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Aletheia

versão impressa ISSN 1413-0394

Aletheia vol.54 no.2 Canoas jul./dez. 2021

https://doi.org/DOI10.29327/226091.54.2-8 

DOI 10.29327/226091.54.2-8

RELATOS DE PESQUISA

 

Ofensa sexual cometida por adolescentes/jovens adultos

 

Sexual offense committed by adolescents/young adults

 

 

Andrea Schettino Tavares1, I; Liana Fortunato Costa2, I; Denise Lima Moreira3, II

IUniversidade de Brasília
IISecretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O objetivo deste artigo é discutir a ofensa sexual cometida por adolescentes/jovens adultos e as implicações sociais e jurídicas decorrentes. A adolescência é um período em que ocorrem mudanças significativas e a ofensa sexual é uma questão de saúde pública, complexa e multideterminada. Cometer ofensa sexual na faixa etária entre 16-21 anos traz a necessidade de compreensão contextualizada, pois envolve dimensões jurídicas diferenciadas. Trata-se de uma pesquisa documental com os prontuários de cinco adolescentes atendidos em uma instituição de saúde pública. Os dados foram analisados a partir de categorias que conectam as vitimizações a aspectos sociofamiliares e implicações jurídicas. Os resultados apresentaram a polivitimização na história de vida e um ponto limite de virem a lidar com conjunto de regras de criminalização ou de proteção, de enfrentarem contextos jurídicos com legislações diferentes, quando ainda pertencem ao mesmo contexto familiar e à mesma comunidade. A responsabilização não pode ser a única resposta.

Palavras-chave: adolescente; ofensa sexual; responsabilização.


ABSTRACT

The purpose of this article is to discuss the sexual offense committed by adolescents/young adults and social and legal implications. Adolescence is a period that significant changes occur and sexual offense is a complex and multi-determined public health issue. Committing sexual offense between 16-21 years old brings the need for contextualized understanding because it involves different legal dimensions. This is a documental research with the records of five adolescents treated at a public health institution. The data were analyzed with categories that connect victimization to social and family aspects and legal implications. The results presented polyvictimization in life history and a limiting point of coming to deal with a set of rules of criminalization or protection, of facing legal contexts with different laws, when they still belong to the same family context and the same community. Criminal liability cannot be the only answer.

Keywords: adolescent; sexual offense; criminal liability.


 

 

Introdução

Os adolescentes/jovens adultos de 16 a 21 anos de idade que cometeram ofensa sexual estão situados em uma condição ambígua e complexa do ponto de vista jurídico e da etapa de seu desenvolvimento psíquico, emocional e social. Adolescentes devem ser vistos como sujeitos de direitos, e esta faixa etária implica que ainda sejam vistos como sujeitos de proteção, mesmo que possam ser responsabilizados judicialmente pelo cometimento de atos infracionais e/ou criminais (Blackley & Bartels, 2018; Sposato, 2017). As decisões referentes à imputação de responsabilização maior que a proteção, ou vice-versa, podem definir o incremento de futuras e maiores violências cometidas posteriormente. A melhor análise e compreensão do cometimento de ofensa sexual nessa faixa etária também se faz importante pela possibilidade de associação com temas correlatos como a polivitimização ou a continuidade da vitimização pela violência, concomitante ao período no qual já se cometem atos infracionais de natureza sexual ou de natureza social (DeKeseredy, Schwartz, Nolan, Mastron & Hall-Sanchéz, 2019; Kerig, 2018).

O texto tem como objetivo discutir a ofensa sexual cometida por adolescentes/ jovens adultos na faixa etária de 16 a 21 anos, bem como as implicações sociais e jurídicas decorrentes, mediante uma pesquisa documental referente a registros dos prontuários de cinco adolescentes. Uma primeira leitura das histórias de vida, das vitimizações sofridas e das vitimizações impostas a estes adolescentes, indica que esses sujeitos se encontram em um ponto limite frente a lidarem com um conjunto de regras de criminalização ou de proteção, de enfrentarem contextos jurídicos com legislações diferentes, quando ainda pertencem ao mesmo contexto familiar (com os mesmos conflitos) e à mesma comunidade (com as mesmas vulnerabilidades).

Conforme apontam Bartijotto, Tfouni e Scorsolini-Comin (2016), este é um tema permeado por contradições e incongruências tanto pelas motivações do cometimento do ato ofensivo como pela difícil decisão jurídica que deve ser tomada para estes casos, com diferentes possibilidades na interpretação da lei. A expectativa do texto é que a discussão a ser desenvolvida venha a contribuir para a adoção de um olhar clínico específico para essa situação contraditória e trazer observações que possam ajudar a pensar esse olhar clínico considerando esse período de desenvolvimento que possui tanto características do adolescente como do adulto jovem. No Brasil, esta questão ainda não ocupa uma grande preocupação de pesquisadores, porém em contexto de língua inglesa este tema é apontado como carente de maior conhecimento e urgência de se estabelecer outros parâmetros para sua compreensão e intervenção (Eastman, Craissati & Shaw, 2019). Ainda se pretende introduzir aspectos da necessária atenção aos conflitos e comportamentos expressos nesta faixa etária que estão vinculados a uma interpretação clínica sobre o significado dessas condutas e o cometimento de ofensa sexual (Schwab-Reese, Currie, Mishra & Peek-Asa, 2018).

O período da adolescência é definido pela Organização das Nações Unidas (ONU) entre 15 e 24 anos de idade e utiliza o termo jovem adulto para a faixa etária de 20 a 24 anos. Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), a adolescência é o período entre 10 e 19 anos de idade (World Health Organization [WHO], 2017). No Brasil, a legislação define, pelo Estatuto da Juventude (Lei no 2.852, 2013), que pessoas entre 15 e 29 anos são jovens, com a ressalva de seguir o proposto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Lei no 8.079, 1990) no caso de jovens entre 15 e 18 anos. O ECA considera a fase da adolescência entre 12 e 18 anos de idade, conforme seu artigo 2º. Evidencia-se uma multiplicidade de classificações sobre esse período do desenvolvimento, trazendo uma ambiguidade e complexidade aos atos infracionais cometidos nas idades entre 16 e 21 anos.

Entende-se a adolescência como uma etapa do desenvolvimento humano que deve ser compreendida nos contextos social, histórico e cultural de cada adolescente, sendo um processo de desenvolvimento singular em que ocorrem mudanças biológicas, psíquicas e emocionais significativas (Andolfi & Mascellani, 2012). É na adolescência que se desenvolve a formação da identidade que inclui os processos de individuação e de diferenciação. Assim, para que a autonomia seja desenvolvida e os limites sejam testados, é importante que o adolescente tenha a sensação de pertencimento a sua família, percebendo nela um espaço de apoio e proteção (Andolfi & Mascellani, 2012).

A ofensa (violência) sexual é uma questão de saúde pública, complexa e multideterminada (Costa, Penso & Chaves, 2017; Sandvik, Nesset, Berg & Søndenaa, 2017). A ofensa é um comportamento que pode ter ou não conjunção carnal e outras violências concomitantes (física, psicológica, ameaça), fornecendo ao autor da ofensa gratificação sexual (WHO, 2017). Também é caracterizada pela relação de hierarquia e de poder e diferença de desenvolvimento psicossexual entre perpetrador e vítima – quando esta é criança ou adolescente (Blackley & Bartels, 2018; Platt, Back, Hauschild & Guedert, 2018).

O adolescente que comete uma ofensa sexual (ato infracional de natureza sexual) precisa ser considerado em seu processo de desenvolvimento, como um ser integral e inserido em um contexto constituído por diversos fatores que possibilitaram a ocorrência do ato ofensivo, como violações de direitos básicos e falta de políticas de proteção (Penso & Costa, 2017; Spilsbury & Korbin, 2013). A dinâmica familiar do adolescente que cometeu ofensa sexual pode apresentar uma organização com múltiplas carências, o que contribui para a passagem ao ato (Domingues & Costa, 2016). Muitas vezes a família atribui ao adolescente a responsabilidade de cuidar dos irmãos, primos e vizinhos menores (Penso & Costa, 2017). Ressalta-se que os adolescentes que cometem ofensa sexual compõem um grupo heterogêneo e o ato sexual ofensivo não é dominante de determinada condição socioeconômica (Conceição et al., 2016).

Sofrer maus-tratos na infância somado a um contexto familiar e social permeado por vulnerabilidades, desproteção, conflitos interparentais, falta de autoridade e de supervisão parental, comunicação empobrecida e violações de direitos aumenta a probabilidade do adolescente cometer, posteriormente, atos transgressores (Domingues & Costa, 2016; Finkelhor, Shattuck, Tuner & Hamby (2015); Sandvik et al., 2017). A polivitimização – sofrimento de violências diferentes – é cumulativa, quanto mais idade o adolescente possui possivelmente mais variadas são as vitimizações sofridas (Schwab-Reese et al., 2018), o que gera consequências mais graves para as vítimas, quando comparadas às vítimas que sofreram a mesma violência repetidas vezes (Finkelhor, Turner, Hamby & Ormrod, 2011). Estas observações referentes ao adolescente são potencializadas se comparadas ao jovem adulto, principalmente no que diz respeito aos conflitos intrafamiliares, agravamento de traumas, transtornos comportamentais e maior uso de força/violência nas agressões cometidas (Eastman et al., 2019).

Em relação à responsabilização, a Constituição Federal (Constituição da República Federativa do Brasil, 1988) sinaliza que pessoas até os 17 anos, 11 meses e 29 dias são consideradas inimputáveis, o que não significa ficar impune e sim receber uma responsabilização adequada à fase de desenvolvimento (Diniz, Brito, Rondon & Gumeri, 2017). Deve-se então seguir o que está proposto no ECA (Lei no 8.079, 1990), que tem como princípios considerar que crianças e adolescentes são pessoas em desenvolvimento, têm direitos e são prioridade. Por outro lado, caso o crime seja cometido por maiores de 18 anos, o Código Penal (Código Penal Brasileiro, 1940) define as penas de reclusão, sendo que para o crime de estupro de vulnerável (Art. 217), a pena pode variar entre oito e 15 anos para o autor da ofensa.

O ECA (Lei no 8.079, 1990) prevê que crianças e adolescentes tenham seus direitos garantidos e que o adolescente seja visto como um ser em desenvolvimento necessitando de proteção. Quando algum direito é violado, medidas de proteção (Art. 101) devem ser aplicadas a fim de intervir na situação que possibilitou essa violação e, dessa forma, evitar futuras violações. Além disso, quando um adolescente (menor de 18 anos, conforme Art.104) comete um ato infracional, deve ser responsabilizado pelo ato cometido, podendo receber uma medida socioeducativa até os 21 anos de idade (Art.112), além de medidas de proteção, se necessário (Domingues & Costa, 2016). As medidas socioeducativas têm um caráter de responsabilização e educação, com o intuito de responsabilizar, socializar e educar o adolescente que violou a lei (Sposato, 2017).

O Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual (Secretaria Nacional de Direitos Humanos, 2013) ressalta a importância do atendimento ao autor da violência, visto que somente a responsabilização jurídica não é suficiente para que o adolescente compreenda a complexidade do ato cometido. Por outro lado, este documento (Secretaria Nacional de Direitos Humanos, 2013) também aponta a necessidade de se oferecer atendimento aos autores de ofensa sexual em idade adulta, e os adultos jovens fazem parte desta classificação e indicação, pois ainda não há uma diferenciação para abordagem terapêutica na faixa etária entre 18 anos e 24 anos (Eastman et al., 2019; Schwab-Reese et al., 2018).

 

Método

A presente pesquisa apresenta um caráter qualitativo (Creswell, 2014) e por se tratar de uma temática complexa, há necessidade de estudos contextualizados, vislumbrando outros aspectos ainda desconhecidos da mesma questão. O estudo foi realizado por meio de uma pesquisa documental utilizando-se fontes primárias de informação (Prates & Prates, 2012). Para o fim de discutir a complexidade presente no cometimento de ofensa sexual perpetrada por adolescentes com idade entre 16 e 21 anos, partiu-se das histórias pessoais, familiares e da vitimização sofrida e cometida.

Contexto

A pesquisa foi realizada em uma instituição da rede de saúde pública de uma capital da região Centro-Oeste do país. Esta instituição (Centro de Especialidade para a Atenção às Pessoas em Situação de Violência Sexual, Familiar e Doméstica – CEPAV) executa um programa responsável por oferecer atendimento psicossocial a crianças e adolescentes em situação de ofensa sexual, em uma perspectiva familiar. Os adolescentes que cometeram ofensa sexual chegam à instituição encaminhados pelo Ministério Público (MP), Conselho Tutelar (CT), Centro de Referência em Assistência Social (CRAS), outros programas de atendimentos à violência, e também por procura espontânea. Ao chegarem ao programa passam por um fluxo de atendimento: acolhimento, entrevista psicossocial (individual e familiar), atendimento grupal/ individual e acompanhamento posterior (se necessário). A equipe de profissionais é composta por psicólogos, assistentes sociais, psiquiatra, neurologista, estudantes de graduação e pós-graduação do curso de Psicologia e residentes de cursos da área da saúde, provenientes de universidades federal e local. Ainda participam da equipe duas professoras supervisoras que mantêm projetos de pesquisa junto à instituição. Este texto trata, portanto, de uma pesquisa acadêmica em parceria com uma instituição pública.

Participantes

As informações (Tabela 1) pertinentes ao que se quer discutir foram retiradas de prontuários de cinco adolescentes atendidos no programa no primeiro semestre do ano de 2019. A amostra obtida enfoca as idades entre 17 e 18 anos. Contudo, a discussão desenvolvida se posiciona com faixa etária mais ampla, pois assim estabelece a literatura.

 

 

Procedimentos para a coleta das informações

A coleta das informações foi realizada considerando as informações presentes nos prontuários dos adolescentes, durante o primeiro semestre de 2019. O critério para escolha dos cinco adolescentes foi o período de nascimento, entre 2001 e 2002, sendo que estariam com 17 e 18 anos no ano de 2019, ano da coleta das informações. Cabe acrescentar que a instituição de saúde atende os adolescentes até 18 anos incompletos, por isso não havia participantes com idades entre 19 e 21 anos. No entanto, como já explicitado anteriormente, discute-se a faixa etária ampliada, conforme justifica a literatura da área. Os encaminhamentos destes adolescentes chegaram à instituição no final de 2018 e início de 2019. As entrevistas que serviram de fonte das informações foram realizadas pela equipe de psicólogos e assistentes sociais entre os últimos meses de 2018 e os primeiros meses de 2019. Cada entrevista durou entre uma e duas horas. Este momento foi organizado de modo que uma parte da entrevista foi com a presença de todos os membros da família (responsáveis e adolescente) e outra parte somente com o adolescente, permitindo um espaço de fala e escuta individualizada. A entrevista apresentou um roteiro que buscou coletar informações relacionadas à história de vida do adolescente e de sua família, às vulnerabilidades e outras violências presentes, à relação com pares, ao desempenho escolar, às relações familiares, ao conhecimento sobre sexualidade e sobre o cometimento da ofensa sexual, às mudanças ocorridas para o adolescente, a vítima e a família após a revelação do ato ofensivo. As entrevistas foram registradas manualmente nos prontuários.

Procedimento para a análise das informações

O critério para a organização e análise das informações foi baseado no modelo proposto por Hamby, Finkelhor, Turner e Kracke (2011), considerando as cinco categorias de vitimizações definidas pelos autores: 1) crime convencional; 2) maus-tratos infantis; 3) vitimização entre colegas/pares e irmãos; 4) vitimização sexual; e 5) testemunho e vitimização indireta. Esses autores construíram um instrumento (Juvenile Victimization Questionnaire) para mensurar as vitimizações sofridas por jovens e adolescentes, cujo objetivo é apontar as diversas formas de vitimizações e as consequências de tais violências, fornecendo uma visão mais abrangente entre as vitimizações sofridas em suas vidas curtas e a perpetração de violências. O diferencial deste instrumento é justamente a inclusão de mais de uma forma de vitimização, visto que geralmente os instrumentos focam em apenas um tipo de vitimização. Desta maneira, este instrumento focaliza os danos maiores relacionados à polivitimização (Finkelhor et al., 2011).

Cada categoria abarca a seguinte caracterização: Categoria (1): assalto, furto, agressão com/sem arma, tentativa de agressão, sequestro. Categoria (2): abuso físico pelo cuidador, abuso psicológico⁄emocional, negligência e interferência na guarda por familiar. Categoria (3): agressão grupal, por irmãos ou pares, bullying, violência no namoro. Categoria (4): agressão sexual, agressão sexual não específica, exposição sexual, assédio sexual verbal, estupro e conduta sexual inaceitável. Categoria (5): instrução, testemunho de violência doméstica, de violência pelos pais aos irmãos, de agressão com/sem arma, assalto, assassinato de membros da família ou amigo.

Cuidados éticos

Este estudo foi submetido ao Comitê de Ética do Instituto de Ciências Humanas e Sociais, via Plataforma Brasil, e obteve o parecer favorável, CAAE 66485717.0.0000.5540.

 

Resultados

Inicialmente apresentam-se as histórias dos adolescentes complementando as informações contidas na Tabela 1. Na apresentação de cada história buscou-se identificar as violências sofridas e praticadas, conforme a categorização sugerida por Hamby et al. (2011). A consideração das violências sofridas pelos adolescentes bem como as praticadas encontram-se na perspectiva de que a violência se manifesta em circuito do qual ora o adolescente é vítima, ora ele é autor. Ainda se considera que esse circuito é retroalimentado pelos vários protagonismos que o adolescente possui em resposta às interações de sua interdependência (Costa et al., 2017). Assim, seguem-se as histórias de cada adolescente e sua inserção nas categorias de Hamby et al. (2011).

Adolescente A com 17 anos de idade completos em 2018 (ofensa sexual cometida com 16 anos): Foi encaminhado pelo MP, recebeu como medida socioeducativa a Prestação de Serviços à Comunidade (PSC). O adolescente cursa o Ensino Médio (EM) em escola particular e está no ano regular para sua idade, reside com os genitores e com a irmã mais velha. O adolescente faz acompanhamento psicoterapêutico particular há um ano por vontade própria. Vítima e situação da violência – A ofensa cometida pelo adolescente foi enviar mensagens online com cunho sexual e violento para uma mulher quase 20 anos mais velha, conhecida da família. Além disso, guardava roupas íntimas da vítima, e também de outras mulheres. Após a denúncia, o adolescente relatou que passou a ficar mais em casa, sentiu-se "triste e burro". Reconheceu o que fez e que foi errado, tinha "sentimentos" pela vítima e não sabia como lidar com isso. Quando os pais descobriram o que aconteceu, pressionaram muito o adolescente para contar a verdade e assumir o que fez. Houve discussões e o adolescente fugiu de casa por não estar aguentando "toda aquela pressão". Foi localizado e levado para casa por um parente. Contexto sociofamiliar – O pai cursou o terceiro grau e a mãe é do lar. No mesmo lote moram outros parentes. A casa da família tem três quartos, duas salas, uma cozinha e quatro banheiros. A família descreve seu relacionamento com poucos conflitos (as brigas ocorrem mais entre irmãos). O pai relatou que existem regras para fazer as tarefas escolares e ajudar nas atividades domésticas. Os quatro membros da família realizam programas de lazer em conjunto. As conversas sobre sexualidade ocorrem entre pai e filho. O adolescente considera como rede de apoio um tio, o psicólogo e o pai.

O adolescente A nas categorias: submetido a castigos (Categoria 2), se alguma regra fosse descumprida principalmente em relação ao estudo, sofreu ainda situação de violência psicológica (pressão) a partir da descoberta do cometimento da ofensa sexual. Foi observada a presença da Categoria 3 com os conflitos e brigas entre os irmãos.

Adolescente B de 17 anos de idade completos em 2018 (ofensa sexual cometida com 17 anos): Foi encaminhado ao CEPAV pelo CT da região em que reside. O adolescente apresenta atraso escolar significativo, está cursando as 3ª e 4ª séries do Ensino Fundamental (EF) pelo programa de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Ele participa de atividades extracurriculares em um programa perto de sua residência, com aulas de futebol e capoeira. A mãe relatou perceber sofrimento no filho, diz que tem dificuldade para acompanhá-lo e supervisioná-lo, percebe que desde os 12 anos ele apresenta comportamentos depressivos, dorme muito, não tem vontade de levantar e faltam expectativas para sua vida. A mãe considera que para ele "não vale a pena viver" nessas condições de pobreza e o adolescente confirmou. A mãe acredita que ele tem depressão e precisa de ajuda. O adolescente relatou que já tentou suicídio algumas vezes (excesso de remédios, enforcamento com corda e blusa, ingestão de veneno de rato), se sentia "agoniado" nessas ocasiões e com vontade de se cortar. Segundo o adolescente, "via vultos e ouvia vozes na sua mente". Atualmente ainda tem ideação suicida. O adolescente diz que não há diálogo sobre sexualidade e quando alguém está conversando sobre sexo, ele sai de perto, pois acha "nojento". Vítima e situação da violência – O adolescente foi acusado de ter violentado sexualmente uma senhora da terceira idade, vizinha da família. O adolescente relatou que foi denunciado pela vítima e que a polícia invadiu sua casa, deram choque nele e o algemaram. Colocaram-no no carro e o levaram para a delegacia. Depois foi levado para o Núcleo de Atendimento Integrado (NAI) – instituição que faz parte da rede de articulação quando o adolescente é apreendido pela polícia –, passando três dias no local. Nesse tempo, a mãe relatou que não foi informada sobre onde o filho estava. O exame no Instituto Médico Legal (IML) não constatou a ofensa sexual. O adolescente foi então liberado e o processo não teve seguimento. A experiência no NAI foi "boa e ruim", de acordo com o adolescente: boa porque tinha um lugar para dormir e ruim porque estava sem roupa e sozinho. O adolescente fez um boletim de ocorrência contra a senhora por calúnia e diz que sente raiva dessa senhora por ter feito isso com ele. A mãe do adolescente diz que acredita que a senhora inventou essa história por não gostar de sua família e querer prejudicá-la. Contexto sociofamiliar – O adolescente mora com a mãe e um irmão em uma casa cedida, com um cômodo de madeirite e um banheiro, com duas camas – que são compartilhadas entre os três membros. O adolescente relatou dormir sozinho na cama e a mãe disse que dorme no chão quando o outro filho dorme em casa. O pai faleceu quando o adolescente tinha quatro anos de idade. O adolescente relatou ter saudades do pai. A mãe está desempregada (empregada doméstica) atualmente. A família se encontra em condição socioeconômica crítica e não recebe auxílio do governo. O adolescente considera como rede de apoio a igreja e o líder religioso.

O adolescente B nas categorias: há descrição de elementos da Categoria 1 quando foi submetido a tortura e agressões (choque elétrico, ameaças, violência física, uso de ameaça com arma) por parte dos policiais que cumpriram o mandado de busca em sua casa, antes mesmo de ser encaminhado à instituição de recebimento de adolescentes apreendidos. A Categoria 4 pode ser observada pela instalação de uma suspeita permanente de ofensa sexual e por não expressar sua sexualidade e achar "nojento" falar e ouvir sobre o assunto. A Categoria 5 pode ser compreendida por seu protagonismo em expressar seu sofrimento nas diversas tentativas de se autoexterminar. Não há uma categoria que classifique de forma específica as violências referentes às condições socioeconômicas, mas observa-se no caso apresentado a extrema pobreza, falta de condições mínimas de moradia e baixa condição socioeconômica, o que reflete no desempenho escolar.

Adolescente C de 18 anos completos em 2018 (ofensa sexual cometida com 15 anos): Foi encaminhado ao CEPAV por um centro de referência em atendimentos de adolescentes. Ele apresenta diagnóstico de déficit intelectual, tendo recebido atendimento desde 2012 por questões escolares e outras decorrentes deste déficit. Atualmente está em acompanhamento no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). O atendimento no CAPS se justifica por ter apresentado comportamento hipersexualizado na escola até dois anos atrás, beijava as colegas, tirava as próprias calças e ficava com o pênis ereto à mostra, durante o intervalo das aulas. Também há relatos de episódios nos quais se encostava em meninas no transporte público. Vítima e situação da violência – Foi denunciado, ano passado, por ofensa sexual contra os irmãos (irmã de 15 anos, irmão de sete anos e irmão de seis anos – idades atuais). Na entrevista, o adolescente negou a ofensa sexual contra os irmãos, porém estas queixas estão registradas no prontuário da instituição encaminhadora. Contexto sociofamiliar – A mãe do adolescente já sofreu estupro, que resultou em gravidez e abortamento. O pai do adolescente está preso por tentativa de homicídio, assalto, tráfico e porte ilegal de armas. O adolescente sofreu diversas violências da mãe do padrasto, físicas, psicológicas e castigos. A família tem uma renda mensal de R$800,00 e recebe auxílio de Benefício de Prestação Continuada (BPC).

O adolescente C nas categorias: a Categoria 2 pode ser observada na violência física e psicológica, nos castigos e punições que recebeu dos pais. Como está-se considerando aqui o circuito de vitimização e protagonismo de agressão, existem as tentativas de agressões sexuais aos colegas da escola e dentro de transporte público, que se enquadram na Categoria 4. A Categoria 5 encontra-se nas agressões praticadas pelo pai na mãe, assim como na prisão desse pai.

Adolescente D de 18 anos completos em 2018, foi encaminhado pelo MP (ofensa sexual cometida com 15 anos): Está cumprindo PSC como medida socioeducativa. Além de PSC, cumpre Liberdade Assistida (LA) por cometimento de ato ilícito. Hoje, está morando com os pais e a irmã de seis anos, faz bicos, recebe auxílio BPC e está sem estudar (cursou até o 8º ano do EF). O adolescente relata uso de álcool em festas, cigarro diário e outras drogas ocasionalmente. Vítima e situação da violência – A ofensa sexual ocorreu contra a irmã de 16 anos, há três anos (na ocasião: a vítima tinha 13 anos e o adolescente 15 anos). O adolescente estava sob efeito de drogas psicoativas no dia da ofensa cometida. A mãe relatou que ele "abusava da irmã" quando esta era criança e a intimidava, e o adolescente disse não lembrar do ocorrido. Na época da ofensa, foi aconselhado pela polícia a sair de casa e ir morar com outros parentes, o que foi acatado pela família. O adolescente foi morar em outro estado com parentes durante um mês. A vítima saiu de casa e foi morar com o namorado após o episódio da ofensa. Atualmente a vítima apresenta comportamentos depressivos e automutilações. Contexto sociofamiliar – O pai reagiu de forma agressiva contra o filho com a descoberta da ofensa. A mãe passa o dia em acompanhamentos médicos, devido à uma doença autoimune. O adolescente relatou que era responsável por cuidar das irmãs, a pedido dos pais, quando estes saíam de casa.

O adolescente D nas categorias: a Categoria 2 concentra as violências sofridas pelo adolescente: atribuição do papel de cuidador das irmãs; abandono/isolamento pelo cometimento da ofensa; falta de apoio dos pais; agressão por parte do pai; mãe ausente de casa para cuidar da saúde; teve que se ausentar de casa sendo obrigado a morar em outro estado; uso excessivo de drogas; agressões devido ao cometimento da ofensa sexual.

Adolescente E de 18 anos completos em 2019 (ofensa sexual cometida com 17 anos): Foi encaminhado ao CEPAV por hospital especializado em atendimento infantil, onde fazia acompanhamento há seis meses. A avó relata que o adolescente tomava medicação para crescimento e percebeu desenvolvimento do interesse sexual em função desse tratamento. O adolescente apresenta diagnóstico de transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH) e déficit intelectual. Relatou que sente vontade de namorar, mas nunca namorou. O adolescente estuda à noite, na 3ª série do EM, vai para a escola na companhia dos primos. Vítima e situação da violência – A ofensa sexual aconteceu contra a sobrinha de oito anos (na época da ofensa). O pai da vítima comunicou ao CT, tendo feito a denúncia, exame no IML e foi aplicada medida protetiva à vítima (o adolescente deveria manter distância de 200 metros). Na ocasião da ofensa, o irmão da vítima presenciou o ato e viu que o adolescente tirou a roupa e solicitou que a vítima praticasse sexo oral nele. O irmão da vítima tem seis anos de idade e contou para sua mãe. A mãe da vítima e o adolescente que cometeu ofensa sexual são irmãos maternos. A mãe da vítima e os filhos estavam morando na casa dos pais (avós do adolescente) porque sua casa estava em obras. A avó sabe que o neto cometeu a ofensa contra a bisneta, mas não presenciou o ato. Com a descoberta, houve conflitos na família. O adolescente reconhece que foi errado e sente que o cunhado está "chateado", pois não o deixa se aproximar da sobrinha (vítima). A vítima também revelou a ofensa sofrida para uma tia. Contexto sociofamiliar – A mãe do adolescente sofria violência doméstica e durante a gestação sofreu agressões físicas. O pai do adolescente assassinou a mãe e cometeu suicídio, quando o adolescente tinha cinco anos (situação presenciada por ele). O adolescente hoje mora com os avós maternos em uma casa própria, com três quartos, uma sala, uma cozinha e um banheiro, com camas privativas, e no mesmo lote ainda moram outros parentes. Além do adolescente, moram mais dois netos de 19 e 16 anos. Os avós são aposentados, recebem aposentadoria e o adolescente recebe BPC e pensão dos pais falecidos. A avó relata que o avô "controla" muito o adolescente, que ele tem "pouca liberdade". Não há conversa sobre sexualidade na família, é proibido ter relações sexuais, namorar e se masturbar, os avós praticam abstinência sexual por conta da religião. Por outro lado, o avô relata que o adolescente precisa namorar. O adolescente considera a tia materna e os avós como rede de apoio.

O adolescente E nas categorias: observação da Categoria 2 em função de isolamento e abandono dos familiares. Após a revelação da ofensa sexual, houve conflitos intrafamiliares entre o adolescente e seu cunhado (pai da vítima) (Categoria 3). Do mesmo modo, há pressão para não namorar, não se masturbar e fazer abstinência sexual (como a avó tem expectativa na família). Na Categoria 5 observa-se vitimização indireta, por ter presenciado agressões interparentais e a morte dos pais.

 

Discussão

O objetivo do texto é, por meio de histórias de ofensa sexual cometidas em período final da adolescência, situar esta condição complexa às vitimizações apontadas por Hamby et al. (2011) que estabelecem relação potencialmente danosa para os adolescentes. A partir da pormenorização desta condição pode-se traçar um quadro mais compreensivo da necessidade de que estes adolescentes (que estão adentrando uma fase de jovem adulto) venham a ser observados em suas necessidades peculiares de responsabilização e de intervenção terapêutica. Em termos práticos, os adolescentes situados entre 16 e 21 anos (que podem ter cometido ofensa sexual em idades anteriores), devem ser vistos como pessoas em idade de transição, porém se cometerem ofensa sexual com 18 anos (ou nos anos imediatamente posteriores) serão considerados sob a égide de um sistema judicial que estabelece fronteira nítida entre atos infracionais cometidos até 18 anos incompletos e atos criminosos a partir de 18 anos. Adolescentes até 17 anos 11 meses e 29 dias recebem medidas conforme o ECA (Lei no 8.079, 1990), sendo aplicadas medidas socioeducativas e/ou de proteção. Já os adolescentes/jovens adultos a partir de 18 anos completos são responsabilizados de acordo com as leis do Código Penal (Código Penal Brasileiro, 1940), atendidos em instituições vinculadas ao sistema penal, não recebendo cuidados na aplicação de medidas de proteção.

A questão da aplicação da legislação é um ponto delicado a ser discutido, e, principalmente, o encaminhamento para qual instituição de intervenção terapêutica será feito nesta faixa etária complexa. Além disso, com 17 e 18 anos (a OMS considera a adolescência até os 19 anos) os adolescentes que sofreram polivitimização estão com mais tempo de vida e, dessa forma, podem apresentar um maior número de violências acumuladas (Said & Junior, 2018), aspecto pouco conhecido e reconhecido.

A partir destas considerações, as informações advindas das histórias de vida dos adolescentes foram organizadas com sentidos que buscaram justificar o propósito do texto. O primeiro sentido – cometimento da ofensa sexual entre as idades de 16 e 21 anos – caracteriza uma situação complexa visto que o adolescente comete a ofensa ainda sob a perspectiva de ser protegido e vai responder judicialmente em idade sem a cobertura precípua do ECA (Lei no 8.079, 1990). Acresce-se a essa condição, o segundo sentido que é o da vitimização que necessita ser melhor conhecida nessa faixa etária da adolescência tardia/adulto jovem. Em seguida, é trazido para a discussão o terceiro sentido: a condição socioeconômica da população de baixa renda que não tem maior relevância na proposta de Hamby et al (2011), mas aqui em nossa realidade configura arranjos familiares peculiares (intra e extra) para a sobrevivência da família. E, finalmente, há uma dimensão prática de se pensar o quarto sentido que é: como prestar atendimento psicossocial e jurídico a essa faixa etária?

Considera-se que os adolescentes nesta faixa etária em destaque encontram-se em um limbo agravado pela presença de polivitimização em suas histórias e representam uma área de pesquisa bastante negligenciada (Eastman et al., 2019). Observa-se que a proposta de Hamby et al. (2011) colabora para a consideração do contexto desses adolescentes (fase de transição, vínculos familiares, vulnerabilidades comunitárias) e os diferentes fatores que concorrem no cometimento da ofensa sexual nessa faixa de idade. Ao cometer a ofensa enquanto adolescentes (protegidos pela legislação) a responsabilização deve vir acompanhada de cuidado e atenção especializada para compreensão do ato agressivo e direcionamento socioeducativo, com o envolvimento da família (Tavares & Montenegro, 2019). Não se pode analisar estes adolescentes com abordagem sociopsicológica sem valorizar o momento de extrema transição em seu desenvolvimento (Eastman et al., 2019), mormente em um contexto de país com características de exclusão da juventude, de falta de escolaridade e da colocação em postos de trabalho que permitam gerar sua própria renda financeira, além de se defrontarem com conflitos sociais de raça, etnia e gênero.

Entretanto, é importante ressaltar que o tempo decorrido entre o cometimento da ofensa sexual e o momento do recebimento da responsabilização pode ser longo, o que pode agravar as condições de vulnerabilidade para o cometimento de nova ofensa. Sobre o cumprimento da justiça juvenil, Andrade e Machado (2017) discutem a questão de que o adolescente precisa ingressar na esfera jurídica como autor de ato infracional para que possa receber as recomendações do ECA (Lei no 8.079, 1990) quanto à proteção devida e o resgate de sua cidadania. Em seguida, após os 18 anos completos, esta condição se agrava, ou finaliza. Conforme a Tabela 1, os adolescentes levaram de um a três anos para serem encaminhados para atendimento, sendo que dos cinco adolescentes somente dois receberam medida socioeducativa, indicando a presença de uma dimensão de responsabilização. Ressalta-se ainda o aspecto da decretação de medidas de proteção com encaminhamentos para a rede de saúde, que podem ser consideradas como o reconhecimento da situação de vulnerabilidades na qual eles se encontram.

Esses adolescentes/jovens adultos demandam um olhar profissional (Psicologia /Direito/Serviço Social) que admita sua condição de desenvolvimento. Mesmo que estejam com 18 anos (um pouco mais, um pouco menos), ainda não apresentam comportamentos de adultos e constituição psíquica formada, precisando de orientação e autoridade. Entende-se que essa idade ainda traz uma permanência dos seus direitos violados. A idade cronológica não pode ser um impeditivo para receber atenção terapêutica e responsabilização adequada (Domingues & Costa, 2016). Os adolescentes do estudo cometeram a ofensa com 15, 16 e 17 anos e chegaram à instituição de saúde cerca de dois/três anos após o ato. Sposato (2017) ressalta que a proteção deve ser garantida em lei e ser possível de aplicação na prática. No entanto, essa prática deve ser configurada em relação aos riscos e necessidades dessa condição de extrema transição. Muitas situações novas podem estar em ocorrência: estar fora de casa, fora da escola, buscando emprego (ingresso no tráfico de drogas?), menos acesso a serviços de proteção, talvez enfrentando situação de paternidade (Eastman et al., 2019).

No que tange às vitimizações sofridas, pode-se compreender as motivações para o ato ofensivo como experimentação da sexualidade, ou como reprodução de ofensa sexual sofrida ou como acréscimo pelo conjunto de vitimizações ocorridas ao longo da curta vida (Blackley & Bartels, 2018; Costa et al., 2017 Domingues & Costa, 2016), e ainda configurado na condição adversa do contexto social e econômico (Spilsbury & Korbin, 2013). No entanto, é necessário não perder de vista a construção de contexto oportunista e de ações inconsequentes que também contribuem para o cometimento da ofensa sexual (Domingues & Costa, 2016). Em todos os casos é possível observar que o ato ofensivo expressa o sofrimento desses adolescentes, por meio da ação (Domingues & Costa, 2016). Observa-se o registro de diversas violações de direitos acumuladas ao longo da vida, sofrendo polivitimização e múltiplas carências físicas, materiais e afetivas, rompimentos emocionais, como violência psicológica, abandono, violências interparentais e perda dos pais, exercendo funções de cuidadores que não permitem o exercício pleno de seu papel de filho – esses adolescentes são autores da violência e são vítimas (American Psychology Association [APA], 2015; Musicaro et al., 2017). Essas constatações de várias e diferentes vitimizações convergem com os achados de Finkelhor et al. (2015) que encontraram em suas pesquisas que 60% dos participantes, crianças e adolescentes, foram vitimizados, tendo sofrido em média três violências diferentes e com a chance de 70% de experienciar outra violência no período de um ano. Schwab-Reese et al. (2018) e Finkelhor et al. (2011) afirmam que um aspecto que deve ser destacado é que os adolescentes/jovens adultos nessa faixa de idade sofreram mais violações de direitos que adolescentes mais novos – devido estarem com mais idade – e este aspecto precisa ser considerado para uma melhor compreensão do cometimento da ofensa sexual e da intervenção com o autor. Ao mesmo tempo, cada vez mais há menos oportunidade e tempo disponível para que a sociedade o considere como necessitando de atenção (Eastman et al., 2019). A discussão atual da sociedade em torno da redução da maioridade penal é uma prova da intolerância que o tecido social está expressando.

Pertencimento a contexto de carência econômica – Os adolescentes do presente estudo se encontram em um ambiente familiar e social com maior vulnerabilidade, deixando-os mais suscetíveis a efeitos negativos em seu desenvolvimento e em sua conduta externalizante (Spilsbury & Korbin, 2013). O pertencimento a contexto empobrecido do ponto de vista material é um fator que contribui e pode agravar o cometimento do ato ofensivo. A situação desfavorável se configura por um conjunto de estressores: carência financeira ou falta de acesso à renda e a serviços somada à fragilidade de vínculos afetivos, baixa qualidade educacional e outras violências (Blom, Högberg, Olofsson & Danielsson, 2014). Essas condições não são unicamente pontuais, mas se constituem em um contínuo que se estende desde a geração anterior e, possivelmente, se manterá nos anos (ou gerações) seguintes. Os estressores não são episódicos, mas sim cumulativos (Eastman, et al., 2019).

O atendimento clínico nesta faixa etária deve ser em rede com uma resposta jurídica e socioassistencial. A ofensa sexual cometida nos casos apresentados caracteriza-se por ter sido cometida em idade de transição adolescência/jovem adultez. Esta indicação precisa ser valorizada e tratada de modo específico, buscando-se uma resposta de atenção psicossocial ao adolescente como de atenção jurídica, contemplando uma aplicação da legislação que possa ser adaptada e enfocada para essa transição (Eastman et al., 2019). Os estudos sobre vitimização vivenciados por estes adolescentes chamam atenção para a necessidade de que o atendimento terapêutico precisa ser priorizado porque a vitimização pode viabilizar efeitos agressivos mais graves e que a dimensão jurídica com base apenas na punição não consegue oferecer uma resposta justa e eficiente (Diniz et al., 2017; Schwab-Reese et al., 2018). Musicaro et al. (2017) assume uma posição de que estes adolescentes precisam ser vistos como polivítimas para ter acesso aos cuidados oferecidos pelo sistema de saúde.

Desse modo, faz-se primordial a construção de uma boa avaliação biopsicossocial que possa apreender os aspectos dos danos sofridos, dos sintomas desvalorizados, das condições de participação dos adolescentes em várias esferas do convívio familiar e social. Estes adolescentes constituem-se em um público pouco estudado e difícil de serem vistos com maior interesse tanto pela justiça como pelos profissionais psicossociais (Eastman et al., 2019). O atendimento psicossocial a essa população precisa considerar que a agressão cometida é um ato de continuidade de uma resposta ao sofrimento e ao padrão de violação até então vigente em sua vida (Eastman, et al., 2019; Schwab-Reese et al., 2018). Em suma, se as adversidades apresentadas por esses adolescentes não forem sensivelmente consideradas, corre-se o risco de avaliar a situação com ênfase no pertencimento a uma faixa categorizada como adolescência ou como jovem adulto, a partir de limites etários estabelecidos e simplificados.

A participação do sistema de justiça é fundamental no atendimento ao resgate dos direitos violados os quais têm influência ativa no cometimento do ato agressor. Enquanto há violações de direitos a proteção deve permanecer. Isso significa que estes adolescentes devem ser adequadamente responsabilizados pelo ato cometido, considerando seu estágio de desenvolvimento. É necessário que haja responsabilização, educação, socialização e restabelecimento da garantia de direitos desses adolescentes/jovens adultos e não punição e privação de liberdade simplesmente (Bartijotto et al., 2016; Diniz et al., 2017; Sposato, 2017). A articulação da rede de proteção, sistema judiciário, família e sociedade é fundamental (Domingues & Costa, 2016). No atendimento psicossocial e na responsabilização desses adolescentes/jovens adultos, os dois lados devem ser considerados: aspectos que dizem respeito ao adolescente (rede de proteção, família, escola, comunidade) e ao jovem adulto (educação psicossexual, família, responsabilização criminal – devido à idade do cometimento). O desafio em termos de execução de plano prático de atenção é conseguir uma aproximação conceitual e operacional entre a proteção (preservada pelo ECA) e um olhar da justiça penal específica para as idades em questão: ato infracional (análogo ao crime) (até 18 anos) e crime (após os 18 anos).

Em termos de programa de atendimento para a faixa etária de 16 a 21 anos, a sugestão é: a) intervenção psicossocial que se dirija ao atendimento familiar (Andolfi & Mascellani, 2012); b) atenção emocional ao sofrimento decorrente da polivitimização (Blom et al., 2014; Kerig, 2018); c) avaliação biopsicossocial visando o conhecimento das condições de danos gravosos a sua integridade emocional e afetivo, e a presença de sintomas psiquiátricos (Schwab-Reese et al., 2018); d) que sejam dadas informações tanto ao adolescente como a sua família sobre a inserção sociojurídica e da aplicação da legislação (ECA e Código Penal) que vai diferenciar sua inserção no processo de responsabilização (Diniz et al., 2017); e) retomada de investimento na escolarização respeitadas as características da vontade do adolescente/jovem adulto; f) encaminhamento para cursos profissionalizantes com provável efetividade empregatícia; g) ampliação da faixa etária da proteção ao adolescente e antecipação da posição da condição de responsabilização mais atenta dada ao jovem adulto (Eastman et al., 2019); h) intervenção em rede com especial lugar para a participação da justiça, particularmente do MP.

Finkelhor et al. (2011) mostram – e as histórias apresentadas também – a importância do conhecimento das várias vitimizações que o adolescente pode apresentar e que estão ligadas à ofensa cometida. A faixa etária apontada neste texto indica possibilidade de que o adolescente possa vir a ser tratado pelo sistema de justiça criminal, o que agravaria ainda mais sua condição de polivitimização.

 

Considerações Finais

Buscou-se apresentar um alerta para um fenômeno que ocorre em idade limítrofe, sobretudo em tempos de discussão sobre redução da maioridade penal. É preciso pensar em políticas públicas específicas que envolvam esse público (dos 16 aos 21 anos) considerando-o em um contínuo adolescentes-adultos. Iniciativas de estudos para esta questão poderão oferecer subsídios para que os profissionais do Direito, da Psicologia e do Serviço Social se aproximem na construção de modos de atendimento em rede.

Observa-se a necessidade e importância de estudos com adolescentes/jovens adultos que cometeram ofensa sexual para a proposição de intervenções específicas para esse público nessa faixa etária. O cometimento de ofensa sexual, na faixa etária de 16 a 21 anos, é um dos temas menos estudados na literatura científica (Eastman et al., 2019). E, no Brasil, esse assunto é ainda mais desprovido de iniciativas de pesquisas. Faz-se necessário considerar o contexto em que estão inseridos esses adolescentes e jovens, compreendendo a etapa do desenvolvimento e as características peculiares de cada um, para se poder avançar em pesquisas e propostas viáveis de atenção ao problema (Blackley & Bartels, 2018; Diniz et al., 2017; Eastman, 2019).

A limitação do estudo encontra-se na falta de outras experiências similares já descritas e estudadas. Por outro lado, também não foi possível abarcar participantes com idades entre 19 e 21 anos. Se, no momento da coleta das informações, tivesse havido maior abrangência (toda a faixa etária de 16-21 anos), a pesquisa poderia oferecer ainda mais subsídios para discussão mais ampla das peculiaridades da problemática. Nesse sentido, esta pesquisa constitui-se em uma tentativa de dar início aos estudos sobre este público de adolescentes/jovens que cometeram ofensa sexual. Reconhece-se a importância de mais estudos serem realizados no contexto brasileiro, e espera-se que o artigo possa apontar esta direção e motivar pesquisadores a adentrarem este tema.

É urgente que novas frentes de pesquisas sobre os autores de ofensa sexual sejam contempladas, para o melhor conhecimento da manutenção e interrupção do ciclo da violência. Além disso, a proposta de atendimento sugerida ao final da discussão necessita ser colocada em prática para que possa ser avaliada no contexto de atendimento e verificada a necessidade de possíveis modificações.

 

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Endereço para correspondência
E-mail:andreaschettino9@gmail.com

Recebido em: março de 2020
Aceito em: março de 2021

 

 

1 Andrea Schettino Tavares: Psicóloga; Mestranda do Programa de Pós-graduação em Psicologia Clínica e Cultura da Universidade de Brasília.
2 Liana Fortunato Costa: Psicóloga; Doutora em Psicologia Clínica; Docente Permanente do Programa de Pós-graduação em Psicologia Clínica e Cultura da Universidade de Brasília.
3 Denise Lima Moreira: Psicóloga; Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal.

 

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