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Psicologia: teoria e prática
versão impressa ISSN 1516-3687
Psicol. teor. prat. vol.18 no.2 São Paulo ago. 2016
https://doi.org/10.15348/1980-6906/psicologia.v18n2p89-102
AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA
Análise das relações entre ansiedade-estado e coesão de atletas de handebol
Analysis of the relationship between state-anxiety and team cohesion among handball athletes
Análisis de la relación entre ansiedad estado y cohesión del grupo de atletas de balonmano
José Roberto Andrade do Nascimento JuniorI; Guilherme Moraes BalbimII; João Ricardo Nickenig VissociIII; Caio Rosas MoreiraIV; Patrícia Carolina Borsato PassosIV; Lenamar Fiorese VieiraIV
IUniversidade Federal do Vale de São Francisco - PE - Brasil
IIUniversidade do Oeste do Paraná - PR - Brasil
IIIFaculdade Ingá - PR - Brasil
IVUniversidade Estadual de Maringá - PR - Brasil
RESUMO
Este estudo investigou a ansiedade-estado e a coesão em 62 atletas de handebol. Foram utilizados o Questionário de Ambiente de Grupo e o Inventário de Ansiedade-Estado Competitiva-2. As análises foram realizadas pela Anova de Medidas Repetidas, t de Student, coeficiente de correlação de Pearson e Regressão simples. Os resultados evidenciaram que enquanto a coesão (tarefa) aumentou durante a competição para os homens, a coesão (social/tarefa) das mulheres diminuiu. O nível de ansiedade somática das mulheres sofreu redução durante o torneio. A ansiedade somática impactou significativamente a integração para o grupo (social/tarefa) e a atração individual (social) das mulheres no jogo final. Já para os homens, a autoconfiança apresentou efeito inverso sobre a integração para o grupo (tarefa) e atração individual (social/tarefa) (p < 0,05). Concluiu-se que, em momentos decisivos, mulheres buscam na coesão uma fonte de controle dos efeitos fisiológicos da ansiedade e os homens utilizam a coesão para controlar a autoconfiança.
Palavras-chave: ansiedade; coesão; esporte; grupo; competição.
ABSTRACT
This study investigated the state-anxiety and team cohesion among 62 handball athletes. data collection was conducted with the Group Environment Questionnaire and Competitive State Anxiety Inventory-2. data analysis was conducted using the repeated measures of variance, t-test, Pearson correlation coefficient and simple regression. Results showed that while men's cohesion (task) increased during the competition, women's cohesion (social/task) decreased. The women's level of somatic anxiety reduced during the tournament. Somatic anxiety impacted significantly over women's integration for the group (social/task) and individual attraction (social) in the final game. For men, the self-confidence had an inverse effect over groups integration (task) and individual attraction (social/task) (p < 0,05). It was concluded that for women the increase of the anxiety physiological effects in decisive moments positively influences their perception of cohesion, and men use cohesion to control the self-confidence.
Keywords: anxiety; cohesion; sport; group; competition.
RESUMEN
Este estudio investigó la ansiedad-estado y la cohesión en 62 jugadores de balonmano. Fue utilizado el Cuestionario de Ambiente Grupal y el Inventario de Ansiedad-Estado Competitiva 2. El análisis de datos se realizó mediante Anova para medidas repetidas, t de Student, coeficiente de correlación de Pearson y de regresión simple. los resultados indican que la cohesión (tarea) de los hombres aumentó a lo largo de la competición, mientras que la cohesión (social/tarea) de las mujeres disminuyó. la ansiedad somática impactó significativamente la integración en el grupo (social/tarea) y la atracción individual (social) de las mujeres en el partido final. ya para los hombres, la autoconfianza presentó efecto inverso sobre la integración en el grupo (tarea) y atracción individual (social/tarea) (p < 0,05). Se concluye que, en momentos decisivos, las mujeres buscan en la cohesión una fuente de control de los efectos fisiológicos de la ansiedad y los hombres los hombres usan la cohesión para controlar la autoconfianza.
Palabras-clave: ansiedad; cohesión; esporte; grupo; competencia.
Na história do esporte mundial, diversas equipes se tornaram lendas e praticamente dinastias em suas modalidades graças aos inúmeros títulos conquistados. Treinadores e jogadores de equipes como Chicago Bulls (Basquetebol, década de 1990), New York Yankees (Beisebol, década de 1990-2000) e Manchester United (Futebol, década de 2000) normalmente creditam seu longo sucesso esportivo à intensa "química" existente entre os atletas (Burke, Davies, & Carron, 2014). Tal fato revela que o estudo da coesão de grupo é extremamente relevante para as ciências do esporte, tanto que tem sido considerado um dos fatores mais intervenientes para o sucesso esportivo (Carron, Eys, & Martin, 2012).
De acordo com o modelo conceitual de Carron, Widmeyer, & Brawley (1985), a coesão de grupo pode ser definida como um processo que envolve a propensão para uma equipe esportiva formar uma ligação na busca de satisfazer seus objetivos de desempenho ou as necessidades afetivas de seus membros. Nessa perspectiva, a coesão é considerada um processo dinâmico composto por aspectos sociais e da tarefa, além de uma distinção entre o indivíduo e o grupo (Carron & Brawley, 2012). A coesão social é definida pelo grau de afetividade existente entre os membros de uma equipe, ao pas-so que a coesão para a tarefa é determinada pelo nível de cooperação entre os membros da equipe a fim de alcançar um objetivo comum (Burke et al., 2014).
Nas últimas décadas, diversas pesquisas têm investigado a coesão de grupo e seus antecedentes ou desfechos (Carron, Eys, & Burke, 2007; Carron, Shapcott, & Martin, 2014). Recentes revisões sistemáticas sobre tais estudos (Carron & Brawley, 2012; Filho, Dobersek, Gershgoren, Becker, & Tenenbaum, 2014) têm proporcionado suporte de que os altos níveis de coesão de grupo podem agir como facilitadores do bem-estar e desempenho do atleta. Estas revisões também identificaram que inúmeros fatores podem afetar a coesão esportiva, tais como: motivação (Horn, Byrd, Martin, & Young, 2012), perfeccionismo (Vieira, Nascimento, & Vieira, 2013) e paixão (Paradis, Martin, & Carron, 2012). Dentre tais variáveis associadas com a coesão, está a ansiedade-estado pré-competitiva (Prapavessis & Carron, 1996; Eys, Hardy, Carron, & Beauchamp, 2003; Borrego, Cid, & Silva, 2012).
Um modelo conceitual que costuma ser aplicado à psicologia do esporte suporta que a ansiedade-estado é um processo psicológico multidimensional que pode ser compreendida como a tendência de o atleta perceber situações competitivas como ameaçadoras e respondê-las com sentimentos de apreensão e tensão (Martens, Burton, Vealey, Bump, & Smith, 1990). A ansiedade é um elemento que pode ser manifestado sob três formas: a ansiedade somática (por exemplo, aumento da frequência cardíaca), ansiedade cognitiva (por exemplo, as preocupações sobre a perda) e autoconfiança (por exemplo, a segurança sobre o próprio desempenho) (Martens et al., 1990). Estudos recentes têm apontado que a ansiedade-estado pode afetar significativamente o desempenho esportivo, particularmente em situações críticas e momentos de tomada de decisão (Nicholls, Polman, & Levy, 2010; Nieuwenhuys & Oudejans, 2012).
Como observado anteriormente, a relação entre a coesão e a ansiedade-estado começou a ser explorada por pesquisadores entre as décadas de 1990 e 2000 (Prapavessis & Carron, 1996; Eys et al., 2003), os quais verificaram que atletas com maiores níveis de coesão para tarefa apresentaram menores níveis de ansiedade. Borrego et al. (2012) observaram que o sexo pode ser uma variável interveniente na relação entre a ansiedade e a coesão, uma vez que atletas do sexo feminino reportam maior ansiedade cognitiva e menor autoconfiança em comparação aos homens.
Apesar de tais achados, percebe-se algumas lacunas nos resultados destas investigações. Primeiro, estes estudos levaram em consideração apenas a coesão para tarefa, desconsiderando o aspecto social, considerado um elemento interveniente (Carron et al., 1985). Segundo, os estudos encontrados utilizam uma abordagem transversal para verificar a relação entre as duas variáveis que, por se tratar de ansiedade-estado, pode sofrer influência direta do decorrer da competição.
Diante dessas considerações, o presente estudo teve como objetivo analisar o nível de coesão de grupo e ansiedade-estado de atletas de handebol ao longo da Fase Final dos Jogos Abertos do Paraná (JAP's) 2012, buscando especificamente comparar o nível de coesão de grupo e ansiedade-estado nos diferentes momentos (Jogos 1 ao 5), além de comparar o nível de coesão de grupo e ansiedade em função do sexo (masculino e feminino) em cada momento da competição e verificar o impacto da ansiedade-estado do atleta sobre a percepção de coesão de grupo. A hipótese testada é de que mulheres sentirão maior impacto da ansiedade sobre a coesão de grupo que os homens e que, ao decorrer do campeonato (jogos 1 a 5), a relação entre ansiedade e coesão sofrerá modificações em comparação aos jogos.
Método
Participantes
A população do estudo foi constituída por atletas de equipes adultas de Handebol do estado do Paraná. Foram convidadas a participar do estudo as duas melhores equipes de handebol do sexo masculino e feminino, considerando o ranking do estado do Paraná. Todas as equipes aceitaram participar da pesquisa, sendo a amostra constituída por 62 atletas (31 do sexo masculino e 31 do sexo feminino) com média de idade de 23,20 ± 5,41 anos, que consentiram voluntariamente em participar do estudo. O critério de seleção da amostra foi o nível de desempenho das equipes no ranking paranaense. As equipes foram avaliadas durante a participação na fase final dos Jogos Abertos do Paraná-2012, sendo cinco jogos para cada equipe (masculino e feminino), totalizando vinte jogos.
Instrumentos
Para verificar o nível de ansiedade-estado dos atletas foi utilizado a Competitive State Anxiety Inventory 2/CSAI-2 (Martens et al., 1990), adaptada e validada para o contexto esportivo brasileiro por Coelho, Vasconcelos-Raposo e Mahl (2010). O questionário é constituído por 27 itens que avaliam a ansiedade-estado dos atletas momentos antes da competição, sendo divididos em três dimensões: 1. ansiedade cognitiva; 2. ansiedade somática; e 3. autoconfiança. As respostas possuem uma escala do tipo "likert" de quatro pontos, que variam de "absolutamente não" (1) a "muitíssimo" (4). As pontuações mais altas significam valores mais elevados (ansiedade e confiança) em cada uma das dimensões. O alfa de Cronbach para as dimensões do CSAI-2 variou de α = 0,90 a α = 0,95, evidenciando forte consistência interna dos dados.
Para identificar o nível de coesão das equipes de handebol foi utilizado o Questionário de Ambiente de Grupo/GEQ (Carron et al., 1985), adaptado e validado para a língua portuguesa por Nascimento, Vieira, Rosado, & Serpa (2012). Tal questionário é constituído por 16 itens que avaliam a coesão de grupo em equipes esportivas e são distribuídos por quatro dimensões: 1. integração no Grupo-Tarefa; 2. integração no Grupo Social; 3. atração individual para o Grupo-Tarefa; e 4. atração individual para o Grupo Social. As respostas são dadas em uma escala do tipo "likert" de nove pontos, que variam de "discordo totalmente" (1) a "concordo totalmente" (9). As pontuações mais altas significam valores mais elevados de coesão de grupo em cada uma das dimensões. O alfa de Cronbach para as dimensões do GEQ variou de α = 0,95 a α = 0,97, evidenciando forte consistência interna dos dados.
Procedimentos
A pesquisa está integrada ao projeto institucional "Estudo dos aspectos psicológicos e comportamentais relacionados ao contexto esportivo" com aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (Parecer n. 339/2011). Inicialmente, os pesquisadores entraram em contato com a diretoria e a comissão técnica das equipes de handebol, com o intuito de esclarecer os objetivos e os procedimentos da pesquisa. Em seguida à autorização dos diretores e treinadores das equipes, foram marcadas datas para assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e para a coleta de dados. A aplicação foi realizada nos vestiários das equipes, uma hora antes de cada jogo, de forma coletiva. As equipes foram avaliadas em 5 momentos, desde o primeiro jogo da fase inicial até o jogo final da competição, destacando que as quatro equipes foram finalistas da competição.
Análise de dados
Para a análise dos dados, foi realizada a análise da distribuição dos dados com base no teste de Kolmogorov-Smirnov. Como os dados apresentaram distribuição normal, foram utilizados média (x) e desvio padrão (dp) para a caracterização dos resultados. Para comparar o nível de coesão e ansiedade dos atletas entre os cinco jogos da competição (5 momentos), foi utilizada a Anova de Medidas Repetidas, posteriormente à verificação da esfericidade dos dados, seguida do Post Hoc de Bonferroni. Para a comparação do nível de coesão e ansiedade dos atletas em função do sexo, foi utilizado o teste t de Student Independente. Para verificar a correlação entre as variáveis, foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson. A significância adotada foi de p < 0,05.
Para verificar o impacto da ansiedade-estado sobre a percepção de coesão de grupo dos atletas, foi conduzido um modelo de regressão com as variáveis que obtiveram correlação significativa e acima de 0,40 (moderada). A existência de outliers foi avaliada pela distância quadrada de Mahalanobis (D2) e a normalidade univariada das variáveis foi avaliada pelos coeficientes de assimetria (ISkI < 3) e curtose (IKuI < 10) uni e multivariada. Como a amostra do presente estudo foi teoricamente pequena, conduzimos a técnica de Bootstrap de Bollen-Stine para corrigir o valor dos coeficientes estimados pelo método da Máxima Verossimilhança (Marôco, 2010) implementado no software AMOS versão 18.0. Não se observaram valores de D2 indicadores da existência de outliers, nem correlações suficientemente fortes entre as variáveis exógenas que indicassem possíveis problemas com a multicolinearidade. Os Variance Inflation Factors (VIF) foram calculados e nenhuma variável apresentou VIF indicadores de multicolinearidade (> 5,0). A interpretação dos coeficientes de regressão teve como referência: pouco efeito para coeficientes < 0,20, médio efeito para coeficientes até 0,49 e grande efeito para coeficientes > 0,50 (Marôco, 2010).
Resultados
Ao comparar o nível de coesão de grupo entre os atletas do sexo masculino do Jogo 1 ao 5, verificou-se maiores escores na dimensão de Integração para o Grupo-Tarefa apenas antes do jogo final (Jogo 5) em comparação com o jogo 2 (p = 0,03; F = 1,13). Não foi encontrada diferença significativa no nível de ansiedade ao longo da fase final da competição (p > 0,05).
Entre as mulheres, notou-se que a Integração para o Grupo Social apresentou os maiores valores nos jogos 2 e 3, com redução no jogo final (p < 0,05; F = 2,45). Quanto à Atração Individual para o Grupo-Tarefa, observou-se menores escores no jogo final em relação ao jogo 1 e 3 (p < 0,05; F = 6,25). Na Atração Individual para o Grupo Social, também foram identificados menores valores no jogo final em relação ao segundo (p < 0,05; F = 6,25). Em relação à ansiedade, verificou-se que o nível de Ansiedade Somática apresentou redução do início da competição (Jogo 1) em comparação aos Jogos 2, 3 e 4 (p < 0,05; F = 4,47).
Ao comparar os atletas do sexo masculino e feminino antes da estreia na competição (Tabela 1), notou-se que as mulheres apresentaram maiores níveis de Ansiedade Cognitiva (p = 0,02), Ansiedade Somática (p = 0,01) e Autoconfiança (p = 0,01). Não houve diferença significativa entre os grupos nos níveis de coesão de grupo antes do primeiro jogo da competição (p > 0,05).
Na Tabela 2 observa-se que no jogo final as mulheres apresentaram maior Autoconfiança do que os homens (p = ,010). Quanto à coesão, nota-se que os atletas do sexo masculino evidenciaram maiores níveis de Integração no Grupo-Tarefa (p = 0,004), Atração Individual Grupo-Tarefa (p = 0,038) e Social (p = 0,010). Não houve diferença significativa no nível de coesão e ansiedade-estado antes dos Jogos 2, 3 e 4 (p > 0,05).
Ao analisar a correlação entre coesão e ansiedade ao longo da competição (Jogo 1 ao 5), notou-se a existência de correlação significativa (p < 0,05) apenas no jogo final da competição (Jogo 5). Entre as mulheres, foi encontrada correlação moderada da Ansiedade Somática com a Integração Grupo-Tarefa (r = 0,44), a Integração Grupo Social (r = 0,42) e a Atração Individual Grupo Social (r = 0,45). Entre os homens, notouse correlação da Autoconfiança com a Integração no Grupo para Tarefa (r = -0,63), a Atração Individual no Grupo para Tarefa (r = -0,46) e a Atração Individual no Grupo para o Social (r = -0,57). Para verificar o impacto da ansiedade-estado dos atletas sobre a percepção de coesão de grupo, depois da análise da correlação (significativa apenas no Jogo 5), foi conduzido um modelo de regressão simples entre as dimensões que apresentaram correlação moderada (r > 0,40).
Em relação aos atletas do sexo feminino (Figura 1), verificou-se que a Ansiedade Somática apresentou impacto significativo (p < 0,05) na variabilidade da Integração para o Grupo-Tarefa (20%), da Integração para o Grupo Social (17%) e da Atração Individual para o Grupo Social (20%). Já para os homens (Figura 1), a Autoconfiança teve um efeito inverso (negativo) sobre a percepção da Integração para o Grupo-Tarefa (36%), Atração Individual para o Grupo-Tarefa (15%) e Atração Individual para o Grupo Social (28%).
Quanto às trajetórias individuais do modelo de regressão para os atletas do sexo feminino (Tabela 3), verificou-se que o aumento da Ansiedade Somática possui um efeito moderado (β > 0,20) sobre a Integração para o Grupo-Tarefa (0,44), a Integração para o Grupo Social (0,42) e a Atração Individual para o Grupo Social (0,45). Tal achado aponta que a cada aumento de um desvio padrão na unidade de Ansiedade Somática, as dimensões de coesão aumentam em 0,44, 0,42 e 0,45 desvio padrão, respectivamente.
Já para os atletas do sexo masculino (Tabela 3), verificou-se que o aumento da Autoconfiança possui um efeito forte (β > 0,50) e inverso sobre a Integração para o Grupo-Tarefa (-0,60), a Atração Individual para o Grupo-Tarefa (-0,39) e a Atração Individual para o Grupo Social (-0,53). Tal achado aponta que a cada aumento de um desvio padrão na unidade da Autoconfiança, a percepção dos atletas sobre tais dimensões de coesão de grupo diminui em 0,60, 0,39 e 0,53 desvio padrão, respectivamente.
Discussão
Os resultados do presente estudo são de fundamental importância por poder proporcionar novos parâmetros sobre os fatores individuais intervenientes na percepção de coesão de atletas de handebol e suas relações com a ansiedade-estados ao longo de uma competição. Ao analisar estas relações entre homens e mulheres, verificou-se que as mulheres necessitam da ansiedade somática para obter melhor coesão entre a equipe, enquanto os homens utilizam a coesão como fator de controle da autoconfiança. Deste modo, ao contrário das investigações anteriores sobre coesão e ansiedade (Prapavessis & Carron, 1996; Eys et al., 2003; Borrego et al., 2012) que analisaram o impacto da coesão no nível de ansiedade-estado de atletas, esta pesquisa analisou como a ansiedade-estado afeta a percepção de coesão de grupo de jogadores de handebol ao longo de uma competição.
Nossos achados (Figura 1) apontaram que quanto mais as mulheres sentem os efeitos fisiológicos da ansiedade (ansiedade somática), mais estas se unem na busca dos objetivos da equipe, além de favorecer as interações sociais dentro do grupo. Esses resultados sugerem que a percepção de ansiedade com sintomas como aumento da frequência cardíaca ou sudorese pode favorecer a coesão social e para a tarefa das mulheres.
Em relação aos atletas do sexo masculino, notou-se que, quanto mais se sentem autoconfiantes antes de jogos importantes, menor é a percepção de coesão social e para tarefa destes jogadores, indicando que a autoconfiança pode influenciar negativamente a união em busca das metas e as relações interpessoais. Dessa forma, percebe-se que a coesão pode ser uma variável de proteção para o efeito adverso da emoção em momentos de grande pressão nos esportes coletivos, nesse caso, o handebol.
Cabe ressaltar que tanto para homens (baixa autoconfiança) quanto para mulheres (alta ansiedade somática), quanto mais sentem os efeitos negativos da ansiedade, mais se unem tanto socialmente como para tarefa. Esses resultados podem ser considerados inéditos e vão de encontro com os resultados de Borrego et al. (2012), que verificaram positiva relação entre a coesão para tarefa e a autoconfiança dos homens. Além disso, não foi encontrada relação entre a ansiedade somática e cognitiva e a coesão, o que pode ser considerado um novo achado visto que pesquisas anteriores demonstravam tal associação (Prapavessis & Carron, 1996; Eys et al., 2003).
Especificamente com atletas do sexo feminino, a única pesquisa que analisou essa relação não encontrou associação entre a ansiedade-estado e a coesão de grupo (Borrego et al., 2012). Um fator que pode explicar essa discrepância com a literatura é que, ao analisar a evolução de uma equipe em uma competição, a coesão aparece, neste caso, como um elemento de suporte para o desequilíbrio emocional manifesto pela ansiedade-estado.
Tais distinções entre homens e mulheres quanto à influência da ansiedade-estado na coesão também pode ser por causa da maneira como cada grupo interpreta os sintomas da ansiedade, visto que tais sintomas podem agir como facilitadores ou debilitadores de coesão de grupo (Eys et al., 2003). Dessa forma, é possível inferir que enquanto as mulheres interpretam o aumento dos sintomas da ansiedade somática como facilitadores da coesão de grupo, os homens utilizam o aumento da autoconfiança como um debilitador da coesão. Todavia, esta inferência deve ser interpretada com cautela, visto que tanto a ansiedade como a coesão estão associadas com outras variáveis psicológicas, indicando que a influência de uma variável sobre a outra depende de outros fatores, como dificuldade da tarefa, coping, motivação, satisfação (Borrego et al., 2012), ou, ao que parece, no nosso caso, com o desempenho na competição.
Percebeu-se que as mulheres demonstraram maiores níveis de ansiedade cognitiva e somática antes do primeiro jogo, indicando que as mulheres vivenciam de forma mais intensa os sintomas fisiológicos e mentais da ansiedade às vésperas do início de uma competição (Interdonato, Miarka, & Franchini, 2013). Estes resultados vão ao encontro de outros estudos, que apontam que mulheres apresentam maior ansiedade cognitiva e/ou somática pré-competitiva do que homens (Nicholls, Polman, & Levy, 2010; Borrego et al., 2012).
Tal achado pode ocorrer em razão das diferentes percepções das demandas da competição, o que leva a interpretações das situações de pressão de distintas maneiras por homens e mulheres (Borrego et al., 2012). No decorrer da competição (Jogos 2, 3, 4 e 5), a ansiedade cognitiva e a somática se mantiveram semelhantes em ambos os sexos (tabelas 1 e 2). Contudo, as mulheres demonstraram maiores níveis de autoconfiança antes dos Jogos 1 e 5 em relação aos homens, resultado que vai contra o que tem sido apontado por outras investigações que reportaram maior autoconfiança em homens (Martens et al., 1990; Borrego et al., 2012). Esse resultado merece destaque porque indica que a autoconfiança parece funcionar como uma estratégia de coping para o enfrentamento do estresse diante do primeiro jogo do torneio e o último (final) para as mulheres. Outra explicação para essa discrepância é o nível competitivo da modalidade, que tem equipes masculinas com mais similaridades de rendimento, potencialmente afetando mais a autoconfiança dos homens. As mulheres, por sua vez, têm uma equipe que se destaca das demais do estado.
No último jogo (5) da competição, observou-se que os homens apresentaram maior percepção de coesão tanto social quanto para tarefa (Tabela 2), indicando que, apesar das mulheres se sentirem mais autoconfiantes neste momento da competição, os atletas do sexo masculino se percebem mais unidos para vencer e com melhores relações interpessoais. Este achado confirma os resultados anteriores deste estudo e de outras pesquisas, que apontam a relação entre coesão, ansiedade e sexo como inconclusiva e com necessidade de futuras investigações (Borrego et al., 2012; Halbrook, Blom, Hurley, Bell, & Holden, 2012). O avanço deste estudo está em mostrar que um dos potenciais mediadores ou moderadores dessa relação é o desempenho ao longo da competição, que parece impor à coesão um papel importante no controle emocional em atletas de rendimento.
Por um lado, observou-se que o nível de Integração para o Grupo-Tarefa aumentou nos homens do início para o final da competição, evidenciando que o resultado dos jogos no decorrer de uma competição pode ter impacto na coesão (Carron & Brawley, 2012). As mulheres, por sua vez, apresentaram uma redução na coesão social e para tarefa, indicando que o bom desempenho não auxiliou positivamente a melhora da coesão. Tal resultado encontra suporte nos achados de Leeson e Fletcher (2005) e de Eys et al. (2015), que notaram redução na percepção de coesão de grupo de atletas de sexo feminino ao longo da temporada e enfatizam que as mulheres têm maiores dificuldades em gerenciar relacionamentos interpessoais em períodos prolongados de tempo, apontando a necessidade de um trabalho desde o início da temporada para garantir a coesão do grupo. Contudo, de forma interessante, a necessidade de suporte emocional parece ser um fator importante para a manutenção da coesão, mesmo em equipes femininas, visto pelos resultados da relação entre coesão e ansiedade (Tabela 3).
Embora os resultados deste estudo forneçam importantes parâmetros sobre as relações entre a ansiedade e a coesão, algumas limitações devem ser levadas em consideração. Considerando que o nível de ansiedade depois da competição não está associado com o desempenho esportivo, esta pesquisa teve enfoque nos níveis de ansiedade pré-competitiva. Além disso, a heterogeneidade da natureza da amostra (atletas do sexo masculino e feminino) e o número limitado de atletas analisados indicam que precauções devem ser tomadas antes de se generalizar os resultados para todo o contexto esportivo. Outra limitação refere-se ao tempo de duração da competição na qual as equipes disputaram. Os atletas foram avaliados em cinco momentos, entretanto, esta é uma competição de curta duração (duas semanas), o que não possibilita ver a evolução temporal da relação entre ansiedade, coesão e desempenho. Assim, futuras pesquisas devem examinar as relações entre estas variáveis em atletas de outras modalidades esportivas e diferentes níveis competitivos, além de aumentar o tamanho da amostra e analisar a evolução destas relações ao longo da temporada das equipes.
Concluiu-se que, em momentos competitivos decisivos, mulheres buscam na coesão de grupo uma fonte de controle do aumento dos efeitos fisiológicos da ansiedade. De forma semelhante, os homens também parecem buscar na coesão de grupo uma forma de lidar com diminuição da autoconfiança. Tais achados evidenciam que a coesão de grupo pode ser considerada como uma variável de proteção para o efeito adverso da emoção em momentos de grande pressão no handebol, visto que quanto mais homens (baixa autoconfiança) e mulheres (alta ansiedade somática) sentem os efeitos negativos da ansiedade, mais se unem tanto socialmente como para tarefa. Como implicações práticas dos achados do presente estudo, pode-se destacar que treinadores e psicólogos do esporte podem utilizar os achados reportados para desenvolver estratégias a fim de trabalhar com atletas que experienciam altos níveis de ansiedade pré-competiviva com o objetivo de manter o foco e a coesão de grupo como uma variável de controle da ansiedade.
Referências
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Endereço para correspondência:
José Roberto Andrade do Nascimento Junior
Universidade Federal do Vale de São Francisco
Avenida Manoel do Arroz, 175, bloco 15 ap. 104, Vila Mocó
Petrolina - PE - Brasil. CEP: 56306-385
E-mail: jroberto.jrs01@gmail.com
Submissão: 4.11.2014
Aceitação: 15.3.2016