discussão

A análise efetuada com base no levantamento bibliográfico, embora não seja exaustiva, proporcionou uma visão geral a respeito da produção científica, tanto estrangeira quanto nacional, no que tange a resiliência familiar.

É preciso ressaltar as limitações decorrentes da redação dos trabalhos/resumos consultados, que nem sempre continham as informações necessárias, tais como a quantidade da amostra e os instrumentos/técnicas utilizados. Além disso, na busca realizada, não foram identificados livros/capítulos nacionais, provavelmente devido ao fato de os mesmos não estarem indexados nas bases de dados, mas não por ausência de produção desse tipo de texto.

O maior percentual de trabalhos estrangeiros aponta a escassez de estudos no Brasil. Aliado a este aspecto, a distribuição dos trabalhos ao longo dos anos, com aumento de investigações a partir de 2000, demonstra que esta é uma área recente e que apresenta lacunas no que se refere à produção do conhecimento. Assim, a descrição aqui fornecida deve ser considerada uma tendência geral da produção científica na área de resiliência familiar.

Os resultados indicam predominância de publicações que tratam da "resiliência e vulnerabilidade" e da "resiliência em famílias com necessidades especiais". Este fato reflete a tendência da literatura na área da resiliência de investigar este relacionado ao enfrentamento de uma situação adversa e a respectiva resposta positiva (Charepe & Figueiredo, 2010; Poletto & Koller, 2008; Silva & Silva et al., 2009; Yunes & Szymanski, 2006; Walsh, 1996). Destaca-se a necessidade de investigações que focalizem, além de situações adversas e de risco, as potencialidades e os processos desencadeadores do modo saudável das famílias lidarem com situações de crises normativas do ciclo de vida familiar (Souza & Cerveny, 2006).

Além dos temas acima mencionados, ressalta-se que os estudos acerca do assunto "conceitos de RF" refletem a necessidade de se ter clareza e objetividade sobre esse construto, uma vez que estes aspectos são fundamentais para o planejamento de pesquisas, bem como de intervenções. Por se tratar de uma área de interesse e pesquisa considerada recente na Psicologia, os trabalhos conceituais e teóricos apresentam um papel importante.

Os assuntos investigados com menos frequência foram aqueles que relacionaram a RF e o desenvolvimento humano, sugerindo a utilização de abordagens mais abrangentes sobre o assunto, o que se torna relevante do ponto de vista das implicações dos diferentes contextos de desenvolvimento. O uso de abordagens que permitam ampliar o escopo de análise para além do microssistema, como é proposto por Bronfenbrenner (1979/1996, 1999, 2011), é fundamental, uma vez que os estudos têm indicado a inter-relação de diferentes variáveis como responsáveis pela resiliência familiar (Poletto et al., 2004). A consideração de diversos sistemas na compreensão dos processos de desenvolvimento representa um importante salto teórico e metodológico para o entendimento do desenvolvimento humano, conforme ressaltam Morais e Koller (2004). De acordo com essa perspectiva, os contextos desempenham papel importante na proteção e promoção de saúde e de resiliência (Silva & Lacharité et al., 2009).

Destaca-se a necessidade do uso de perspectivas teórico-metodológicas coerentes com a multiplicidade de famílias da atualidade. Esta diversidade tem sido ressaltada por Petzold (1996), abrangendo a maior parte das formas de famílias existentes (Dessen, 2010). Nesse sentido, a resiliência familiar deve ser investigada considerando os diferentes arranjos e focalizando o desenvolvimento humano, já que ela é um fator que promove o desenvolvimento do grupo e de cada um de seus membros.

No tocante ao tamanho da amostra das pesquisas, verifica-se variação na quantidade de famílias investigadas, sendo que nos estudos estrangeiros há tendência de uso de amostras maiores.

Em relação ao uso de instrumentos/técnicas para a coleta de dados, houve predomínio da utilização de apenas um deles, especialmente na produção internacional, sendo a entrevista a mais frequente. Já no Brasil, verificou-se maior presença de estudos que utilizaram dois ou mais. A combinação de instrumentos/técnicas tem sido ressaltada pela literatura por oferecer maior possibilidade de compreensão do fenômeno estudado (Dessen, 2010; Dessen & Lewis, 1998). Observa-se que em grande parte dos resumos (n=28) não há descrição dos instrumentos utilizados.

Ressalta-se a necessidade de estudar a resiliência familiar levando em conta um número maior de famílias, especialmente no Brasil. É fundamental destacar ainda a importância de se investigar esse construto fundamentado pela abordagem ecológica, a qual focaliza não somente o grupo familiar como um contexto de influência no desenvolvimento da pessoa, seja ela criança, adolescente, adulta ou idosa, mas também os demais.

 

Referências

Bardin, L. (2011). Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70.         [ Links ]

Black, K., & Lobo, M. (2008). A conceptual review of family resilience factors. Journal of Family Nursing, 14, 33-55.         [ Links ]

Brandão, J. M., Mahfoud, M., & Gianordoli-Nascimento, I. F. (2011). A construção do conceito de resiliência em psicologia: discutindo as origens. Paidéia, 21, 263-271.         [ Links ]

Bronfenbrenner, U. (1996). A ecologia do desenvolvimento humano: experimentos naturais e planejados. Porto Alegre: Artes Médicas. (Original publicado em 1979).         [ Links ]

Bronfenbrenner, U. (1999). Environments in developmental perspective: Theoretical and operational models. In S. L. Friedman & Wachs, T. D. (Orgs.), Measuring environment across the life span: emerging methods and concepts, (pp. 3-28). Washington, DC: American Psychological Association.         [ Links ]

Bronfenbrenner, U. (2011). Bioecologia do desenvolvimento humano: tornando os seres humanos mais humanos. Porto Alegre: Artmed. (Original publicado em 2005).         [ Links ]

Bronfenbrenner, U., & Morris, P. A. (1998). The ecology of developmental processes. In W. Damon & M. Lerner (Eds.), Handbook of child psychology, (Vol. 1, pp. 993-1027). New York: John Wiley &         [ Links ] Sons.

Carvalho, F. T., Morais, N. A., Koller, S. H., & Piccinini, C. A. (2007). Fatores de proteção relacionados à promoção de resiliência em pessoas que vivem com HIV/AIDS. Caderno de Saúde Pública, 23, 2023-2033.         [ Links ] 

Cerqueira-Silva, S., Dessen, M. A., & Costa Júnior, A. L. (2011). As contribuições da ciência do desenvolvimento para a psicologia da saúde. Ciência & Saúde Coletiva, 16, 1599-1609.         [ Links ]

Charepe, Z. B., & Figueiredo, M. H. J. S. (2010). Promoción de la esperanza y resiliencia familiar: prácticas apreciativas. Investigación y Educación en Enfermería, 28, 250-257.         [ Links ]

Dessen, M. A. (1997). Desenvolvimento familiar: transição de um sistema triádico para poliádico. Temas em Psicologia, 3, 51-61.         [ Links ]

Dessen, M. A. (2010). Estudando a família em desenvolvimento: desafios conceituais e teóricos. Psicologia: Ciência e Profissão, 30, 202-219.         [ Links ]

Dessen, M. A., & Braz, M. P. (2005). A ciência do desenvolvimento humano: tendências atuais e perspectivas futuras. In M. A. Dessen & A. L. Costa Jr. (Orgs.), A família e suas inter-relações com o desenvolvimento humano, (pp. 113-131). Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Dessen, M. A., & Lewis, C. (1998). Como estudar a "família" e o "pai"?. Paidéia, 8, 105-121.         [ Links ]

Junqueira, M. F. P. S., & Deslandes, S. F. (2003). Resiliência e maus-tratos à criança. Cadernos de Saúde Pública, 19, 227-335.         [ Links ]

Masten, A. S. (2001). Ordinary magic. Resilience processes in development. American Psychologist, 56, 227-238.         [ Links ]

McCubbin, H. I., & McCubbin, M. A. (1988). Typologies of resilient families: emerging roles of social class and ethnicity. Family Relations, 37, 247-254.         [ Links ]

Morais, N. A., & Koller, S. H. (2004). Abordagem ecológica do desenvolvimento humano, psicologia positiva e resiliência: ênfase na saúde. In S. H. Koller (Org.), Ecologia do desenvolvimento humano: pesquisa e intervenção no Brasil, (pp. 91-107). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Petzold, M. (1996). The psychological definition of "the family". In M. Cusinato (Org.), Research on family: resources and needs across the world, (pp. 25-44). Milano: LED – Edizioni Universitarie.         [ Links ]

Pinheiro, M. H. C., & Biasoli-Alves, Z. M. M. (2008). A família como base. In L. N. D. Weber (Org.), Família e desenvolvimento: visões interdisciplinares, (pp. 21-36). Curitiba: Juruá         [ Links ].

Poletto, M., & Koller, S. H. (2006). Resiliência: uma perspectiva conceitual e histórica. In D. D. Dell`Aglio, S. H. Koller & M. A. M. Yunes (Orgs.), Resiliência e psicologia positiva: interfaces do risco à proteção, (pp. 19-44). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ] 

Poletto, M., & Koller, S. H. (2008). Contextos ecológicos: promotores de resiliência, fatores de risco e de proteção. Estudos de Psicologia, 25, 405-416.         [ Links ]

Poletto, M., Wagner, T. M. C., & Koller, S. H. (2004). Resiliência e desenvolvimento infantil de crianças que cuidam de crianças: uma visão em perspectiva. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 20, 241-250.         [ Links ]

Rutter, M. (1981). Stress, coping and development: some issues and some questions. Journal of Child Psychology & Psychiatry, 22, 323-356.         [ Links ]

Rutter, M. (1985). Resilience in the face of adversity. Protective factors and resistance to psychiatric disorder. British Journal of Psychiatry, 147, 598-611.         [ Links ]

Rutter, M. (1993). Resilience: some conceptual considerations. Journal of Adolescent Health, 14, 626-631.         [ Links ]

Seligman, M. E., & Csikszentmihalyi, M. (2000). Positive psychology. An introduction. American Psychologist, 55, 5-14.         [ Links ]

Silva, M. R. S. (2003). A construção de uma trajetória resiliente durante as primeiras etapas do desenvolvimento da criança: o papel da sensibilidade materna e do suporte social. Tese de doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis.         [ Links ]

Silva, M. R. S., Lunardi, V. L., Lunardi Filho, W. D., & Tavares, K. O. (2005). Resiliência e promoção da saúde. Texto & Contexto – Enfermagem, 14, 95-102.         [ Links ]

Silva, M. R. S., Lacharité, C., Silva, P. A., Lunardi, V. L., & Lunardi Filho, W. D. (2009). Processos que sustentam a resiliência familiar: um estudo de caso. Texto & Contexto – Enfermagem, 18, 92-99.         [ Links ]

Silva, M. R. S., Silva, P. A., Dias, A. B., Medeiros, G. L., Silva, B. T., & Botelho, L. R. (2009). Aplicação e implicações do conceito de resiliência na prática de enfermagem/saúde. Ciência, cuidado e saúde, 8, 55-61.         [ Links ]

Souza, M. T. S., & Cerveny, C. M. O. (2006). Resiliência psicológica: revisão da literatura e análise da produção científica. Revista Interamericana de Psicologia, 40, 115-122.         [ Links ]

Yunes, M. A. M. (2003). Psicologia positiva e resiliência: o foco no indivíduo e na família. Psicologia em Estudo, 8, 75-84.         [ Links ]

Yunes, M. A. M. (2006). Psicologia positiva e resiliência: o foco no indivíduo e na família. In D. D. Dell`Aglio, S. H. Koller & M. A. M. Yunes (Eds.), Resiliência e psicologia positiva: interfaces do risco à proteção, (pp. 45-68). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Yunes, M. A. M. (2011). Os discursos sobre a questão da resiliência: expressões e consequências para a promoção do desenvolvimento saudável. In D. Colinvaux, L. B. Leite & D. D. Dell`Aglio (Eds.), Psicologia do desenvolvimento: reflexões e práticas atuais, (pp. 225-246). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Yunes, M. A. M., & Szymanski, H. (2001). Resiliência: noção, conceitos afins e considerações críticas. In J. Tavares (Org.), Resiliência e educação (pp.13-42). São Paulo: Cortez.         [ Links ]

Yunes, M. A. M., & Szymanski, H. (2006). O estudo de uma família que supera as adversidades da pobreza: um caso de resiliência em família. Psicodebate: Psicologia, Cultura y Sociedad, 7, 119-139.         [ Links ]

Walsh, F. (1996) The concept of family resilience: Crisis and challenge. Family Process, 35, 261-281.         [ Links ]

Walsh, F. (2002). A family resilience framework: Innovative practice applications. Family Relations, 51, 130-137.         [ Links ]

Walsh, F. (2005). Fortalecendo a resiliência familiar. São Paulo: Roca. (Original publicado em 1998).         [ Links ]

Weber, L. N. D. (2008). Interações entre família e desenvolvimento. In L. N. D. Weber (Org.), Família e desenvolvimento: visões interdisciplinares, (pp. 9-20). Curitiba: Juruá         [ Links ].

 

 

Endereço para correspondência:
Nara Liana Pereira Silva
Departamento de Psicologia – Instituto de Ciências Humanas – Universidade Federal de Juiz de Fora – Campus São Pedro
Rua José Lourenço Kelmer
CEP 36036-900 – Juiz de Fora/MG
E-mail: naraliana.silva@ufjf.edu.br

Recebido em 11/05/2012
Revisto em 30/08/2012
Aceito em 25/09/2012