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Aletheia
versão impressa ISSN 1413-0394
Aletheia no.31 Canoas abr. 2010
ARTIGOS DE ATUALIZAÇÃO
Estudo do processo de resposta num teste de memória
Study about the response process of a memory test
Fabián Javier Marín RuedaI; Fermino Fernandes SistoI; Cláudia Araújo da CunhaI; Alexandre José RaadII
I Universidade São Francisco
II Universidade Tiradentes
RESUMO
O processo de resposta do Teste Pictórico de Memória (TEPIC-M) classifica seus itens em três categorias sequenciais (céu, terra e água). Assim, aventou-se a hipótese que pessoas com uma familiaridade diária com o mar (Aracaju-grupo A) lembrariam mais desses itens quando comparadas com pessoas sem esse contato diário (Uberlâdia-grupo B). Participaram 858 estudantes universitários, com idades entre 18 e 68 anos, de ambos os sexos, e que responderam coletivamente ao teste. Primeiramente, a hipótese não foi confirmada, sendo que o grupo B obteve maiores pontuações que o grupo A. Também, todas as categorias mostraram diferenças significativas entre os grupos, sendo que o grupo B sempre mostrou melhor desempenho. Por fim, o grupo A apresentou uma sequência não esperada (terra, céu e água) se diferenciando dos grupos do manual.
Palavras-chave: Memória, Processo de resposta, Testes psicológicos, Avaliação psicológica.
ABSTRACT
The response process of The Teste Pictórico de Memória (TEPIC-M) classified the items into three sequential categories (sky, land and water). So, it was hypothesized that the day-by-day familiarity with the sea by the people (Aracaju-group A) could ease their recovering of item of water grouping, when comparing with people that who not have that daily experience (Uberlândia-group B). 858 college students, aging 18 to 68 years old, of both sexes collectively answered the test. First of all, the hypothesis was not confirmed, and the group B obtained higher scores than the group A. Besides, all categories presented significant differences between both groups, always group B showing the best performance. Finally, the group A presented unexpectedly the sequence land, sky and water differentiating itself of all groups related in the Manual.
Keywords: Memory, Response process, Psychological tests, Psychological assessment.
Introdução
Do século XVII até o XIX, filósofos como John Locke, John Stuart Mill e Thomas Brown especularam sobre os fatores que afetariam a força de associações particulares no âmbito do sistema psicológico. Eles supusseram que o "despertar" de associações da memória (recordação) poderia ter maior ou menor intensidade em razão da semelhança da pista estimulante para a memória, o quão recente fosse a experiência, a coexistência de poucos "associados alternativos" para a pista (chamados "interferência"), e as "diversidades temporárias de estado" (intoxicação, delírio, depressão). Tais conjecturas geraram muita pesquisa e varias teorias, até hoje, sendo que cada uma delas lidou com esses fatores de formas diferentes (Bower & Hilgard, 1981).
Desde que a memória começou a ser estudada empiricamente, vários pesquisadores propuseram definir o que se entendia pelo construto; porém, uma das primeiras grandes correntes foi a empírica, introduzindo a teoria de associação por contiguidade (Warren, 1921). Segundo essa corrente, ideias complexas seriam formadas na mente, conectando na memória ideias simples baseadas em sensações que seriam vivenciadas simultaneamente em tempo e/ou espaço.
Quando se fala em investigadores da memória humana, o primeiro foi Ebbinghaus, que em 1885, se interessou em saber qual a quantidade de informação que as pessoas poderiam se lembrar, imediatamente após sua apresentação. Foi ele quem inventou a noção da sílaba sem sentido ao fornecer para si mesmo materiais de aprendizagem de dificuldade homogênea, evitando dessa forma a variabilidade de palavras familiares (Tulving & Craik, 2000).
Investigações subsequentes propuseram outros paradigmas e testaram muitas variáveis que determinaram o desempenho da memória em diferentes contextos. A memória começou a ser testada tanto por lembrança, reconhecimento, reconstrução, além de uma variedade de medidas indiretas. A natureza dos materiais poderia ser variada, como também a forma de apresentação, as estratégias que os sujeitos usam para estudá-las, as expectativas a respeito do teste e as relações entre vários conjuntos de materiais a serem aprendidos. Como resultado, uma enorme quantidade de informação empírica foi acumulada sobre como se aprende em dadas situações, além de muitas hipóteses terem sido aventadas e testadas para integrar as diferentes definições e propostas para entender a memória humana (Tulving & Craik, 2000).
Mesmo com inúmeras variações e elaborações, o experimento de memória contemporâneo consiste de três fases, quais sejam, uma fase de estudo ou codificação, na qual o material é apresentado ao sujeito, um intervalo de retenção e, finalmente, uma fase de devolução ou teste, na qual o sujeito tenta responder a uma questão que envolve o uso da informação inicialmente estudada. Os diferentes métodos de memória, de Ebbinghaus até os dias de hoje, podem ser caracterizados em termos das condições que eles estabelecem para cada uma dessas três fases. A estratégia de pesquisa fundamental tem sido variar as condições em cada uma das fases.
É importante salientar que a mudança na forma de abordagem não trouxe modificações radicais na forma de avaliar o construto, mas deu-lhe um novo propósito, produzindo outra ênfase e o surgimento de novos procedimentos. Cada uma das três fases passou a ser vista como um conjunto de operações complexas a ser entendido em termos de um processador de informação ativo. Além disso, o foco desses métodos mudou o entendimento da interação com outras variáveis em cada uma das fases.
Bastante relacionado com essa mudança de foco, existia um crescente debate em relação ao número e forma dos diferentes sistemas de memória, assim como também a relação do construto com outras variáveis. Uma das variáveis muito pesquisada ao longo dos anos foi a idade. Pode-se dizer que o interesse pelo estudo da memória e a idade surgiu da pesquisa de Brunswik, Goldscheider e Pilek, que em 1932 estudaram a memória de escolares de 6 a 18 anos, observando que o número de repetições necessárias para apreender um material apresentado decrescia conforme aumentava a idade das pessoas. Após esse estudo, as relações entre idade e memória, especialmente na primeira infância e na idade avançada, têm sido muito investigadas.
Nesse sentido, Anderson, Craik e Naveh-Benjamin (1998) mostraram que o desempenho em testes de memória de adultos idosos era pior na codificação e devolução do que adultos jovens. Dentro desse contexto, enquanto alguns autores afirmaram que a memória entraria em declínio nos adultos velhos ou idosos (Kausler, 1994; Ryan, 1992), outros consideraram que nem todos os aspectos da memória ficariam prejudicados com o passar da idade (Balota & Duchek, 1988; Burke & Light, 1981; Craik, 1983; Schacter, Kihlstrom, Kaszniak & Valdiserri, 1993; Shimamura, 1989). Assim, em testes de memória explícita, segundo Verhaeghen e Marcoen (1993), existiria uma diferença de cerca de 20% entre adultos jovens e idosos, e em testes de memória implícita essas diferenças poderiam cair para aproximadamente 5% (Graf, 1990).
Já Alonso e Prieto (2004), pesquisando idosos, concluíram que conforme aumenta a idade diminui a memória de longo prazo, como também a de curto prazo e a capacidade cognitiva. Esse estudo corroborou os achados anteriores de Wilson, Cockburn e Baddeley (1985) com a população inglesa.
Se até o momento os autores citados concordam quase que unanimemente em que a memória de idosos seria prejudicada quando comparada com adultos jovens, nem todos os autores e pesquisas confirmam esses dados. Assim, as investigações de Kline e Orme-Rogers (1978), Di Lollo, Arnett e Kruk (1982) e Gilmore, Allan e Royer (1986) indicaram que a diferença no desempenho em tarefas de memória sensorial de jovens adultos e idosos seria mínima, com uma pequena vantagem para os idosos. Esses resultados também foram alcançados por Parkinson e Perry (1980) estudando o desempenho em memória sensorial auditiva em idosos e adultos jovens.
Estudando a memória de curto prazo, Puckett e Stockburger (1988) encontraram desempenhos semelhantes entre idosos e adultos jovens em uma tarefa de lembrança de letras por curtos períodos de tempo. Já em estudos sobre a memória de longo prazo, pesquisadores sustentaram que os idosos teriam um desempenho menor que os adultos jovens (Craik & Byrd, 1982; Kausler, 1991; Rabinowitz & Ackerman, 1982). Por sua vez, Giambra e Arenberg (1993), Park, Royal, Dudley e Morrell (1988) e Rybarczyk, Hart e Harkins (1987) afirmaram que quando igualados os períodos de codificação inicial de teste, ou seja, quando os idosos têm um maior tempo para a codificação que os adultos jovens, a diferença no desempenho seria relativamente pequena.
No Brasil, o estudo de Rueda e Sisto (2006) com a versão preliminar do Teste Pictórico de Memória, que avalia a capacidade do indivíduo devolver uma informação em um curto período de tempo, foi ao encontro dos achados de Ackil e Zaragoza (1998), Balota e cols. (1999), Craik e Byrd (1982), Java (1996), Perfect e Dasgupta (1997), Poole e White (1993), dentre outros, que afirmam que tanto as pessoas mais velhas quanto as mais novas, apresentam desempenhos menores que os indivíduos considerados adultos jovens. No caso da pesquisa de Rueda e Sisto, os sujeitos de 18 a 25 anos apresentaram as maiores pontuações no teste, quando comparados com os indivíduos mais novos e adultos velhos, o que poderia sugerir um aumento da memória até certo ponto da vida e após uma estabilidade da mesma aconteceria um declínio.
Após uma reconfiguração desse teste, a versão final também foi estudada por Rueda (2006) em função da idade das pessoas. Os resultados mostraram que os sujeitos de 17 a 36 anos apresentaram as maiores pontuações, o que novamente foi sugestivo de um aumento da memória até certo ponto da vida e, após, uma estabilidade seguida de um declínio. A diferença entre a pesquisa de Rueda e Sisto (2006) e de Rueda (2007) é que na primeira os participantes tinham entre 10 e 60 anos, enquanto que na investigação de Rueda (2007) não participaram pessoas com menos de 17 anos.
Mas esses não foram os únicos aspectos relevantes usados na construção de um teste que poderiam explicar o comportamento das pessoas. Nesse sentido, uma das perguntas que começaram a ser colocadas por pesquisadores deixou de ser como diferentes processos de codificação influenciariam os níveis de desempenho (causa e efeito), e a questão de maior interesse se tornou como a lembrança poderia ser determinada pela interação de processos de codificação particulares. Esse tipo de estudo passou a ser denominado processo de resposta e tem servido para uma maior compreensão dos fenômenos psicológicos.
Nesse contexto, no Teste Pictórico de Memória (Rueda & Sisto, 2007) os autores investigaram o processo de resposta utilizado pelos indivíduos ao responder o teste. Para isso, o ponto de partida para a análise foram três estudos. Assim, Paivio (1991) propunha que a memória para localização seria pobre no meio de uma página, mas seria melhor perto dos cantos e bordas; por sua vez, Mandler, Seegmiller e Day (1977) apontaram que cenas organizadas seriam lembradas melhor do que cenas não-organizadas; e, finalmente, Couclelis, Golledge, Gale e Tobler (1987) indicaram que alguns elementos de uma cena pictórica, chamados pontos de referência, seriam mais salientes na paisagem geográfica e serviriam como pontos de referência cognitivos na organização de espaço, o que determinaria a lembrança de determinados detalhes em detrimento de outros. Com base nesses dados foram realizados procedimentos para averiguar se esses resultados se mantinham nos dados da pesquisa.
Após o estudo dessas possibilidades, Rueda e Sisto (2008) encontraram que três agrupamentos formavam uma sequência constante, quais sejam, céu, terra e água. Para isso, reanalisaram os 51 itens da versão preliminar do instrumento, oito fazendo parte do ambiente água, 18 do céu e 25 da terra. Os estudos foram feitos transformando os dados em médias ponderadas em razão da desproporcionalidade da representação, e realizando uma análise de variância (ANOVA) para verificar possíveis diferenças entre os três agrupamentos. Obteve-se como resultado um [F (2, 511)=74,92, p=0,000], sendo que a prova de Tukey diferenciou os três grupos.
Após a realização de uma equalização dos itens de cada agrupamento do desenho do teste, Rueda (2008) submeteu o instrumento a um novo estudo sobre o processo de resposta, obtendo como resultado a mesma configuração que na versão preliminar. Porém o valor da análise de variância foi consideravelmente maior [F (2, 642)=256,84, p=0,000].
Com base nesses resultados, Rueda e Sisto (2008) e Rueda (2008) sugeriram estudos que se propussessem a avaliar o processo de resposta ao teste em indivíduos de diferentes contextos, como uma forma de verificar a existência de variáveis que influenciariam tal processo. Dentro desse contexto, o objetivo deste estudo foi verificar possíveis diferenças em função de populações que moram em contextos diferentes, como uma forma de verificar se a estrutura de resposta ao teste se manteria ou seria modificada. Para isso, foi estudada uma amostra de pessoas que vivem em uma cidade beira-mar, ou seja, que vivenciam diariamente a presença do mar (Aracaju) e outra cuja vivência cotidiana não inclui a presença marcante de água (Uberlândia). Convém salientar que não foram encontrados estudos dessa natureza que tratassem dessa relação, nem que houvessem relatado a presença desses elementos (céu, terra e água) ao estudar testes pictóricos, nem na literatura nacional nem internacional. Além disso, as diferenças nesse processo de resposta em função da idade também foram verificadas.
Método
Participantes
Participaram da pesquisa 858 estudantes universitários, sendo 296 (34,5%) da cidade de Aracaju (grupo A), estado de Sergipe e 562 (65,5%) da cidade de Uberlândia (grupo B), estado de Minas Gerais. Do total, 251 (29,3%) eram homens e 600 (69,9%) mulheres. Não informaram o sexo apenas 7 (0,8%) pessoas. Quanto à idade, ela variou de 18 até 68 anos, verificando-se uma concentração de indivíduos até os 25 anos (67,6%). A média de idade foi 26,50 (± 10,70).
Instrumento
Teste Pictórico de Memória – TEPIC-M (Rueda & Sisto, 2007)
O Teste é composto por uma figura com vários desenhos e detalhes que podem ser agrupados em três categorias, quais sejam, itens que pertencem e podem ser encontrados na categoria Água (peixe, jet-ski, por exemplo); itens referentes à categoria Céu (pássaro, sol, balão, dentre outros) e itens que podem ser localizados na categoria Terra (barraca, casa, árvore, por exemplo). Para responder o teste a pessoa deve visualizar a figura durante um minuto e, em seguida, deve lembrar a maior quantidade de desenhos e detalhes possíveis e escrevê-los na folha de resposta do teste. A pontuação pode variar de 0 a 55, sendo que é atribuído 1 ponto para cada item lembrado pelo indivíduo.
Quanto às propriedades psicométricas do instrumento, no manual são relatados estudos de evidências de validade pelo funcionamento diferencial do item, assim como análise de itens pelo modelo Rasch. Quanto aos índices de precisão, eles foram considerados satisfatórios (0,63 a 0,74).
Procedimento
Após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade São Francisco, por parte dos respondentes, o instrumento foi aplicado de forma coletiva. O tempo total de aplicação foi de aproximadamente 5 minutos, e não excedeu a 30 pessoas por grupo.
A aplicação do teste ocorreu seguindo as orientações do manual. São elas: Este é um teste de memória. Será projetado na lousa quadro com vários desenhos e detalhes. Vocês terão um minuto para olhar e memorizá-los. Vou pedir para vocês não falarem nem escreverem nada. Apenas olhem o quadro e tentem memorizar a maior quantidade de desenhos e detalhes que conseguirem.
Dada a instrução, foi projetada a transparência e não foi permitido que as pessoas fizessem qualquer anotação. Após 1 minuto desligou-se o retroprojetor. Feito isso, foi dito: Agora quero que peguem a folha e escrevam a maior quantidade de desenhos e detalhes que conseguirem. Vocês terão dois minutos para isso.
Resultados
Num primeiro momento foram realizadas as estatísticas descritivas do TEPIC-M com a amostra total; foram comparadas as pontuações no teste em função da cidade dos participantes; posteriormente essa mesma análise foi realizada levando em consideração a faixa etária dos participantes; e, por fim, foi realizada uma análise de variância para verificar se a estrutura original de cada agrupamento do teste se mantinha nos sujeitos de cada cidade.
No caso da estatística descritiva, ela foi realizada por agrupamento e com a pontuação total do teste. Esses dados podem ser visualizados na Figura 1.
No caso do agrupamento Água, as pontuações poderiam variar de zero a 16, verificando-se uma concentração entre dois e cinco pontos (64,3%). A média de pontos foi 3,59, com um desvío padrão de 2,10. A pontuação mínima foi zero e a máxima seis. Esses resultados mostram que as pessoas se lembraram de poucos itens do agrupamento. Com relação ao agrupamento Céu pode-se observar que a concentração de pontos ficou entre 5 e 8 (69,9%) de um total possível de 17. A média foi 6,24 (DP=1,98). No caso desse agrupamento as pontuações, como no agrupamento anterior, também não alcançaram a máxima possível. Quanto ao agrupamento Terra, a pontuação máxima possível é de 22 pontos e a máxima obtida pelos participantes foi 15. A concentração das pontuações ficou entre cinco e oito pontos (62,4%). Por fim, em relação à pontuação total do instrumento observou-se uma média de 16,15 (DP=4,64), sendo que essa pontuação média foi considerada baixa, pois é inferior ao ponto médio do instrumento. Esses resultados vão ao encontro dos achados de Rueda (2007) e Rueda e cols. (2007).
Com a finalidade de verificar diferenças em cada ambiente do teste e na pontuação total foi realizada a prova t de student levando em consideração o grupo dos participantes, partindo do pressuposto que os indivíduos da cidade de Aracaju (grupo A) lembrariam mais itens pertencentes ao ambiente Água, pelo fato de terem mais contato com o mesmo, quando comparados às pessoas da cidade de Uberlândia. Esses resultados encontram-se na Tabela 1.
Os dados da Tabela 1 mostram que houve diferença estatísticamente significativa em todos os agrupamentos do teste assim como também na pontuação total, sendo que em todas as medidas os indivíduos da cidade de Uberlândia (grupo B) apresentaram maiores pontuações. Deve-se ressaltar que enquanto a sequência dos agrupamentos foi correta para o grupo B, o mesmo não ocorreu com o grupo A, pois houve uma inversão na sequência. Com a finalidade de aprofundar esses dados dividiram-se os participantes de acordo com as três faixas etárias estabelecidas pelo manual do teste, quais sejam, dos 18 aos 36 anos, dos 37 aos 59 anos e indivíduos com 60 anos ou mais. Os resultados podem ser observados na Tabela 2.
De acordo com a Tabela 2, na faixa etária dos 18 aos 36 anos todas as medidas apresentaram diferenças estatíticamente significativas. Novamente verificou-se que os participantes do grupo B se lembraram de mais itens em todos os casos. Já na faixa etária dos 37 aos 59 anos houve diferença significativa em três das quatro medidas, quais sejam, na Água, no Céu e na pontuação total, com uma média maior também dos indivíduos do grupo B. No caso do agrupamento Terra verificou-se que as pessoas do grupo A lembraram mais itens, porém a diferença não foi estatíticamente significativa. Por fim, nas pessoas de 60 anos ou mais, as do grupo B obtiveram maiores pontuações no agrupamento Céu e na pontuação total do teste, enquanto que o grupo A teve um melhor desempenho nos agrupamentos Água e Terra. Destaca-se, porém, que nenhuma dessas diferenças foi estatisticamente significativa. Ao lado disso, o total de respostas diminuiu com o avançar da idade, sendo que nas pessoas com mais de 60 anos, a diferença entre os grupos deixou de ser significativa.
Para verificar se a estrutura de cada agrupamento do teste se mantinha em função dos grupos realizou-se uma análise de variância após calcular as médias ponderadas de cada agrupamento, em razão das diferentes quantidades de itens. No resultado observaram- se diferenças estatísticamente significativas, sendo que a prova de Tukey diferenciou os três agrupamentos [F (2, 858)=242,50, p=0,000] e [F (2, 858)=112,26, p=0,000] para as cidades de Uberlândia e Aracaju respectivamente. Os resultados da diferenciação da prova de Tukey podem ser visualizados na Tabela 3.
Na Tabela 3 observa-se que a estrutura estabelecida pelo Manual do teste foi mantida no grupo B, ou seja, os itens da Água foram os menos lembrados e os itens do Céu apresentaram a maior média de pontuação. Por sua vez, no grupo A os itens mais lembrados pertenciam à Terra, seguidos pelo Céu e Água.
Discussão
Este estudo partiu da proposta de Rueda e Sisto (2008) e Rueda (2008) de avaliar o processo de resposta no TEPIC-M em pessoas que convivem em diferentes contextos, no que se refere a ter a presença do mar em seu cotidiano ou não. Com base nisso estudaram-se amostras de duas cidades diferentes, quais sejam, Aracaju e Uberlândia. A primeira caracteriza-se por ser uma cidade costeira na qual as pessoas convivem diariamente com estímulos provenientes do mar. Por sua vez, os habitantes da cidade de Uberlândia não têm esse contato com tanta frequência, por ser localizada a mais de 500 quilómetros da cidade costeira mais próxima. Assim, acreditava-se que os indivíduos de Aracaju lembrariam mais dos itens do teste pertencentes ao ambiente Água do que as pessoas de Uberlândia.
Nos resultados essa expectativa não foi comprovada, pois os participantes de Uberlândia se lembraram de mais itens em todas as medidas do TEPIC-M. Quando comparadas as medidas em função das faixas etárias contempladas pelo manual do teste, evidenciou-se esse mesmo resultado dos 18 aos 36 anos. Já dos 37 aos 59 anos essa tendência aconteceu em dois agrupamentos (Água e Céu) e na pontuação total do teste. Por sua vez, nas pessoas com 60 anos ou mais não foram observadas diferenças em nenhuma das medidas estudadas. Infelizmente esse tipo de dado não foi encontrado na literatura o que impossibilitou comparações. Entretanto, há que se ressaltar que houve uma diminuição das pontuações conforme aumentou a idade, fato esse já amplamente comentado na literatura (Alonso & Prieto, 2004; Graf, 1990; Kausler, 1994; Ryan, 1992; Verhaeghen & Marcoen, 1993; Wilson, Cockburn & Baddeley; 1985).
Por esses resultados podem ser discutidos dois aspectos. O primeiro deles seria que com o passar da idade das pessoas o processo de resposta mudaria, ou seja, até uma determinada idade verifica-se diferença entre os participantes de cada cidade, e com uma idade mais avançada (a partir dos 60 anos aproximadamente) essa diferença não é mais observada. Nesse sentido pode-se pensar na possibilidade da memória das pessoas ser influenciada pelo contexto no qual convivem até certo ponto da vida e, posteriormente, a lembrança deixaria de ter uma relação tão estreita com o contexto da pessoa, podendo estar mais relacionada, talvez, com a experiência. Também pode ser aventada a possibilidade de que o número de participantes das faixas etárias desta pesquisa foi pequeno, o que daria lugar a outros estudos com essa população.
Por outro lado, e talvez o achado mais importante da investigação, foi que o processo de resposta dos indivíduos no instrumento estaria relacionado ao entorno da pessoa. De fato, não da forma que se postulou, qual seja, que as pessoas que convivessem diuturnamente com o mar teriam mais facilidade de se lembrar de elementos correlatos, principalmente porque essa categoria sempre foi a menos lembrada em todas as pesquisas feitas e descritas no Manual. Assim, a hipótese inicial de que as pessoas de Aracaju tenderiam a lembrar mais dos itens do agrupamento Água foi refutada. Também, esse tipo de agrupamento de pessoas mostrou outro resultado, as pessoas com convivência com o mar apresentaram uma sequência diferente da detectada pelo Manual, fato esse que alerta para a necessidade de pesquisas para entender detalhadamente quais variáveis estariam envolvidas nesse processo. De fato, a estrutura original do teste foi mantida apenas na cidade de Uberlândia.
Assim como alguns autores sugerem que os itens que compõem os testes pictóricos podem influenciar na resposta das pessoas (Couclelis, Golledge, Gale & Tobler, 1987; Mandler, Seegmiller & Day, 1977; Paivio, 1991), esta pesquisa mostrou que o Teste Pictórico de Memória também apresenta tal influência. Mas mostrou também um processo de resposta ainda não descrito na literatura e a influência de uma variável em uma situação para a qual esta pesquisa não possuía dados para explicar. Nesse sentido, pesquisas usando esses procedimentos devem ser encorajadas e fica em aberto a questão da diferença na sequenciação das categorias.
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Endereço para correspondência
E-mail: marinfabian@yahoo.com.br
Recebido em março de 2009
Aprovado em agosto de 2009
Fabián Javier Marín Rueda: Psicólogo; Doutor em Avaliação Psicológica (Universidade São Francisco, campus Itatiba-SP).
Fermino Fernandes Sisto: Pedagogo; Doutor em Pedagogia (Universidad Complutense de Madrid); Livre-docente (Unicamp); Professor do curso de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia da Universidade São Francisco, campus Itatiba-SP; Bolsista de Produtividade CNPq.
Cláudia Araújo da Cunha: Psicóloga; Doutora em Educação (Universidade Estadual de Campinas); Professora do curso de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia-MG.
Alexandre José Raad: Psicólogo; Mestre em Psicologia (Universidade São Francisco); Professor assistente do Departamento de Psicologia da Universidade Tiradentes, Aracaju-SE.