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Revista Brasileira de Psicodrama

versão On-line ISSN 2318-0498

Rev. bras. psicodrama vol.17 no.1 São Paulo  2009

 

EDITORIAL

 

A família foi uma importante instituição na mediação do Estado sobre os indivíduos durante longo período na recente história do Brasil. Foi por meio da família que a sociedade desenvolveu padrões de conduta, assegurando normas comportamentais no que diz respeito à sexualidade, às hierarquias entre os gêneros e todo o tipo de prescrição e expectativas para os papéis sociais. Na segunda metade do século XX, no entanto, aconteceram profundas modificações sociais que afetaram instituições e indivíduos.

Uma instituição que ficou e ainda está na berlinda é o casamento. A rachadura se insinua já na década de 60, com o surgimento de novos métodos contraceptivos, com a luta das mulheres contra a opressão exercida por um sistema machista e a consequente liberação sexual. Um pensamento menos conservador e mais cosmopolita começa a discutir valores e hierarquias rígidas no Brasil e no mundo.

O refluxo destas mudanças aconteceu na década de 80 com o advento da Aids, reativando fantasmas aparentemente adormecidos, ligados à culpa e à sexualidade. Avanços concretos ou aparentes caem por terra. A doença, no entanto, revelou redes hipocritamente negadas pelas sociedades, com amores bem diferentes daqueles descritos como desejáveis pelo direito, pela religião e até pela ciência. Para além dos amores domésticos e da sagrada família, havia os "sexos disparatados", como escreveu Michel Foucault. Toda a normatização começa a ser discutida, desvelando uma outra vida muito mais complexa.

A família, todavia, não será afetada apenas pelas questões da Aids e das sexualidades divergentemente mais explícitas. O advento da internet, o aumento do consumismo, as vidas urbanas cada vez mais centradas no indivíduo e no individualismo, a violência crescente e banal, as religiões ressurgindo com uma inusitada virulência midiática, as novas configurações familiares, a sociedade do espetáculo, impingindo novos e eficientes modos de controle, influenciaram e influenciam decisivamente a família contemporânea. A família, por sua vez, responde estruturando-se de diferentes modos, mas também modificando a sociedade.

Como o Psicodrama tem refletido estas tão importantes questões? A seção temática deste número A família na sociedade pós-moderna: o recorte psicodramático traz artigos que demonstram práticas e reflexões maduras, críticas e instigantes para com o problema. No Diálogo Eletrônico, duas psicodramatistas, respeitadas no trabalho com famílias, comentam a experiência na clínica e fora dela, ressaltando os nós da sociedade encarnados no plano da política familiar.

Na Seção Livre e nos artigos premiados pela Febrap, no XVI Congresso Brasileiro de Psicodrama, as preocupações sociais estão presentes, assim como modos de investigação das problemáticas grupais. Uma resenha de inglesa, uma outra abordando importantes questões teóricas e uma amorosa reportagem fecham o volume.

Contrastando com essa pulsação de vida, encontramos um mundo em constante e profunda crise, sendo a questão econômica apenas um vetor. O indivíduo se debate procurando emprego ou discutindo se deve ou não se casar ou, ainda, se mudar para o interior ou para outro país. A família se debate tentando novos estímulos. O mundo vive uma convulsão. O Psicodrama não está fora.

Boa leitura: por novas ideias, novas questões e novas intervenções!

Um abraço,

 

Devanir Merengué
Editor