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Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.15 no.3 São Paulo dez. 2013

 

DESENVOLVIMENTO HUMANO

 

Estudo transversal sobre imagem corporal de adolescentes

 

Cross-sectional study on body image in adolescents

 

Estudio transversal sobre la imagen corporal en adolescentes

 

 

Valter Paulo Neves MirandaI; Ana Carolina Soares AmaralI; Leonardo Sousa FortesI; Maria Aparecida ContiII; Maria Elisa Caputo FerreiraIII

IUniversidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora - MG - Brasil
IIUniversidade de São Paulo - São Paulo - SP - Brasil
IIIUniversidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora - MG - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo do estudo foi avaliar a satisfação corporal de adolescentes de uma cidade de Minas Gerais, Brasil. O desenho do estudo foi transversal, com estudantes divididos em dois grupos, de acordo com período da adolescência: intermediário (15-16 anos) e final (17-21 anos). Para avaliação da imagem corporal, utilizou-se a escala de satisfação por áreas corporais. Participaram 170 escolares (66 meninos e 104 meninas). A mediana de satisfação corporal foi de 52,0 (25,0-72,0) pontos. A satisfação com a imagem corporal avaliada pelas áreas corporais foi elevada nos adolescentes, embora tenham sido encontrados baixos índices de satisfação com o peso e com o tônus muscular. Meninas tiveram escores menores de satisfação com o peso que os meninos (p = 0,045), houve também uma correlação significativa entre a idade e o escore total de satisfação corporal (r = 0,955). Verificou-se que a satisfação com a imagem corporal foi elevada, sendo o peso e o tônus muscular os itens com menores escores.

Palavras-chave: imagem corporal; comportamento alimentar; adolescentes; idade; estudos transversais.


ABSTRACT

The aim of this study was to evaluate the body satisfaction among adolescents in a town of Minas Gerais state, Brazil. The study was cross-sectional with students divided into two groups according to the adolescent period: intermediate (PI) (15-16 years) and late (PF) (17-21 years). For the body satisfaction evaluation, the body parts satisfaction scale was applied. One hundred seventy adolescents were studied (66 males and 104 females). The median body satisfaction was 52.0 (25.0-72.0) points. The satisfaction with body image assessed by body areas was elevated, although it has been observed low levels of satisfaction with weight and muscle tone. Girls had lower scores of satisfaction with weight than boys (p = 0.045), there was also a significant correlation between age and total score of body satisfaction (r = 0.955). It was found that satisfaction with body image was high, and the weight and muscle tone items with lower scores.

Keywords: body image; feeding behavior; adolescents; age; cross-sectional studies.


RESUMEN

El objetivo de este estudio fue evaluar la satisfacción corporal en adolescentes de una ciudad de Minas Gerais, Brasil. El diseño del estudio fue transversal, con estudiantes divididos en dos grupos de acuerdo con el período de adolescencia: intermedio (PI) (15 a 16 años de edad) y tardío (PF) (17-21 años de edad). Para evaluar la imagen corporal se utilizó la escala de áreas de satisfacción corporal. Fueron estudiados 170 estudiantes (66 chicos y 104 chicas). La satisfacción corporal mediana fue de 52,0 (25,0 a 72,0) puntos. La satisfacción con la imagen corporal evaluada respecto a las áreas del cuerpo fue alta en estos adolescentes, pero se han encontrado niveles bajos de satisfacción con el peso y el tono muscular. Las niñas obtuvieron puntos más bajos de satisfacción con el peso que los niños (p = 0,045), también hubo una correlación significativa entre la edad y la puntuación total de satisfacción corporal (r = 0,955). Se encontró que la satisfacción con la imagen corporal fue alta, y los elementos de peso y tono muscular con puntuaciones más bajas.

Palabras clave: imagen corporal; conducta alimentar; adolescentes; edad; estudios transversales.


 

 

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, adolescência é a fase do desenvolvimento compreendida entre 10 e 19 anos (World Health Organization, 2005). Trata-se de um período particular da vida do ser humano, pois manifesta maturação psíquica, biológica e social (Papalia, 2008). Cronologicamente, a adolescência pode ser dividida em períodos caracterizados por alterações específicas: inicial de 10 a 14 anos, intermediário de 15 a 17 anos e final de 18 a 19 anos (World Health Organization, 2005). Em todo mundo, há aproximadamente 1,2 bilhão de adolescentes, quase 20% da população mundial (World Health Organization, 2005).

A imagem corporal pode ser entendida como a figuração que o indivíduo tem do tamanho, da forma e do contorno do próprio corpo, bem como dos sentimentos referentes às características e às partes que o constituem (Slade, 1994). A satisfação corporal é um desses sentimentos e diz respeito à apreciação que se tem com a própria aparência física (Slade, 1994; Dumith et al., 2012,). A insatisfação corporal entre os adolescentes pode surgir como consequência das mudanças naturais ocorridas no corpo, em função do processo maturacional (Papalia, 2008). Entre estas, destacam-se o rápido crescimento em altura e peso, mudanças nas proporções e na forma do corpo, e a obtenção da maturidade sexual (Papalia, 2008). Miranda, Conti, Bastos e Ferreira (2011) constaram que adolescentes, principalmente do sexo feminino, mostraram-se mais insatisfeitas no período inicial da adolescência, uma fase em que são mais perceptíveis as alterações durante a puberdade.

Alguns estudos apontam para uma alta prevalência de insatisfação corporal entre os adolescentes (Berg et al., 2007). Outros, ainda, suportam que a insatisfação corporal é um dos critérios predisponentes para o desencadeamento dos transtornos alimentares, como a bulimia nervosa e a anorexia nervosa (Dumith et al., 2012; Martins, Nunes, & Noronha, 2008). Embora sejam limitados os dados populacionais a respeito da prevalência desses transtornos entre os adolescentes brasileiros, estima-se que de 0,5% a 5% dos jovens podem apresentar algum sintoma de transtorno alimentar, e de 90% a 95% dos casos ocorrem em meninas na faixa etária de 15 a 25 anos (Petroski, Pelegrini, & Glaner, 2012).

Muitos estudiosos têm alertado que essa insatisfação corporal característica da adolescência pode se justificar pelo fato de esse grupo estar entre os mais vulneráveis às pressões da sociedade para a obtenção do corpo ideal, principalmente em razão da ampla divulgação em comerciais, revistas e cinema de um padrão corporal que valoriza a magreza entre as mulheres e o aumento da massa muscular entre os homens, como sinônimo de beleza e ascensão social (Berg et al., 2007; Petroski et al., 2012).

Além disso, os adolescentes apresentam um comportamento de contestação e são altamente influenciados pelo grupo (Dumith et al., 2012), aspectos que podem desencadear a insatisfação corporal. No Brasil, grande parte dos estudos epidemiológicos busca investigar a satisfação com a imagem corporal sem focar na satisfação por partes corporais, principalmente de adolescentes moradores de centros urbanos com maior contingente de população, sendo escassos os estudos destinados a esse fim em contextos sociais diferenciados (Miranda et al., 2011; Petroski et al., 2012). Um levantamento sobre a insatisfação corporal de jovens de diferentes realidades socioculturais é necessário, pois ampliaria o foco das pesquisas epidemiológicas e descritivas, e, com isso, seria possível analisar como jovens moradores de diferentes contextos demográficos se relacionam com a sua imagem corporal (Cafri, Yamamiya, Brannick, & Thompson, 2005).

Dessa forma, o presente estudo pretende avaliar descritivamente a imagem corporal de adolescentes moradores em uma cidade de pequeno porte do interior do Estado de Minas Gerais, por meio do grau de satisfação corporal geral e de partes específicas do corpo, verificando a possível associação com o estágio da adolescência.

 

Método

Trata-se de um estudo epidemiológico, transversal de base escolar, realizado entre adolescentes estudantes do ensino médio da rede pública da cidade de Tabuleiro, Minas Gerais, que possui uma população de 4.061 habitantes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2008). Esse é um dos fatores demográficos que justificam sua classificação como cidade de pequeno porte, segundo a avaliação do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (2001).

Participantes

De acordo com informações da Secretaria de Educação do Estado de Minas Gerais, existiam, no ano letivo de 2009 (ano em que foi realizada a pesquisa), 198 alunos matriculados na única escola estadual que oferece o ensino médio (EM) na cidade de Tabuleiro, sendo todos advindos de uma única escola pública. Todos os alunos foram convidados a participar da pesquisa. Essa escola se localiza no centro da cidade e recebe alunos tanto da zona urbana quanto da zona rural. O ensino médio é oferecido apenas no período noturno.

Os critérios de inclusão foram os seguintes: adolescentes domiciliados na cidade de Tabuleiro, com idade entre 15 e 19 anos, que, após a decisão voluntária de participar da pesquisa, apresentassem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) assinado pelo seu responsável. Utilizou-se amostragem por conveniência para inclusão de sujeitos no estudo pelo fato de a pesquisa ser com todos os adolescentes que estavam regularmente matriculados no ensino médio na escola pública de Tabuleiro e que se dispuseram a participar voluntariamente da pesquisa. O valor mínimo de adolescentes necessários foi de 150, segundo o procedimento amostral definido por Lwanga e Lemeshow (1991) que leva em consideração a prevalência do fenômeno a ser avaliado e o nível de significância adotado (5%). Deve-se ressaltar que era desconhecida a prevalência de insatisfação corporal entre os adolescentes de Tabuleiro, e, por isso, utilizou-se a prevalência de 10% recomendada pela Organização Mundial da Saúde.

A amostra foi dividida em dois grupos, de acordo com a idade, seguindo a classificação da Organização Mundial da Saúde: período intermediário (PI) (entre 15 e 16 anos) e período final (PF) (entre 17 e 21 anos) da adolescência.

Instrumento

Utilizou-se a escala de satisfação corporal proposta por Brown, Cash e Mikulka (1990) e adaptada por Loland (1998). Trata-se de um questionário composto por cinco níveis de satisfação, desde "muito insatisfeito" até "muito satisfeito", em escala na forma Likert de pontos de 1 a 5, e 15 partes do corpo, a saber: rosto, cabelo, nádegas, quadril, coxas, pernas, estômago, cintura, seio/tórax, costas/ombros, braços, tônus muscular, peso, altura, todas as áreas. A partir da classificação do nível de satisfação corporal de cada área, calculou-se o escore geral de satisfação corporal. Esse escore foi calculado somando-se os pontos obtidos em cada área corporal. O escore varia de 15 a 75, e quanto menor o escore apresentado, maior a insatisfação corporal do adolescente.

Os participantes responderam, ainda, a um questionário com as seguintes informações sociodemográficas: nome (opcional), data de nascimento, sexo e série. A idade dos participantes foi calculada pela diferença entre o ano de nascimento e o ano da pesquisa (2009).

A pesquisa foi realizada entre os meses de março e agosto de 2009.

Análise estatística

Para análise dos dados, foi utilizado o software estatístico SPSS versão 17.0, adotando-se o nível de significância de 5%. Inicialmente, realizou-se uma análise descritiva dos dados (média e desvio padrão). Por meio do teste de Komolgorov Smirnov, constatou-se que a distribuição dos dados não apresentou normalidade; por isso, optou-se por procedimentos estatísticos não paramétricos. Para a comparação das médias de insatisfação entre os sexos e entre os períodos inicial e final da adolescência, utilizou-se o teste de Mann-Whitney. Realizou-se ainda um teste de correlação de Spearman entre a idade e os valores totais de insatisfação, além de um teste qui-quadrado de associação linear entre as áreas corporais de menor escore, o sexo e os períodos intermediários e final da adolescência.

Considerações éticas

Esta pesquisa foi desenvolvida pelo Laboratório de Estudos do Corpo (Labesc) da Faculdade de Educação Física e Desportos da Universidade Federal de Juiz de Fora. O projeto atendeu às exigências éticas e científicas fundamentais descritas na Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde, sendo aprovado pelo Comitê de Ética de Pesquisa (CEP) com seres humanos da Universidade Federal de Juiz de Fora, no dia 19 de fevereiro de 2009, com o número de Protocolo nº 1612.302.2008.

 

Resultados

Dos 198 alunos matriculados no EM, 170 participaram da pesquisa, representando cerca de 85% da população. Os demais alunos não foram incluídos no estudo porque demonstraram falta de vontade em participar da pesquisa (20 alunos) e não completaram corretamente os instrumentos de avaliação da imagem corporal (oito alunos). Do total de participantes, 66 (38,7%) eram do sexo masculino e 104 (61,3%) do feminino.

A mediana da idade dos alunos foi de 17 anos (15-19). A caracterização da amostra de acordo com períodos da adolescência pode ser observada na Tabela 1.

 

 

O escore mínimo e máximo de satisfação corporal foi de 25 e 72 pontos, respectivamente. Os valores dos quartis da distribuição da pontuação total foram 47,0 (P25), 52,0 (P50) e 58,0 (P75). Percebe-se que 85 adolescentes (50% da amostra) tiveram uma pontuação acima de 52,0, o que corresponde a 70% da pontuação total do instrumento.

Os escores de acordo com o sexo e com o período da adolescência estão apresentadas na Tabela 2. Não foi encontrada diferença estatisticamente significativa de satisfação corporal entre os grupos da idade (PI e PF) e entre os sexos (meninas e meninos). Porém, houve uma correlação significativa entre a idade e os valores totais de satisfação (r = 0,955), mostrando que quanto maior a idade do adolescente, maior o escore de satisfação.

 

 

Quando se analisaram separadamente meninos e meninas, também não foi encontrada diferença estatisticamente significativa entre os períodos da adolescência. Entretanto, pôde-se observar que meninos no PF da adolescência apresentaram média dos escores de satisfação corporal superior àqueles do PI. Já entre as meninas, aquelas classificadas no PI apresentaram média geral dos escores de satisfação corporal mais elevada do aquela observada em meninas do PF.

Com relação às médias de cada área corporal, verificou-se que o item "peso" obteve a menor média de pontuação quando se analisou toda a amostra, indicando que se trata de área de menor satisfação corporal. Os itens com menores níveis de satisfação entre os sexos foram peso e tônus para meninas e meninos, respectivamente. Os itens ombro (ambos os sexos), rosto (sexo feminino) e estatura (sexo masculino) foram aqueles que apresentaram maiores níveis de satisfação. A Tabela 3 apresenta uma análise descritiva dos escores médios de satisfação para cada área corporal, também entre os períodos intermediário e final da adolescência. Observou-se que o menor escore médio de cada grupo foi verificado para o item "peso", tanto entre os adolescentes do PI quanto do PF.

 

 

Quando se compararam meninos e meninas em cada um dos períodos da adolescência, verificou-se que, entre as meninas do PI, a área de menor satisfação foi "cintura", enquanto as classificadas como no PF da adolescência apresentaram menor satisfação com o "peso". A área corporal classificada com o maior escore de satisfação entre as meninas do PI foi o "rosto", já, naquelas no período final da adolescência, a área de maior satisfação foi o "ombro".

Entre os meninos, as áreas de menor escore de satisfação corporal foram "tônus muscular" e "cintura" para PI e PF, respectivamente. A área corporal "nádegas" foi classificada com o maior escore médio de satisfação entre os meninos do PI, enquanto a "estatura" foi alvo de maior satisfação entre os meninos classificados como no período final da adolescência.

Quando se dividiu a pontuação de cada área corporal pelos quartis, percebeu-se que os primeiros e segundos quartis das áreas "peso" e "tônus muscular" foram maiores que as demais, mostrando que mais indivíduos marcaram as opções 1 e 2, que significam "muito insatisfeito" ou "insatisfeito" com essas partes do corpo. Considerando a amostra total, 16,5% dos alunos (n = 28) estavam muito insatisfeitos com o próprio peso, sendo 22,1% das meninas (n = 23) e 7,6% dos meninos (n = 5).

Realizou-se o teste qui-quadrado de associação linear entre as áreas peso e tônus muscular que tiveram menor de pontuação satisfação. Foi observado que as meninas apresentaram menores escores de satisfação corporal que os meninos (p = 0,045). Com relação a tônus muscular, a diferença entre os sexos não foi significativa (p = 0,512). Entre os grupos das fases intermediária e final da adolescência, peso e tônus muscular não apresentaram diferença significativa.

 

Discussão

A satisfação com a imagem corporal avaliada pelas áreas corporais pode ser considerada elevada nos adolescentes do ensino médio de Tabuleiro, muito embora tenha sido registrado algum grau de menores índices de satisfação em áreas como peso e tônus muscular. As meninas tiveram escores menores de satisfação com o peso do que os meninos (p = 0,045), e foi encontrada também uma correlação significativa entra a idade e o escore total de satisfação corporal (r = 0,955).

Os escores obtidos pelos participantes indicaram uma satisfação com as diferentes áreas corporais de cerca de 70% do valor total da escala. Esse resultado contrapõe os dados de estudos nacionais envolvendo adolescentes domiciliados em grandes centros urbanos, pois há elevada insatisfação corporal, com variação de 28% a 36% em relação ao escore total dos instrumentos (Pelegrini & Petroski, 2010).

Em uma cidade de médio porte de Minas Gerais, Amaral, Oliveira, Madeira e Ferreira (2007) encontraram uma média geral de satisfação corporal utilizando a escala de áreas corporal de Loland (1998), sendo os resultados semelhantes aos deste estudo. Usando escala de silhueta para avaliar a satisfação corporal, Fidélix, Silva, Pelegrini, Silva e Petroski (2011) verificaram que a prevalência de insatisfação com a imagem corporal é elevada, mesmo em adolescentes residentes em municípios de pequeno porte, sendo mais evidente no sexo masculino. Diferentemente, nesta pesquisa as meninas apresentaram menores valores de satisfação corporal, tendo o peso como a área de maior preocupação.

Ao avaliarem adolescentes das zonas urbana e rural, Petroski et al. (2012) encontraram uma prevalência de insatisfação com a imagem corporal de 60,4% sendo as meninas (65,7%) mais insatisfeitas que os meninos (54,5%). Ainda segundo esses pesquisadores, os rapazes (26,4%) apresentaram maior desejo em aumentar o tamanho da silhueta corporal, enquanto as moças (52,4%) desejavam diminuir. Na presente pesquisa, as meninas tiveram escores de satisfação corporal menor que os meninos, sendo as primeiras com menor escore referente ao "peso" e os segundos ao "tônus muscular".

Neste estudo, os escolares maiores de 16 anos se mostraram significativamente menos satisfeitos que os mais jovens, o que corrobora os resultados de Miranda et al. (2011), que também constataram que adolescentes na fase inicial da adolescência são mais insatisfeitos que adolescentes na fase final da adolescência. De forma semelhante, entre as meninas participantes deste estudo, as mais velhas tenderam a ser mais insatisfeitas, e o oposto foi verificado entre os meninos. Esses achados podem indicar as diferenças entre a insatisfação corporal entre meninos e meninas, já que estas se distanciam do ideal corporal ao longo da puberdade (aumento da gordura corporal), enquanto aqueles se aproximam do corpo desejado (aumento da massa muscular e da estatura) (Berg et al., 2007; Petroski et al., 2012). Entretanto, há pesquisas que relatam que a idade parece não influenciar na insatisfação corporal perante os aspectos culturais de uma população (Cafri et al., 2005), fato que pode justificar os resultados encontrados no presente estudo.

Além disso, a não constatação de diferenças significativas entre os escores apresentados por meninos e meninas da presente amostra confronta os resultados da maior parte dos estudos realizados com adolescentes no Brasil, os quais costumam indicar que meninas apresentam níveis de insatisfação maiores que seus pares do sexo masculino (Dumith et al., 2012; Amaral et al., 2007; Martins et al., 2008). Uma possível justificativa para a não ocorrência dessa diferenciação pode estar nas próprias características socioculturais dos adolescentes investigados, os quais podem estar submetidos a pressões semelhantes em relação ao corpo, independentemente do sexo. Pesquisas recentes atestam que o estresse negativo com a aparência física pode causar insatisfação corporal excessiva tanto entre meninas como entre meninos, bem como estar associado com a baixa autoestima, sintomas depressivos e desenvolvimento de comportamentos alimentares de risco em ambos os grupos (Miranda et al., 2011; Dumith et al., 2012; Petroski et al., 2012).

Entre os diferentes níveis de satisfação corporal, deve-se destacar o fato de que os instrumentos validados para avaliação desse aspecto entre adolescentes brasileiros trazem, em seu conteúdo, questionamentos sobre o peso e a forma física, fatores relacionados com a depreciação da imagem corporal em meninas (Berg et al., 2007; Dumith et al., 2012; Miranda et al., 2011). Em sua maioria, esses instrumentos não apresentam itens relacionados aos fatores mais fortemente ligados à insatisfação corporal masculina, como a muscularidade (Berg et al., 2007; Carvalho, Amaral, & Ferreira, 2009). Esse fato pode colaborar para a observação de níveis de insatisfação mais elevados entre meninas, não refletindo, entretanto, a associação real do adolescente do sexo masculino com seu corpo.

Assim como foi encontrado nesta pesquisa, outros estudos realizados com adolescentes brasileiros, em diferentes contextos culturais, também identificaram o peso como alvo de maior descontentamento (Amaral et al., 2007; Carvalho et al., 2009). Esse fato merece destaque por demonstrar como o peso corporal pode estar associado à construção da autoimagem, exercendo influência direta sobre os comportamentos alimentares de adolescentes (Conti, Latorre, Hearst, & Segurado, 2009), em diversos contextos sociodemográficos do Brasil. Ao avaliarem a insatisfação com a imagem corporal de adolescentes da região metropolitana de São Paulo e de cidades peque-nas de Minas Gerais, Laus, Miranda, Almeida, Braga e Ferreira (2012) verificaram que ambos os grupos de adolescentes com sobrepeso e obesidade apresentaram elevada insatisfação corporal.

As diferentes áreas corporais com menores índices de satisfação corporal entre meninos e meninas podem ser discutidas à luz das características corporais advindas das alterações da puberdade, bem como de acordo com o padrão de corpo ideal estabelecido socialmente. Para a amostra do presente estudo, essas características foram o "peso" entre as meninas e o "tônus muscular" entre os meninos. Nesse sentido, Conti et al. (2009) mostraram também que insatisfações para distintas áreas corporais podem apresentar diferentes origens, refletindo fatores sociais, com meninos desejando ombros mais largos, cintura fina, quadril fino e estômago plano, e meninas almejando corpos mais delgados, com coxas, nádegas, cintura e estômago com menos acúmulo de gordura.

Por se tratar de uma pesquisa transversal com adolescentes do ensino médio da cidade de Tabuleiro, a opção da seleção amostral por conveniência mostrou-se a mais adequada por selecionar os adolescentes de ambos os sexos matriculado no período em que a pesquisa foi realizada. O processo de seleção amostral por conveniência não selecionou os participantes de maneira randomizada. A inferência de que os adolescentes residentes em cidades menores possuem uma associação mais positiva com sua imagem corporal, comparados aos adolescentes de cidades maiores, é limitada pelo fato de a pesquisa transversal não trazer relação de causa e efeito que possa justificar essa observação, assim como não seria conveniente comparar valores de satisfação com a imagem corporal usando diferentes instrumentos.

Assim, percebe-se que os resultados desta pesquisa merecem ser observados com cautela, quando comparados às observações encontradas por outros autores sobre a satisfação com a imagem corporal dos adolescentes. O fato de os adolescentes investigados serem oriundos de uma única escola e de uma única cidade pode indicar uma realidade social muito específica, não refletida em outras cidades com as mesmas características demográficas. Além disso, o instrumento utilizado para a avaliação da satisfação corporal foi apenas traduzido para a língua portuguesa. Justifica-se, entretanto, que ele foi utilizado por não haver, na época da coleta de dados da pesquisa (março de 2009), um instrumento validado para a população adolescente brasileira. Deve-se considerar também que outros estudos semelhantes a este utilizaram essa ferramenta na avaliação da satisfação por áreas corporais (Brown, Cash, & Mikulka, 1990; Amaral et al., 2007; Conti et al., 2009).

Em oposição a essas limitações, considera-se que esta pesquisa representa um avanço ao pretender analisar a satisfação, tendo em vista a carência de pesquisas em diferentes regiões sociodemográficas do Brasil com este tipo de avaliação em relação a diferentes áreas corporais. Muito embora a insatisfação com a imagem corporal já tenha sido registrada entre os adolescentes (Miranda et al., 2011; Martins et al., 2008), mais estudos precisam abordar diferentes aspectos sociais, culturais e fisiológicos que possam auxiliar na compreensão dos fatores que desencadeiam sentimento de rejeição com a imagem corporal. Já é consenso que fatores individuais, sejam ele biológicos e/ou antropométricos, atrelados aos fatores socioculturais interferem no sentimento do jovem em relação à sua aparência física (Dumith et al., 2012). Além disso, a pressão sociocultural para perda de peso, ganho muscular e construção de um modelo de corpo pela mídia está presente no dia a dia dos jovens (Berg et al., 2007; Cafri et al., 2005; Petroski et al., 2012).

Este estudo pôde verificar que a satisfação com a imagem corporal avaliada por um instrumento que usa áreas corporais foi elevada, sendo o peso e o tônus muscular as áreas com menores escores de insatisfação para meninas e meninos, respectivamente. Pode-se também constatar uma correlação significativa entre a idade e o escore total de satisfação corporal. Este estudo ressalta a importância de os profissionais das áreas da educação e saúde incentivarem os jovens a conhecer melhor a si mesmos e o próprio corpo, e a refletir sobre a forma física considerada ideal pela sociedade.

Ademais, a investigação de contextos culturais diferenciados é necessária, para que se possa traçar um perfil da satisfação corporal entre os adolescentes brasileiros de diferentes contextos demográficos e da influência desse componente na adoção de comportamentos considerados de risco para a saúde, como dietas hipocalóricas, uso de anabolizantes e excesso de atividades físicas. Pesquisas futuras nas escolas poderão observar como alguns fatores biológicos e sociais podem de fato influenciar no aumento ou na diminuição da satisfação corporal desse grupo populacional.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
Valter Paulo Neves Miranda
Universidade Federal de Juiz de Fora, Faculdade de Educação Física e Desportos, Laboratório de Estudos do Corpo (LABESC)
Rua José Lourenço Kelmer, s/n, Campus Universitário, Bairro São Pedro
Juiz de Fora - MG - Brasil. CEP: 36036-900
E-mail: vpnmiranda@yahoo.com.br

Submissão: 20.05.2013
Aceitação: 06.09.2013