Serviços Personalizados
Journal
artigo
Indicadores
Compartilhar
Revista Psicologia Organizações e Trabalho
versão On-line ISSN 1984-6657
Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.22 no.1 Brasília jan./mar. 2022
https://doi.org/10.5935/RPOT/2022.1.21354
10.5935/RPOT/2022.1.21354 ARTIGOS
Bem-estar psicológico e características sociolaborais em profissionais do poder judiciário
Psychological well-being and sociolaboral characteristics in judicial power professionals
Bienestar psicológico y características sociolaborales en profesionales del poder judicial
José Luciano Vieira de Freitas Júnior; Silvânia da Cruz Barbosa
Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), Brasil
RESUMO
Recentes reformas, pautadas no gerencialismo produtivo, intensificaram a exploração do trabalho nos setores judiciários, potencializando vivências de mal-estar psicológico que demandam pesquisas e intervenções. Esta pesquisa traçou perfis de bem-estar psicológico em profissionais judiciários, identificando fatores ambientais protetivos e de risco à saúde. Participaram 72 profissionais (amostra de 69,9%). Aplicaram-se os instrumentos: (a) Questionário de Saúde Geral, (b) Escala de Autoestima de Rosenberg, (c) Escala de Bem-Estar Afetivo no Trabalho e (d) Questionário de Condições de Trabalho. Efetuaram-se estatísticas descritivas, teste Shapiro Wilk, análises de Clusters, Teste Exato de Fischer e teste Mann-Whitney. Identificaram-se dois perfis de bem-estar psicológico: Deficitário e Equilibrado. Este último, mais numeroso, incluiu mais profissionais casados. A categoria ambiental "posição socialmente valorizada", mais abundantemente percebida, destacou-se como fator protetivo do BEP; e "apoio do supervisor", mais deficitariamente percebida, destacou-se como fator de risco. O conhecimento destas características ambientais influentes da felicidade e da infelicidade no trabalho devem subsidiar ações promotoras da saúde profissional.
Palavras-chave: bem-estar psicológico; modelo ecológico; poder judiciário.
ABSTRACT
Recent reforms, based on productive managerialism, have intensified the exploitation of work in the judicial sectors, potentiating experiences of psychological malaise that demand research and interventions. This research outlined profiles of psychological well-being in legal professionals by identifying environmental protective factors and health risks. Seventy-two professionals participated (sample of 69.9%). The following instruments were applied: (a) General Health Questionnaire, (b) Rosenberg's Self-Esteem Scale, (c) Affective Well-Being at Work Scale and (d) Work Conditions Questionnaire. Descriptive statistics, Shapiro Wilk test, Cluster analysis, Fisher Exact test and Mann-Whitney tests were performed. Two psychological well-being profiles were identified: Deficient and Balanced. The latter, more numerous, included more married professionals. The environmental category "socially valued position", most abundantly perceived, stood out as a protective factor for BEP; and "support from the supervisor", more deficiently perceived, stood out as a risk factor. The knowledge of these influential environmental characteristics of happiness and unhappiness at work should support actions that promote professional health.
Keywords: psychological well-being; ecological model; judicial power.
RESUMEN
Las recientes reformas, basadas en el gerencialismo productivo, han intensificado la explotación del trabajo en los sectores judiciales, potenciando experiencias de malestar psicológico que demandan investigaciones e intervenciones. Esta investigación describió perfiles de bienestar psicológico en profesionales judiciarios, identificando factores ambientales de protección y riesgos para la salud. Participaron 72 profesionales (muestra del 69,9%). Se aplicaron los siguientes instrumentos: (a) Cuestionario de salud general, (b) Escala de Autoestima de Rosenberg, (c) Escala de Bienestar Afectivo en el Trabajo y (d) Cuestionario de Condiciones de Trabajo. Se realizaron estadísticas descriptivas, prueba de Shapiro Wilk, análisis de Clusters, prueba exacta de Fischer y pruebas de Mann-Whitney. Se identificaron dos perfiles de bienestar psicológico: Deficiente y Equilibrado. Este último, más numeroso, incluyó a más profesionales casados. La categoría ambiental "posición socialmente valorada", percibida con mayor abundancia, se destacó como factor protector del BEP; y el "apoyo del supervisor", percibido como más deficitario, se destacó como factor de riesgo. El conocimiento de estas características ambientales influyentes de felicidad e infelicidad en el trabajo debe alimentar acciones que promuevan la salud profesional..
Palabras clave: bienestar psicológico; modelo ecológico; Poder Judicial.
Por volta de 1970, o capitalismo experimenta uma nova crise econômica que se mostra mais duradoura e profunda do que a anterior, entre 1914/1929, e com características estruturais. Para a saída da crise o capital investe maciçamente na reestruturação produtiva, substituindo o modo produtivo fordista pelo de acumulação flexível que, notadamente com o Toyotismo, expande-se mundialmente e alcança condição hegemônica no mundo do trabalho por meio da globalização do mercado (Alves, 2016; Macêdo, 2018).
No Brasil, até a década de 1980, a reestruturação produtiva ocorreu de forma limitada e localizada em alguns setores privados, sobretudo o industrial. Na década de 1990, com a vitória do neoliberalismo no país e acentuada privatização de setores produtivos estatais (p. ex. siderurgia, telecomunicações, eletricidade), intensifica-se a organização flexível do trabalho nas empresas privadas aplicando-se inovações contínuas nos padrões tecnológicos/produtivos, nas formas de organização social do trabalho e nos métodos gerenciais denominados "participativos" (Antunes, 2018). Os padrões gerenciais desenvolvidos para empresas privadas penetram na esfera pública, a partir de 1995, com a implantação do plano de reformas do aparelho do estado, propiciando reestruturar a produção nos órgãos estatais brasileiros em consonância com os valores do capitalismo neoliberal defensor da liberdade do mercado e mínima intervenção do Estado (Alves, 2015; Reis, 2019).
No Poder Judiciário os impactos mais visíveis da reestruturação produtiva, associando modernização gerencial e tecnológica, aparecem na década de 2000 com as inserções do Processo Judicial Eletrônico (PJE) e do conceito de gerencialismo que possibilitaram desburocratizar e, ao mesmo tempo, controlar a eficiência, a produtividade e o ritmo do trabalho estabelecendo metas crescentes e mensuração quantitativa dos resultados (Lima, Fraga & Oliveira, 2016; Pinheiro, 2020; Ramos & Miranda Netto, 2020). Segundo Alves (2015) esses procedimentos inovadores, claramente pautados na filosofia just in time aplicada à produção sob demanda, passam a orientar que ações nos Tribunais de Justiça (TJ) sejam feitas "na hora certa", evitando desperdícios, acúmulo de processos judiciais e custos extraordinários.
A modernização do Poder Judiciário é justificada pelo governo como absolutamente necessária para garantir eficiência, celeridade e maior acessibilidade da população aos serviços jurisdicionais (Maio, 2019; Trevisanuto, 2018). Mas, se por um lado a modernização trouxe significativa resolutividade de questões judiciais para atender aos anseios sociais de uma justiça mais célere e transparente (Adorno Júnior & Muniz, 2016), por outro lado trouxe, também, vivências subjetivas impactantes na saúde e na vida pessoal dos magistrados e demais servidores do judiciário, conforme apontam algumas pesquisas revisadas.
Na pesquisa de Fonseca e Carlotto (2011), por exemplo, foi verificado grande número de licenças médicas no trabalho por transtornos de humor em servidores judiciários do Rio Grande do Sul. Este resultado foi atribuído ao estresse provocado pelo aumento da demanda e da carga de trabalho, pressão por produtividade, e pela implantação de um novo horário de trabalho que desacomodou a rotina pessoal e familiar dos servidores, gerando gastos, antes inexistentes, e levando muitos deles a utilizarem o tempo de intervalo para o almoço como tentativa de evitar acúmulo e atraso no trabalho. Outra pesquisa (Amazarray, Oliveira, & Feijó, 2019), também no Rio Grande do Sul, com 2.063 judiciários, constatou 27,2% da amostra apresentando Transtornos Mentais Comuns (não especificados pelos autores), sendo mais prevalente nos oficiais de justiça e nos servidores que trabalham com processos judiciais (físicos ou virtuais). Consonante com esses estudos, Antunes (2015), em pesquisa realizada com 440 magistrados, constatou que 80% levam trabalho para fazer em casa, 86% abdicam do lazer por causa do trabalho, 64% dedicam mais horas ao trabalho do que à família, 47% chegam em casa de mal humor por causa do trabalho, 26% declaram diminuição da libido sexual devido ao estresse laboral, e 18% têm dificuldade de esquecer as preocupações de trabalho.
Além dessas, outras pesquisas (Adorno Júnior & Muniz, 2016; Machado, Stefano, Kuhl & Campos, 2019; S. V. M. Santos et al., 2018; K. A. B. Santos, 2019; Silva, 2017) constataram judiciários frequentemente estressados, psiquicamente desgastados no trabalho, ou adoecidos por motivos emocionais, como reflexos da implantação do PJE e do gerencialismo. De maneira geral, esses estudos mostram que as exigências elevadas de produtividade estão fortemente associadas às Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), e que a prescrição e o alcance das metas têm conduzido a avaliações de desempenho individuais frequentes e integradas numa cultura organizacional cada vez mais informatizada, que sobrecarrega os trabalhadores e os fazem aumentar a quantidade de horas trabalhadas acima dos limites da jornada normal para atingir metas. Ademais, distintas pesquisas (Arena & Piccinini, 2019; Pooli & Monteiro, 2018; Velasco, 2016) identificaram experiências de assédio moral no ambiente judiciário, com repercussões negativas na saúde: ansiedade, depressão, angústia, nervosismo, irritabilidade, problemas de sono, dentre outras.
Tendo em vista as particularidades da modernização produtiva e seus potenciais riscos psicossociais nos setores judiciários, esta pesquisa foi realizada no Fórum estadual da cidade de Patos (PB) com o objetivo de traçar perfis de bem-estar psicológico em profissionais da justiça identificando fatores ambientais protetivos e de risco à saúde. Os objetivos específicos foram: a) avaliar o grau de qualidade da saúde mental dos profissionais judiciários atuantes no Fórum de Patos e b) identificar quais indicadores ambientais são percebidos como favoráveis e desfavoráveis à saúde mental. Utilizou-se como referência teórica o modelo ecológico de saúde mental, formulado por Peter Warr, que integra um conjunto de variáveis sociolaborais possíveis de influenciar o bem-estar do trabalhador.
A principal contribuição da pesquisa é elucidar quais aspectos presentes no ambiente laboral judiciário se mostraram favoráveis à saúde mental, e quais se mostraram nocivos, sendo tal elucidação importante para subsidiar futuras intervenções que potencializem atitudes positivas e protetivas à saúde mental. Outra contribuição é disseminar a viabilidade do modelo ecológico de Warr em estudos sobre situações de emprego e de desemprego. Também alude a importância de se estudar o bem-estar psicológico como um construto multifacetado, articulando variados instrumentos e técnicas de análise.
Modelo Ecológico de Saúde Mental
O modelo ecológico (ou vitamínico), elaborado por Warr (2007; 2013), é aplicável ao estudo de qualquer meio social, em especial aos contextos de trabalho e situações de desemprego, para analisar os determinantes ambientais na saúde mental das pessoas. Nesse modelo a saúde mental é compreendida como sinônimo de Bem-estar Psicológico (BEP), em conformidade ao conceito difundido pela World Health Organization (WHO, 1984), e como um construto multidimensional, que integra aspectos hedônicos (vivências de prazer) e eudaimônicos de felicidade (experiências de autovalidação), constituído de cinco dimensões: 1. Bem-estar afetivo; 2. Competência; 3. Autonomia; 4. Aspiração; e, 5. Funcionamento integral.
O autor teorizou que as dimensões, embora interrelacionadas, podem ser medidas separadamente, sendo que a avaliação das dimensões 1, 2, 3 e 4 vai definir o Funcionamento integral (quinta dimensão), que expressa o nível de felicidade (bem-estar) ou de infelicidade (mal-estar) das pessoas dependendo de como elas avaliam as características do meio em que estão inseridas. Ele propõe 12 categorias sociolaborais como fatores determinantes do BEP no trabalho, quais sejam:
I. Disponibilidade de dinheiro (Dinheiro disponível, nível salarial, pagamento por resultados);
II. Segurança física (Condições de trabalho adequadas, grau de riscos, qualidade dos equipamentos);
III. Posição socialmente valorizada (Importância da tarefa/função, contribuição à sociedade, status em grupos valorizados);
IV. Apoio do supervisor (Consideração e tratamento justo pelos chefes, preocupação com o bem-estar);
V. Desenvolvimento de carreira (Segurança no emprego, oportunidade de promoção);
VI. Equidade das ações (Justiça dentro da organização, equilíbrio nas relações da organização com a sociedade);
VII. Oportunidade de controle (Influência pessoal, autonomia, liberdade de decisão, participação);
VIII. Oportunidade para uso e aquisição de habilidades (Um entorno potencial para uso e desenvolvimento de competências e conhecimentos);
IX. Metas geradas externamente (Demandas externas, desafio, baixa carga ou sobrecarga de trabalho, identificação com a tarefa, conflito de papéis, trabalho emocional, conflito trabalho-casa);
X. Variedade (Alterações no conteúdo das tarefas, variedade de contatos sociais e de local de trabalho);
XI. Clareza do entorno (Resultados previsíveis, demandas e funções claras, feedback sobre tarefas, baixa ambiguidade sobre o futuro);
XII. Contato com outras pessoas (Contato social, qualidade nas relações sociais, dependência dos demais, trabalho em equipe).
Warr (2007; 2013) chamou o modelo de vitamínico pela analogia entre os efeitos das vitaminas na saúde física e os efeitos do ambiente na saúde mental. Uma boa saúde física precisa de doses equilibradas de vitaminas, e a falta delas adoece. A ingestão de altas dosagens melhora progressivamente a saúde, mas, após alcançar certo nível, o efeito se mantém constante sem produzir mais benefício algum. No entanto, há certas vitaminas que a superdosagem surte efeito tóxico; e outras não porque o próprio organismo se encarrega de eliminar o excedente. De modo semelhante, as 12 categorias sociolaborais surtem bons efeitos na saúde mental quando percebidas moderadamente no contexto de trabalho, e a percepção de falta ou escassez delas produz efeitos lesivos. Quando percebidas em excesso podem surtir dois diferentes tipos de efeitos, que o autor chamou de Efeito Constante (EC) e Diminuição Adicional (DA). Warr (2013) classificou as categorias ambientais de 1 a 6 como sendo do tipo EC, pois mesmo percebidas em demasia não apresentam riscos, nem intensificam melhorias no BEP. As categorias ambientais de 7 a 12 são do tipo DA, pois percebidas em abundância surtem efeitos tóxicos potencializando danos à saúde mental.
Método
Participantes
A pesquisa é exploratória, descritiva, ex post facto e de corte transversal, com delineamento quantitativo (Rodrigues, Lima, & Barbosa, 2017). Foi realizada no Fórum do Judiciário Estadual, situado na cidade de Patos (PB), onde trabalham 103 profissionais do Poder Judiciário com cargos funcionais (auxiliares judiciários, técnicos judiciários, oficiais de justiça, analistas judiciários) e de magistratura (juízes).
A amostragem foi acidental não probabilística, por conveniência (Silvano, 2016), formada pela inclusão dos profissionais ativos no serviço e que concordaram participar da pesquisa. Foram excluídos aqueles com contrato temporário de trabalho ou na condição de cedidos de outros órgãos públicos, bem como os que estavam afastados do trabalho por motivos como férias, treinamento, licença maternidade ou para tratamento de saúde.
Participaram 72 profissionais, correspondendo a 69,9% da população. Observou-se que 56,9% são homens e 43,1% são mulheres, com idades entre 23 e 72 anos (M = 45,9; DP= 9,65). A maioria é casada (63,9%) e tem filhos (80,6%). Relativo à escolaridade, 63,9% possui especialização, 20,8% concluiu ensino superior, 5,6% têm ensino superior incompleto, 5,6% têm ensino médio, e 4,2% possui mestrado. A maioria (58,3%) trabalha em horários fixos de entrada e saída usando registro eletrônico de ponto; 15,3% declara trabalhar algumas vezes à noite, e 41,7% nos finais de semana dependendo das demandas do Fórum. A média de tempo de serviço no TJ foi de 16,3 anos (DP = 8,6) e no cargo atual foi de 14,5 (DP = 9,06). Os salários giram em torno de menos de R$ 1.500,00 a mais de R$ 20.000,00.
Instrumentos
Foi utilizada uma Ficha Sociodemográfica para descrever as características biográficas (idade, sexo, número de filhos, estado civil, escolaridade) e sócio-ocupacionais da amostra (tipo de cargo, salário, regime de trabalho, aposentadoria, filiação sindical). Para avaliar as cinco dimensões do BEP e as doze categorias ambientais do modelo ecológico de Peter Warr, foram utilizadas variadas medidas, descritas a seguir:
Medidas para avaliar as dimensões do bem-estar psicológico.
Versão reduzida do Questionário de Saúde Geral (QSG-12) - da autoria de Goldberg (1972). este instrumento avalia distúrbios psíquicos leves (não-psicóticos) por meio de 12 itens distribuídos em escala do tipo Likert de quatro pontos, que variam de 0 a 3. Aplicou-se a versão validada nas pesquisas de Borges e Argolo (2002a; 2002b) que se mostra adequada para mensurar dois fatores: Redução da Autoeficácia (α = 0,86), avalia quanto o trabalhador se percebe dando conta do fazer e da competência em interagir com o ambiente psicossocial (ex. de item 'Você tem se sentido capaz de tomar decisões?'); Tensão Emocional e Depressão (α = 0,83), avalia sentimentos de esgotamento emocional e depressão decorrentes de situações de trabalho (ex. de item 'Você tem tido a sensação de que não pode superar suas dificuldades?').
Escala de Autoestima de Rosenberg (EAR). Elaborada por Rosenberg (1965), esta escala é a mais usada no Brasil (Marrone, Souza, & Hutz, 2019) para mensurar o grau de autoavaliação que os indivíduos fazem e geralmente mantêm de si mesmos, sendo muito aplicada em estudos ocupacionais (p. ex. Oliveira, 2018; J. F. Santos et al., 2017, Tertuliano, 2018). Foi aplicada a versão validada por Sbicigo, Bandeira, & Dell'Aglio (2010) com 10 itens distribuídos em escala do tipo Likert de quatro pontos (em que os extremos são 1 = concordo totalmente e 4 = discordo totalmente), que avaliam o grau de autoaceitação dos indivíduos por meio de dois fatores: Autoestima Positiva (α = 0,76), autojulgamento de valor, confiança e competência (ex. de item 'Sinto que sou uma pessoa de valor como as outras pessoas'); Autoestima Negativa (α = 0,77), sentimentos de incompetência, inadequação e incapacidade de enfrentar os desafios (ex. de item 'Eu sinto vergonha de ser do jeito que sou').
Escala de Bem-estar Afetivo no Trabalho (JAWS). Denominada em inglês Job-related Affective Well-being Scale (JAWS), foi elaborada por Katwyr, Spector, Fox e Kelloway (2000) para avaliar estados emocionais vivenciados no contexto laboral. No Brasil, o estudo de adaptação e validação realizado por Gouveia et al. (2008) identificou uma estrutura bifatorial formada por 27 itens, distribuídos numa escala do tipo Likert de 5 pontos (em que os extremos são 1 = Nunca e 5 = Quase sempre), que se agrupam em torno dos fatores: Afetos Positivos (α = 0,94), avalia quanto o trabalhador tem experimentado emoções positivas no ambiente laboral (ex. de item 'Entusiasmo'); Afetos Negativos (α = 0,87), avalia quanto o trabalhador tem experimentado emoções negativas no ambiente laboral (ex. de item 'Assustado').
Medida para avaliar a percepção das características ambientais.
Questionário de Condições de Trabalho (QCT). Foi desenvolvido por Borges et al. (2013), inspirado no referencial do European Working Conditions Observatory (EWCO), para avaliar a percepção dos trabalhadores sobre as condições laborais. Se aplicou a versão que conta com evidência de validade na pesquisa de Borges et al. (2019, submetido), composta por três itens que mensuram Condições Contratuais e Jurídicas (CCJ) por meio de escalas nominais, e um conjunto de itens estruturados numa escala do tipo Likert de 6 pontos (1 = Nunca; 2 = Raramente; 3 = Algumas vezes; 4 = Muitas vezes; 5 = Todo o tempo; 6 = Não se aplica) que mensuram três amplas categorias, a saber:
Exigências, Contradições e Condições Materiais. Refere-se aos aspectos de exigências desproporcionais às condições de trabalho, tarefas conflitivas ou contraditórias, prazos incompatíveis com as demandas. Esta categoria possui cinco fatores: 1. Ambiente Físico (α = 0,91), sentir-se exposto à riscos e aos incômodos do ambiente e das instalações utilizadas; 2. Exigências (α = 0,89), percepção de ritmo acelerado, rigidez de prazos, sobrecarga, exigência de metas produtivas desproporcionais e incompatíveis entre as demandas e número de servidores; 3. Violência (α = 0,88), observações de assédios morais, intimidações, agressões verbais, elogios inadequados, e outras formas de violência interpessoal; 4. Respeito às Limitações (α = 0,75), observação de respeito à necessidade de afastamento para tratamento da saúde, pausas e limitações em geral de cada servidor; 5. Precariedade Material (α = 0,88), observação de carência de equipamentos e materiais de trabalho.
Comunicação, Desafio e Participação. Abrange aspectos de conteúdo do trabalho, organização e divisão do trabalho, demandas do cargo, modos de execução das atividades e desempenho do trabalhador. Esta categoria possui dois fatores: 1. Atualização do Saber (α = 0,84), percepção de que o trabalho exige atualização contínua de saberes e competências, formações complementares, domínio do saber-fazer e iniciativas de formação e informação fora dos limites organizacionais; Participação (α = 0,75), sentir-se oportunizado a participar das decisões e da qualidade das decisões ponderadas coletivamente.
Suporte e Planejamento. Abrange aspectos de interações interpessoais, práticas, ações e orientação gerenciais padronizadas e seguras para realização das tarefas. Esta categoria possui 3 fatores: Suporte e Proteção (α = 0,79) percepção de que a empresa oferece ações de orientação e treinamento para evitar riscos de adoecimento e de acidentes no trabalho; Normatização (α = 0,63) percepção de que a empresa disponibiliza normas padronizadas que norteiam os limites das tarefas; Objetivos (α = 0,73), percepção do quanto consegue realizar objetivos e atividades planejadas, com diálogo e conflitos interpessoais administrados entre setores.
A Tabela 1 sintetiza as cinco dimensões do BEP, propostas no modelo ecológico de Warr, e os fatores usados como indicadores para avaliá-las. Na Tabela 2 estão as 12 categorias ambientais do referido modelo e os fatores do QCT usados como indicadores para avaliá-las.
Procedimentos de Coleta dos Dados e Cuidados Éticos
Foram respeitados os regulamentos éticos das Resoluções Nº 466/12 e Nº 510/16 do Conselho Nacional de Saúde ─ CNS que orientam pesquisas em seres humanos. A coleta dos dados foi iniciada após anuência da direção do Fórum de Patos - PB e aprovação da pesquisa pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), protocolo nº CAAE 08976819.6.0000.5187. Os profissionais que foram convidados e aceitaram participar da pesquisa receberam um protocolo contendo todos os instrumentos a serem preenchidos, e assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE com informações sobre o objetivo da pesquisa, o anonimato e sigilo das respostas, e sobre o direito de desistência, a qualquer momento, sem nenhum tipo de prejuízo pessoal.
Procedimentos de Análise dos Dados
Os dados foram digitados no programa Statistical Package for Social Science - SPSS e, em seguida, foram efetuadas análises descritivas (medianas, percentis, frequências e porcentagens) para caracterizar a amostra; o teste Shapiro Wilk para averiguar a normalidade dos dados, análise de Clusters para identificar perfis de BEP, o teste Exato de Fischer para averiguar o grau de associação entre perfis de BEP e variáveis sociodemográficas, e o teste Mann-Whitney para identificar se os perfis de BEP se diferenciam por condições sociolaborais. O nível de significância adotado foi para um p menor do que 0,05.
Resultados
Aplicaram-se análises descritivas aos fatores usados para avaliar as quatro primeiras dimensões de saúde do modelo ecológico, obtendo-se os seguintes resultados (Tabela 3): a primeira dimensão, Bem-estar afetivo, obteve mediana de 1,00 no fator Tensão Emocional e Depressão (percentis 0,75 e 1,25), de 3,93 no fator Afetos Positivos (percentis 3,32 e 4,29), e de 2,15 no fator Afetos Negativos (percentis 1,92 e 2,44). Estes resultados indicam baixo nível de tensão e tendência a vivenciar mais afetos positivos (experiências de prazer) do que negativos (experiências de dor) no contexto de trabalho.
As outras três dimensões, Competência, Autonomia e Aspiração, obtiveram medianas de 0,63 no fator Redução da Autoeficácia (percentis 0,50 e 1,00), de 1,67 no fator Autoestima Positiva (percentis 1,33 e 3,50) e de 3,75 no fator Autoestima Negativa (percentis 2,00 e 4,00). Estes resultados indicam que a amostra se percebe muito competente no trabalho, porém com baixa autonomia ou desinteresse para opinar, influenciar nas decisões e tomar iniciativas.
Para avaliar a quinta e última dimensão, Funcionamento Integral, aplicou-se uma análise de Clusters (conglomerado) tomando-se os fatores que avaliaram as quatro primeiras dimensões da saúde. Esse tipo de análise permite dividir a amostra em subgrupos e combinar seus escores, possibilitando identificar diferenças significativas entre eles e, também, dentro do próprio grupo. Foram identificados dois grupos com perfis de Bem-Estar Psicológico (BEP), designados: Deficitário e Equilibrado (Tabela 4).
O grupo com BEP Deficitário é formado por 19 profissionais (26,4%) com elevada pontuação em Autoestima Negativa e em Tensão Emocional e Depressão, seguida de pontuações moderadas nos fatores Redução da Autoeficácia, Afetos Positivos e Afetos Negativos. Essa combinação de pontuação revela um grupo fortemente tenso e menos autoconfiante para solucionar problemas e enfrentar desafios no trabalho, sendo, talvez, propenso a cometer erros. Também se mostra apático ou pouco interessado em buscar oportunidades e atingir objetivos, e menos disposto a opinar ou influenciar nas decisões, sendo um grupo que tende a experimentar menos felicidade no trabalho.
O segundo perfil (BEP Equilibrado) reúne 34 participantes (47,2%) com elevadas pontuações em Afetos Positivos, moderadas pontuações em Autoestima Negativa e baixas pontuações em Afetos Negativos, em Tensão Emocional e Depressão e em Redução da Autoeficácia. Se caracteriza por ser mais vigoroso e entusiasmado no trabalho, confiante para influenciar, tomar decisões, emitir opiniões, enfrentar pressões e problemas, e, também, apresenta baixa tensão, sendo um grupo que tende a experimentar mais felicidade no trabalho.
Elaborou-se uma tabela de dupla entrada e se aplicou o teste Exato de Fischer para analisar a variabilidade dos perfis de BEP (Deficitário e Equilibrado) por características sociodemográficas. O resultado rejeita apenas a independência entre a variável estado civil [p = 0,026 < 0,05], indicando que os participantes solteiros tendem a apresentar perfil Deficitário, e os casados tendem a apresentar perfil Equilibrado (Tabela 5).
Se avaliou a percepção do ambiente de trabalho explorando os dez fatores que compõem o QCT (escores de 1 a 6). Os resultados (Tabela 6) mostram que na primeira categoria do QCT "Exigências, contradições e condições materiais", o fator Respeito às Limitações se destacou com mediana 4,50 (percentis 4,00 e 5,00) e altas pontuações concentradas no intervalo IV, indicando que 52,8% da amostra considera que o TJ adota ações justas e respeitosas para com os funcionários e a sociedade. O fator Violência foi o que obteve escore mais baixo (mediana 1,00; percentis 1,00 e 1,50), indicando que para praticamente toda a amostra (90,3%) inexiste intimidações, ameaças ou sérios conflitos no trabalho entre chefes/subordinados.
Na segunda categoria do QCT "Comunicação, desafio e participação", a mediana foi de 3,33 para os fatores Atualização do Saber (percentis 2,67 e 4,00) e Participação (percentis 3,00 e 3,67), ambos com escores moderado-alto, indicando que 27,8% dos servidores percebem a oportunidade de crescimento na carreira associada à sobrecarga, alcance de metas produtivas e atualização contínua do saber, e que 48,6% se percebem contribuindo no planejamento do TJ e nas mudanças sociais por meio de suas habilidades laborais.
Na terceira categoria do QCT "Suporte e planejamento", a maior mediana foi de 4,00 para os fatores Normatização (percentis 3,33 e 4,67) e Objetivos (percentis 3,50 e 5,00), ambos com altos escores concentrados no intervalo IV, indicando 43,1% da amostra percebendo-se controlada por procedimentos padronizados de trabalho, regras e normas institucionais, e 44,4% considerando-se suficientemente atualizada sobre os procedimentos que norteiam os objetivos do TJ e as metas de trabalho. O fator Suporte e Proteção obteve mediana baixa, de 2,50 (percentis 2,00 e 3,00) com escores situados no intervalo II (baixo-moderado), indicando que 47,2% se ressentem de praticamente não existir no TJ política de estímulo ao estudo e aperfeiçoamento ou oferta de treinamentos, orientação e atualização do trabalhador.
Aplicando-se o teste Mann-Whitney, observou-se que dos dez fatores indicadores de condições de trabalho, apenas Participação (U = 162,000; p < 0,01) foi capaz de diferenciar significativamente os perfis de saúde, indicando que os profissionais com BEP Equilibrado são os que se percebem mais influentes e socialmente valorizados, mais autônomos e com maior liberdade para tomar decisões no trabalho (Tabela 7).
Discussão
Esta pesquisa, embasada no modelo ecológico de Warr (2007; 2013), examinou características laborais percebidas por profissionais judiciários como fontes de felicidade ou de infelicidade no trabalho. Os resultados identificaram dois perfis diferenciados de bem-estar psicológico, prevalecendo mais felicidade nos profissionais casados (78,1%) e nos mais socialmente valorizados, que tenderam a apresentar BEP Equilibrado.
A pesquisa de Ferreira e Mendes (2003) com auditores fiscais da Previdência Social também identificou predominância de maior equilíbrio emocional entre os profissionais casados, o que foi explicado pela possibilidade de que, talvez, eles tenham desenvolvido melhores estratégias de adaptação às condições oferecidas pela instituição pela necessidade de permanecerem no emprego para horarem compromissos e responsabilidades assumidas no âmbito familiar. Sabe-se que nas empresas públicas brasileiras, empregados concursados podem permanecer até a aposentadoria, mas o processo de reestruturação produtiva lhes trouxe ameaça velada do desemprego (Alves, 2015), sendo razoável pensar que, também, no caso do TJ o esforço do controle emocional pode estar sendo maior entre os profissionais casados porque, para eles, assegurar o emprego significa suprir o sustento familiar.
No que tange às características ambientais (avaliadas por fatores do QCT), os resultados mostraram que "equidade nas ações" (avaliada pelo fator Respeito às Limitações) foi percebida como a mais abundante no TJ, indicando que a maioria considerou receber tratamento muito justo por parte da organização. Esta característica laboral, além de muito importante para o fortalecimento da relação de confiança entre empregado/organização, é coerente com os princípios de justiça do TJ referenciados em leis, devendo ser preservada na organização porque está entre aquelas de Efeito Constante (EC) e, portanto, o seu excesso não traz prejuízo à saúde.
As categorias ambientais "clareza do meio ambiente" (avaliada pelo fator Objetivos) e "oportunidade de controle" (avaliada pelo fator Normatização), foram percebidas como as segundas mais abundantes, indicando que os profissionais conhecem bem suas atribuições e a obrigatoriedade de seguir com exatidão os regulamentos e normas institucionais para consecução dos objetivos institucionais. Sabe-se que ter domínio e conhecimento claro das atividades burocráticas legislativas é absolutamente necessário para evitar erros e injustiças, e essencial no planejamento e alcance de metas, e que doses equilibradas dessas duas categorias, segundo Warr (1987; 2013), reduzem sentimentos de ansiedade e desesperança. Contudo, doses exageradas podem exacerbar a autoconfiança do trabalhador, levando-o a cometer atos imprudentes ou estagnar a busca por novos conhecimentos e habilidades por acreditar que já não há mais o que aprender. Recorda-se que estas duas categorias causam Diminuição Adicional (DA), portanto a percepção excessiva surte bons efeitos, mas até certo ponto, depois pode danificar a saúde. Warr (1987; 2013) considera que os efeitos tóxicos podem ser evitados quando organização e/ou trabalhador constroem ações eficazes para lidar com o excedente. Não se sabe, contudo, quais ações vêm sendo praticadas no TJ, mas é possível que elas estejam se mostrando eficazes já que o nível de felicidade foi prevalente em 34 servidores (47,2%), que apresentaram BEP Equilibrado.
A categoria "posição socialmente valorizada" (avaliada pelo fator Participação) foi percebida em dose moderada-alta, indicando que a amostra se orgulha por ocupar função de status e de importante contribuição social. Este resultado corrobora os estudos de Antunes (2015) e de Paixão (2000), que também identificaram sentimento de orgulho em magistrados por exercerem uma profissão socialmente reconhecida e vocacionada a ajudar pessoas.
A categoria "apoio do supervisor" (avaliada pelo fator Suporte e Proteção), percebida em dose baixo-moderada, indicou que, para a amostra, os chefes não se mostram suficientemente preocupados com o aperfeiçoamento dos subordinados; fato também observado por Machado et al. (2019) em oficiais de justiça, que relataram aprender o trabalho sozinhos ou com colegas, sem ajuda dos chefes. Ambas as categorias produzem Efeito Constante, ou seja, não prejudicam a saúde mental quando percebidas em doses equilibradas. Este foi o caso da posição social valorizada, mas não do apoio do supervisor que se mostrou o aspecto mais deficitário no TJ e, portanto, um fator de desproteção à saúde.
A categoria "contato com outras pessoas" (avaliada pelo fator Violência), percebida em doses baixíssimas, indicou prevalência de um clima de grande amizade, coleguismo e camaradagem no trabalho, e que inexistem conflitos interpessoais, ou eles são bastante reduzidos. Este resultado é benéfico à saúde, mas até certo ponto, já que esta categoria está entre as que causam DA. Significa que após se ter alcançado níveis moderados de amizades no âmbito do trabalho, não há nenhum benefício adicional à saúde a partir do aumento da amizade. Segundo Warr (2013) doses demasiadas de intimidade e afeição nas relações interpessoais não é desejável, pois geralmente dificultam atos de imparcialidade e criam favorecimentos no trabalho, podendo-se concluir que este aspecto deve ser mais bem administrado no TJ para evitar futuros danos à saúde do coletivo de trabalho.
De modo geral, nenhuma categoria ambiental se mostrou fortemente desgastante à saúde, contudo "Apoio do supervisor" foi vista como a mais empobrecida e indicadora de menor bem-estar, o que implica dizer que para a amostra as oportunidades de desenvolvimento e qualificação profissional lhes são pouco oferecidas, ou muito aquém do que precisam para manterem-se produtivos no trabalho. A categoria "posição socialmente valorizada" se destacou como uma característica forte nos dois perfis de BEP, sendo mais presente no grupo com perfil Equilibrado.
Considerações Finais
Observou-se nesta pesquisa que o ambiente laboral dos profissionais de justiça de Patos (PB) possui características potencialmente geradoras de felicidade e de infelicidade no trabalho. Os resultados evidenciaram que a categoria "posição socialmente valorizada" (de efeito constante) se destacou como o fator de melhor proteção à saúde mental da amostra, devendo ser constantemente estimulada no Fórum com ações que deem mais visibilidade social aos trabalhos judiciais. Com essa finalidade é recomendável, por exemplo, investir na divulgação de temáticas de interesse popular por meio de encontros virtuais, redes sociais e mídias diversas. Também as categorias "clareza do meio ambiente" e "objetivos gerados externamente" se mostraram mais positivamente avaliadas e benéficas ao bem-estar psicológico, porém como elas estão entre aquelas que surtem efeito de diminuição adicional, devem ser mais bem administradas no TJ para conter futuros danos psíquicos. Implementar ações como, distribuir tarefas claras, fornecer feedbacks contínuos, reduzir cargas de trabalho e suprimir atividades em situação home-office, podem ser boas medidas, mas se deve evitar que elas sejam prescritivas da gerência e sim planejadas nos espaços coletivos e de forma condizente às reais expectativas dos trabalhadores.
Dentre as categorias mais negativamente avaliadas, foi "apoio do supervisor" que se destacou como a mais deficitária no ambiente estudado, devendo este aspecto ser melhorado ofertando aos servidores insumos, sobretudo informacionais e de incentivo ao conhecimento, já que esses aspectos se tornaram fundamentais na consecução das metas produtivas e consequente avaliação do desempenho individual no trabalho. Assim, pode-se, por exemplo, incrementar cursos e treinamentos para capacitação regular dos profissionais, voltados as suas especialidades e atribuições no Tribunal de Justiça.
Estes resultados representam importante contribuição científica, podendo subsidiar a instituição a planejar ações de promoção da saúde baseadas em discussões coletivas que possam manter, incrementar ou equilibrar o suprimento de características sociolaborais protetivas à saúde mental, considerando seus potenciais efeitos constantes e de diminuição adicional. Apesar dessa contribuição, a pesquisa apresenta algumas limitações. Uma delas se refere ao fato de ter-se excluído os servidores com licença médica devido à dificuldade de localizá-los, embora se saiba que conhecer as causas das doenças que motivaram o afastamento ajudaria a identificar e compreender melhor os déficits de bem-estar psicológico dos servidores relativos às condições de trabalho. Outra limitação é que a pesquisa, por seu caráter transversal, não possui poder de generalização dos resultados para outras realidades laborais externas ao local onde o estudo foi realizado, sendo recomendável se fazer uma leitura parcimoniosa dos dados apresentados e discutidos. Uma terceira limitação diz respeito à ausência de dados qualitativos que pudessem explorar mais profundamente as vivências subjetivas de trabalho na amostra, o que certamente possibilitaria obter mais informações sobre as condições de trabalho.
Ademais, Warr (1987; 2007; 2013) não apresenta nenhum instrumento para mensurar as 12 características ambientais, o que dificulta encontrar uma escala validada no Brasil que atenda a essa finalidade. Se usou o QCT por ser composto por um conjunto de fatores muito próximo dos fatores ambientais de Warr, embora essa alternativa tenha demandado interpretar os resultados com certa cautela. Apesar dessas limitações, o QCT e demais instrumentos se mostraram apropriados à consecução dos objetivos da pesquisa, gerando resultados que podem promover discussões sobre saúde dos trabalhadores judiciários, e sobre a importância de se estudar o bem-estar psicológico como um construto multidimensional articulando técnicas variadas de análise de dados. Além disso, o fato de BEP no trabalho estar relacionado à percepção que trabalhadores têm do ambiente laboral, seria importante empreender novas pesquisas apoiadas no modelo ecológico de Peter Warr que pudessem explorar indicadores como, engajamento no trabalho, suporte social no trabalho e satisfação no trabalho.
Referências
Adorno-Júnior, H. L., & Muniz, R. V. (2016). Os reflexos da implantação do processo judicial eletrônico sobre a saúde de seus sujeitos processuais. Revista Universitas, 9(17),77-98. Recuperado de http://www.revistauniversitas.inf.br/index.php/UNIVERSITAS/article/viewFile/233/160 [ Links ]
Arenas, M. V. S., & Piccinini, V. C. (2019). Assédio moral em uma instituição do poder judiciário do norte do país. Revista Temas em Saúde, 19(5),63-88. Recuperado de http://temasemsaude.com/wp-content/uploads/2019/10/19505.pdf [ Links ]
Alves, G. (2015). Precarização do trabalho, qualidade de vida e saúde dos magistrados trabalhistas no Brasil. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, 47(1),243-259. Recuperado de https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/100765/2015_alves_giovanni_precarizacao_trabalho.pdf?sequence=1&isAllowed=y [ Links ]
Alves, G. (2016). Crise do capitalismo global, desmedida do valor e as mutações orgânicas da totalidade viva do trabalho: notas críticas sobre o capitalismo do século XXI. Caderno do CEAS: Revista Crítica de Humanidades, 239(1),681-697. http://doi.org/10.25247/2447-861X.2016.n239.p681-697 [ Links ]
Amazarray, M. R., Oliveira, G. F., & Feijó, F. R. (2019). Contexto de trabalho e transtornos mentais comuns em trabalhadores do judiciário federal do Rio Grande do Sul, Brasil. Revista Psicologia: Organizações e Trabalho, 19(3),687-694. https://doi.org/10.17652/rpot/2019.3.16744 [ Links ]
Antunes, R. (2018). O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Boitempo. [ Links ]
Borges, L. O., & Argolo, J. C. T. (2002a). Adaptação e validação de uma escala de bem-estar psicológico para uso em estudos ocupacionais. Avaliação Psicológica, 1(1),17-27. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid =S1677-04712002000100003&lng=pt&tlng=pt [ Links ]
Borges, L. O., & Argolo, J. C. T. (2002b). Estratégias organizacionais na promoção da saúde mental do indivíduo podem ser eficazes? Em M. G. Jacques & W. Codo (Orgs.), Saúde mental e trabalho: leituras (pp. 271-295). Petrópolis: Vozes. [ Links ]
Borges, L. O., Costa, M. T. P., Alves-Filho, A., Souza, A. L. R., Falcão, J. T. R., Leite, C. P. R. L. A., & Barros, S. C. (2013). Questionário de condições de trabalho: reelaboração e estruturas fatoriais em grupos ocupacionais. Avaliação Psicológica, 12(2),213-225. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v12n2/v12n2a12.pdf [ Links ]
Borges, L. O., Primo, G. M. G., Barros, S. C., Santos-Neto, S. P., Heleno, C. T., & Motta, G. M. V. (2019, submetido). Questionário de Condições de Trabalho para servidores universitários: validade convergente e discriminante. [ Links ]
Ferreira, M. C., & Mendes, A. M. (2003). Trabalho e riscos de adoecimento. Brasília: LPA. [ Links ]
Fonseca, R. M. C., & Carlotto, M. S. (2011). Saúde mental e afastamento do trabalho em servidores do judiciário do estado do Rio Grande do Sul. Psicologia em Pesquisa, 5(2),117-125. [ Links ]
Goldberg, D. P. (1972). The detection of psychiatric illness by questionnaire. Londres: Oxford University Press. [ Links ]
Gouveia, V. V., Fonsêca, P. N., Lins, S. L. B., Lima, A. V. de, & Gouveia, R. S. V. (2008). Escala de bem-estar afetivo no trabalho (JAWS): evidências de validade fatorial e consistência interna. Psicologia: Reflexão e Crítica, 21(3),464-473. https://doi.org/10.1590/S0102-79722008000300015 [ Links ]
Katwyk, P. T. V., Spector, P. E., Fox, S., & Kelloway, E. K. (2000). Using the job-related affective well-being scale (JAWS) to investigate affective responses to work stressors. Journal of Occupational Health Psychology, 5(2),219-230. https://doi.apa.org/doi/10.1037/1076-8998.5.2.219 [ Links ]
Lima, D. M. C., Fraga, V. F., & Oliveira, F. B. (2016). O paradoxo da reforma do judiciário: embates entre a nova gestão pública e a cultura organizacional do jeitinho. Revista de Administração Pública, 50(6),893-912. http://doi.org/10.1590/0034-7612152761 [ Links ]
Macêdo, D. V. C. (2018). Algumas considerações sobre o trabalho e sua precarização no contexto capitalista. Revista em Pauta, 41(16),240-255. https://doi.org/10.12957/rep.2018.36700 [ Links ]
Machado, P. I. S., Stefano, S. R., Kuhl, M. R., & Campos, E. A. R. (2019). Fatores causadores de estresse: um estudo descritivo com os oficiais de justiça avaliadores federais. Revista Gestão & Regionalidade, 35(103),5-24. https://doi.org/10.13037/gr.vol35n103.4414 [ Links ]
Maio, I. S. (2019). Os impactos do teletrabalho na saúde mental dos trabalhadores: um estudo na justiça federal do Rio de Janeiro. Anais do 160 Congresso Brasileiro de Assistentes sociais. Brasília, Brasil, 1-13. Recuperado de https://broseguini.bonino.com.br/ojs/index.php/CBAS/article/view/146/143 [ Links ]
Marrone, D. B. D., Souza, L. K., & Hutz, C. S. (2019). O uso de escalas psicológicas para avaliar autoestima. Avaliação Psicológica, 18(3),229-238. http://doi.org/10.15689/ap.2019.1803.15982.02 [ Links ]
Oliveira, E. R. (2018). Impacto do trabalho voluntário nos níveis de empatia, autoestima e bem-estar subjetivo (Dissertação de Mestrado, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil). Recuperado de https://www.researchgate.net/publication/340465163_Impacto_do_trabalho_voluntario_nos_niveis_de_empatia_autoestima_e_bem-estar_subjetivo [ Links ]
Paixão, R. (2000). O significado do trabalho no judiciário em Mato Grosso do Sul (Dissertação de mestrado em Administração de Empresas), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS. Recuperado de http://.handle.net/10183/1823 [ Links ]
Pinheiro, C. R. R. (2020). O modelo gerencialista implantado no poder judiciário e o impacto na magistratura (Tese de doutorado, Universidade Estadual de Campinas, Brasil). Recuperado de http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/343058 [ Links ]
Pooli, A. M., & Monteiro, J. K. (2018). Assédio moral no judiciário: prevalência e repercussões na saúde dos trabalhadores. Revista Psicologia: Organizações e Trabalho, 18(2),346-356. https://doi.org/10.17652/rpot/2018.2.13516 [ Links ]
Ramos, E., & Miranda-Netto, E. (2020). O novo imperialismo e o neoliberalismo nas políticas das instituições de justiça na América Latina: uma análise a partir da reforma do poder judiciário brasileiro e da busca pela consolidação do estado democrático de direito. Revista Direito em Debate, 29(53),128-140. https://doi.org/10.21527/2176-6622.2020.53.128-140 [ Links ]
Reis, T. S. (2019). Expropriação do funcionalismo público: o gerencialismo como projeto. Revista Katálysis, 22(1),80-89. https://doi.org/10.1590/1982-02592019v22n1p80 [ Links ]
Rodrigues, C. F. S., Lima, F. J. C., & Barbosa, F. T. (2017). Importância do uso adequado da estatística básica nas pesquisas clínicas. Revista Brasileira de Anestesiologia, 67(6),619-625. https://.doi.org/10.1016/j.bjan.2017.01.0030 [ Links ]
Rosenberg, M. (1965). Society and the adolescent self-image. Princeton: Princeton University Press. [ Links ]
Santos, J. F., Holanda, A. S. S., Oliveira, G. S. S., Mendonça, C. N. G., Veras, A. C. C., & Leite, F. N. T. S. (2018). Relação entre qualidade de vida e capacidade para o trabalho em funcionários do poder judiciário. Revista Brasileira de Medicina do Trabalho, 16(1),2-9. https://doi.org/10.5327/Z1679443520180068 [ Links ]
Santos, K. A. B. (2019). Atividade laboral dos oficiais de justiça no poder judiciário do Rio Grande do Norte: riscos e precarização (Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil). Recuperado de https://repositorio.ufrn.br/jspui/handle/123456789/28218 [ Links ]
Santos, S. V. M., Macedo, F. R. M., Silva, L. A., Resck, Z. M. R., Nogueira, D. A., & Terra, F. S. (2017). Acidente de trabalho e autoestima de profissionais de enfermagem em ambientes hospitalares. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 25(1),1-8. https://doi.org/10.1590/1518-8345.1632.2872 [ Links ]
Sbicigo, J. B., Bandeira, D. R., & Dell'Aglio, D. D. (2010). Escala de Autoestima de Rosenberg (EAR): validade fatorial e consistência interna. Psico-USF, 15(3),395-403. http://doi.org/10.1590/S1413-82712010000300012 [ Links ]
Silva, R. S. (2017). Reflexão clínica acerca do trabalho de servidores do poder judiciário no estado do Rio Grande do Sul (Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil). Recuperado de https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/178660 [ Links ]
Silvano, A. M. C. (2016). Possibilidades e limites da abordagem quantitativa na pesquisa em educação. Educação, Escola e Sociedade, 9(9),95-110. Recuperado de https://www.periodicos.unimontes.br/index.php/rees/article/view/286/319 [ Links ]
Tertuliano, M. R. V. (2018). Condições de trabalho e saúde psíquica dos trabalhadores de saneamento básico na região metropolitana de Belo Horizonte (Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil). Recuperado de http://hdl.hnadle.net/1843/BUOS-B6ZELN [ Links ]
Trevisanuto, T. M. C. (2018). A revolução 4.0 e os impactos na área jurídica. Revista Jurídica das Faculdades Integradas de Bauru, n. especial, 183-192. Recuperado de https://revistas.fibbauru.br/jurisfib/article/view/338/309 [ Links ]
Velasco, L. B. (2016). O assédio laboral intentado contra as mulheres do judiciário gaúcho: uma abordagem crítica sobre o arquétipo do feminino no judiciário brasileiro (Trabalho de Conclusão de Curso, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil). Recuperado de http://repositorio.furg.br/handle/1/7423 [ Links ]
World Health Organization (1984). Health promotion: a discussion document on the concept and principles. Geneva: WHO. [ Links ]
Warr, P. (1987). Work, unemployment, mental health. New York: Oxford University Press. [ Links ]
Warr, P. (2007). Learning about employee happiness. Revista Psicologia: Trabalho e Organizações, 7(2),133-140. Recuperado de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rpot/v7n2/v7n2a08.pdf [ Links ]
Warr, P. (2013). Fuentes de felicidad e infelicidad en el trabajo: una perspectiva combinada. Journal of Work and Organizational Psychology, 29(3),99-106. https://doi.org/10.5093/tr2013a15 [ Links ]
Informações sobre os autores:
José Luciano Vieira de Freitas Júnior
E-mail: lucianojuniorpsi@gmail.com
Silvânia da Cruz Barbosa
E-mail: silv.barbosa@gmail.com
Submissão: 08/08/2020
Primeira Decisão Editorial: 15/05/2021
Versão Final: 29/05/2021
Aceito em: 27/11/2021