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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.13 no.2 Florianópolis ago. 2013

 

Carreira proteana: revisão teórica e análise bibliométrica

 

Protean career: theoretical review and bibliometric analysis

 

 

Mônica Maria NevesI; Leonardo Nelmi TrevisanII; Belmiro do Nascimento JoãoIII

IPontifícia Universidade Católica de São Paulo
IIPontifícia Universidade Católica de São Paulo
IIIPontifícia Universidade Católica de São Paulo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Carreira Proteana é um conceito que representa uma nova configuração de carreira advinda das mudanças ocorridas no mercado de trabalho e que passaram a demandar novas formas de relacionamento entre empresa e empregados, bem como o planejamento do desenvolvimento dos profissionais. Assim sendo, este estudo objetiva realizar uma análise bibliométrica relacionada ao tema carreira proteana para melhor compreensão e conhecimento da evolução dos estudos no campo das ciências sociais, os centros de pesquisa, autores, entre outras informações relevantes para o planejamento de futuras pesquisas. A análise dos dados foi sustentada pelas abordagens de pesquisa quantitativa e qualitativa na bibliometria. Em termos qualitativos procurou-se analisar os assuntos das publicações levantadas e palavras frequentes que podem sugerir o direcionamento dos estudos publicados. Do ponto de vista quantitativo foram investigadas variáveis como número de publicações de artigos, autores, áreas temáticas, centros de pesquisa, anos das publicações, países, idiomas e citações que indicam a relevância das publicações para o desenvolvimento científico na área temática. O levantamento de artigos na base Web of Science resultou em 39 publicações relacionadas à carreira proteana, inseridos principalmente nas áreas de administração e psicologia aplicada, com predominância dos estudos e seus respectivos autores sediados nos Estados Unidos. A Universidade de Boston e o Journal of Vocational Behavior reúnem o maior número publicações. O ano de 2009 concentra maior número de publicações; sendo, no entanto, as publicações de 1995 e 2004 de Douglas T. Hall, o idealizador dessa nova abordagem de carreira, as que mais influenciaram as publicações recentes.

Palavras-chave: Carreira, Carreira Proteana, Bibliometria.


ABSTRACT

Protean Career is a concept that represents a new setting of orientation towards career arising from changes that took place in the labor market and that began came to demand new forms of relationships between company and employees, as well as in the planning of professional development planning. Therefore, the aim of this study aims atis a bibliometric analysis related to the protean career topic, protean career toward a better understanding and knowledge of the evolution of studies in the social sciences area, of research, institutions, authors, and other information relevant to the planning of future research. Data analysis was supported by the approaches of quantitative and qualitative research in bibliometrics. Qualitatively, we tried sought to analyze the issues raised and publications surveyed, for topics and frequent words that may might suggest the direction of the published studies. From the quantitative point of view, were investigated variables such as: number of source of publication numberss, authors, topic areas, research institutions, publications of the years, countriescountries, languages, and quotes that show the relevance of the publications to the scientific development in the subject area. The collectionsurvey of articles based oin the Web of Science database resulted in 39 publications related to the protean career, set primarily in the areas of management and applied psychology, with a predominance of studies and their authors based in the United States. The Boston University and the Journal of Vocational Behavior gather hold as manythe largest number of publications. The year 2009 focuses moreshows the highest concentration of publications, being, however,although the publications of from 1995 and 2004 by Douglas T. Hall, the creator of this new approach to career, are the most influential on recent publications.

Keywords: Career, Protean Career, Bibliometric.


 

 

A aceleração das descobertas tecnológicas, sobretudo as tecnologias voltadas para a comunicação observadas a partir da última década do século XX, impulsionou a globalização e a crescente internacionalização e abertura dos mercados, alterando radicalmente a economia e a política mundial, bem como as sociedades.

Essas mudanças impactaram o funcionamento das organizações que, para manterem a competitividade, foram obrigadas a incorporar em sua agenda estratégica temas como eficácia, agilidade, inovação e flexibilidade, o que gerou, como consequência, transformações nas relações de trabalho e no gerenciamento da carreira das pessoas.

Novos processos de produção de bens, com uma preocupação acentuada pela qualidade e atendimento das necessidades dos clientes aliados à redução de custos são incorporados às organizações que passam a demandar maior conhecimento e desenvolvimento constante por parte das pessoas ao mesmo tempo em que as incertezas e o dinamismo do mercado não oferecem garantias de vínculos de trabalho duradouros como observado nas décadas passadas. Um bom exemplo desse fenômeno pôde ser observado nos processos de reengenharia que reduziram postos de trabalho no mundo todo nas últimas décadas (Chanlat, 2000; Dutra, 2010; Harvey, 1992).

A partir dessas mutações, a construção da carreira, até então tradicional, concebida nas bases da administração científica de Taylor e no modelo hierárquico funcional desenvolvido por Fayol nas primeiras décadas do século XX e de responsabilidade das organizações, onde a preocupação era a maximização e eficiência de processos com a participação restrita dos funcionários e pouco investimento em qualificação (Fleury, 2002), passa a demandar das pessoas seu gerenciamento. A empregabilidade, bem como os vínculos de curta duração, faz parte da nova realidade no campo do trabalho e não mais o emprego para a vida toda. Neste contexto surgem novos conceitos e significados para as carreiras.

O desenvolvimento dos primeiros conceitos que deram origem às novas abordagens de carreira ocorreu na América do Norte no final da década de 1970 ganhando maior impulso a partir da década de 1990, sendo na atualidade um tema amplamente debatido pela academia.

Por se tratar de um tema atual e de impacto tanto para organizações como para profissionais de diversos segmentos de atuação, faz-se útil conhecer a evolução dos estudos e das publicações disponíveis na esfera mundial para melhor compreensão das variáveis ou influências que impactam a carreira das pessoas.

Dessa forma, o objetivo deste artigo é realizar uma análise bibliométrica das publicações científicas sobre os novos conceitos de carreira, a fim de compreender o direcionamento dos estudos e as tendências para apoiar futuras pesquisas. Dessa forma, foi feito um levantamento nas bases Web of Science (SCI-Expanded, SSCI, A&HCI) de artigos relacionados à carreira proteana, que resultou em 39 artigos analisados levando-se em conta as áreas temáticas, quem são os principais autores responsáveis pelas publicações, períodos de maior publicação, localidade, idioma, área da ciência de maior concentração dos estudos, os trabalhos mais citados por outros estudos, palavras-chave dos artigos, entre outras informações.

Nas próximas seções deste trabalho, tem-se a conceituação e revisão teórica de carreira proteana a fim de facilitar o entendimento do tema que se analisou, o conceito de pesquisa bibliográfica, a metodologia utilizada neste estudo, a apresentação e os passos da análise dos dados extraídos das bases Web of Science e considerações finais, bem como uma agenda para futuras pesquisas.

 

Carreira proteana

De acordo com Hall (1976), pesquisas realizadas tanto com jovens quanto com trabalhadores de todas as idades revelam uma tendência nas pessoas de utilizarem seus próprios critérios de sucesso, usualmente com foco na autorrealização e na felicidade, ao contrário do que se valorizava no período de predomínio da carreira tradicional onde o foco estava em condições externas como salário, nível hierárquico e status. Sob esse prisma, a carreira é vista como uma sequência de experiências de trabalho ao longo da vida que possibilitam a satisfação pessoal e o sucesso psicológico.

Com essa nova visão de carreira, Hall (1976) desenvolveu o conceito de carreira proteana, em analogia à figura mitológica de Proteu, que possuía a habilidade de mudar sua forma ao comando de sua vontade. Pessoas passam a valorizar a liberdade para desenvolver e encontrar desafios não só em uma ampla variedade de empresas como também em todas as esferas da experiência humana. A mudança em prol da realização pessoal é seu valor principal.

Nesta perspectiva, a carreira deverá ser reinventada de tempos em tempos e passa a ser dirigida pelas pessoas e não pelas organizações, por meio de ações efetivas em variadas experiências educacionais, treinamentos, trabalhos em diversas empresas, mudanças no campo de trabalho entre outras.

A carreira proteana requer que as organizações tenham uma gestão humanizada e flexibilizada, de forma a considerar as necessidades e valores individuais de cada profissional. Já na ótica dos profissionais, ela deve ser vista como aquela em que a própria pessoa tem a responsabilidade de buscar o constante aperfeiçoamento, conhecimento, autoconhecimento, bem como a capacidade de adaptação diante de possibilidades de mudanças por necessidades pessoais ou circunstâncias ambientais.

Hall (2002) afirma que as novas relações de trabalho serão de curto prazo e com foco em necessidades correntes, tanto dos indivíduos quanto das organizações, bem como em suas performances.

Embora o autor tenha desenvolvido o conceito de carreira proteana em 1976, suas principais características, conforme Tabela 1, ganharam maior representatividade a partir da década de 1990, período de turbulência e incerteza nos mercados com redução significativa da segurança tanto para organizações que não poderiam mais garantir relações de longo prazo com seus profissionais, quanto para os trabalhadores que viam seus empregos desaparecerem da noite para o dia com os movimentos de reengenharia e downsizing implantados nas empresas.

Na atualidade, o conceito de carreira proteana é cada vez mais presente em função das mudanças profundas ocorridas no mercado de trabalho que passaram a demandar novas formas de relacionamento entre empresa e empregados, como, por exemplo, trabalho temporário, prestação de serviço de consultoria, contratos de profissionais na modalidade de pessoa jurídica, empreendedorismo, fusões, aquisições e novas empresas de menor porte ingressando na economia (Hall, 2002).

Vale argumentar, no entanto, que embora a abordagem da carreira proteana enfatize que a própria pessoa deve ser responsável pelo desenvolvimento da sua carreira e que os indivíduos passam a buscar e valorizar o sucesso psicológico, nem todos os trabalhadores têm os requisitos necessários para assumir uma carreira com essas características, uma vez que sentem a necessidade de um suporte externo (Dutra, 2010; Hall, 2002).

Esse ponto de vista é o oposto do conceito, pois envolve o indivíduo com compromisso em relação a uma única organização ou linha de trabalho. A carreira proteana, diferentemente, será moldada pelas necessidades do próprio indivíduo, suas metas e valores, e não por estruturas organizacionais ou ideias recebidas de programas de desenvolvimento profissional. O sucesso profissional dependerá, pelo conceito, de adaptabilidade, automotivação e uma necessidade de aprendizado de novas habilidades.

 

Revisão Teórica

A revisão da literatura específica sobre o conceito de carreira proteana demanda, inicialmente, reconhecer a importância do trabalho de Rousseau, no final dos anos de 1980; apesar do pioneirismo do trabalho de Hall, publicado no início da segunda metade dos anos de 1970. A contribuição de Rousseau (1989) amplia os termos do binômio lealdade do trabalhador/segurança do emprego para incluir os novos "jogos psicológicos" que passaram a marcar a relação empregado-empregador, embutiram as irreversíveis transformações dos conceitos satisfação pessoal e sucesso psicológico no ambiente de trabalho e caracterizaram a literatura sobre carreira desde o início dos anos de 1990.

No contexto da última década do século XX, quando as táticas gerenciais das reengenharias e dos downsizings tanto impactaram o mundo do trabalho, a literatura sobre carreira reconheceu a relevância das mudanças tecnológicas e sociais, com as publicações de Hall e Mirvis (1996) e de Sullivan (1999). Esta última destaca as incidências das transições de carreira e identifica nessa incidência a acelerada mutação da carreira tradicional, linear, para "novos modelos". A literatura sobre o conceito de carreira proteana se consolida a partir dessa percepção.

Na última década, os estudos sobre carreira proteana avançaram em duas direções, apenas em parte complementares. A primeira, mais voltada para a exploração dos "valores internos" de cada trabalhador, buscava oferecer uma espécie de parâmetro, um "guia de sucesso" para as carreiras, bastante individualizado. A segunda direção explorava mais a "autoadministração" da carreira, destacando a "habilidade de adaptação" do indivíduo às novas demandas por performance localizadas ou por contínua aprendizagem. O trabalho de Briscoe e Hall (2006) catalogou com clareza essa mudança, a influência dessas duas direções, na evolução do conceito de carreira proteana.

A partir desse estudo de Briscoe e Hall, as pesquisas sobre formas de orientação na carreira proteana dominaram a maior parte dos estudos sobre o conceito, como observou Sullivan e Baruch (2009). É fato que o estudo de Briscoe, Hall e DeMuth (2006) confirmou que podem ocorrer atitudes de carreira proteana sem mobilidade física, ou seja, troca de emprego. Do mesmo modo, estudo de Briscoe e Finkelstein (2009) confirmou a hipótese de que carreiras proteanas são menos compromissadas com organizações, referindo atitudes de continuidade e comprometimento normativo.

A literatura sobre o conceito conquistou avanço relevante com os estudos de Agarwala (2008) e Segers e colaboradores (2008), mostrando inexistência de diferença de gênero na orientação de carreiras proteanas, embora a pesquisa de Segers e colegas tenha revelado que mulheres acumulem a exigência de "padrões mais elevados" na orientação de carreira proteana do que os homens. Em termos de pesquisa multinacional, o estudo de Segers (dividido com os demais autores) também evidenciou que em culturas com menor exigência de padrões de masculinidade (maior aceitação de papéis sociais não definidos por sexo) o foco na qualidade de vida na orientação de carreira proteana é mais forte do que decisões advindas de prêmios intrínsecos e competição. Nas culturas com menor exigência de padrões de masculinidade, o estudo de Segers e colaboradores (2008) também confirmou que há menor influência da "autoridade" na orientação de carreira proteana, com maior incidência na administração individual da carreira e menor delegação dessa orientação para gestores organizacionais ou sistemas ortodoxos de carreiras. O estudo de Segers e colaboradores (2008) sugere ainda significativo peso dos fatores culturais na orientação de carreira proteana.

Os aspectos negativos na escolha da carreira proteana foram objeto de estudo de Vardy e Kim (2007). O foco desse trabalho foi o questionamento da associação de carreira proteana à ideia de winners, ou vencedores. A hipótese principal desse estudo é de que a orientação de carreira proteana tem ênfase individualizada, pois caracteriza pessoas que sempre encontram o trabalho "que estavam destinadas a fazer", formando grupo específico com nova identidade profissional. Esses autores cobram a inexistência de estudos com os que não tiveram sucesso na orientação proteana de suas carreiras.

Visões críticas bastante consistentes sobre o conceito de carreira proteana apontam também a probabilidade de que a "desvinculação plena" com a organização provoque nos empregados crescente sentimento de "apatia e indiferença" como notou Brousseau (1996). Aliás, este autor ressaltou que a inexistência de "vínculos especiais ou de identidade" provocam uma "separação" perigosa entre empregados e organização. Brousseau considera prejudicial, especialmente para as organizações essa sensação de "liberação de responsabilidade" sobre a carreira dos empregados. Apontando risco semelhante, Balassiano, Ventura e Fontes Filho (2004) retomam Brousseau para insistir nos "possíveis prejuízos, principalmente para as organizações" em que pese "o entusiasmo de diversos autores em torno da visão de carreira como inerente ao indivíduo".

Nesse ponto, em relação ao indivíduo, as críticas ao conceito de carreira proteana ganham vertente relevante em torno da análise de Foucault (1994) de outras formas de "poder disciplinar". A referência é específica à ideia desse autor de "docilidade-utilidade", em que explora a singularidade da relação da modernidade do sujeito com ele mesmo, no que chamou de "tirania da identidade de si".

Outro aspecto das críticas ao conceito de carreiras proteanas está no vínculo entre essa forma de trabalho e a constituição de uma "crise afetiva", como proposta por Costa Freire, formada pela contínua busca de fragmentados projetos individuais. Este autor fala da escolha de habilidade profissional que lhe permitia "continuar nela a vida toda" e que o apelo por contínuas mudanças pode não permitir a percepção do "sentido da vida como algo consistente pelo qual vale a pena lutar" (Cezimbra,2003). O impacto psicológico dessas seguidas mudanças de local de trabalho pode provocar também a falsa percepção de que diminuem ou até desaparecem as cadeias hierárquicas no desempenho e avaliação profissional. Com base em princípios da psicologia evolucionária, Nicholson (1996) ressalta o fator hierarquia no processo de interação entre pessoas.

 

Bibliometria

Trata-se de uma técnica de medição e avaliação dos índices de produção e disseminação do conhecimento científico que pode ser de cunho quantitativo e qualitativo. Surgiu no início do século XX e desenvolveu-se a partir da elaboração de leis empíricas sobre o comportamento da literatura, tendo como marcos de seu desenvolvimento três principais leis bibliométricas: a lei de Lotka, que mensura a produtividade científica de autores; a lei de Bradford, que mensura a produtividade de periódicos científicos; e as leis de Zipf, que mensuram a distribuição e frequência de palavras num texto (Araújo, 2006; Guedes & Borschiver, 2005).

A lei de Lotka considera que uma larga proporção da literatura científica é produzida por um pequeno número de autores, supostamente de maior prestígio em uma determinada área do conhecimento e muitos pesquisadores, supostamente de menor prestígio produzem pouco (Guedes & Borschiver, 2005).

A lei de Bradford permite estimar o grau de relevância de periódicos em dada área do conhecimento. Ela considera que os periódicos que produzem o maior número de artigos sobre dado assunto formam um núcleo de periódicos, supostamente de maior qualidade ou relevância para aquela área (Guedes & Borschiver, 2005).

As leis de Zipf permitem estimar as frequências de ocorrência das palavras de um determinado texto científico e a região de concentração de termos de indexação, ou palavras-chave, ou seja, quando um pequeno grupo de palavras ocorre muitas vezes e um grande número de palavras é de pequena frequência de ocorrência. Essa lei permite a indexação temática automática (Guedes & Borschiver, 2005).

Outra função importante da bibliometria reside na análise de citações que permite buscar em um conjunto de referências bibliográficas incluídas em publicações, quais autores e artigos exercem maior influência e são mais relevantes para aquela área científica. Price (1965) em seu clássico trabalho sobre redes de artigos científicos observou que é um grupo pequeno de autores e de publicações que exercem maior influência em uma dada área temática, além de identificar a procedência geográfica e institucional desses autores, tipo de documento mais utilizado, idade média da literatura utilizada, periódicos mais citados, entre outras informações (Araújo, 2006).

As citações (...) contribuem para o desenvolvimento da ciência, proveem o necessário reconhecimento de um cientista por seus colegas, estabelecem os direitos de propriedade e prioridade da contribuição científica de um autor, constituem importantes fontes de informação, ajudam a julgar os hábitos de uso da informação e mostram a literatura que é indispensável para o trabalho dos cientistas.(Foresti, 1989, p. 2)

O uso de dados bibliométricos, como indicadores da produção científica, pode ser útil para o planejamento das atividades de pesquisa científica (Araújo, 2006) e contribuir para tomadas de decisão na gestão da produção de conteúdo e do conhecimento em determinada área, pois auxilia na organização e sistematização de informações científicas e tecnológicas (Guedes & Borschiver, 2005).

 

Metodologia e Análise das publicações

O levantamento e a análise deste estudo foram realizados a partir das bases de dados do sistema Web of Science (2011) que oferece acesso direto ao fluxo de 36 milhões de registros em mais de 230 disciplinas em ciências, ciências sociais, artes e humanidades, incluindo informações bibliográficas, referências citadas e navegação em referências citadas atualizados semanalmente.

Esse site foi publicado pela primeira vez em 1963, com dados de citações a partir de 1961 (Garfield, 1963 em Carpes et al., 2011). Oferece informações de mais de 12 mil periódicos de maior prestígio e impacto no mundo da pesquisa.

A pesquisa dividiu-se em 10 etapas apresentadas a seguir:

1ª etapa: Foram digitadas as palavras "Career" and "Protean" como tópicos nos campos de pesquisa sem delimitação de datas. Dessa forma, foram levantadas informações sobre: número total de publicações, áreas temáticas, tipos de publicações, autores, títulos das fontes, instituições, agências de financiamento, anos das publicações, idiomas e países.

2ª etapa: foi feito um refinamento na busca, selecionando como tipo de publicação apenas artigos nas áreas temáticas de pesquisa relacionadas às ciências do trabalho, tais como: Psicologia Aplicada (Psycology Applied), Administração (Management),Negócios (Business), Ciências Sociais Interdisciplinares (Social Sciences Interdisciplinary), Relações Industriais e do Trabalho (IndustrialRelations Labor) e Questões Sociais (Social Issues) originando 39 publicações para análise, conforme Tabela 2.

 

 

Vale ressaltar que se chegou a um total de 56 publicações pelo fato haver múltiplas ocorrências, ou seja, um mesmo artigo publicado em mais de uma área temática.

3ª etapa: dos 39 artigos identificados, foi feito o levantamento dos autores que apresentaram mais do que uma publicação relacionadas à carreira proteana como segue na Tabela 3.

 

 

Foi possível verificar que há um predomínio de publicações entre os autores Hall (2011) - o idealizador da abordagem de carreira proteana, atual professor e pesquisador na Universidade de Boston, tendo como áreas de interesse o desenvolvimento de carreira, desenvolvimento de liderança, planejamento de sucessão em executivos, integração entre trabalho e vida pessoal, comportamento organizacional e temas afins - e Briscoe (2011) - professor e pesquisador na Universidade de Illinois, concentrando suas áreas de pesquisa e interesse em liderança, desenvolvimento de carreira e comportamento organizacional - , tendo ambos, escrito em conjunto, artigos e capítulos de livros relacionados às novas abordagens de carreira. Esse fato corrobora com a lei de Lotka da bibliometria.

4ª etapa: foi feito um levantamento dos países onde se concentram as publicações desses artigos, ou seja, os países que mais têm se dedicado ao estudo do tema. Neste item, pode-se observar que os Estados Unidos lideram o ranking com 15 publicações, seguido da Inglaterra com sete publicações, Bélgica cinco, Austrália e Alemanha ambas com quatro publicações e Canadá e Espanha com duas publicações cada. A maior incidência de publicações nos EUA pode ser explicada pelo fato das novas abordagens de carreira serem originadas neste país e que há, portanto, oportunidade de expansão dos estudos relacionados ao tema carreira proteana para outros países e culturas. Todas as publicações, no entanto, foram realizadas na língua inglesa.

5ª etapa: nesta etapa foram analisadas quais universidades foram responsáveis por tais publicações (Tabela 4). Por meio dessa análise, foi possível observar que a Universidade de Boston foi a que mais publicou artigos relacionados à carreira proteana. Uma possível explicação pode residir no fato de o idealizador dessa abordagem, Douglas Hall, ser membro dessa instituição de ensino e pesquisa.

 

 

A instituição, conta com um departamento de Estudos relacionado ao comportamento organizacional, sendo o Professor Douglas Hall um dos integrantes da equipe de pesquisas sobre desenvolvimento de carreira nos novos ambientes organizacionais.

6ª etapa: a análise bibliométrica permitiu verificar os anos de maior concentração de publicações de artigos sobre carreira proteana. Pode-se observar na Figura 1, a seguir, que em 2009 houve um pico desse tipo de publicação. Nesse sentido, há espaço para aprofundamento de pesquisas futuras para entender o que levou os pesquisadores a publicarem mais artigos relacionados a esse tema naquele ano em especial. Uma hipótese possível pode residir no fato de os estudiosos estarem preocupados com estudos sobre os movimentos de carreira após a crise do sistema financeiro ocorrida em 2008 e que afetou profundamente o mercado de trabalho não só nos Estados Unidos, como em todo o mundo.

 

 

7ª etapa: foi identificado que o Journal of Vocational Behavior e o Career Development International foram os veículos de publicação de pesquisa com maior incidência de artigos relacionados ao tema de carreira proteana, com 14 e 6 artigos respectivamente.

O Journal of Vocational Behavior (2011) publica artigos empíricos e teóricos visando ampliação do conhecimento do comportamento profissional e desenvolvimento de carreira desde a sua escolha, bem como seu desenvolvimento ao longo da vida profissional. As publicações também abordam aplicações do tema visando apoiar ações de aconselhamento de carreira que podem ser utilizadas em universidades e empresas. A edição de outubro de cada ano apresenta uma revisão dos estudos do comportamento profissional. As áreas de concentração de publicação de pesquisas incluem: desenvolvimento de carreira, satisfação no trabalho, ajuste profissional e de carreira, compromisso e envolvimento do profissional no trabalho, estresse e tensão no trabalho, entre outros. Esse journal tem um fator de impacto na ordem 2,604 (JCR) e conta com seis edições anuais.

O Career Development International (2011) é um journal norte-americano que integra a editora Emerald, especializada em revistas acadêmicas e livros com forte presença na área de ciência sociais. O journal fornece uma plataforma de investigação empírica e teórica na área de carreira tanto do ponto de vista individual como organizacional e da sociedade. Ele tem caráter internacional de submissão de artigos por entender que o tema é preocupação para pesquisadores de todo o mundo. Os artigos publicados abrangem temas como: carreiras individuais, perspectivas psicológicas e de desenvolvimento, intervenções na carreira, estratégias organizacionais, trabalho e contexto profissional entre outros afins. Os autores Douglas Hall e Jon Briscoe fazem parte do conselho consultivo do editorial do journal. Esse journal tem um fator de impacto na ordem de 0,041 (SJR - Scopus) e conta com sete edições anuais.

Pode-se considerar, portanto os dois periódicos os que produzem artigos de referência nessa temática, corroborando com a lei de Bradford.

8ª etapa: foi feita uma análise detalhada dos 39 artigos publicados envolvendo o foco de cada um, resumo geral, palavras-chave, incidência de citações dos artigos, nível de impacto do artigo e seu autor, entre outras informações.

Essas informações são relevantes por se reconhecer que o valor de cada publicação é determinado por quem as usa e pela quantidade de uso que se faz dela (Costa Filho, 2009).

De acordo com Garfield (1963), citado por Costa Filho (2009), a frequência das citações reflete o valor de um periódico e o uso feito dele. Assim, no caso de um artigo muito importante, o índice de citações tem um valor quantitativo, porque ele pode ajudar o pesquisador a medir a influência do artigo - isto é, seu fator de impacto.

Os 39 artigos tiveram um total de 447 citações, com uma média de citação na ordem de 11,46 para cada artigo, tendo um h-index 1 de 9.

O artigo mais citado, da lista dos 39 artigos, foi publicado em 1995 pelo idealizador do conceito de carreira proteana, Douglas Hall, em parceria com Mirvis, P. H. com 78 citações (Tabela 5). Os dois autores são psicólogos organizacionais, estudiosos das novas abordagens de carreira. Embora esse artigo tenha sido publicado há mais de 15 anos, ele ainda exerce influência no campo de pesquisas, uma vez que continua sendo citado em publicações recentes. O segundo artigo mais citado foi publicado também por Douglas Hall, em 2004, com 61 citações (Tabela 5) é o que exerce mais influência nas publicações recentes.

9ª etapa: por meio da ferramenta estatística textstat, para análise textual a partir da montagem (corpus) para análise, verificou-se o índice de frequência de palavras que mais aparecem em todos os resumos (abstracts) dos 39 artigos levantados neste artigo, conforme Tabela 6.

 

 

As palavras-chave encontradas correspondem àquelas normalmente utilizadas em pesquisa de carreira proteana, ou seja, carreira proteana, carreira sem fronteira, self (a própria pessoa), orientação, comprometimento, desenvolvimento, sucesso, mobilidade e atitudes.

10ª etapa: Na tabela 7 pode ser verificada a relação dos artigos publicados nos últimos três anos por ordem de publicação do mais recente para o mais antigo incluindo informações como: título, autor, palavras-chave, journal, ano publicação e área temática.

Foi feita uma análise do conteúdo (Bardin, 2002) dos abstracts (resumos) dos artigos mais recentes onde foi possível verificar que há uma tendência e ênfase de se investigar as formas contemporâneas de trabalho advindas das grandes mudanças do mercado globalizado que enfatizam a perda da linearidade e previsibilidade das carreiras hoje substituídas por uma maior mobilidade e autodireção das carreiras que podem impactar no comprometimento dos profissionais para com as organizações em um regime de trabalho instável e provisório.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O levantamento dos artigos constantes na base Web of Science sem delimitação de data resultou em 39 trabalhos relacionados à carreira proteana, inseridos principalmente nas áreas temáticas de administração e psicologia aplicada. O maior número de publicações relacionado ao tema em questão foi encontrado no Journal of Vocational Behavior, sendo oriundos deste journal os dois artigos mais citados em outros trabalhos e cuja autoria é do idealizador dessa nova abordagem de carreira, Douglas Tim Hall, e consequentemente de maior relevância para a área das ciências que investigam as tendências de carreira na modernidade.

As análises obtidas neste trabalho também chamaram a atenção para o fato de que a maioria dos estudos nessa área temática foi desenvolvida nos Estados Unidos, sendo a Universidade de Boston a que mais produziu artigos sobre carreira proteana.

O foco das publicações recentes trata da falta de linearidade e previsibilidade na construção da carreira, sendo observados aspectos como mobilidade e influência das características das carreiras proteanas no novo contexto do mercado de trabalho, concebidos a partir da instabilidade dos mercados advindos da globalização.

A bibliometria, por sua vez é uma ferramenta estatística de relevância, pois permite mapear e gerar diferentes indicadores de gestão da informação e do conhecimento necessários ao planejamento e avaliação da produção de ciência de uma determinada comunidade científica ou país.

Os resultados desta pesquisa são importantes por terem levantado publicações de destaque na área temática e por terem gerado um panorama abrangente dos estudos de carreira proteana na comunidade acadêmica global, no entanto é preciso considerar a possibilidade de realização de futuros levantamentos que incluam outros tipos de publicações e em outras fontes de pesquisa além da base do Web of Science.

 

Agenda para futuras pesquisas

Em torno da orientação para uma carreira proteana há também significativa incidência de novos temas de pesquisa a partir da base investigada no Web of Science. O primeiro tema de uma agenda de pesquisas futuras é o papel representado pela alteração nas estruturas familiares no processo de aceitação da carreira proteana. O casal, com diferentes evoluções profissionais, pode encontrar nessa opção de carreira efetivo "fator de convivência"; o trabalho de Boswel e Olson-Buchanan (2007) construiu importantes hipóteses de investigação sobre conflitos familiares e definições de carreira que demandam novas vertentes de pesquisa. Em especial sobre novas realidades multinacionais e equacionamento entre carreira e família.

A vertente "satisfação no trabalho" também faz parte de um conjunto futuro de investigação acoplado à orientação de carreira proteana. Essa possibilidade pode ter como referência inicial o estudo de Valcour e Tolbert (2003) sobre sucesso e satisfação no trabalho apesar da constante mudança de regras no ambiente corporativo. O vínculo entre atitude proteana e reconhecida satisfação no exercício profissional ainda contém diferentes hipóteses de pesquisa que merecem atenção.

Do mesmo modo, estudos sobre a orientação proteana para a carreira pós-corporativa estão à espera de novas formulações de hipóteses de investigação. Neste aspecto, o ponto de partida pode ser o trabalho de Mallon e Walton (2005) que realizou pesquisa exploratória sobre o desenvolvimento de indivíduos dentro e fora das organizações confirmando hipóteses de evolução mais ampla nas carreiras não tradicionais. Este estudo evidenciou a relação entre avanço tecnológico e opções de carreira. Esse viés exige constante atualização, especialmente a partir da expansão de aspectos globalizantes no mundo do trabalho.

A análise da base de dados oferecida pela Web of Science também permite abrir agenda de pesquisa teórica em torno do conceito de carreira. O modelo de carreiras híbridas, desenvolvidas dentro e fora das organizações, com e sem apoio de uma única estrutura organizacional ainda demanda maior conhecimento. Os trabalhos de McDonald, Brown e Bradley (2005) e de McDonald e Hite (2008) correspondem a importantes pontos de partida para a formulação de novas hipóteses para o debate conceitual em torno da proposta de carreira proteana.

 

Limitações

Algumas limitações deste estudo devem ser consideradas. Os resultados da pesquisa consistem somente de artigos em periódicos científicos. Artigos apresentados em anais, dissertações, livros ou capítulos de livros não foram cobertos pela pesquisa, embora representem uma parte da discussão científica sobre carreira proteana. Publicações mais antigas podem ter recebido mais citações ao longo dos anos do que os mais novos. Os fatores de impacto são maiores para trabalhos mais antigos, sendo considerados os trabalhos mais relevantes na análise. Existem várias outras críticas comuns às consultas no ISI Web of Science, como fonte de dados para análise bibliométrica, tendência para publicações norte-americanas, em relação ao idioma inglês, e dependência dos fatores de impacto dos periódicos. Artigos publicados em outras línguas tendem a ter menos impacto sobre o tema da pesquisa. Uma grande porcentagem de artigos, em inglês, nos índices do ISI reflete a pesquisa internacional, onde até mesmo pesquisadores asiáticos - da China, Taiwan ou Coreia do Sul - publicam em inglês.

As bases de dados do ISI têm certos limites, mas não invalidam completamente os resultados de um estudo bibliométrico. Há muitos erros ortográficos e, em especial, nas referências citadas. Há também a possibilidade de falta de informações em várias partes de análise (por exemplo, as publicações podem listar vários países ou registros que não contenham dados). As bases do Web of Science simplesmente reproduzem as informações fornecidas pelos autores nas publicações. Um pré-tratamento dos dados muitas vezes é necessário para refinar a análise. Por geral, deve-se enfatizar que a análise bibliométrica representa apenas uma visão do mundo científico visto por meio de publicações, não levando em conta, por exemplo, as comunicações informais ou o conhecimento tácito dos pesquisadores. Outras técnicas frequentemente empregadas em cocitação de análise como a análise fatorial, análise de cluster ou de escalonamento multidimensional não foram realizados para esta pesquisa.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência:
Leonardo Nelmi Trevisan
Rua Monte Alegre, 984 Sala 4E-04, Perdizes
São Paulo - SP. CEP 05014-901
Tel. (11) 3670-8513
E-mail: lntrevisan@pucsp. br

 

 

1 H-Index, em inglês, foi criado em 2005 pelo físico J. E. Hirsch, da University of California. Quantifica a produtividade e o impacto de cientistas baseando-se nos seus artigos ( papers) mais citados. Em outras palavras, o índice H é o número de artigos com citações maiores ou iguais a esse número. Exemplo: um pesquisador com H = 5 tem cinco artigos que receberam cinco ou mais citações; Trabalhos menos citados não seriam considerados (Barbosa Filho, 2009).