SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.19 número3Participação social e subjetividade: vivências juvenis em uma comunidade vulnerávelAvaliação psicológica de jogadores de videogame, tabuleiro e live: personalidade, raciocínio e percepção emocional índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

artigo

Indicadores

Compartilhar


Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.19 no.3 São Paulo dez. 2017

https://doi.org/10.5935/1980-6906/psicologia.v19n3p159-175 

ARTIGOS
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA

 

Evidências de validade para uma medida de estilos de aprendizagem

 

Evidencias de validez para una medida de estilos de aprendizaje

 

 

Katya Luciane de OliveiraI; Acácia Aparecida Angeli dos SantosII; Fabio Alexandre Pereira ScacchettiIII

IUniversidade Estadual de Londrina, SP, Brasil
IIUniversidade São Francisco, SP, Brasil
IIIUniversidade Tecnológica Federal do Paraná, PR, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo objetivou buscar evidências de validade para uma escala de estilos de aprendizagem, bem como identificar quais são esses estilos. Participaram do estudo 709 estudantes do ensino técnico profissional. Utilizou-se uma escala de Estilos de Aprendizagem, com 80 itens destinados à descrição dos estilos de aprendizagem, avaliados em cinco dimensões: condições ambientais, sociais, instrumentais, pessoais e da atividade. A aplicação ocorreu de forma coletiva em dia e horário estabelecidos pelas instituições de ensino. A análise fatorial com rotação Varimax indicou estrutura de três fatores para a escala. Os fatores se agruparam da seguinte maneira: fator 1 - condições pessoais e condições da atividade, com 16 itens (α = 0,78); fator 2 - condições ambientais, com 11 itens (α = 0,79); fator 3 - condições sociais, com 11 itens (α = 0,81). No geral, os estudantes se mostraram mais orientados pelos estilos das condições pessoais e da atividade. Uma escala que possa mapear o estilo de aprendizagem dos estudantes parece ser relevante para a educação brasileira por permitir que se conheça as preferências no modo de aprender, podendo propiciar-lhes melhores condições de aprendizado.

Palavras-chave: estilos; estilos de aprendizagem; estilos cognitivos; avaliação psicológica; ensino técnico profissional.


RESUMEN

Los objetivos del presente estudio fueron obtener evidencia de la validación de la escala de estilos de aprendizaje y analizar los estilos de aprendizaje de estos estudiantes. El estudio incluyó a 709 estudiantes de la enseñanza técnica profesional. Se utilizó una escala de evaluación de estilos de aprendizaje, con 80 artículos para la descripción de los estilos preferidos y evaluamos cinco dimensiones, a saber: las condiciones ambientales, sociales, instrumentales, personales y de la actividad. La aplicación se produjo colectivamente en día y hora fijadas por cada institución. Un análisis de factores con rotación varimax indicó estructura de tres factores de la escala. Los factores se agrupan de la siguiente manera: factor 1 - términos personales y las condiciones de la actividad, con 16 ítems (α = 0,78); factor 2 - condiciones ambientales, con 11 ítems (α = 0,79); factor 3 - condiciones sociales, con 11 ítems (α = 0,81). Los estudiantes fueron más guiadas por los estilos personales de las condiciones y actividad. Una escala que pueda mapear el estilo de aprendizaje de los estudiantes parece ser relevante para la educación brasileña por permitir que se conozca sus preferencias en el modo de aprender, pudiendo propiciarles mejores condiciones de aprendizaje.

Palabras-claves: estilos; estilos de aprendizaje; estilos cognitivos; evaluación psicológica; enseñanza técnico profesional.


 

 

Introdução

Aprender é um fenômeno cognitivo complexo por exigir a conexão de uma ampla rede de habilidades neuronais que interagem simultaneamente. Pesquisas que buscam compreender as habilidades cognitivas de modo a elucidar como o processo de aprendizagem é efetivado no contexto escolar ganharam destaque nas últimas décadas (Cheng, Hu & Sin, 2016; Oliveira, Santos & Scacchetti, 2016; Oliveira, Inácio & Buriola, 2016; Curry, 1983; Riding & Cheema, 1991; Zhang & Sternberg, 2005).

Zhang e Sternberg (2005) observam que a aprendizagem, por ser um processo multifacetado, apresenta aspectos que permitem a organização, o armazenamento e a reorganização do conhecimento, indo além, portanto, da noção de ação. Além dos aspectos cognitivos envolvidos, há de se considerar que a característica pessoal de cada indivíduo influencia diretamente a maneira como ele adquire conhecimentos (Felder, 2002; Felder & Spurlin, 2005; Litzinger, Lee, Wise, & Felder, 2007).

Em razão disso, aprender é uma tarefa dinâmica que exige o trabalho em conjunto de diferentes habilidades cognitivas. Para que o aprendizado se efetive em um contexto específico, como o escolar, é necessário que o aluno possa empregar e diversificar tanto padrões mais sofisticados de pensamento e elaboração quanto aqueles mais superficiais na hora de processar a informação a ser aprendida (Gomes, Marques & Golino, 2014).

Autores como Litzinger et al. (2007) consideram que cada aluno pode apresentar um padrão cognitivo considerado único no momento do aprendizado. Cada aprendiz terá uma maneira preferencial de processar as novas informações para realizar as atividades escolares, e esta pode interferir em seu aprendizado (Fan, 2016; Gomes et al., 2014; Zhang, 2015). Tendo essa premissa como base, Oliveira, Trassi e Santos (2017) afirmam que o ato de observar as especificidades da aprendizagem em cada indivíduo, convertendo-se em ações aplicadas no momento do estudo e do aprendizado, tem levado os estudiosos a ampliarem o arcabouço de conhecimento acerca do construto estilos de aprendizagem.

No que se refere à terminologia "estilos", Zhang e Sternberg (2005) esclarecem que o termo é geral. Nesse sentido, é possível encontrar expressões como estilo cognitivo, estilo de manejo de tempo, estilo de tomada de decisão para a resolução de problemas, estilo de aprendizagem, estilo da mente, estilo perceptual, estilo de pensamento, estilo intelectual, entre outros.

Conforme apontam Zhang e Sternberg (2005), entre os principais modelos de estilo estabelecidos ao longo das décadas, pode-se citar alguns dos principais, quais sejam: o de cebola dos estilos de aprendizagem (Curry, 1983); o dos processos e estilos cognitivos (Miller, 1987); o integrador de estilos cognitivos (Riding & Cheema, 1991); o dos estilos sob o enfoque da cognição, da personalidade e da atividade (Gringorenko & Sternberg, 1995); o da teoria do autogoverno mental (Zhang & Sternberg, 2005). Este último, de acordo com Zhang (2011), seria o mais agregador, pois consegue incorporar os elementos propostos nos modelos anteriores.

No modelo empregado por pesquisadores como Fan (2014), Fan e Zhang (2014), Zhang e Sternberg (2005) e Zhang (2015), os estilos de aprendizagem podem ser compreendidos como parte de um conceito mais amplo denominado estilos intelectuais. O estilo intelectual abrangeria tanto elementos cognitivos (como memória, atenção, prontidão, entre outros, ou seja, teria elementos do estilo cognitivo) quanto de aprendizagem (por terem como característica ações aplicadas e direcionadas ao aprendizado, como a escolha dos recursos usados, as condições ambientais, as condições de socialização, entre outros, ou seja, incluiria elementos do estilo de aprendizagem).

No presente trabalho, adotar-se-á a terminologia "estilos de aprendizagem", considerando que se recorreu ao arcabouço teórico voltado para a compreensão da preferência do aluno por ações aplicadas ao aprendizado (modelo camada de cebola dos estilos de aprendizagem - Curry, 1983); isto é, seu estilo de aprendizagem (Santos & Mognon, 2010). Posto isso, esses estilos abarcam as características e as preferências de aprendizado de uma pessoa. O aluno pode ser visto como o aprendiz que apresenta um estilo ou uma preferência para processar, analisar e arquivar a nova informação, tornando-se alguém que participa do próprio processo de aprendizagem. Para tanto, o estudante adotará ações práticas, expressas em preferências, que podem se concretizar antes, durante e após a situação de aprendizagem.

Santos e Mognon (2010) observam que é possível encontrar diferença no estilo de aprender dos alunos, pois alguns são mais auto-orientados a aprender melhor com informações orais, enquanto outros apresentam melhor aproveitamento com informações escritas, e ainda há aqueles que preferem adquirir a informação por meios como a internet. Também há aqueles que focam as condições ambientais, assim, aspectos como barulho, temperatura, luminosidade, entre outros, tornam-se imprescindíveis para que o aprendizado se concretize.

A literatura científica parece indicar que não há um quantum positivo ou negativo para a classificação de estilos de aprendizagem. Ao que parece, determinado estilo de aprendizagem não deve ser considerado melhor ou pior que outro, o que deve haver é a promoção do desenvolvimento de diferentes estilos em sala de aula, de modo que não ocorra o favorecimento a estilos de aprender (Santos & Mognon, 2010). Nessa perspectiva, os estilos, além da possibilidade de serem estimulados no ambiente escolar, também podem ser alterados de acordo com fatores contingenciais, como experiências afetivas, condições sociais e ambientais, entre outros (Cardoso, 2007; Oliveira et al., 2016).

Alguns alunos conseguem estudar ouvindo música e outros não, por considerarem que o som atrapalhe. Para os primeiros, aprender e ao mesmo tempo ouvir música pode ser estimulante e favorece o aprendizado. Dessa maneira, destaca-se que um aluno que conhece o próprio estilo de aprendizado pode direcionar sua ação para a obtenção de melhores resultados (Oliveira et al., 2017). Autores como Oliveira & Oliveira (2007) e Watanabe, Cassetari, Santos, Lombard-Platet & Di Domenico (2001) consideram que o estudante comprometido com o próprio aprendizado pode avaliar e alterar hábitos inadequados de aprendizagem, ou seja, consegue modificar ou adaptar um estilo, visando otimizar seu aprendizado.

Grácio & Rosário (2004) e Stoker & Faria (2012) ampliam a discussão quando mencionam que fatores pessoais podem associar-se a contingências ambientais no momento do estudo. Assim, aspectos como motivação, dedicação, desempenho, entre outros, também fariam a diferença na aquisição do conhecimento. Nesse contexto, o professor exerce papel essencial na mediação da aprendizagem do aluno, pois enquanto promove a facilitação da aquisição do conhecimento, pode orientar o aluno face às exigências de cada conteúdo ou ambiente de estudo. Portanto, se o próprio educador for capaz de avaliar os estilos de aprendizagem de seus alunos, poderá buscar recursos mais eficazes no momento do ensino.

Ainda que o estudo dos estilos de aprendizagem pareça promissor, no Brasil há uma lacuna na produção de conhecimento e de instrumentos psicoeducacionais que avaliem o construto aqui estudado. No âmbito internacional, Volkova & Rusalov (2016) e Zhang (2011) chamam a atenção para o fato de que, devido às discrepâncias nas terminologias empregadas para o estudo dos estilos, há carência de pesquisas que visem padronizar instrumentos e métodos para a avaliação dos estilos de maneira mais consensual teoricamente.

Zhang & Sternberg (2005) elaboraram uma revisão das formas de mensuração dos estilos, na qual identificaram que os instrumentos disponíveis também apresentavam diversidade teórica no modo de se compreender o construto, conforme apontaram Volkova & Rusalov (2016). Entre os instrumentos, foi possível constatar que alguns não somente apresentam uma multiplicidade terminologias como também diferenças conceituais. Entre os instrumentos encontrados pode-se citar o Learning Style Inventory - LSI (Kolb's, 1976), o Self-Directed Search - SDS (Holland, 1985), o Kirton Adaption-Innovation Inventory - KAII (Kirton, 1987), o Style of Learning and Thinking - SOLAT (Torrance, McCarthy & Kolesinski, 1988), o The Myers-Briggs Type Indicator - MBTI (Myers & McCaulley, 1988), o Thinking Styles Questionary for Students (Sternberg & Wagner, 1992), o Studying Inventory (Wilson, Smart & Watson, 1996), o Strategic Flexibility Questionnaire (Cantwell & Moore, 1998), o Thinking Styles Inventory - TSI-R e TSI-R2 (Sternberg, Wagner & Zhang, 2003).

Diante dessas informações, o presente estudo teve como objetivo a identificação de evidências de validade relativas à análise da estrutura interna dos itens de uma escala de estilos de aprendizagem direcionada a estudantes do ensino técnico profissional. Visou também identificar os melhores itens para um possível refinamento da escala estudada. Adicionalmente, pretendeu-se identificar os estilos de aprendizagem predominantes nesses estudantes.

 

Método

Participantes

Participaram do estudo 709 estudantes do ensino técnico profissional, totalizando 652 alunos provenientes de uma unidade do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e 57 estudantes do ensino médio técnico de uma Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). O gênero feminino representou 65,6 % (n = 465), e o masculino 34,4 % (n = 44). A idade média dos estudantes foi de 18 anos e 2 meses (DP = 4,39), sendo 13 anos a idade mínima e a máxima, 49 anos.

Instrumentos

Utilizou-se a Escala de Avaliação de Estilos de Aprendizagem, elaborada por Santos em 2006 e destinada à descrição dos estilos preferenciais (conforme proposição do modelo de cebola dos estilos de aprendizagem, Curry, 1983). No modelo apresentado por Curry (1983), o comportamento de aprender é baseado na ação do aprendiz e manifestado por meio dos estilos de aprendizagem que ele expressa em razão de suas preferências educacionais. Assim, os itens foram elaborados teoricamente para avaliar cinco condições: ambientais, sociais, instrumentais, pessoais e da atividade. Cabe esclarecer que o estilo não seria apenas uma condição de aprendizagem, mas, na proposição do modelo proposto, seria considerado um estilo de aprendizagem.

Inicialmente, o instrumento passou por um procedimento de avaliação do conteúdo dos itens e das suas dimensões representativas. Participaram cinco juízes especialistas, sendo dois doutores e três mestres da área de processos cognitivos e de aprendizagem. Eles constituíram o grupo de especialistas que julgaram os itens, considerando a definição operacional do construto. Os juízes doutores eram professores universitários na área de psicologia e pertenciam a Programas de Pós-Graduação Stricto Sensu de diferentes universidades; os discentes que participaram da pesquisa estavam matriculados nesses programas. Foram enviadas por e-mail a escala e uma taxionomia dos itens para que eles pudessem julgar a que se referia o item (se abrangia preferência ambientais, sociais, instrumentais, pessoais ou de atividade). Não houve discrepâncias quanto ao julgamento dos itens (ficando dentro dos 80% esperados).

A escala continha 80 questões do tipo Likert, com quatro alternativas: sempre (3 pontos); muitas vezes (2 pontos); poucas vezes (1 ponto); nunca (0 ponto). A dimensão condições ambientais (dimensão1 - composta por 22 itens: 2, 6, 10, 11, 28, 30, 39, 41, 42, 45, 48, 49, 56, 58, 59, 62, 67, 68, 69, 70, 71 e 75) diz respeito aos estímulos físicos do ambiente imediato: iluminação, ventilação, ruído, tempo, espaço (tipo de ambiente - formal ou informal e sua estrutura física). Para exemplificar essa dimensão, pode-se citar o item 2 "Prefiro estudar em silêncio". A dimensão condições sociais (dimensão 2 - formada por 14 itens: 9, 12, 15, 21, 27, 31, 34, 36, 51, 54, 57, 61, 77 e 80) diz respeito à maneira preferencial de realização da tarefa, considerando-se os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem (aluno-colegas-professor). Essa dimensão pode ser exemplificada pelo item 9 "Prefiro realizar tarefas em grupo". A dimensão condições instrumentais (dimensão 3 - tem 12 itens: 14, 16, 23, 32, 35, 37, 40, 52, 55, 60, 72 e 73) diz respeito à preferência por recursos didáticos e tecnológicos durante a situação de aprendizagem (recursos como jogos, revistas, jornais, livros, apostilas, lousa, retroprojetor, computador, TV e vídeo). Um exemplo que avalia essa dimensão é o item 14 "Aprendo pouco por meio de jogos". A dimensão condições pessoais (dimensão 4 - apresenta 20 itens: 1, 4, 7, 13, 18, 20, 22, 24, 26, 38, 43, 44, 46, 50, 53, 63, 64, 66, 76 e 79) diz respeito às preferências sensoriais, perceptuais e cognitivas do aprendiz na execução de uma tarefa (fazer, observar, ouvir, ler, o ritmo de execução e a resolução do problema). O item 1 seria um exemplo dessa dimensão "Aprendo melhor anotando durante as aulas". Por fim, a dimensão condições da atividade (dimensão 5 - tem 12 itens: 3, 5, 8, 17, 19, 25, 29, 33, 47, 65, 74 e 78) diz respeito à preferência de formato e de proposição da atividade (atividades mais detalhadas, dirigidas, organizadas, claras, fechadas, livres, convencionais, controladas, originais e/ou criativas). Um exemplo seria o item 3 "Aprendo melhor com as explicações do professor".

Procedimentos de coleta de dados

Os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido; para os participantes com idade inferior a 18 anos, os responsáveis legais o assinaram. A coleta aconteceu de forma coletiva em sala de aula, em dia e horário agendados pelas instituições coparticipantes. Um pesquisador acompanhava sempre a coleta, que tinha uma duração aproximada de 30 minutos, entre a explicação dos questionários e tempo para resposta.

Procedimentos de análise de dados

Os dados foram organizados em planilha e submetidos à estatística descritiva e inferencial, visando o atendimento dos objetivos estabelecidos. Empregou-se o pacote estatístico SPSS IBM® e realizou-se o Teste de Esfericidade de Bartlett para a verificação da viabilidade de aplicação da análise fatorial exploratória. O índice de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) indicou a adequação da amostra para a efetivação da análise. Para tanto, recorreu-se à Análise Fatorial Exploratória, pois, segundo Damásio (2012), ela pode ser implementada quando o pesquisador não parte de uma teoria prévia subjacente ou ainda não possua evidências empíricas suficientes que permita afirmar como determinados itens podem ser agrupados.

 

Resultados

Foi realizado o Teste de Esfericidade de Bartlett para verificar a possibilidade de aplicar o método da análise fatorial exploratória. O resultado indicou uma correlação entre os itens (x2[3160; N = 709] = 10819,884; p<0,001), e, portanto, uma adequabilidade ao uso da análise fatorial. A medida de adequação da amostra foi averiguada com o índice de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO), que foi de 0,779.

A análise fatorial com rotação varimax foi o modelo que mais se adequou à análise, pois indicou uma estrutura de três fatores para a escala, com eigenvalues acima de 1,0 e capazes de explicar 21,88% da variância total. Os fatores se agruparam da seguinte maneira: fator 1 - condições pessoais e condições da atividade, com 16 itens (3, 13, 17, 18, 22, 24, 25, 26, 46, 47, 50, 63, 64, 65, 66 e 74); fator 2 - condições ambientais, com 11 itens (2, 6, 10, 11, 41, 42, 49, 56, 58, 59 e 62); fator 3 - condições sociais, com 11 itens (9, 15, 21, 27, 31, 36, 51, 54, 57, 77 e 80). A Tabela 1 mostra a distribuição dos itens por fator e suas respectivas cargas fatoriais e comunalidades:

Cabe salientar que a menor carga fatorial foi de 0,351 e a maior foi de 0,771. O alpha de Cronbach encontrado para o Fator 1 - condições pessoais e condições da atividade foi de 0,78; para o Fator 2 - condições ambientais, 0,79; para o Fator 3 - condições sociais o valor encontrado foi 0,81.

Após a análise da escala de 80 itens, houve uma redução para 38 itens: os itens 12, 34, 61 (condições sociais) e 55 (condições instrumentais) foram excluídos por carregarem para o Fator 1. Os itens 25 e 29 (condições da atividade) e 52 (condições instrumentais) foram excluídos por carregarem para o Fator 2. Os itens 43 (condições pessoais) e 73 (condições instrumentais) foram excluídos por carregarem para o Fator 3. Os itens restantes, 1, 4, 5, 7, 8, 14, 16, 19, 20, 23, 28, 30, 32, 33, 35, 37, 38, 39, 40, 44, 45, 48, 53, 60, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 75, 76, 78 e 79, foram excluídos da versão por não apresentarem carga fatorial para os três fatores que foram impostos. A Tabela 2 apresenta os itens agrupados de acordo com a congruência teórica da escala:

Para atender ao segundo objetivo, o de identificar os estilos de aprendizagem utilizados pelos estudantes do ensino técnico profissional, apurou-se a média de pontos nas subescalas de condições pessoais e da atividade, condições ambientais e condições sociais, descritas na Tabela 3:

Com os resultados alcançados a partir dessa análise, foi possível observar que 46,8% dos estudantes (n = 332) apresentaram pontuação superior à média de pontos alcançados, atribuindo maior importância às condições pessoais e de atividade. Para as condições ambientais, 50,5% dos estudantes (n = 358) atingiram pontuação superior à média, valorizando as condições ambientais. Com relação às condições sociais, 44,8% dos estudantes (n = 318) pontuaram acima da média quanto à relevância das condições sociais para a aprendizagem.

 

Discussão

Estudar os estilos de aprendizagem não é tarefa fácil, pois há controvérsias na literatura acerca da definição da terminologia estilos de aprendizagem (Oliveira et al., 2017). O entendimento de que o estilo de aprendizagem envolveria um processamento profundo pode ser discutido. Nessa mesma linha, a posição teórica de assumir que os estilos seriam comportamentos mais superficiais em relação ao processo cognitivo parece ser plausível (Oliveira et al., 2016). Ora, se o processamento cognitivo é algo complexo que envolve a mobilização de diversas funções cerebrais, os estilos de aprendizagem expressariam o modo preferencial do sujeito para conseguir adquirir e processar as informações (Santos & Mognon, 2010; Zhang, 2011). A preferência seria um comportamento mais ligado aos sentidos e ao modo como o sujeito lê e interpreta a realidade. Dependeria das experiências pessoais de cada sujeito com o próprio processo de aprendizado.

Ao estudar a estrutura fatorial da escala, foi possível observar que a análise fatorial exploratória organizou o primeiro fator da escala como representativo das condições pessoais (preferências sensoriais, perceptuais e cognitivas do aprendiz na execução de uma tarefa) e condições da atividade (preferência de formato e proposição da atividade). Ao que parece, a congruência na organização dos itens que compuseram esse fator está em conformidade com a literatura. Nessa direção, Grácio e Rosário (2004) concordam que as características pessoais relacionam-se às demandas situacionais no momento do estudo. As condições da atividade/tarefa em si podem ter implicação direta no modo pessoal com que cada sujeito aprende. O valor do alpha desse fator (0,78) pode ser considerado positivo.

Ao analisar os itens que compuseram o segundo fator, qual seja, condições ambientais (estímulos físicos do ambiente imediato), é possível também concluir que esse fator apresentou um alpha considerado aceitável (0,79). Esse resultado parece indicar que as condições de estudo e leitura dos estudantes (ver Oliveira & Oliveira, 2007) influenciam diretamente a aquisição do conhecimento e a forma como o aluno otimiza as atividades direcionadas ao seu estudo.

No terceiro fator, condições sociais (maneira preferencial de realização da tarefa, considerando-se os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem: aluno-colegas-professor), foi possível observar um alpha de 0,81, sendo este o maior valor obtido em termos de consistência interna. Os itens que compuseram esse fator expressam o modo preferencial de estudar, tendo como foco atividades/situações que envolvam interações sociais entre os envolvidos. Ribeiro e Ribeiro (2011) e Santos e Mognon (2010) chamam atenção para a importância do papel do professor como aquele que influencia a construção da preferência por determinado estilo de aprendizado. Esse fator também abarcava a relação entre aluno-colegas, assim sendo, ao que parece, as parcerias de estudo e as relações de amizade no contexto escolar parecem estar associadas de forma positiva à concretização do aprendizado desse aluno.

O fator condições instrumentais (preferência por recursos didáticos e tecnológicos durante a situação de aprendizagem), não despontou como um fator na escala. Também, é importante mencionar que não se calculou um valor de alpha da escala como um todo, pois cada item da escala representa um estilo de aprendizagem, e o fato de uma pessoa ter um modo preferencial mais marcante no momento do estudo não é positivo nem negativo.

Dos 80 itens que compuseram a escala em seu formato inicial, restaram 38 após o tratamento dos dados por meio da análise fatorial exploratória. Embora os valores dos alphas de cada subescala tenham sido aceitáveis, há que se mencionar a necessidade de o instrumento continuar em processo de investigação, para verificar o motivo do fator condições instrumentais não figurar como fator presente nesse formato da escala com 38 itens.

Em uma análise mais qualitativa de cada item nos fatores em que se agruparam comparados com a escala original, verificou-se que o primeiro fator da nova configuração da escala reuniu itens do Fator 4 da escala original, referente às condições pessoais, como 'Prefiro atividades em que eu possa criar coisas novas' ou 'Aprendo melhor discutindo a matéria', bem como do Fator 5 original, relativo a condições da atividade, como 'Exercícios práticos auxiliam minha aprendizagem' e 'Tarefas detalhadas facilitam minha aprendizagem'. Nesse sentido, observou-se que a separação de ambos não obteve suporte empírico, mas não houve comprometimento do sentido teórico, visto que o fator gerado pode perfeitamente agrupar o detalhamento operacional de atividades preferenciais dos alunos na forma de efetivamente se envolverem nas tarefas acadêmicas. O segundo fator englobou itens do Fator 1 da escala original que dizem respeito às preferências por condições ambientais e facilitadoras para a aprendizagem, como 'Prefiro estudar em lugares silenciosos', 'Prefiro estudar em ambientes bem iluminados'. Por fim, o Fator 3 diz respeito às preferências relacionadas aos itens do Fator 2 da escala original, que respeito é referente à interação social presente ou não nas situações de estudo, tais como 'Prefiro fazer os trabalhos escolares individualmente' e 'Estudar em grupo me faz aprender melhor'. Desse modo, parece plausível citar que o presente estudo serviu como base para identificar os melhores itens para uma proposta de reformulação do instrumento, com um número menor de itens que podem produzir a mesma informação que a inicialmente pretendida. Os itens relativos às condições instrumentais que constituíam o Fator 3 da escala original de avaliação dos estilos de aprendizagem não tiveram respaldo empírico para se manter. Esta se constitui de uma limitação do estudo, que precisa ser mais bem investigada com amostras de segmento educacional diverso.

No que se refere à identificação dos estilos de aprendizagem dos estudantes, a Tabela 3 indicou que a maior média de preferências ficou concentrada no fator condições pessoais e da atividade. Esse achado precisa ser mais bem investigado em estudos futuros, haja vista para o fato de que a amostra foi exclusivamente constituída por estudantes de ensino profissional. Importante, portanto, que se investigue alunos do ensino médio regular, de modo a verificar se o mesmo resultado se repetiria ou se deveu à especificidade da amostra do presente estudo.

 

Considerações finais

Os estilos de aprendizagem e seu arcabouço mais amplo, qual seja, os estilos intelectuais, constituem um campo de estudo complexo e multifacetado. Eles envolvem comportamentos característicos e pessoais de cada um. Se para uma pessoa estudar em um ambiente barulhento pode ser considerado inadequado, para outros, esse tipo de condição pode ser considerado favorável à aprendizagem.

Assim, ao discutir estilos de aprendizagem, estamos tratando de uma ação preferencial com intencionalidade direcionada ao estudo e à aprendizagem. Também é importante notar que o estilo constitui um atributo adaptativo, à medida que a preferência do indivíduo pode mudar, especialmente considerando as contingências situacionais e ambientais. Esse achado apoia-se no fato de que há diferenças no estilo de aprendizagem dos estudantes e que essas diferenças podem sofrer modificações, pois as preferências são variáveis, podendo ser alteradas ao longo do tempo e do contexto. O modelo integrador no qual considera o estilo de aprendizagem sob o arcabouço dos estilos intelectuais parece ser um modelo promissor a ser empregado em investigações futuras, por apresentar maior congruência teórica na forma de se compreender as facetas dos vários estilos de aprender dos estudantes. Sob essa perspectiva, cabe acrescentar que construir e estudar uma escala que apresente um construto com essa complexidade é um desafio que poderá contribuir sobremaneira para compreender as formas diversificadas de aprender em um mundo repleto de informações oriundas de uma miríade de fontes diferentes.

 

Referências

Cheng, S., Hu, X., & Sin, K. F. (2016). Thinking styles of university deaf or hard of hearing students and hearing students. Research in Developmental Disabilities, 55,377-387. doi:10.1016/j.ridd.2016.04.004        [ Links ]

Damásio, B. F. (2012). Uso da análise fatorial exploratória em psicologia. Avaliação Psicológica, 11(2),213-228.         [ Links ]

Gomes, C. M. A., Marques, E. L. L., & Golino, H. F. (2014). Validade incremental dos estilos legislativo, executivo e judiciário em relação ao rendimento escolar. Revista Eletrônica de Psicologia, Educação e Saúde, 3(2),31-46. Recuperado de http://revistaepsi.com/wp-content/uploads/artigos/2013/Ano3-Volume2-Artigo3.pdf        [ Links ]

Grácio, M. L. F., & Rosário, P. (2004). Olhares dos estudantes sobre o que torna difícil aprender. In C. Machado, L. S. Almeida, M. Gonçalves & V. Ramalho (Orgs.), Avaliação Psicológica: formas e contextos (pp.164-169). Braga: Psiquilíbrios Edições.         [ Links ]

Fan, J. (2014). The role of thinking styles in career decision-making self-efficacy among university students. Thinking Skills and Creativity, 20,63-73. doi:10.1016/j.tsc.2016.03.001        [ Links ]

Fan, J., & Zhang, L. F. (2014). The role of perceived parenting styles in thinking styles. Learning and Individual Differences, 32,204-211. doi:10.1016/j.lindif.2014.03.004        [ Links ]

Felder, R. (2002). Index of Learning Styles Page. Recuperado de http://www2.ncsu.edu/unity/lockers/users/f/felder/public/RMF.html        [ Links ]

Felder, R. M., & Spurlin, J. E. (2005). Applications, Reliability, and Validity of the Index of Learning Styles. Intl. Journal of Engineering Education, 21(1),103-112.         [ Links ]

Litzinger, T. A., Lee, S. H., Wise, J. C., & Felder, R. M. (2007). A Psychometric Study of the Index of Learning Styles. J. Engr. Education, 96(4),309-319.         [ Links ]

Kolb, D. A. (1984). Experiential learning: Experience as the source of learning and development. Englewood Cliffs: Prentice Hall.         [ Links ]

Oliveira, K. L., Inácio, A. L. M., & Buriolla, H. L. (2016). Diferenças considerando ano escolar no ensino fundamental: um estudo com estilos intelectuais. Argumentos Pró-Educação, 1(3),408-422. Recuperado de http://ojs.univas.edu.br/index.php?journal=argumentosproeducacao&page=article&op=view&path%5B%5D=143&path%5B%5D=130        [ Links ]

Oliveira, K. L., Trassi, A., & Santos, A. A. A. (2017). Estilos intelectuais: revisitando e atualizando conceitos. In S. C. Martinelli & D. C. Fernandez (Orgs.), Aprendizagem escolar na contemporaneidade (pp. 64-77). Curitiba: Editora Juruá         [ Links ].

Oliveira, K. L., Santos, A. A. A., & Scacchetti, F. A. P. (2016). Medida de estilos de aprendizagem para o ensino fundamental. Psicologia Escolar e Educacional, 20(1),127-136. doi:10.1590/2175-3539/2015/0201943        [ Links ]

Oliveira, K. L., & Oliveira, R. A. M. (2007). Propriedades psicométricas de uma escala de condições de estudo para universitários. Avaliação Psicológica, 6(2),181-188.         [ Links ]

Ribeiro, V. M. B., & Ribeiro, A. M. B. (2011). A aula e a sala de aula: um espaço-tempo de produção de conhecimento. Revista do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, 38(1),71-76.         [ Links ]

Santos, A. A. A., & Mognon, J. F. (2010). Estilos de aprendizagem em estudantes universitários. Boletim de Psiclogia [online]. 2010,60(133),229-241.         [ Links ]

Sternberg, R. J., & Wagner, R. K. (1992). Thinking Styles Inventory. Unpublished manual, Yale University.         [ Links ]

Sternberg, R. J., Wagner, R. K., & Zhang, L. F. (2007). Pensando em inventário de estilos - Revised II (TSI-R2), Tufts University.         [ Links ]

Sternberg, R. J., Wagner, R. K., & Zhang, L. F. (2003). Thinking styles inventory: revised. Unpublished: Yale University.         [ Links ]

Stoker, J., & Faria, L. (2012). Desenvolvimento intraindividual das concepções pessoais de competência ao longo do ensino secundário. Boletim de Psicologia, 62(137), 183-199.         [ Links ]

Volkova, E., & Rusalov, V. (2016). Cognitive styles and personality. Personality and Individual Differences, 99,266-271. doi:10.1016/j.paid.2016.04.097        [ Links ]

Watanabe, O. M., Cassetari, L., Santos, M. L. M., Lombard-Planet, V. L. V., & Di Domenico, V. G. C (2001). Um levantamento dos hábitos dos alunos do curso de psicologia do Centro Universitário FMU. Psikhê: Revista do Curso de Psicologia do Centro Universitário FMU, 6(2),61-68.         [ Links ]

Zhang, L. F. (2011). The developing field of intellectual styles: four recent endeavours. Learning and Individual Differences, 21(3),311-318. doi:10.1016/j.lindif.2010.11.018        [ Links ]

Zhang, L. F. (2015). Fostering successful intellectual styles for creativity. Asia Pacific Educ. Rev., 16,183-192. doi:10.1007/s12564-015-9378-5        [ Links ]

Zhang, L., & Sternberg, R. J. (2005). A Threefold Model of Intellectual Styles. Educational Psychology Review, 17(1),1-53.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Dra. Katya Luciane de Oliveira
Laboratório de Avaliação e Pesquisa Psicológica/LAPPSIC; Depto. de Psicologia e Psicanálise. Centro de Ciências Biológicas. Universidade Estadual de Londrina. Campus Universitário
Rodovia Celso Garcia Cid (PR 445), km 380
Caixa Postal 6.001
CEP: 86051-990
Telefone (43) 3371-4397
E-mail: katyauel@gmail.com

Submissão: 4.3.2014
Aceite: 23.8.2017

Creative Commons License Todo o conteúdo deste periódico, exceto onde está identificado, está licenciado sob uma Licença Creative Commons