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Junguiana

versão On-line ISSN 2595-1297

Junguiana vol.40 no.1 São Paulo jan./jun. 2022

 

Complexo cultural na metrópole nos tempos da COVID-19

 

Complejo cultural de la metrópolis en tiempos de COVID-19

 

 

Cyntia Helena Ravena Pinheiro

Psicóloga na abordagem junguiana graduada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, especialista em clínica junguiana pela Universidade Paulista (UNIP). Mestre e Doutora em Ciências pela Universidade de São Paulo (USP). Analista Trainee pela SBPA. Atua em consultório particular em São Paulo, SP. e-mail: cypinheiro.psi@gmail.com

 

 


RESUMO

A reflexão a que se propõe este artigo surge da necessidade de compreender as razões que levam a metrópole paulistana a sucumbir diante das adversidades da pandemia. A autora estabelece uma tessitura que entrelaça mapas georreferenciados da COVID-19, da urbanidade da cidade, comportamentos, sentimentos, memórias e as raízes ancestrais paulistana e brasileira, que oferecem matéria-prima para a identificação dos complexos culturais envolvidos nesse drama atual.

Palavras-chave: COVID-19, complexo cultural, São Paulo, psicologia analítica.


RESUMEN

La reflexión propuesta en este artículo surge de la necesidad de comprender las razones que llevan a la metrópoli de São Paulo a sucumbir a las adversidades de la pandemia. El autor establece un tejido que entrelaza mapas georreferenciados de la COVID-19, la urbanidad de la ciudad, los comportamientos, los sentimientos, las memorias y las raíces ancestrales de São Paulo y Brasil, que ofrecen la materia prima para la identificación de los complejos culturales involucrados en este teatro actual.

Palabras clave: COVID-19, complejo cultural, São Paulo, psicología analítica


 

 

Introdução

A pandemia anunciada desde o final da década de 1990, depois da gripe aviária de 1997, materializou-se em 2020 com a COVID-19. Snacken et al. (1999) alertaram para a constante iminência de pandemia pelas variantes dos vírus da influenza, para a necessidade do desenvolvimento de estratégias de intervenção adequada a cada país e principalmente para o fato de que a próxima pandemia encontraria a maior parte do mundo despreparada. Há mais de 15 anos, Ujvari (2004) chamou atenção para um vírus que vinha causando infecções respiratórias ao homem: o coronavírus (SARS-CoV), mas não foi ouvido, e o surgimento do SARS-CoV2 realizou-se, como previsto (Carmo et al., 2020).

Então, a nossa relação com o ambiente urbano foi desafiada pelo novo coronavírus. A permanente apreensão a que estivemos submetidos em decorrência do risco de contaminação, do desconhecimento da ciência quanto ao comportamento do vírus e das controversas discussões quanto às alternativas para o tratamento das pessoas que apresentam os sintomas causados pelo SARS-CoV-2 trouxeram sérias consequências à saúde mental daqueles que conviveram com sua iminência ou suas consequências.

Assombrada por essa situação, recorri à leitura de "Pandemias: a humanidade em risco", de Stefan Ujvari (2011), buscando o entendimento das variáveis que influenciam nosso comportamento frente aos desafios atuais, frente a pandemia, dialogando com o complexo cultural e as perspectivas junguianas contemporâneas sobre a psique e a sociedade de Thomas Singer e Samuel Kimbles (2004) e colaboradores. Obras de Jung constituem os alicerces fundantes das reflexões a que se propõe o presente artigo.

 

Desafios da modernidade e o coronavírus

Em "O problema psíquico do homem moderno", Jung (2013) apresenta sua conferência no Congresso da Liga de Colaboração Intelectual, realizada em Praga, em outubro de 1928, na qual aponta para o desafio que enfrentamos em viver no presente, pois isso exige a consciência de nossa existência como ser humano nesse exato momento. Ao mesmo tempo, há a dor da consciência do passado, da herança inerente à história humana que nos constitui psiquicamente. Jung traz a reflexão que se pode fazer a respeito do paradoxo que há entre as benesses oferecidas pelos avanços científico, tecnológico e técnico e os seus efeitos catastróficos. Assim, com a consciência moderna, a psique humana vive em profunda insegurança, abalada a fé em nós mesmos como civilização. Nessa perspectiva, a atual pandemia nos confronta no que tange às nossas raízes históricas, à nossa psique individual e coletiva. Jung enfatiza que algo de nossa psique não é individual, mas povo, coletividade, humanidade.

Nesse texto, Jung alerta para a importância de nos atentarmos para a possibilidade de incorrermos em distorções e falsas conclusões quando partimos da perspectiva da psicologia pessoal na descrição de uma ideia ou problema cultural, que podem gerar sérias consequências, e é esse o desafio das elaborações propostas nesse artigo. Convida à reflexão quanto à situação crítica do ocidente e aos perigos da arrogância frente às outras culturas, como a africana e as das populações indígenas.

Partir da premissa junguiana de que o mal provém em grande medida da própria inconsciência do homem é ao mesmo tempo assustador e reconfortante, pois o inimigo em nós pode parecer mais acessível para ser combatido. A concepção junguiana da dinâmica do inconsciente é ampliada, reconhecendo que todos fazemos parte de uma única psique: anima mundi. A intrínseca relação entre o mais exterior e o mais íntimo, entre a anima mundi e o si-mesmo, foi mencionada por Jung já em 1912, em Símbolos da Transformação (1986, p. 343, §550). Assim, a anima mundi está simultaneamente no mais íntimo do homem e ao mesmo tempo envolve o mundo (JUNG, 2014a, p. 314, §554).

Já em 1928, no período entre as duas guerras mundiais, Jung (2013) traça o paralelo entre o abalo do mundo e o abalo de nossa consciência. Vai tecendo a trama que conecta a realidade dentro e fora, o consciente e o inconsciente, ocidente e oriente, ciência, racionalismo e espiritualidade, corpo e espírito, visando valorizar a experiência da totalidade, a coniunctio dessas polaridades.

No momento atual, a reflexão cabe quanto aos problemas psíquicos do homem frente à pandemia do SARS-CoV-2, inspirados nas de Jung diante do abalo psíquico do homem moderno, decorrente da constatação da sua fragilidade e da sombra que se manifestava na sua capacidade de destruição, denunciada pelas atrocidades das grandes guerras mundiais. Sugere que, reconhecendo que não há respostas no presente, elas se encontram no "abismo do futuro". Entretanto, as ações no presente podem predispor esse futuro. Luigi Zoja (2000), em "História da Arrogância", nos confronta e instiga a uma resposta para esse abismo do futuro.

Recorro a alguns "ingredientes" para essa elaboração no fogo de purificação aceso pela pandemia, essa marca civilizatória na cidade de São Paulo: que complexos culturais estariam atuando na metrópole e como estariam relacionados aos números da COVID-19? Afinal, o que nos torna assim tão vulneráveis a esse vírus, apesar dos avanços da ciência e da tecnologia e estarmos na maior cidade brasileira?

 

Na perspectiva do complexo cultural

Boechat (2018) refere-se às condicionantes que levaram aos estudos cada vez mais aprofundados das interações entre indivíduo e a cultura, a partir da Revolução Industrial. Considera que Jung foi um dos pensadores que, no século XX, se debruçaram sobre as questões sociais e que coube aos pós-junguianos a continuidade dos estudos e a compreensão dessas relações do indivíduo com a cultura. Surge a perspectiva do inconsciente cultural e dos complexos culturais.

A escolha da perspectiva do complexo cultural como referencial teórico visou explorar crenças e emoções mais profundas, em contextos e representações grupais e individuais, em imagens, emoções, padrões e práticas. O complexo cultural diz respeito aos conflitos que são observados em uma nação ou coletividade. Se origina no início da organização de uma cultura e se desenvolve no decorrer da sua história. Por meio da atividade desses complexos pertencentes a um contexto cultural como um todo, o indivíduo tem um sentimento de pertencimento a um grupo específico, com uma identidade específica (KIMBLES, 2004).

A noção de complexo cultural foi primeiramente proposta por Joseph Henderson em uma carta a Jung em dezembro de 1947. Embora não tenha desenvolvido mais esse conceito, ele contribuiu para os fundamentos e a descrição de inconsciente cultural, a partir da proposta de Jung para o inconsciente coletivo. Henderson conceituou que essa instância inconsciente estaria mais próxima da consciência do ego que o inconsciente coletivo (SINGER; KAPLINSKY, 2019). Esses autores consideram que a noção de complexo cultural pressupõe a singularidade das diferentes culturas e seus complexos específicos. Da mesma maneira que os complexos atuam no âmbito pessoal, individual, os culturais podem possuir o grupo e fazê-lo pensar e agir de modo não racional, não politicamente correto, ainda que esse último possa ser, ele mesmo, um complexo cultural.

Os complexos culturais se misturam aos pessoais. Eles se afetam mutuamente, expressam comportamentos repetitivos e alta carga emocional e afetiva, são resistentes à consciência e criam núcleos de memórias ancestrais. Ambos apresentam funcionamento autônomo e correlação com núcleos arquetípicos. Os complexos culturais têm comportamento bipolar: uma parte se identifica com o complexo cultural inconsciente e a outra é projetada no grupo ou um de seus integrantes, adotando linguagens somáticas, gestos e posturas corporais compartilhadas pelo grupo. A identidade cultural pode ser contaminada por aspectos positivos, mas também pelos negativos dos complexos culturais. Assim como os complexos afetivos, os complexos culturais podem irradiar, terem influência sobre outros com os quais tenham afinidade, gerando efeitos muitas vezes destrutivos para a cultura. Indivíduos cujos complexos pessoais têm afinidade com os culturais existentes na sociedade da qual pertencem, sofrem as tensões da sinergia entre essas instâncias psíquicas.

Singer (2018) considera como critério de identificação de um complexo cultural investigar uma série de questões a respeito dos vários tipos de atividades mentais que são recrutadas quando um complexo cultural é disparado. Com base nesses preceitos de Singer, busquei identificar as imagens, as memórias, os comportamentos, sentimentos e pensamentos observados no contexto paulistano que possibilitam inferir quais complexos culturais que aí estariam presentes.

 

Imagens: São Paulo, cidade mosaico, arlequim

São Paulo se constituiu historicamente pela multiplicidade de contribuições culturais, resultante da presença de imigrantes de variadas procedências, europeia, asiática, africana, latina. Barcellos (2010) discorre a respeito das contradições, dificuldades e potencialidade desse mosaico cultural, de pessoas, de sonhos e de construções, que caracterizam a cidade paulistana, a qual denominou "Cidade arlequim". A alusão à figura do arlequim da comédia italiana, com sua vestimenta multicolorida, um trickster, está presente na obra do poeta, novelista e ensaísta modernista de São Paulo Mário de Andrade, em "Pauliceia desvairada", nos idos 1922. Barcellos enfatiza que a cidade é, ao mesmo tempo o lugar e a imagem da alma e que anima e polis podem ser percebidas primeiro pelas experiências do coração. Expõe as experiências contraditórias, paradoxais vividas na relação de amor e ódio com nossa cidade. Ela é ao mesmo tempo mãe e amante, ilude e entrega, enobrece e diminui quem a procura.

Inspirada por essa metáfora do autor, reconheço a forte experiência emocional de me debruçar sobre os mosaicos que serão apresentados nos mapas que seguem, em busca de respostas para as perguntas da presente pesquisa. Tanto quanto Mário de Andrade e Gustavo Barcellos, tenho uma relação afetiva com a minha cidade e busco entender as dinâmicas das relações das pessoas com a cidade e as questões ambientais urbanas (PINHEIRO, 2018). Os mapas expressam alguns dados relevantes da cidade e da COVID-19 nesse contexto, como disparadores para as reflexões a respeito dos mecanismos psíquicos subjacentes ao comportamento dos cidadãos nessa metrópole.

A cidade de São Paulo é a maior do Brasil, a quarta mais populosa do mundo e considerada uma das suas 33 megacidades, segundo relatório da Organização das Nações Unidas - ONU (2018). Sua população tem cerca de 12 milhões de habitantes, que coabitam uma cidade desigual, segundo o Índice Paulista de Responsabilidade Social de 2018, (ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2018), pois é uma cidade com níveis elevados de riqueza mal distribuída, associados aos indicadores sociais insatisfatórios (longevidade e/ou escolaridade baixos) (SEADE, 2021). Outros dados do município podem ser analisados a partir das imagens escolhidas para nossa reflexão.

O primeiro mapa, Figura 1, oferece a imagem do índice de urbanidade e justiça espacial na cidade de São Paulo (CANOVA, 2020), a partir do qual podemos estabelecer correlações com os dados referentes à população mais afetada pela COVID-19. Canova ressalta o paralelo que há entre a desigualdade, a menor incidência de serviços públicos e a consequente maior prevalência de doenças, associadas também aos fatores ambientais. Seu trabalho revela a importância da cartografia como instrumento de exploração das determinantes geográficas da saúde e a territorialização dos eventos causadores e difusores de doenças. A análise de dados gerados por sistemas de informação georreferenciadas, como a que observamos na Figura 2, oferece subsídios também para o planejamento de ações que visam o enfrentamento da atual pandemia.

 

 

 

 

A urbanidade revela a realização do caráter interacional da cidade. Quanto maior a urbanidade, maior integração dos grupos sociais, também de acesso aos recursos urbanos, tornando a cidade mais produtiva e criativa no conjunto da vida social. Assim, quanto menor, mais compacta, densa e diversa for a cidade, mais se coadunam com a urbanidade. Canova (2020) utiliza critérios que englobam também a análise de indicadores apontados em relatórios do Programa das Nações Unidas para os assentamentos urbanos (ONU-Habitat), para o trato dos problemas das cidades. O mapa da Figura 1, resultante da análise matricial de indicadores ponderados, contempla questões fundamentais da urbanidade e da justiça espacial, nas escalas municipal, regional e local. Revela que a pior situação se encontra nas áreas mais periféricas da cidade, enquanto a melhor se observa na região mais central. Canova (2020) enfatiza que, assim como a maioria das grandes cidades mundiais, o planejamento urbano de São Paulo surgiu a posteriori da ocupação intensa e crescimento variado e desordenado, sem um programa urbanístico prévio. Menciona o quanto foi e ainda é incompatível a adoção de modelos importados e atrelados muito mais ao modelo econômico de produção.

As áreas com pior situação de urbanidade e justiça espacial coincidem em grande parte com aquelas com maior número de negros e pardos, como exibem os mapas das Figuras 1 e 2. As raízes históricas de políticas higienistas, de exclusão social e racismo estrutural justificam o fato da maioria da população negra ou parda ocuparem as "franjas da cidade". Goes et al. (2020) evidenciam a correlação existente entre as desigualdades raciais e a pandemia da COVID-19 no Brasil e citam o mesmo quadro nos Estados Unidos da América.

A geografia da COVID-19 na cidade de São Paulo também foi objeto de investigação de pesquisadores do LabCidade da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP (MARINO et al., 2021) e do Observatório das Metrópoles (PASTERNAK et al., 2020). Eles verificaram, já nos primeiros meses da pandemia, o movimento do vírus rumo às áreas mais periféricas da cidade de São Paulo, precárias em infraestrutura, equipamentos urbanos e moradia, especialmente favelas e cortiços, o que favoreceu o agravamento da situação de contágio, hospitalização e óbitos em maior número nessas regiões.

Pode-se inferir, sobrepondo-se os mapas das Figuras 1 e 3, a correlação entre os mais baixos índices de urbanidade e justiça espacial, a ausência de infraestrutura urbana, e os números mais expressivos de óbitos por 10 mil habitantes causados pela COVID-19 entre março de 2020 e março de 2021. Revelam as disparidades com as quais coabitam os cidadãos paulistanos, a vulnerabilidade social, a ineficiência das políticas públicas ao longo da história, tanto quanto às de enfrentamento do momento de pandemia à qual essa população está submetida.

 

 

Observa-se no mapa da Figura 4 a forte correlação entre a distribuição das origens de viagem de transporte público na cidade de São Paulo e as áreas da cidade com maior de hospitalizações por síndrome respiratória aguda grave (SRAG) no início da pandemia, maio de 2020, principalmente a periferia da cidade, das quais provinham os trabalhadores de serviços essenciais de saúde e abastecimento, empregadas domésticas, usuários de transporte público que garantiram o atendimento à população.

Segundo aponta o Instituto Polis (2021) e o Labcidade da FAUUSP (MARINO et al, 2021), o processo de imunização reforçou as desigualdades. Chega-se a essa constatação correlacionando os mapas das Figuras 1, 3, 4, 5 e 6. Verifica-se que a imunização com duas doses até 17 de maio de 2021 não priorizou áreas mais vulneráveis, considerando que os menores percentuais de cobertura da vacinação ocorreram naquelas com maior número de óbitos por COVID-19 entre março de 2020 e março de 2021, menor idade ao morrer, segundo dados anteriores a esse período, e menor infraestrutura urbana.

 

 

Os mapas apontavam essa realidade e possibilitavam a adoção de medidas, mas prevaleceu o critério baseado nos dados epidemiológicos internacionais existentes, que indicavam a maior prevalência de óbitos entre os mais idosos e portadores de comorbidades, e no limitado número de doses disponíveis da vacina. A naturalização dessa condição de vulnerabilidade e a falta de agilidade e eficiência do poder público favoreceram o agravamento da situação com a disseminação da doença.

A análise dos dados expressados por essas imagens, por esses mapas mosaicos, associada à compreensão dos aspectos históricos e culturais da cidade, pode auxiliar na identificação dos complexos culturais que atuam na psique coletiva e individual dos cidadãos paulistanos.

 

Complexos culturais: memória e identidade

Os complexos culturais emergem à consciência, provenientes do inconsciente cultural, interagindo continuamente com as instâncias do inconsciente pessoal e coletivo. Singer e Kaplinsky (2019, p. 58) citam a definição de inconsciente cultural de Henderson (1990) como uma área da memória histórica, que fica entre o inconsciente coletivo e o padrão manifesto da cultura. Pode-se atribuir a ele então uma característica ao mesmo tempo consciente e inconsciente, incluindo-se também o inconsciente coletivo.

Está relacionado à memória cultural, um processo vivo, dinâmico. Importante lembrar que o processo de enraizamento, de construção da identidade de uma comunidade está vinculado tanto à memória individual quanto à coletiva na cultura. Tanto quanto os complexos pessoais, os culturais tendem a ser repetitivos, autônomos, resistentes à consciência e identificam as experiências que reafirmam sua visão de mundo construída historicamente.

Dias e Gambini (1999) consideram importante inserir nossa história no contexto de uma psique global. Analisando a topografia psíquica do europeu do século XVI, reconhece-se que o Novo Mundo representava uma válvula de escape psíquica para a sombra da Europa: "a pressão da sombra é que criou o hemisfério sul" cheio de pecado. Abaixo da linha do Equador estava permitida a impulsividade incompatível com o mundo católico europeu, que se via superior aos outros povos. As projeções psicológicas que recaíram sobre os povos indígenas se referiam às representações do inconsciente europeu. Geravam encantamento, mas não poderiam ser aceitas, eram proibidas, pecaminosas sob a perspectiva judaico-cristã dos colonizadores, razão pela qual foram automaticamente projetadas no outro. Ou seja, "já nascemos como bodes expiatórios de uma história que não é nossa, nascemos para compensar o outro" (DIAS; GAMBINI, 1999, p. 55). Somos uma nação com ego atrofiado, sem compaixão, na qual são toleradas as desigualdades sociais. Os autores enfatizam que a saída está em nos conscientizarmos, assumirmos a nossa sombra, caso contrário, continuaremos a projetá-la nos povos indígenas, no negro e na mulher.

O protobrasileiro nasceu, então, do colonizador e de uma mãe reduzida apenas à sua função biológica e ao trabalho servil, psiquicamente impedida de integrar o filho na sua ancestralidade. Restringida a um ventre, braços e colo, sem protagonismo, a mãe nativa brasileira foi impedida de transmitir ao filho mestiço a mitologia, a religião, a consciência, o imaginário, a atitude diante da vida, o que pode explicar o sentimento de não pertencimento, de não identidade. A civilização europeia vivia a Inquisição naquele momento histórico das descobertas e reprimia o princípio do feminino, do qual as mulheres indígenas e a natureza eram representações vivas. A criança nascida dessa mulher com o conquistador branco não tinha lugar na sociedade, era um pária. Em decorrência desse processo histórico, há a ausência da polaridade necessária ao processo de integração psíquica no brasileiro, uma imaturidade do ego pela atrofia do lado feminino, a anima. O feminino brasileiro é empobrecido, reduzido ao objeto do desejo ou, mais recentemente reproduz o modelo masculino, patriarcal, para ser no mundo. Os autores enfatizam que somente o princípio do feminino, das mulheres e dos homens, poderia restaurar a alquimia abortada, o processo de transformação, a coniunctio que ficou por se realizar. Falta emergir no Brasil o arquétipo da Grande Mãe, que zela por seus filhos, os alimenta e tem compaixão pelo seu sofrimento. A desigualdade social no país mantém esse quadro de exclusão (DIAS; GAMBINI, 1999).

Não somente os povos indígenas foram depositários da sombra da cultura branca do colonizador. Sucederam a eles grande contingente de homens e mulheres trazidos nos porões dos navios negreiros, vendidos como escravos nos tempos do Brasil colônia. Fuentes (2014) apresenta, a partir do olhar da psicologia analítica, a perspectiva da alma brasileira africana, que busca ser integrada, reconhecida. Expõe o silenciamento, a marginalização, a pobreza, a invisibilidade, o preconceito racial a que foi submetido o contingente de povos africanos no Brasil. A violência da exclusão a qual a autora se refere, expõe os afrodescendentes à inacessibilidade aos direitos de cidadãos e à impossibilidade de constituir sua identidade e realizar-se como pessoa. Ramos (2011) expõe o complexo cultural e a elaboração do trauma da escravidão no Brasil. Compara a relação com a ancestralidade de graduandos residentes nas cidades de Salvador e São Paulo. A pesquisa revela que os primeiros desconhecem suas raízes ancestrais, enquanto os segundos, de descendência predominantemente europeia, têm conhecimento da origem ancestral familiar. Os afrodescendentes residentes em São Paulo mencionam o quanto a cor da pele é fator determinante para o sentimento de inferioridade e discriminação.

Dias e Gambini (1999) asseveram que há um mecanismo perverso de impedir que os "pedaços" da alma brasileira se integrem ao todo. Ainda há um mandato de exclusão, um débito psíquico brasileiro. O reconhecimento da culpa da sociedade branca para com as sociedades indígena e negra, é imprescindível, a fim de que possamos nos conscientizar de nossa identidade.

Entende-se então, a partir do que já foi exposto, que o complexo cultural do excluído está presente em nós brasileiros, que, alijados das raízes ancestrais, vagamos a esmo, buscando a África ou a Europa como berço, não o Brasil. Jung (2014b), em seus seminários de 1925, fez menção a esse complexo, ao se referir aos ingleses que, tendo vivido por um período na África, nem bem poderiam ser considerados como iguais pelos africanos, tampouco pelos compatriotas ingleses, pois que haviam sido influenciados pelos primeiros, quer pela linguagem, pelo estilo ou hábitos. Da mesma maneira, somos então, literalmente, uma sociedade de excluídos e talvez aí resida a razão pela qual naturalizamos a exclusão em nossa sociedade.

A leitura de "Tristes Trópicos", de Lévi-Strauss (2016), publicado em 1955, inspira pela contribuição etnográfica, a nos confrontar com nossa sombra paulistana:

Uma sensação de irrealidade, como se tudo aquilo não fosse uma cidade, mas um simulacro de construções edificadas às pressas para atender a uma filmagem cinematográfica ou a uma representação teatral. [...]. São Paulo tinha tanto orgulho quanto Chicago de seu Loop: zona de comércio formada pela intersecção das ruas Direita, São Bento e 15 de Novembro, vias atulhadas de letreiros onde se comprimia uma multidão de comerciantes e de funcionários que, com seus trajes escuros, proclamavam sua fidelidade aos valores europeus ou norte-americanos [...] (p.104-105).

Suas palavras remetem à formação da identidade do brasileiro e da memória nacional baseadas na valorização do estrangeiro, esse olhar sempre voltado para fora, para as influências advindas dos países assim chamados "mais civilizados". Boechat (2018) assevera a urgência de mergulho nas raízes, nos valores tradicionais da brasilidade, para que possamos encontrar nossa identidade coletiva genuína.

Segundo Gambini (DIAS; GAMBINI, 1999), o mito brasileiro existe, está sempre presente em cada um de nós, inconsciente, mas estamos defasados em relação a ele, não nos interessamos pela busca de uma identidade coletiva. Para reconhecer o mito, precisaríamos entrar em contato com nossas raízes, com o caminho percorrido de onde viemos.

Dessa forma, o não reconhecimento do mito de origem, do herói ou heroína na psique coletiva do brasileiro, importante na constituição da identidade nacional, gera em nós brasileiros um sentimento de não pertencimento, de rejeição às coisas da pátria como nossas e, portanto, que demandam cuidado (RAMOS, 2004). Essa falta decorre da ruptura da cultura, das relações sociais e, como já mencionado, das representações da alma indígena na sociedade brasileira pela ação do colonizador, sob os "escombros de um genocídio psíquico", como analisa Gambini (1994).

Mas, ainda que nossa consciência não reconheça essa alma indígena, ela nos habita, constitui um dos estratos da psique, qual as camadas geológicas revelam a história planetária. Essa analogia foi feita por Jung (2014b), nos Seminários sobre psicologia analítica (1925), de que as camadas da psique dizem da sobreposição, a partir da superfície até as camadas mais profundas: indivíduos, famílias, clãs, nações, grandes grupos de nações, ancestrais primatas, ancestrais animais em geral.

Essas diferentes instâncias psíquicas com as quais convivemos, se revelam, constelam em nossos comportamentos e denunciam a sombra ou as sombras da cultura brasileira, seus complexos culturais. Deles resultam os complexos de inferioridade e do excluído, que se pode constatar no comportamento dos cidadãos e nas políticas públicas na metrópole paulistana.

 

Comportamentos: cidadania e políticas públicas

Observando a cidade de São Paulo, pode-se notar indícios da ausência do cidadão e da ação dos seus representantes políticos quando nos deparamos com a má qualidade das águas dos seus rios e córregos, com as ruas salpicadas de lixo, com as árvores mutiladas ou a ausência delas. Nossa libido há muito voltou as costas para a cidade e direcionou-se para nós, sujeitos narcísicos, que não mais nos relacionamos face a face, tampouco sabemos o significado de cidadania. O sociólogo Laymert Garcia dos Santos (2002) expõe suas reflexões: São Paulo deixou de ser uma cidade, não por ter sido promovida a metrópole, mas porque o espírito da cidade não habita mais seus moradores.

Seu espírito se esvaneceu e agora tudo começa a mostrar os sinais da desagregação e da decomposição. Mas ninguém se importa com o que já aconteceu, acontece ou está por acontecer. A agonia da cidade é um efeito colateral que ninguém vê, nem quer ver (SANTOS, 2002, p.116).

Há uma oposição paradoxal entre natureza e progresso no mundo capitalista e não é diferente no Brasil. O mito da fundação edênica do Brasil, pródigo em riquezas naturais, tem contribuído para sua desvalorização, pois estas são ainda hoje consideradas como inferiores àquelas produzidas com tecnologia industrial. Tal qual as coisas da natureza, somos, como brasileiros, inferiores; quanto mais ecológico, mais natural, mais inferior. As qualidades e produções intelectuais, os avanços da tecnologia produzidos no Brasil tendem a não serem reconhecidos pela nação. (RAMOS, 2004).

O complexo de inferioridade do brasileiro e a falta de confiança nas instituições, nos governos, geram a ausência da população nos espaços de interlocução e construção de políticas e de gestão públicas, como assevera DaMatta (1997, p.19): "desgarrados, somos quase sempre maltratados pelas chamadas 'autoridades' e não temos paz nem voz".

 

Sentimentos: pertenço ou não pertenço?

Os monumentos e os símbolos de uma cidade revelam sua personalidade, exibem a "cara" da cidade para o mundo a sua volta e representam a imagem de si-mesma mais ou menos ideal, como afirma Stein (2010). Dizem não só da sua identidade cultural, dos seus valores mais caros, da consciência de si-mesma, mas além disso o que a cidade deseja projetar para seus habitantes no presente e no futuro. Entretanto, tanto quanto exibem a persona, exibem também sua sombra. Murray Stein enfatiza que, dentro e por trás da persona, há indícios do que a cidade representa conscientemente, bem como do que talvez inconscientemente deseje revelar, mas não pode fazê-lo diretamente ou oficialmente.

Ramos (2012) discorre a respeito dos símbolos de representação da força na cidade de São Paulo, expressos pelo brasão: "Non ducor, duco" (Não sou conduzido, conduzo), pelo seu animal símbolo: a onça parda, símbolo de poder, sendo o mais forte e maior felino do estado de São Paulo. Também menciona o monumento aos Bandeirantes, referindo-se aos paulistas como uma raça de gigantes, que nunca se submetem. Trata-se de uma escultura em granito de Victor Brecheret, inaugurada em 1953, como parte das comemorações do quarto centenário na cidade de São Paulo. Representa as expedições de exploração que partiam da cidade para o interior do país. Há dois cavaleiros, sendo um português colonizador que chefia a missão e um indígena como guia. Atrás destes segue um grupo de indígenas, negros, portugueses e mestiços (mamelucos), puxando uma canoa utilizada pelos exploradores em suas expedições (RAMOS, 2012, p. 57).

A persona paulistana parece ser de um povo que não se submete, da altivez expressa no monumento aos Bandeirantes, e a sombra também fica registrada nele, um silêncio devastador, a opressão, a dominação dos povos indígenas e da natureza. Dias e Gambini (1999) ressaltam o caráter fálico da empreitada dos descobrimentos, do processo de colonização, no qual, desprovido das qualidades do feminino, do eros, não se reconhece o valor do outro. A desigualdade gerada no processo de colonização e escravidão dos povos indígenas e negros reverbera, qual um grande abalo sísmico, ainda hoje na sociedade brasileira e que se faz sentir nos alicerces paulistanos. Há na cidade de São Paulo um grande contingente de cidadãos que migraram de diferentes estados brasileiros, que talvez nutram pelos paulistanos o mesmo sentimento de rivalidade a que Ramos (2012) se refere, e pode contribuir para o sentimento de não pertencimento, reforçando a ideia de Augé (2012) de "não lugar", que caracteriza o comportamento em geral da população dessa metrópole.

Scandiucci (2014) e Wahba (2012) analisam as problemáticas da vida na cidade contemporânea, por meio dos grafites e da pichação, como representantes simbólicos da complexidade do comportamento e das contradições da alma humana, uma possibilidade de o jovem da periferia da metrópole reclamar seu espaço de direito no coração da cidade. Os autores exploram aspectos do complexo cultural relacionado ao trauma, à discriminação, à opressão e ao sentimento de inferioridade. Veem essas intervenções como manifestações da sombra do grupo e o complexo cultural de exclusão, de inferioridade, a ela relacionado.

 

Mosaico cultural e complexo cultural do excluído

A partir das análises realizadas dos mapas mosaico da cidade de São Paulo e das reflexões já apresentadas quanto aos complexos culturais presentes, nos deparamos com a contradição, com o paradoxo dos nossos tempos: a fantasia arquetípica da globalização com inclusão se revelou mais como um processo de exclusão da maioria para o benefício de poucos, como enfatiza Boechat (2018, p. 70). E São Paulo representa essa realidade: uma cidade desigual.

Entretanto, como adverte Campbell (1990), em nosso tempo atual, a alternativa para a situação da civilização não é mais pensar a cidade, mas o planeta:

E o único mito de que valerá a pena cogitar, no futuro imediato, é o que fala do planeta, não da cidade, não deste ou daquele povo, mas do planeta e de todas as pessoas que estão nele. Esta é a minha ideia fundamental do mito que está por vir. E ele lidará exatamente com aquilo com que todos os mitos têm lidado - o amadurecimento do indivíduo, da dependência à idade adulta, depois à maturidade e depois à morte; e então com a questão de como se relacionar com esta sociedade e como relacionar esta sociedade com o mundo da natureza e com o cosmos. É disso que os mitos têm falado, desde sempre, e é disso que o novo mito terá de falar. Mas ele falará da sociedade planetária. Enquanto isso estiver em curso, nada irá acontecer (p. 46).

Já em 1931, em entrevista ao New York Sun, Jung vislumbrava a necessidade de repensarmos essa sociedade planetária:

Estamos começando a despertar para o sentimento de que algo está errado no mundo, de que nosso moderno preconceito de superestimar a importância do intelecto e da mente consciente pode ser falso. Queremos simplicidade. Estamos sofrendo, em nossas cidades, de uma necessidade de coisas simples. Gostaríamos de ver nossos grandes terminais ferroviários desertos, as nossas estradas e ruas desertas, uma grande paz descer sobre nós (MCGUIRE; HULL, 1982, p. 60).

Pois que em março de 2020 presenciamos a cidade tal qual descrita: vazia. E pudemos observar o céu limpo da São Paulo com a redução das emissões atmosféricas no início da quarentena, em março de 2020 (ROLNIK, 2020), como podemos observar na Figura 7.

Boechat (2018) considera importante notar a estreita ligação que há entre os fenômenos psicológicos e os da natureza, enfatizando o quanto Jung, em muitos momentos na sua obra, recorreu aos processos da natureza para ilustrar os processos psíquicos compreendendo que o homem não existe separado da Mãe Gaia.

 

O que a metrópole pode aprender com o coronavírus

Estaríamos em um ponto de virada, a metanoia da humanidade, como sugere Fellows (2019), da qual a cidade de São Paulo faz parte? Considerando os complexos culturais atuantes na metrópole, representação mosaico do povo brasileiro, sua ainda imatura sociedade, a ausência de identificação com suas raízes e sua ancestralidade, pode-se inferir que, no que diz respeito ao desenvolvimento do ego grupal, ainda nos encontramos em uma etapa muito anterior ao ponto de inflexão da curva do desenvolvimento como cidade, tanto quanto como Nação. Fellows faz menção ao capítulo XVI do volume 8/2 das OC "as etapas da vida humana", comparando o estágio atual da humanidade à metanoia (JUNG, 2013, p. 352, §773). Argumento que estaríamos ainda na fase anterior. Estaríamos na fase adulta da humanidade, considerando que somente nela é que podemos ter dúvidas a nosso próprio respeito (JUNG, 2013, p. 348, §760). Ou estaríamos ainda na juventude da humanidade, conscientes apenas do ego, satisfazendo nossa ânsia de prazer e domínio? (JUNG, 2013, p. 349, §764).

Neste momento, a pandemia gerada pelo SARS-Cov-2 nos faz perceber a Umbra Mundi, à qual Murray Stein se refere (2020). A sombra do mundo revelou a nossa própria sombra, quer coletiva como país, estado ou cidade, quer individual, representada pelas desigualdades sociais, pelos problemas da urbanidade, pela incompetência das políticas públicas. Como brasileiros, convivemos com os complexos culturais do colonialismo, do holocausto indígena, da escravidão e da corrupção, aos quais Boechat (2018) se referiu, que são os precursores dos complexos de inferioridade e do excluído.

Reconhecendo os complexos culturais atuantes na população da metrópole, como psicólogos e cidadãos, é imenso o desafio de atuar frente ao complexo do excluído, ao de inferioridade e à arrogância. Essa tarefa envolve a relação que se estabelece entre o trauma individual, nosso e dos nossos analisandos, e o trauma coletivo associados aos complexos culturais brasileiros já mencionados. Kalsched (2021) explora a perspectiva da intersecção dos traumas pessoais com o coletivo gerado pela pandemia da COVID-19. Essa experiência traumática coletiva atual ressuspendeu traumas pessoais e coletivos que jaziam nos sedimentos das profundezas da psique. Os mapas "mosaico" apresentados revelam uma psique coletiva fragmentada, que lida parcialmente com sua realidade, tal como observada nas defesas dissociativas no trauma. Somos, como nação, uma criança vítima de um trauma relacional precoce, filha do pai colonizador e da mãe indígena, corpos desalmados.

Dialogo com Gadotti (2020), em consonância com Jung, quanto à realidade com qual nos deparamos na pandemia e à relação da anima-anima mundi como imprescindível ao enfrentamento da exclusão. A autora, adotando a perspectiva de Jung, considera a anima vinculada à dinâmica matriarcal, e como tal atua na perspectiva de Eros, como potência de inclusão e alteridade, lado a lado com Logos. A alma sem Eros sofre e adoece, sob o domínio estritamente do capital e do poder, como a vemos numa cidade como São Paulo. A pandemia denunciou o terreno estrutural paulistano em desvantagem, levando maior sofrimento e morte principalmente às áreas com menor urbanidade e justiça espacial. Escancarou ainda mais as feridas da cidade, nos confrontou a encontrarmos caminhos para mudar esse nosso status urbano atual, com urgência!

 

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Recebido: 10/02/2022
Revisão: 05/06/2022

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