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Desidades
versão On-line ISSN 2318-9282
Desidades no.29 Rio de Janeiro jan./abr. 2021
TEMAS EM DESTAQUE TEMAS SOBRESALIENTES
A escola como promotora da saúde mental e do bem-estar juvenil: oficinas pedagógicas com adolescentes
The school as a supporter of mental health and the well-being of the youth: pedagogical workshops with teenagers
La escuela como promotora de la salud mental y el bienestar de los jóvenes: talleres pedagógicos con adolescentes
Sonia Maria Ferreira KoehlerI; Nathália Garcia Panacioni GonzalesII; Júlia Barbeito MarpicaIII
ICentro Terapêutico / Guaratinguetá-SP, Brasil. Professora Titular Aposentada do Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL) - Campus Lorena, Brasil. Psicóloga e Pedagoga. Doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano. IPUSP, Brasil (2003). Mestre em Psicologia da Educação. PUCSP, Brasil (1995). E-mail: soniakoehler@hotmail.com
IICentro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL-Lorena), Brasil. Terceiranista do Curso de Formação em Psicologia - Bacharelado e Licenciatura. Bolsista BEXT-SAL, Programa de Bolsas de Extensão (BEXT-SAL 2019-2020). Integrante do Grupo de Estudos do Observatório de Violências nas Escolas, SP, Brasil. E-mail: nathaliaggonzales@hotmail.com
IIICentro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL-Lorena), Brasil. Terceiranista do Curso de Formação em Psicologia - Bacharelado e Licenciatura. Bolsista BEXT-SAL. Programa de Bolsas de Extensão (BEXT-SAL 2019-2020). Integrante do Grupo de Estudos do Observatório de Violências nas Escolas, SP, Brasil. E-mail: juliabarbeitomarpica@hotmail.com
RESUMO
O presente artigo trata de um relato de experiência sobre um projeto de extensão composto por oficinas de vertente pedagógica e psicológica realizadas com 91 alunos/as matriculados/as no Ensino Médio de uma escola estadual, com idades entre 14 e 17 anos, no ano de 2019. O projeto buscou construir coletivamente recursos fundamentais para a proteção e a promoção da saúde mental e bem-estar dos jovens dentro e fora do ambiente escolar, através da troca de experiências que possibilitaram a participação ativa e o protagonismo dos adolescentes no enfrentamento das adversidades e desafios que atravessam seus cotidianos. A experiência procurou demonstrar a importância da implementação de projetos que viabilizem a expressão e a discussão acerca das realidades e relações que permeiam as vivências das juventudes, bem como promover um diálogo entre educação e saúde que oportunize a reflexão crítica a respeito da construção de um desenvolvimento juvenil integral e plural.
Palavras-chave: psicologia e educação, saúde e educação, adolescência e saúde, escola e saúde mental.
ABSTRACT
This article comes to an experience report on an extension project composed of workshops with pedagogical and psychological aspects, carried out, in 2019, with 91 high-school students from a public school, ages from 14 to 17. The project aimed at collectively developing essential resources to promote mental health safety and the well-being of the students inside and outside scholar environment, by the means of exchanging experiences which resulted in the active participation and prominence from the teenagers in facing adversities and challenges on a daily basis. The experience meant to present the importance of implementing projects in which the youth can express themselves and discuss on the reality and relationships of their lives, as well as promoting a direct link between health and education in order to benefit critical reflection on making a plural and integral youthful growth.
Keywords: psychology and education, health and education, youth and health, school and mental health.
RESUMEN
El presente artículo trata de un relato de experiencia desarrollado en un proyecto de extensión universitaria. Compuesto por talleres pedagógicos y psicológicos realizado con 91 alumnos matriculados en el Bachillerato de una escuela pública, de entre 14 y 17 años, en el año 2019. El proyecto tuvo por objetivo construir colectivamente recursos fundamentales para la protección y promoción de la salud mental y el bienestar de los jóvenes, dentro y fuera de la escuela. El intercambio de experiencias posibilitó la participación activa y el protagonismo de los adolescentes en el enfrentamiento de la adversidades y desafíos que atraviesan su día a día. La experiencia intentó demostrar la importancia de implementar proyectos que permitan la expresión y discusión sobre las realidades y relaciones que hacen parte de la vida de los jóvenes, ademas de proporcionar un diálogo entre educación y salud que permita la reflexión crítica acerca de la construcción de un desarrollo juvenil integral y plural.
Palabras clave: psicología e educación, salud y educación, adolescencia y salud, escuela y salud mental.
A escola como promotora da saúde mental e do bem-estar juvenil: oficinas pedagógicas com adolescentes
Promover um diálogo entre educação e saúde é essencial no que tange ao desenvolvimento de pessoas, sobretudo das juventudes. Conforme elucidam Casemiro, Fonseca e Secco (2014), são áreas que caminham juntas, pois bons níveis de educação estão relacionados a uma sociedade mais saudável, e uma população saudável tem maiores possibilidades de se apropriar dos conhecimentos da educação formal e informal. A saúde, nesse sentido, configura-se como um importante recurso do desenvolvimento humano, pessoal e social atravessada por inúmeros fatores ambientais, biológicos, políticos e econômicos que atuam como determinantes na qualidade de vida e bem-estar dos sujeitos (Brasil, 2016a), sendo, portanto, "um conceito em construção, em movimento, dependendo de valores sociais, culturais, subjetivos e históricos" (Brasil, 2002a, p. 12).
Sendo assim, como já propunha a 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986), importante marco histórico na promoção da saúde no Brasil, é fundamental compreendê-la sob a ótica da integralidade, de maneira a envolver e fortalecer diferentes setores, instituições, serviços e ações no cuidado e proteção à vida humana (Brasil, 2019; Carvalho, 2008). Nesse sentido, a escola, enquanto instituição educativa, configura-se como um importante espaço para a concretização de ações de saúde, uma vez que nela o adolescente passa grande parte de seu dia, troca experiências, adquire conhecimentos e constrói vínculos (Faial, L. et al., 2016). Portanto, é também responsabilidade da escola adotar práticas e iniciativas que deem oportunidade para que haja condições necessárias para a manutenção da saúde e bem-estar dos estudantes, pautada numa perspectiva de atenção integral e atendimento às necessidades dos mesmos, "numa relação dialógica do cuidar/ser cuidado, do ensinar/aprender" (Brasil, 2002a, p. 14).
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), legitimado em 1990 no Brasil, foi fundamental para a garantia de proteção à vida e à saúde das crianças e adolescentes mediante a efetivação de políticas públicas que possibilitem o crescimento sadio e harmonioso deles, sendo o direito à educação primordial para o desenvolvimento pessoal e o exercício da cidadania (Brasil, 1990). Nesse sentido, a escola assume, além da sua função pedagógica, uma função que é social e política, direcionada à transformação da sociedade através da prática da cidadania, da oferta de conhecimentos e oportunidades de aprendizagem, crescimento e, portanto, do compromisso com ações que viabilizem propostas de promoção da saúde (Brasil, 2002b). Desse modo, o processo educativo deve garantir a formação do ser humano ao nível físico, intelectual e moral, sendo ator fundamental para o desenvolvimento integral dos sujeitos (Toledo, 2019). A educação, nesse viés, encontra-se atrelada à saúde na medida em que possibilita o crescimento pessoal e a interação com o outro, o que subsidia a construção de projetos, relações e ambientes mais saudáveis (Ribeiro et al., 2016).
Logo, de acordo com o Ministério da Saúde (Brasil, 2002b), promover saúde na esfera da educação formal diz respeito à integração de saberes para conscientizar e estimular a autonomia, cuidar da saúde mental e estabelecer diálogos e comunicação entre os sujeitos, objetivando envolvê-los nessa tarefa de forma compartilhada. Compreender, assim, que a educação e o conhecimento são construídos através da interação e colaboração entre os indivíduos, fruto das motivações, experiências e valores de cada um e que, portanto, promover saúde no contexto escolar "tem a ver com respeito às possibilidades e aos limites do corpo, do intelecto e das emoções, da participação social e do estabelecimento de alianças" (Brasil, 2002b, p. 535).
Dessa maneira, segundo Gomes e Horta (2010), o elo entre essas áreas somadas ao suporte familiar é fundamental para a constituição dos sujeitos e para o incentivo ao autocuidado com a saúde, além de valorizar sua participação e protagonismo nos diversos contextos em que atuam. Para tanto, é necessário reconhecer no adolescente que se encontra na escola sua subjetividade, seus diferentes modos de vida e as dimensões sociais, econômicas, familiares e afetivas que o influenciam, fazendo uso da atenção e da escuta para perceber o sentido das queixas e demandas que apresentam (Gomes; Horta, 2010).
Para além do desenvolvimento e das transformações que ocorrem a nível biológico, físico, cognitivo e emocional próprias desse período, a adolescência deve ser compreendida como uma construção social (Papalia; Feldman, 2013). Assim, as mudanças que ocorrem nesse período também perpassam os modos de agir e pensar do jovem, seu posicionamento e assunção de papéis diante dos grupos e espaços de que faz parte (Gonçalves et al., 2016). Dessa maneira, existem diferentes fatores que podem afetar a saúde dos adolescentes até a vida adulta, incluindo comportamentos de risco como uso de drogas, exposição à violência e maus-tratos, dificuldade de acesso à escola e serviços de saúde, pobreza, entre outros (Araújo et al, 2015). Segundo os autores, tais condições tornam essa faixa etária mais vulnerável nos âmbitos psíquico, biológico e social, o que exige uma atenção mais ampla e sensível voltada à saúde do adolescente. Além disso, as juventudes também expressam vulnerabilidades nas dimensões dos valores, emoções e contextos culturais, o que destaca a participação juvenil no cuidado e na cidadania como impulsionadora do desenvolvimento humano, da autonomia, da transformação social e, por consequência, do bem-estar subjetivo (Guimarães; Lima, 2011).
Nessa perspectiva, a adolescência não deve ser interpretada como um período de transição entre a infância e a vida adulta, interpelada por ambivalências, rebeldia e desafios como geralmente é caracterizada por diferentes concepções (Schoen-Ferreira; Aznar-Farias; Silvares, 2010), mas, sim, como um momento de significados e interpretações próprias de cada indivíduo em um contexto social e histórico, com marcas culturais. Nesse viés, Bock (2007) elucida que a adolescência é vista como uma construção social, com repercussões na subjetividade e no desenvolvimento dos sujeitos e que, portanto, pode assumir novas formas de interpretação na sociedade. Ser adolescente carrega, primordialmente, inúmeras possibilidades de expressão, com novas maneiras de ser e existir (Berni; Roso, 2014).
A adolescência é, nessa perspectiva, um processo que "não só sofre influências de sua cultura, mas que se constitui a partir dela" (Berni; Roso, 2014, p. 132). Assim como a adolescência, o conceito de juventude pode ser considerado bastante amplo, complexo e dinâmico, uma construção social, histórica e mutável entre culturas e gerações. Para Abramovay e Castro (2015), as experiências e vivências pertencentes ao campo das juventudes se expressam de maneira diversa e distinta, assim como apresentam diferentes representações e significados nos mais variados contextos. Constroem-se, portanto, através da produção de estereótipos, referências e marcos históricos de cada sociedade, perpassadas por questões de gênero, classe, raça, grupo, entre outras (Abramovay; Castro, 2015).
Uma dimensão importante da condição juvenil, segundo Dayrell e Carrano (2014), é a sociabilidade. Esta se desenvolve em espaços de lazer e também na escola e no trabalho, já que, através dos grupos de pares e amigos, os jovens ampliam suas referências e experiências na construção de suas identidades. A sociabilidade pode se expressar, também, em diferentes tempos e espaços intersticiais recriados de maneira a oportunizar trocas afetivas, comunicação e solidariedade em meio aos determinismos institucionais. Dessa maneira, as discussões no campo das juventudes perpassam pelo reconhecimento do processo de socialização e transmissão de valores que se estabelecem nas relações com a escola e dentro dela (Abramovay; Castro; Waiselfisz, 2015).
Sob esse viés, para Buss (2001), o ambiente em que o adolescente se desenvolve e está inserido é um dos fatores que mais influencia as condições do seu existir. Nesse sentido, é preciso pensar em ações que transformem os sujeitos, que os preparem para enfrentar as adversidades, uma educação alicerçada na saúde é parte de uma formação ampla para a cidadania e promove a articulação de saberes de maneira integral, bem como a participação de diversos indivíduos no meio social (Carvalho, 2015). Sendo assim, segundo o autor, a escola é o lugar onde a realidade deve ser questionada e refletida, e as ações que visam à saúde, quando associadas a práticas pedagógicas, podem ser o ponto de partida.
A escola é, assim, um importante ambiente de intercâmbio de ideias, troca de conhecimento, de construção pessoal e coletiva, pluralismo cultural, de encontro e crescimento. Constitui um espaço que possibilita a aprendizagem não somente no viés cognitivo e curricular, mas também na representação de "um campo de interações sociais, crescimento integral e construção cultural" (Brasil, 2015, p. 5). A instituição educativa não apenas transmite conhecimentos, nem mesmo apenas os produz, mas ela também fabrica sujeitos, produz identidades e deve estar, intrinsecamente, comprometida com a manutenção da sociedade (Louro, 2014).
Paulo Freire (1996), ao pensar sobre os desafios da educação, considera que uma das importantes tarefas da prática educativo-crítica é propiciar condições para que os sujeitos, em suas relações uns com os outros, tenham a experiência de assumirem-se como seres históricos, sociais, pensantes, criadores e ativos, agentes de transformação do seu entorno. De acordo com Gomes e Horta (2010), um ambiente educativo que promova práticas de cuidado e atenção à saúde, pautadas no respeito aos indivíduos enquanto seres humanos e na valorização de suas qualidades, favorece a assimilação e a capacidade de tomar decisões. Nesse mesmo viés, a escola representa um local promissor para a prática das ações de saúde na medida em que possibilita aos jovens a apropriação da realidade, das relações interpessoais e do próprio ambiente (Faial, L. et al., 2016). Leão, Dayrell e Reis (2011) elucidam que aos jovens devem ser proporcionados tempos, espaços e relações de qualidade que lhes possibilitem experimentar e desenvolver suas habilidades.
Por outro lado, como apontam Dayrell e Carrano (2014), nem sempre a escola dá voz ao jovem em escolhas importantes a serem tomadas acerca de questões que dizem respeito a ele e à própria instituição da qual faz parte, sendo que tal realidade desestimula a participação ativa e o protagonismo dos estudantes. Nesse sentido, cabe à escola buscar compreender a relação que o aluno estabelece com ela, o que faz sentido para ele naquele espaço e com o que se aprende para, então, sustentar suas expectativas e sonhos (Abramovay; Castro; Waiselfisz, 2015). É preciso, como propõem Dayrell e Carrano (2014), pensar de que maneira os espaços em que os jovens atuam, recriam e atribuem significados inspiram suas decisões e projetos de vida. Compreender, portanto, que estes vivenciam o tempo de maneira singular e distinta nos diferentes ambientes que ocupam, seja na escola, seja em casa ou no trabalho. Através da produção de significados e das interações afetivas e simbólicas, esses espaços passam a ter sentido, tornam-se um lugar e nele se constroem memórias individuais e coletivas, atuando como suporte para as relações sociais que se estabelecem (Dayrell; Carrano, 2014).
Segundo Weller (2014), um marco importante no processo de amadurecimento e ganho de autonomia na juventude é a elaboração de projetos de vida, momento que coincide com a vivência do Ensino Médio e ocorre de maneira dinâmica na medida em que os jovens lidam com as mudanças e situações que aparecem. Além de configurar uma etapa da escolarização, o Ensino Médio corresponde a um período em que se deposita nos jovens uma série de expectativas relacionadas à transição para a vida adulta, em termos de competências intelectuais, sociais, profissionais, dentre outras. Ademais, esse tempo é marcado por reflexões em torno da própria experiência, de um saber sobre si e da busca por sentido (Leão; Dayrell; Reis, 2011; Weller, 2014).
Assim, segundo os autores, o desafio da escola é fornecer ferramentas e informações para que os jovens que frequentam o Ensino Médio tenham a possibilidade de experimentar e traçar novos rumos diante da realidade que lhes é apresentada. É através do compartilhamento às demandas que surgem que o espaço educativo poderá contribuir para a constituição de identidades positivas e para a construção de projetos nas esferas individual e coletiva (ibidem). Portanto, como defende Pacheco (2019), é preciso se ocupar de uma educação inovadora, que procure ressignificar a relação com o saber, atribuir sentido aos espaços comuns e que estimule a autonomia e o protagonismo juvenil. E, ainda, conforme afirma Abromavay (2018), considerar a participação das juventudes como força motriz para a solidificação de uma educação que acolha de maneira ativa as diferentes formas de expressão e trajetórias individuais a fim de captar as potencialidades de cada aluno, gerando sentimentos positivos de motivação e pertencimento.
Isso posto, de acordo com o Ministério da Saúde (Brasil, 2015), uma vez que a escola assume papel fundamental nas interações sociais e no crescimento integral dos sujeitos, configura-se também como um espaço de construção da cidadania e do convívio entre os pares que, quando respeitoso, fomenta a edificação de uma cultura de paz e de prevenção às violências. A cidadania, segundo Guimarães e Lima (2011), é resultante desse processo de integração social e, nesse viés, na medida em que o jovem aprende a articular o sofrimento pessoal e as experiências sociais, constrói uma visão de mundo mais pautada na consciência crítica, o que interfere diretamente na organização e vivências da sociedade, bem como nos processos de construção de si e do outro.
A educação em saúde dentro do ambiente escolar permite aos jovens a incorporação de atitudes e comportamentos sadios em diferentes dimensões, desenvolve a noção de responsabilidade social e os capacita para a participação como sujeitos ativos e coautores em seu processo de saúde (Faial, L. et al., 2016). Desse modo, a aprendizagem contempla o desenvolvimento completo dos estudantes, incluindo competências e habilidades emocionais, como capacidade de comunicação e relacionamento, cooperação, confiança, responsabilidade, entre outros. Tal processo deve firmar-se na responsabilidade compartilhada entre os campos da educação e da saúde na proteção e promoção dos direitos humanos e no respeito indelével à diversidade de gênero, cultural, étnico-racial e religiosa. Desse modo, essa responsabilidade compartilhada é, juntamente com a família, protagonista no cuidar e no desenvolver da autoestima, criatividade e curiosidade em crianças, jovens e adultos (Brasil, 2015).
As possibilidades de construções internas e subjetivas do jovem, enquanto sujeito ativo, se dão, portanto, a partir das atividades externas, nas relações sociais e afetivas, o que ressalta a influência do entorno na esfera da saúde mental e bem-estar subjetivo dos indivíduos, nas diferentes fases do seu desenvolver. Nessa perspectiva, como ressalta a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), não é possível falar em saúde mental sem reconhecer os fatores externos que a influenciam, como as mudanças sociais, condições de trabalho, estilos de vida, questões de gênero, entre outros (OPAS, 2016).
Sendo assim, saúde mental, segundo o Relatório Mundial da Saúde (OMS, 2002), é um conceito amplo que abrange o bem-estar subjetivo, a autonomia, a autoeficácia, a competência e a autorrealização do potencial intelectual e emocional dos indivíduos. É necessário, nesse sentido, um entendimento da totalidade de aspectos que afetam o desenvolvimento físico, mental e social dos sujeitos, pois, como proposto, são "fios da vida estreitamente entrelaçados e profundamente interdependentes" (OMS, 2002, p. 29). Tal temática deve, primordialmente, dialogar com os diversos fenômenos sociais nos quais os adolescentes, em seu processo de adolescer, estão inseridos; isto é, deve estar ancorada em uma perspectiva múltipla e plural (Rossi et al., 2019). Nesse mesmo viés, outras informações fornecidas pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) destacam a adolescência como um período fundamental para o desenvolvimento de hábitos significantes na manutenção do bem-estar social e emocional (OPAS, 2018).
Ademais, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), citada pela Organização das Nações Unidas (ONU, 2018), um em cada cinco adolescentes enfrenta problemas de saúde mental e estima-se que metade das doenças mentais começa aos 14 anos de idade; porém, não recebem diagnóstico ou tratamento na maioria dos casos. A organização aponta, ainda, a depressão como uma das principais causas de adoecimento e incapacidade entre os jovens e o suicídio como sendo a segunda maior causa de morte entre pessoas de quinze a vinte e nove anos de idade (ONU, 2018). Sendo assim, a discussão em saúde mental se mostra urgente e necessária, uma vez que a não oferta de condições e serviços de saúde trazem prejuízos em todos os âmbitos da vida do adolescente, que se estendem até a vida adulta e comprometem suas possibilidades de prosperar (OPAS, 2018).
Sendo assim, o setor educacional se mostra como grande aliado na promoção da saúde através de ações que valorizem as capacidades dos sujeitos e ofereçam suporte para a tomada de decisões favoráveis à saúde individual e coletiva, direcionadas ao fortalecimento dos fatores de proteção e à construção de ambientes saudáveis para a edificação de uma nova cultura voltada para a qualidade de vida (Brasil, 2002b).
Logo, as relações interpessoais vivenciadas pelos jovens em diferentes contextos dão suporte às possibilidades de engajamento, de expressão e, por consequência, impulsiona-os para as diversas experiências da vida (Rossi et al., 2019). No entanto, de acordo com os autores, tais relações também podem ser violentas, desencadeadoras de estresse e podem contribuir com o sofrimento psíquico. A violência, segundo Witter (2010), encontra-se generalizada nas relações, instituições e na sociedade, manifestando-se em diferentes níveis e formas. Nesse sentido, embora a escola seja uma instituição que assume papel fundamental no desenvolvimento dos adolescentes, é também permeada por práticas violentas de natureza física e psicológica (Sales; Sousa, 2012). Para Alane Freire e Aires (2012), a prevenção e enfrentamento às violências nas escolas deve partir de uma compreensão ecológica do fenômeno; isto é, como sendo resultante das relações que se estabelecem entre as dimensões pessoais, sociais, familiares e educacionais em que o sujeito está inserido.
Diante disso, apoiado em uma práxis psicológica e crítica, como propõe Carneiro (2013), o trabalho interventivo deve buscar a integração dessas realidades, atuando, ainda, de maneira preventiva no enfrentamento às situações de injustiça, opressão e violência, na preservação e respeito à diversidade humana em sua complexidade. Sendo assim, para traçar possíveis soluções, é necessário, sobretudo, compreender o adolescente que se encontra na escola sob a ótica da integralidade, ou seja, reconhecendo todos os aspectos históricos, sociais, culturais e subjetivos que atravessam sua trajetória, que influenciam suas vivências e que atuam em seu bem-estar psicológico.
Assim, segundo Fabio Carvalho (2015), é importante reconhecer que os alunos, muitas vezes, expressam em seus comportamentos e hábitos suas experiências na família, na comunidade e que podem, por exemplo, reproduzir condutas violentas se assim for o ambiente em que se encontram. Portanto, através da aliança entre práticas pedagógicas e ações de saúde, a escola deve buscar refletir e questionar sobre essas realidades que se apresentam.
Na concepção de uma educação integral, a escola se configura como o espaço de encontro entre educação e saúde, um lugar privilegiado para a convivência social e para a consolidação de relações favoráveis à proteção e promoção da saúde (Brasil, 2018). Considera-se, portanto, que as experiências nos mais diversos meios repercutem no desenvolvimento da autonomia, adaptabilidade frente aos desafios, emoções e ações cotidianas dos adolescentes.
Isso posto, o cuidado em saúde mental, segundo Cardoso e Galera (2011), deve ser pensado em uma perspectiva plural, decorrente de uma intrínseca relação entre o sujeito, a família e diferentes profissionais, bem como os serviços de saúde. Esse cuidado não deve ser individualizante, mas deve procurar estabelecer diálogos com as múltiplas possibilidades de vivência da adolescência. O cuidado está diretamente relacionado à ampliação do horizonte de saberes, à mudança de comportamento e de perspectiva, ao engajamento e compartilhamento de valores, pois "cuidar de si é definir a própria existência, a sua forma de vida em um processo estruturante a constituição do sujeito" (Guimarães; Lima, 2011, p. 864).
É preciso, a partir disso, superar a percepção cultivada e sustentada socialmente de uma adolescência que se caracteriza como um período difícil, de crises e "rebeldia", uma vez que tal visão culpabiliza o sujeito e individualiza a questão da saúde mental, desconsiderando a influência e a responsabilidade do contexto sócio-histórico e aumentando, ainda mais, o sofrimento psíquico das juventudes (Rossi et al., 2019). Assim, o cuidado deve ser considerado como um processo que se constrói a partir das especificidades culturais, sociais, pessoais e emocionais, atento às demandas particulares de cada pessoa ou grupo. O cuidado, além disso, deve almejar, sobretudo, o destaque às potencialidades do indivíduo, de maneira a desenvolver sua autonomia frente aos dilemas que se apresentam (Cardoso; Galera, 2011).
Conforme salientam os autores, destaca-se o valor das relações interpessoais na construção das identidades juvenis, no suporte e estímulo para as vivências e expressões do ser, além de espaços que possibilitem dar voz aos adolescentes, a fim de compreender, sob a perspectiva deles, as questões que perpassam essa etapa de suas vidas. É essencial, portanto, investigar e refletir sobre quais fatores produzem sofrimento psíquico nos jovens na atualidade, quais vivências despertam angústia e emoções negativas neles, quais são as realidades que sustentam suas narrativas e como eles podem adquirir repertório para o enfrentamento de tais adversidades (Rossi et al., 2019). A educação em saúde, nesse sentido, revela-se como campo de orientação e construção coletiva de alternativas que permitam melhor compreender a relação saúde-doença-cuidado na busca pela concretização de hábitos de vida mais saudáveis, através da interlocução entre os saberes dos profissionais da saúde, os da educação e os advindos das vivências singulares dos sujeitos (Carvalho, 2015).
À vista disso, evidenciam-se a importância e a necessidade de promover espaços de escuta atenta nos quais os adolescentes se sintam acolhidos para falar, refletir e pensar sobre suas experiências e angústias, podendo manifestar, assim, sentimentos de pertencimento, segurança, confiança e apoio para o enfrentamento dos desafios (Rossi et al., 2019). Nesse sentido, a escola se apresenta como um lugar de possibilidades para o desenvolvimento de ações e atividades que contribuam com a responsabilização e o envolvimento das juventudes no cuidado com sua saúde e bem-estar (Gomes; Horta, 2010). Assim, considerar a saúde em seus múltiplos aspectos e mobilizar projetos e debates que coloquem em pauta as questões que permeiam as realidades dos alunos e da comunidade escolar são recursos que favorecem o compartilhamento de saberes e valores como cooperação e solidariedade, transformando o espaço educativo em um lugar de promoção à saúde (Brasil, 2002b).
Promover saúde é tocar nas diferentes dimensões humanas, é considerar a afetividade, a amorosidade e a capacidade criadora e a busca da felicidade como igualmente relevantes e como indissociáveis das demais dimensões (Brasil, 2002b, p. 535).
Sendo assim, acolher e legitimar as necessidades dos sujeitos e oferecer apoio nos mais diferentes contextos em que estão presentes são práticas que promovem a saúde mental e dão suporte para a construção de projetos individuais e coletivos, além de estimular a autonomia e o protagonismo nas relações e experiências cotidianas. Diante do exposto, o projeto relatado neste artigo teve como objetivo construir esse espaço de participação e cuidado para compreender como os jovens planejam seus projetos de vida na atualidade, além de favorecer o compartilhamento das questões que permeiam seu entorno. O trabalho foi desenvolvido por meio de grupos de oficinas de vertente pedagógica e psicológica, através de dinâmicas de grupo, rodas de conversa, entre outros recursos.
Descrição do trabalho de campo
O presente relato de experiência versa sobre o desenvolvimento de um projeto de extensão que se configurou como pesquisa-ação, isto é, um "tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo" (Thiollent, 1986, p. 15), em que se estabelece uma relação de ação e cooperação entre pesquisador e participante.
O estudo, realizado ao longo do ano de 2019, em uma escola da rede pública localizada no interior de São Paulo, foi conduzido por jovens universitários que atuaram como mediadores e facilitadores das oficinas, objetivando motivar a reflexão acerca de múltiplas questões que perpassam a experiência humana na fase da adolescência. Para a implementação da proposta, as oficinas englobaram aspectos pedagógicos e psicológicos ao abordarem diversas temáticas do cotidiano juvenil, captando suas percepções acerca das relações interpessoais, dos sentimentos e emoções experienciadas, como pensam e constroem um projeto de vida pessoal.
Foram convidados a fazer parte das oficinas todos os estudantes do período matutino (309) e vespertino (92), com idade entre 14 a 17 anos, totalizando 401 adolescentes. Participaram, em média, 91 alunos e alunas do 1º ao 3º ano do Ensino Médio. De maneira geral, considerando as outras atividades realizadas na escola, como reuniões, palestras e rodas de conversa, o projeto contemplou também professores, direção e coordenação.
Para a realização da proposta, o estudo se desenvolveu em etapas, com a participação semanal dos universitários mediadores em dias e horas regulares. Em um primeiro momento, foi realizada a observação da escola, enquanto campo de pesquisa. A partir do segundo semestre, foi iniciada a divulgação das oficinas e a inscrição dos interessados. O número de inscritos permitiu a composição de 5 grupos de 20 pessoas por sorteio e, assim, as oficinas, com a duração de 40 minutos, foram efetuadas semanalmente, mediadas por duplas de facilitadores em dias e horários diferentes, a fim de não comprometer a assiduidade dos estudantes nas aulas1. Foram desenvolvidas, ao todo, 63 oficinas com, em média, 12 participantes por cada dupla de facilitadores.
Nos primeiros encontros com o grupo, os mediadores solicitaram que cada participante sugerisse duas temáticas de seu interesse para serem discutidas ao longo das oficinas. A partir disso, as oficinas foram estruturadas previamente, mas também sofreram adaptações, sempre no sentido de evidenciar as solicitações e a necessidade de cada grupo, como autoconhecimento, relações interpessoais, família, sexualidade, Direitos Humanos, questões de gênero, identidade, cidadania, estereótipos, preconceito, projeto de vida, entre outras. Sendo assim, os temas foram escolhidos pelos próprios alunos, conforme as sugestões e os assuntos que surgiam nas discussões, e foram trabalhados com o auxílio de diferentes recursos, como dinâmicas de grupo, rodas de conversa, elaboração de produções artísticas, jogos de expressão corporal, desenhos, poemas, recursos audiovisuais, estudos de caso, contos infantis, música, entre outros. Acredita-se que a utilização de tais ferramentas se mostrou essencial como via de comunicação e expressão dos participantes por meio da dimensão simbólica, o que facilitou o posicionamento crítico e a reflexão acerca das questões que vivenciavam em seu dia a dia, dentro e fora do ambiente escolar.
A seguir, foram selecionados dados referentes às oficinas desenvolvidas com um dos grupos de estudantes.
Para a provocação das discussões, foram utilizadas como ferramenta diferentes técnicas, como estudos de caso, discussão sobre documentários, letras de músicas, poemas, dinâmicas e vivências grupais para trabalhar temáticas como autoconhecimento, cidadania, interesses pessoais, informações em Educação em Sexualidade, oficinas sobre estereótipo e diferentes tipos de preconceito, sonhos e expectativas dos participantes, o que possibilitou o surgimento de assuntos ligados à saúde mental, pois os alunos e as alunas, ao relatarem suas experiências pessoais, descreviam suas angústias, os sintomas de ansiedade, pânico e depressão, assim como situações de adoecimentos dos amigos ou familiares.
Resultados e Discussão
A fim de mensurar o grau de satisfação dos alunos e das alunas participantes do projeto, foi elaborada uma Ficha de Avaliação que permitiu registrar e avaliar se os objetivos propostos pelo trabalho foram alcançados. Também foi disponibilizado um espaço na ficha para comentários a respeito das ações que foram desenvolvidas na escola, de modo a colher as impressões e sugestões dos participantes. Ao todo, foram respondidos 60 (sessenta) instrumentos.
Optou-se aqui por selecionar somente duas das 16 questões fechadas da Ficha de Avaliação dos alunos, representadas nos Gráficos 1 e 2:2
Os dados revelam que, na possibilidade de compartilhar suas experiências e sentimentos, os participantes puderam pensar e desenvolver um repertório mais significativo para lidar com as questões que os afetam na esfera pessoal e subjetiva. Nessa perspectiva, o trabalho desenvolvido demonstrou que consolidar espaços democráticos de confiança e livre expressão estimula o olhar de respeito às diferenças e cuidado com o bem-estar individual e coletivo, legitimando necessidades, expectativas e projetos dos adolescentes.
Os dados expressam a concretização dos objetivos do projeto de extensão no que diz respeito à prática e ao desenvolvimento da autonomia e participação ativa dos adolescentes na comunidade escolar e na sociedade de modo geral. Como ressaltado através dos resultados obtidos, as ações desenvolvidas na escola se mostraram como uma importante ferramenta para o crescimento pessoal dos participantes, a participação social e o estabelecimento de relações e ambientes mais saudáveis (Brasil, 2002b; Ribeiro et al., 2018).
Ao atentar-se às dimensões sociais, afetivas e familiares que estão implícitas nas demandas trazidas pelos jovens (Gomes; Horta, 2010), foi possível reconhecer sua subjetividade e seus diferentes modos de vida. A partir da consideração dessas múltiplas possibilidades, o cuidado em saúde, como já exposto por Cardoso e Galera (2011), deve buscar, primordialmente, o destaque às potencialidades dos sujeitos, a fim de desenvolver sua autonomia frente aos dilemas que se apresentam. Ficou evidenciado que os encontros refletiram no bem-estar e na saúde mental dos participantes ao estimularem o sentimento de pertencimento ao grupo, o acolhimento e o respeito às múltiplas experiências, opiniões e expressões das juventudes (Abramovay; Castro, 2015).
A adolescência, segundo Bock (2007), é um momento de significado interpretado e construído pelos indivíduos na sociedade, sendo um fenômeno social que adquire sentidos a partir da experiência cultural de se desenvolver. Berni e Roso (2014) comentam que a adolescência é um processo que traz a possibilidade de vir a ser, tornar-se e transformar-se. Além disso, compreender de que maneira os tempos e espaços partilhados pelos jovens atribuem sentido às suas vivências, decisões e projetos é fundamental para acolher seus sonhos e expectativas (Dayrell; Carrano, 2014). Nesse sentido, acredita-se que as oficinas propiciaram o reconhecimento dos desejos, aspirações e exigências que permeiam suas experiências, especificamente ao longo do Ensino Médio, que, além de uma etapa de escolarização, expressa um período marcado pela construção de reflexões e saberes em torno da própria existência e da busca por sentido (Leão; Dayrell; Reis, 2011; Weller, 2014).
Assim, foi perceptível, ao longo dos encontros, o desenvolvimento do pensamento crítico e construtivo sobre a escola, as relações e os sentimentos de necessidades que se apresentam nas diferentes esferas do cotidiano das juventudes, como a percepção de cada um sobre suas potencialidades e talentos, vulnerabilidades e medos. Ficou evidenciada a conquista de um espaço criativo e dinâmico, pois enfatizavam frequentemente a relevância daquele espaço para que fossem ouvidos e pudessem discutir e aprender sobre si mesmos, sobre a escola e sobre as questões cotidianas.
Conforme apresenta o Ministério da Saúde (Brasil, 2002b), a escola deve assumir uma função social e política, comprometida com a transformação da sociedade através de práticas de cidadania e de ações que viabilizem a promoção da saúde, em diferentes dimensões. Além disso, considerando as contribuições de Paulo Freire (1996), propiciar condições para que os sujeitos, em suas relações uns com os outros, tenham a experiência de assumirem-se como seres históricos, sociais, criadores e pensantes é uma importante tarefa da prática educativo-crítica.
Portanto, acredita-se que, através do diálogo, do cuidado e do trabalho em grupo, foi possível consolidar recursos psicológicos e relações afetivas promotoras da saúde e bem-estar dos alunos na escola e fora dela. Por meio dessas práticas, concretizou-se o compartilhamento de valores como solidariedade e autonomia, possibilitando, assim, que os sujeitos se reconhecessem como agentes de transformação de seu entorno. Ao interiorizar as memórias individuais e coletivas construídas nesse espaço, o adolescente pôde cultivar experiências e saberes que contribuíram para seu crescimento e transformação saudáveis, ressignificando suas percepções sobre si, o outro e o mundo. Dessa maneira, como proposto por Dayrell e Carrano (2014), através das interações afetivas e simbólicas, as oficinas ganharam sentido, tornando-se um lugar de partilha e suporte para as relações que se estabelecem.
À vista disso, como colocado por Gomes e Horta (2010), a escola se revelou um importante espaço para a inserção de ações e atividades direcionadas ao acolhimento e envolvimento dos adolescentes no cuidado com a saúde. Além disso, destacou-se a necessidade de criar espaços de escuta dentro da escola, nos quais alunos e alunas se sintam seguros para pensar, refletir e dialogar sobre suas experiências e angústias, promovendo, assim, sentimentos de pertencimento, confiança e apoio para o enfrentamento dos desafios (Rossi et al., 2019).
Segundo Guimarães e Lima (2011), na medida em que o jovem aprende a articular o sofrimento pessoal e as experiências sociais, constrói uma visão de mundo mais pautada na consciência crítica. Dessa forma, acredita-se que as temáticas discutidas nas oficinas refletiram nas vivências pessoais e coletivas dos sujeitos, revelando-se como impulsionadoras da responsabilização e participação das juventudes em seu processo de saúde, por meio da concretização de projetos atrelados à qualidade de vida social, emocional e subjetiva.
Considerações finais
Diante do exposto, é possível reafirmar que as oficinas deram oportunidade para a criação de um espaço de fala, escuta e troca construídos coletivamente, expandindo a reflexão sobre os modos singulares de pensar e agir, além de trabalhar emoções, sentimentos e questões intrínsecas ao desenvolvimento pessoal e identitário dos adolescentes. Consideramos, também, a importância de projetos que promovam uma transformação significativa na atuação das juventudes frente às adversidades, de maneira que os próprios participantes sintam e reconheçam as contribuições das temáticas ali trabalhadas.
Segundo Campos (2015), através da fala, o ser humano expressa sua maneira de perceber o outro, o mundo e a si próprio e, ao refletir sobre a angústia que o aflige e trazê-la à consciência, mostra suas vivências, memórias, distorções, autorreferências, dúvidas, medos e anseios. Sendo assim, as oficinas de vertente pedagógica e psicológica, a partir das demandas individuais e coletivas dos grupos, possibilitaram a ressignificação dos alunos, atribuindo sentido às próprias experiências e o crescimento nas diferentes esferas do seu desenvolver.
As oficinas se tornaram lugar do encontro, das trocas afetivas, e o contato com o outro permitiu transformação, manifestação e comunicação, o que corroborou, significativamente, com o seu desenvolvimento integral enquanto pessoas, cidadãos e cidadãs. Destaca-se, ainda, a importância de a escola acolher projetos como este, na medida em que o ambiente educativo se revela como fundamental para a construção das identidades, exercício da cidadania e de um pensar social através do convívio com o outro, das trocas afetivas e das decisões tomadas em conjunto.
Por fim, espera-se que este relato de experiência possa suscitar reflexões acerca das questões que envolvem a promoção da saúde e o bem-estar dos adolescentes na escola, na sociedade e nos diversos espaços que ocupam. Ademais, acredita-se que, a partir da relevância social do projeto-ação desenvolvido em uma escola do interior de São Paulo, seja possível inspirar novos estudos e intervenções referentes à temática das juventudes, expandindo essa proposta para novos campos de ação.
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Data de recebimento/Fecha de recepción: 29/09/2020
Data de aprovação/Fecha de aprobación: 16/12/2020
1 Destaca-se que, ao optarem por compor as oficinas, foi feito um convite aos pais e responsáveis para participarem de uma reunião de esclarecimentos e assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Além disso, os alunos assinaram o Termo de Assentimento Livre e Esclarecido (TALE), para crianças e adolescentes, como prescrevem as normas de pesquisa com seres humanos, homologada pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) Nº 510, de 07 de abril de 2016, nos termos do Decreto de Delegação de Competência de 12 de novembro de 1991 (BRASIL, 2016b). Dessa maneira, foram garantidos os cuidados éticos, como privacidade, anonimato, participação voluntária e possibilidade de desligamento da pesquisa a qualquer momento que julgasse necessário. Foi estabelecido um contrato pedagógico com os alunos e alunas participantes, para informar e discutir sobre a garantia de sigilo dos assuntos tratados naquele espaço e a importância do respeito à fala de cada um, a fim de proporcionar um ambiente democrático de liberdade e confiança. Cabe ressaltar que este projeto foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), sob o número do processo: 12993019.4.0000.5695, data de aprovação: 27/05/2019.
2 Na montagem dos gráficos, os números foram aproximados para melhor visualização.