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Psicologia: teoria e prática
versão impressa ISSN 1516-3687
Psicol. teor. prat. v.10 n.1 São Paulo jun. 2008
ARTIGO ORIGINAL
Um estudo comparativo entre duas traduções brasileiras do Inventário de Auto-avaliação para Jovens (YSR)1
A comparative study between two Brazilian translations of the “Youth self-report” (YSR)
Un estudio comparativo de dos traducciones brasileñas del “Autoinforme del comportamiento de jóvenes” (YSR)
Marina Monzani da Rocha; Lucirley Guimarães de Sousa Araújo; Edwiges Ferreira de Mattos Silvares
Universidade de São Paulo
RESUMO
O Inventário de Auto-avaliação para Jovens é um questionário norte-americano de auto-avaliação de comportamento para jovens (de 11 a 18 anos). Uma revisão da literatura indicou a ausência de validação desse instrumento no Brasil e a coexistência de duas traduções, aqui denominadas Formas A e B. Para superar tal dificuldade, facilitando trabalhos futuros de validação, 90 adolescentes (M = 13,12; DP = 0,805) de três cidades brasileiras preencheram sucessivamente as duas traduções: metade deles na seqüência A-B e a outra metade na seqüência B-A. Nas duas situações, os participantes fizeram um intervalo correspondente a uma aula antes de preencherem a segunda forma. Não se encontraram diferenças estatisticamente significativas nas respostas dadas às duas formas. O índice de correlação entre A e B foi alto para a maioria das escalas analisadas, indicando equivalência de conteúdo entre elas. Conclui-se que o desejável é ter apenas uma forma em uso no Brasil, em função de os resultados terem demonstrado que as duas traduções são capazes de mensurar de maneira próxima os comportamentos propostos.
Palavras-chave: Distúrbios do comportamento, Adolescência, YSR, Avaliação psicológica, Correlação estatística.
ABSTRACT
The Youth Self-Report is a North-American self evaluation inventory of behavior problems aimed at youth (11-18 years). A literature review has indicated an absence of validation studies of this questionnaire in Brazil and the coexistence of two translations, here named Forms A and B. To overcome such difficulty, helping future researches, a group of 90 youths (M = 13.12; SD = 0.805) from three Brazilian cities fulfilled successively both translations: half of them followed the sequence A-B and the other half the sequence B-A. In both situations all the participants had a break equivalent to the duration of a class before filling the second translation. No statistical differences were found regarding the answers on both forms. The correlation index between forms A and B was elevated for most scales, indicating content equivalence. In conclusion, it is desirable to have only one translation in use in Brazil, considering the results that depicted that both translations are capable of measuring, with similar intensity, the proposed behaviors.
Keywords: Behavior-disorders, Adolescence, YSR, Psychological assessment, Statistical correlation.
RESUMEN
El Autoinfome del Comportamiento de Jóvenes es un inventario norte-americanos de auto evaluación para problemas de conducta destinado a los jóvenes (11 a 18 años). Una revisión de la literatura indica ausencia de estudios de validación de este cuestionario en Brasil y la coexistencia de dos traducciones, presentadas aquí como Formas A y B. Para superar estas dificultades, y ayudar a futuros estudios, 90 jóvenes (M = 13,12; DE = 0,805) de tres ciudades brasileñas respondieron las dos traducciones: mitad siguieron la secuencia A-B, y los otros, la secuencia B-A. En ambas situaciones los participantes tuvieron un descanso equivalente a la duración de una clase, antes de llenar la segunda traducción. No se encontraron diferencias estadísticas en cuanto a la respuesta de los dos cuestionarios. El índice de correlación entre las formas A y B es elevado para la mayoría de las escalas, indicando equivalencia de contenido. Concluyese que es deseable tener sólo una de las formas en uso en Brasil pues los resultados mostraron que las dos traducciones son capaces de medir con relativa proximidad los comportamientos propuestos.
Palabras clave: Trastornos de la conducta, Adolescencia, YSR, Evaluación psicológica, Correlación estadística.
Introdução
Os pais ou seus substitutos são, geralmente, as mais importantes fontes de informação sobre as competências e os problemas de comportamento de seus filhos, já que, em função da convivência, estão mais bem informados para avaliar as variações de comportamento que ocorrem nas diversas situações (ACHENBACH, 1991a). É consenso entre os psicólogos clínicos que o envolvimento dos pais no processo de avaliação e a visão deles sobre o comportamento dos filhos são, muitas vezes, cruciais para se definir a intervenção a ser realizada.
Além dos pais, outros agentes sociais que servem como fontes de dados, tais como os professores e os pares, também são importantes no processo de avaliação de crianças e adolescentes. No caso dos adolescentes, a maturidade social e a maturidade cognitiva atingidas permitem que eles próprios relatem seus sentimentos e comportamentos nas diversas situações, o que os torna potenciais informantes no processo de avaliação (ACHENBACH, 1991b).
O Sistema de Avaliação Empiricamente Baseado do Achenbach (Achenbach System of Empirically Based Assessment – ASEBA) é um sistema integrado de avaliação por meio de múltiplos informantes (ACHENBACH; RESCORLA, 2001). Nesse sistema, encontramos uma ampla gama de inventários que auxiliam no processo de avaliação das competências e dos problemas de comportamento de maneira rápida e com baixo custo (ACHENBACH; RESCORLA, 2001). Baseados em décadas de pesquisa e experiências práticas iniciadas na década de 1960 (ACHENBACH; EDELBROCK, 1978), os inventários do ASEBA conseguem avaliar semelhanças e diferenças do funcionamento humano em diferentes faixas etárias, condições e interações.
Esse sistema de avaliação é chamado Empiricamente Baseado por conta da maneira como foi elaborado. Inicialmente, o professor Thomas Achenbach, com auxílio de pais e diversos profissionais que trabalham diretamente com crianças e adolescentes (psicólogos, pedagogos, médicos, professores etc.), elaborou uma lista de comportamentos- queixa freqüentemente encontrados nessas faixas etárias. Após a elaboração, a lista foi aplicada em uma larga escala da população norte-americana com o objetivo de observar a co-ocorrência dos problemas listados. Assim foi possível fazer uma análise fatorial, o que levou à elaboração das escalas empiricamente baseadas que usamos hoje para avaliar as crianças e adolescentes com o uso de diferentes inventários do ASEBA. Assim sendo, os dados obtidos têm por base as experiências de pessoas que lidam com os clientes em diversos contextos e o relato do cliente sobre sua própria experiência. Não obstante, foram analisados estatisticamente de maneira que identificassem os padrões de ocorrência dos problemas. Tais padrões, derivados da análise estatística, foram usados para construir as escalas síndromes que marcam os conjuntos de problemas que co-ocorrem (ACHENBACH; RESCORLA, 2004).
O Inventário dos Comportamentos de Crianças e Adolescentes entre 6 e 18 anos2 é um material, também elaborado pelo psiquiatra norte-americano Thomas M. Achenbach, que visa obter, de maneira padronizada, o relato dos pais sobre o comportamento de seus filhos. O instrumento é dividido em duas partes: a primeira é composta por sete itens que avaliam as competências da criança, abrangendo a prática de esportes e de outras atividades lúdicas, a participação em grupos ou equipes, a realização de tarefas em casa, os relacionamentos sociais e o desempenho acadêmico. A segunda parte é composta por uma lista com 113 problemas de comportamento, sendo que os pais devem atribuir valor 0 (zero) quando o problema não é verdadeiro para seu filho, 1 (um) quando é um pouco ou algumas vezes verdadeiro, e 2 (dois) caso o problema seja muito ou freqüentemente verdadeiro para aquela criança.
Essa lista de problemas de comportamento (CBCL) foi a primeira a ser elaborada por Achenbach, que se baseou nos primeiros estudos que desenvolveu no fim da década de 1960 e início dos anos 1970 (ACHENBACH, 1991a). Diversas revisões foram feitas nos itens do questionário, sendo a atual versão (ACHENBACH; RESCORLA, 2001) a terceira da série.
O Inventário de Auto-avaliação para Jovens2 é uma variação do CBCL/6-18 que se utiliza de um formato padronizado e que foi elaborada para obter informações sobre o adolescente a partir de seu próprio ponto de vista. A metodologia empregada para a elaboração desse inventário foi a mesma descrita para o CBCL, e muitos itens são semelhantes nos dois instrumentos, o que facilita a comparação dos dados obtidos das duas fontes de informação (no caso, pais e/ou responsáveis e o próprio adolescente) (ACHENBACH; RESCORLA, 2001).
Mesmo sabendo que, a princípio, o adolescente, por ser o maior observador de seus próprios comportamentos nos diversos contextos, poderia fornecer informações mais completas que os outros informantes, não se deve utilizar a auto-avaliação do adolescente como fonte única de informação ou como a fonte mais precisa (VERHULST; VAN DER ENDE, 1992; ACHENBACH; RESCORLA, 2001; DE LOS REYES; KAZDIN, 2005). O que um indivíduo relata sobre si mesmo pode ser afetado pela maneira como ele está se sentindo naquele momento, pela maneira como a questão foi elaborada, e por sua sinceridade e capacidade de julgamento (ACHENBACH, 1991b).
A auto-avaliação do adolescente é parte do processo de avaliação, que também deve incluir informações advindas de outras pessoas que convivem com ele nos diversos contextos (ACHENBACH, 1991b). A análise fatorial dos itens dos inventários CBCL e YSR levou à elaboração de oito escalas de problemas de comportamento: Ansiedade/Depressão, Isolamento/Depressão, Queixas Somáticas, Problemas Sociais, Problemas de Pensamento, Problemas de Atenção, Comportamento de Quebrar Regras e Comportamento Agressivo. Alguns itens não se encaixaram em nenhuma dessas escalas, e são apresentados como Outros Problemas. Essas escalas são reunidas em três grupos: Problemas Internalizantes, que reúne as três primeiras escalas; Problemas Externalizantes, que reúne as duas últimas escalas; e Problemas Totais, que inclui todas as escalas analisadas e todos os itens reunidos em Outros Problemas (ACHENBACH; RESCORLA, 2001).
Buscando integrar os diferentes paradigmas utilizados para o estudo e para a avaliação das psicopatologias, e para facilitar a aplicação dos dados usados no Sistema de Avaliação Empiricamente Baseado ao sistema de diagnóstico formal, Achenbach e Rescorla (2001), com o auxílio de 22 psicólogos e psiquiatras de 16 diferentes culturas, elaboraram as escalas orientadas pelo DSM-IV (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 1994). Utilizou-se o procedimento de avaliar quais itens do CBCL e dos outros questionários do ASEBA eram muito consistentes em relação às categorias diagnósticas descritas no DSMIV (ACHENBACH; RESCORLA, 2007). Encontraram-se correspondências para os seguintes diagnósticos: transtornos afetivos, transtornos de ansiedade, transtornos somáticos, transtorno de déficit de atenção/hiperatividade, transtorno opositor desafiante e transtorno de conduta (ACHENBACH; RESCORLA, 2001).
O ASEBA é o sistema de avaliação empiricamente baseado mais usado e pesquisado do mundo, com mais de seis mil publicações cujas pesquisas foram feitas em 67 culturas (ACHENBACH; RESCORLA, 2007). No Brasil, seu uso em pesquisas é crescente, como, por exemplo, em Salvo, Silvares e Toni, 2005; Rocha e Silvares, 2006; e Silvares et al., 2006. Não se dispõe, entretanto, de normas para os inventários, o que significa dizer que, quando esses instrumentos são utilizados, comparam-se os resultados obtidos de crianças e adolescentes brasileiros com os obtidos de crianças e adolescentes norte-americanos. A ausência de normas brasileiras pode levar a resultados pouco acurados, já que não é levado em consideração o aspecto cultural.
Como qualquer outro tipo de avaliação baseada na percepção de informantes, os questionários do ASEBA estão sujeitos a influências culturais. As diferenças culturais expressas na linguagem, os costumes na educação das crianças, o sistema educacional, os padrões sociais, a alimentação, o estresse, as estratégias de enfrentamento e as oportunidades podem afetar a prevalência de algum distúrbio, a forma que ele toma e o que é feito quando o distúrbio está presente (ACHENBACH et al., 1990). Para melhorar a comunicação entre os profissionais do país e permitir a comparação dos resultados de diferentes culturas, os procedimentos de avaliação devem ser padronizados (VERHULST; ACHENBACH; FERDINAND; KASIUS, 1993).
Bordin, Mari e Caeiro (1995) realizaram um estudo de validação preliminar do CBCL (ACHENBACH; RESCORLA, 1991a) utilizando a avaliação psiquiátrica como modelo de comparação entre os resultados obtidos por meio deste inventário (BORDIN; MARI; CAEIRO, 1995). O procedimento adotado foi o de comparar a avaliação feita pela mãe, que usou o CBCL, com a avaliação feita por um psiquiatra que não teve acesso ao inventário respondido pela mãe. A correlação encontrada pelas autoras foi alta, o que sugere que o uso do questionário é válido no Brasil. No entanto, deve-se atentar para o pequeno número de participantes avaliados nesse estudo e para sua caracterização homogênea (SILVARES et al., 2006). Além disso, o modelo de validação selecionado tem recebido críticas em função da baixa correlação encontrada entre a avaliação psiquiátrica e a avaliação feita com instrumentos padronizados (RETTEW et al., 2006). Em uma meta-análise, Rettew et al. (2006) encontraram uma baixa concordância entre o diagnóstico obtido por meio de entrevista diagnóstica padronizada e o diagnóstico clínico, com kappa de 0,15 para crianças e 0,26 para adultos. Como há diversas variáveis que podem alterar um diagnóstico psiquiátrico (por exemplo, quem faz a entrevista diagnóstica), entende-se que esse tipo de avaliação não pode ser o único critério para a validação de um instrumento diagnóstico (RETTEW et al., 2006). A despeito de tais ressalvas, o trabalho realizado por Bordin, Mari e Caeiro (1995) foi um primeiro passo no sentido de validar o uso do CBCL no Brasil.
Silvares et al. (2006), considerando a necessidade de novos estudos com o CBCL, visando, então, alcançar normas brasileiras, analisaram os inventários respondidos por pais de crianças encaminhadas para atendimento em cinco diferentes clínicas-escola de psicologia. Encontraram-se resultados semelhantes ao estudo de Bordin, Mari e Caeiro (1995) quanto à distribuição dos perfis e queixas principais. Os dados, no entanto, ainda não foram conclusivos devido ao pequeno número de participantes e à distribuição heterogênea dentro das clínicas-escola envolvidas.
Com relação ao YSR, cujo uso é crescente em diversos tipos de pesquisa no Brasil (SCHOEN-FERREIRA; AZNAR-FARIAS; SILVARES, 2003; ROCHA; SILVARES, 2006; ARANTES; SILVARES, 2007; CAPUTO; BORDIN, 2007), não foram encontrados, em revisão não exaustiva da literatura, estudos de padronização ou validação da versão brasileira. Um estudo preliminar apresentou um índice de correlação bastante alto (0,98) na comparação entre os escores médios obtidos pelos adolescentes brasileiros encaminhados para atendimento psicológico e os escores médios obtidos pelos adolescentes da amostra normativa americana encaminhados a serviços de saúde mental tendo sido observadas as somas de escala analisadas do inventário (ROCHA; SILVARES, 2006). Novamente, o baixo número de participantes no estudo e o fato de todos serem da mesma cidade e provenientes de uma única fonte (encaminhados para clínicas-escola de psicologia) fazem com que não haja dados conclusivos com relação à validação do instrumento no Brasil.
Nesse momento, nos deparamos com a necessidade de mais estudos brasileiros sobre inventários do ASEBA, visando obter normas brasileiras e, assim, poder ampliar seu uso em pesquisas e em contextos clínicos.
Uma dificuldade que se encontrou para realizar essa tarefa foi a existência de duas traduções brasileiras do inventário Youth Self-Report (YSR), aqui nomeadas da seguinte maneira: Forma A – do Laboratório de Terapia Comportamental do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo – e Forma B – do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo. Estudar a associação entre as duas traduções parece ser um passo importante no sentido de uniformizar os inventários, o que facilitaria os trabalhos de validação e normatização posteriores.
O estudo teve como finalidade avaliar o grau de concordância existente entre as duas traduções (formas A e B) do inventário YSR.
Método
Participantes
Participaram do estudo 90 adolescentes (40 do sexo masculino e 50 do sexo feminino) cuja faixa etária varia entre 12 e 15 anos (M = 13,12; DP = 0,805).
O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em pesquisas com seres humanos do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Em todas as escolas onde os dados foram coletados, obteve-se assinatura da direção em termo de consentimento livre e esclarecido, sendo autorizada a realização do estudo em suas dependências. Participaram do estudo apenas os adolescentes que, após breve explicação sobre a tarefa a ser realizada, concordaram em responder aos inventários.
Os dados foram coletados nas salas de aula de turmas de 6ª e 7ª séries do Ensino Fundamental de três escolas públicas brasileiras, localizadas nas cidades de Sete Lagoas – MG (N = 31), São Paulo – SP (N = 22) e São Carlos – SP (N = 37).
Técnicas de coleta de dados O YSR/11-18 (ACHENBACH; RESCORLA, 2001) foi respondido pelos adolescentes nas duas versões (A e B). Usaram-se os escores brutos obtidos a partir das respostas dos adolescentes.
O Procedimento de coleta de dados
Os inventários foram aplicados durante o período letivo e em horário escolar. Pesquisadores explicavam a tarefa enfatizando que seriam aplicadas duas formas de um mesmo questionário e que havia questões similares que deveriam ser preenchidas em sua totalidade. Apenas aqueles adolescentes que concordaram em participar da pesquisa responderam aos inventários. A classe foi dividida ao meio, formando-se dois grupos: o dos alunos que preencheram a Forma A e o dos alunos que preencheram a Forma B. Após o intervalo de uma aula, requisitou-se a cada grupo que respondesse a outra forma, garantindo, dessa maneira, que todos os adolescentes preenchessem as Formas A e B. Desse modo, metade da turma respondeu aos inventários na seqüência A-B e a outra metade na seqüência B-A.
Todos os inventários foram reunidos no Laboratório de Terapia Comportamental do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (LTC – IP/USP) para serem analisados com o auxílio do software ADM (Assessment Data Manager), desenvolvido por Achenbach e sua equipe (Achenbach System of Empirically Based Assessment, 2006) para cálculo dos escores e elaboração de perfis. Após a análise dos perfis, os dados foram submetidos a tratamento estatístico, e contaram com o auxílio do software SPSS 12.0 (Statistic Package for Social Science).
Resultados
Comparação entre as formas
Apresentam-se, na Tabela 1, os escores médios obtidos pelos adolescentes tanto nas escalas de competências e nas escalas de problema de comportamento empiricamente baseadas, quanto na correlação entre as duas formas.
Tabela 1. Comparação dos escores médios obtidos por meio das duas formas do YSR nas escalas empiricamente baseadas do YSR e índice de correlação
Análises de variância (ANOVA) utilizadas para comparar os resultados obtidos por meio das duas formas (A e B) e para cada uma das escalas ou soma de escalas não apontaram diferença estatisticamente significativa entre os escores brutos. Ou seja, os escores obtidos por meio da Forma A para as escalas de competências e para as escalas de problemas de comportamento são semelhantes aos escores obtidos por meio da Forma B. Entretanto, foi encontrada uma tendência à diferença estatística na escala Atividades (p = 0,077). Sendo assim, sugere-se uma análise mais aprofundada da tradução dos itens que compõem esta escala.
A correlação entre os escores obtidos com as formas A e B é significativa (p < 0,001) para todas as escalas analisadas. É interessante, entretanto, atentar para os itens das escalas Desempenho Acadêmico e Isolamento/Depressão, visto que a correlação entre as duas formas foi inferior a 0,70.
Além de comparar as formas em função do agrupamento empiricamente baseado, comparamos os itens agrupados nas escalas orientadas pelo DSM-IV. Os escores obtidos com cada uma das formas, bem como o índice de significância da análise estatística e o índice de correlação alcançado, são apresentados na Tabela 2.
Tabela 2. Comparação dos escores médios obtidos por meio das formas A e B do YSR para as escalas orientadas pelo DSM-IV e índice de correlação
Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa entre os escores obtidos por meio das formas A e B para as escalas orientadas pelo Manual Estatístico de Classificação de Transtornos Psiquiátricos DSM-IV. A correlação alcançada entre as duas formas para essas escalas foi significativa. Entretanto, o índice de correlação atingido na escala Transtorno Opositor Desafiante foi inferior a 0,70, tornando necessária a atenção à tradução dos itens que compõem esta escala
Discussão de resultados
O estudo realizado teve como objetivo comparar os resultados encontrados com duas traduções brasileiras do YSR, a fim de facilitar futuros trabalhos com o questionário.
Observaram-se vantagens do presente estudo em relação à composição da amostra. A primeira delas é o seu caráter relativamente heterogêneo, dado o fato de os participantes serem de três cidades diferentes da região Sudeste do Brasil, o que permite, inclusive, maior confiabilidade ao teste das duas traduções do YSR. Além disso, nota-se um equilíbrio entre o número de participantes de cada sexo, o que garante uma menor influência desse aspecto sobre os resultados encontrados. Ressalta-se, ainda, a importante configuração de uma amostra total de tamanho razoável (N = 90) para as análises estatísticas de correlação com base nos escores médios brutos.
Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre os escores médios obtidos pelos adolescentes por meio das duas formas do YSR. Esse resultado é um indício de que as diferenças apresentadas nas traduções não interferem na compreensão> do conteúdo analisado pelo questionário.
É interessante atentar, no entanto, à tradução dos itens que compõem a escala Atividade, uma vez que se encontrou uma tendência à diferença estatística entre as duas formas para essa escala. Acredita-se que, nesse caso, uma das traduções não esteja tão acurada quanto a outra, levando a uma discrepância de resultados, sendo mais adequado adotar apenas uma das escalas no País.
A correlação entre as formas A e B foi significativa para todas as escalas analisadas. Porém, para as escalas Desempenho Acadêmico, Isolamento/Depressão e Transtorno Opositor Desafiante, o índice de correlação foi inferior a 0,70, ou seja, abaixo do esperado em termos de respostas similares dos adolescentes a um mesmo questionário. Dessa maneira, aliada à recomendação de uso de apenas uma forma do questionário no País, sugere-se uma revisão dos itens que compõem essas escalas.
O uso de apenas uma das formas facilitaria a comunicação entre profissionais e pesquisadores brasileiros, pois se estabeleceria um padrão para a comparação de dados de pesquisas nacionais e se possibilitariam pesquisas multiculturais, como é sugerido por Verhulst et al. (1993).
Os resultados deste estudo, atrelados a uma revisão metodológica do trabalho de Rocha e Silvares (2006), apontam a validação do YSR como a próxima etapa neste processo de investigação e abrem caminho para novos estudos dessa natureza para todos os instrumentos do ASEBA, em caso de haver a coexistência de duas ou mais traduções brasileiras de outros questionários deste sistema.
Conclui-se que, a despeito de ambas as traduções do inventário YSR serem capazes de mensurar de maneira próxima os comportamentos analisados, dever-se-ia ter uma única forma do questionário em vigor no País.
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Endereço para correspondência
Marina Monzani da Rocha
Av. Nossa Senhora da Assunção, 647 – ap. 124B
São Paulo – SP
CEP 05359-001
E-mail: marinamonzani@gmail.com
Tramitação
Recebido em abril de 2008
Aceito em junho de 2008
1 Os autores agradecem a colaboração de Daniela Patrícia Ado Maldonado, Márcia Helena da Silva Melo e Paulo Henrique Barbosa do Carmo. Agradecem também à Dra. Isabel Altenfelder Santos Bordin, por fornecer sua tradução do questionário “Youth Self-Report” para a realização deste estudo.
2 SILVARES, E. F. M.; ROCHA, M. M.; Equipe Projeto Enurese, 2007. Versão brasileira, não publicada, do inventário “Child Behavior Checklist” 6/18, de Achenbach e Rescorla (2001). Os interessados poderão obter esse questionário com a professora Edwiges Silvares, no seguinte endereço eletrônico: efdmsilv@usp.br