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Psicologia Escolar e Educacional

versão impressa ISSN 1413-8557

Psicol. esc. educ. v.7 n.2 Campinas dez. 2003

 

RESENHAS

 

Avaliação da alfabetização

 

Fehring, H. (Org.), (2003), Literacy Assessment. Newark: ALEA & IRA, vi + 199 p.

 

O livro é resultado de um esforço conjunto da Australian Literacy Educators’ Association e da International Reading Association. Reúne uma coleção de artigos, publicados entre 1992 e 2002 pela primeira Associação aqui referida. Heather Fehring foi a pessoa encarregada de organizar o livro, sendo docente de Avaliação da Alfabetização no Royal Melbourne Institute of Technology University, em Victória (Austrália). Escolheu 19 textos de vários autores, com enfoques diversos para representarem o que significa alfabetização hoje, como avaliar os vários tipos de alfabetização e como isto pode enriquecer as pessoas. Na Introdução apresenta as preocupações que nortearam as escolhas feitas. Cabe aos educadores considerar as necessidades dos estudantes, os direitos dos pares, a responsabilidade profissional com os colegas, os pressupostos e demandas do sistema governamental e a agenda macropolítica. A coleção de artigos foi composta com textos previamente incluídos nos periódicos The Australian Journal of Language and Literacy, Literacy Learning: the Middle Years e Practically Primary, além de trabalhos apresentados na ALEA National Conference. Os critérios adotados, além dos parâmetros temporais foram contar com alguns artigos que explicassem princípios diferentes do prisma teórico sobre a avaliação da alfabetização; relatassem pesquisas de avaliação; que estabelecessem padrões e especificidades; que demonstrassem aplicações em sala de aula e técnicas de relatório, que incluíssem da escola primária ou elementar até a secundária ou ensino médio e que todos os artigos destacassem a importância da avaliação feita pelo professor para relatar a alfabetização dos seus alunos. O primeiro texto (o livro não está organizado em capítulos, partes ou algo similar, apenas se sucedem) é de autoria de Fehring, apresentado na conferência a que se fez menção. Enfoca as influências que os professores recebem quando avaliam e relatam a alfabetização dos alunos em sala de aula. Além do contexto da macropolítica destaca: o conhecimento reflexivo internalizado, as expectativas que servem de padrão, a avaliação das estratégias de seleção; a disseminação, as considerações externas e o poder dos pares. Naturalmente, subjazem a estas questões o conceito de alfabetização e os modelos teóricos de aprendizagem da linguagem. O artigo seguinte é de Kate Mount e trata do como acessar a informação de alfabetização, mais especificamente de como a criança aprende a avaliar sua própria aprendizagem. Isto implica em dominar as habilidades de: articular e registrar os fatos conhecidos, formular questões, localizar a informação, escrever e ilustrar respostas claras, organizar um livreto de registros, apresentar eficientemente a informação, avaliar sua própria apresentação e monitorar o próprio progresso. É um texto prático. O trabalho de Robyn Perkins trata de como a criança faz sua própria avaliação apresentando apenas sucessivos exemplos de falas de crianças. Não há novidade ou qualquer elaboração pessoal por parte de quem produziu o texto. Christina E. van Kraayenoord enfoca a auto-avaliação da aprendizagem da alfabetização. A autora considera que a auto-avaliação envolve auto-reflexão e auto-mensuração, ou seja, habilidades metacognitivas, implicando também que o aluno avalie seus conhecimentos e habilidades em relação ao seu desempenho e sentimentos anteriores, ou os padrões e critérios de realização. Esta é uma atividade que envolve a sala de aula e que é preciso saber quem, o que, e o como avaliar. As atividades de sala de aula devem desenvolver estas habilidades. Todavia, há várias questões a serem resolvidas. Lynne Badger e Lyn Wilkinson enfocam a questão quando os participantes são pobres ou de comunidades diversificadas. Embora sem usar a estrutura do discurso científico para relato de pesquisa, o trabalho está alicerçado em dados de um projeto de pesquisa envolvendo este tipo de participantes, em salas de aula do sétimo grau. Concluem que é possível mudar os resultados da aprendizagem da alfabetização, o que implica menos em encontrar procedimentos de avaliação mais eficientes do que mudar os programas de sala de aula. Mas destacam que ensinar e avaliar estão inseparavelmente unidos. É de Jenni Connor o artigo que aparece em seguida e enfoca o mesmo problema tendo por base de dados pesquisa realizada com crianças indígenas, de forma muito sucinta e com base em sua leitura pessoal acrítica da situação. O uso de registros contínuos em sala de aula é enfocado por Lorraine Wilson e Melissa Dash que registraram a freqüência de erros em leitura de um menino de oito anos. Limitam-se a reproduzir exemplos de registros sem maiores comentários ou análises. Concluem que a análise de erros é produtiva, mas não há dados para alicerçar tal afirmação além do constante nas poucas referências de apoio. Anne Nelson teve reimpresso um breve registro que fez de avaliação de leitura de forma autêntica incluindo atitudes, envolvimento e satisfação com a tarefa. São registros qualitativos. Também lembra a importância de registros feitos pelos pais e auto-avaliações feitas pela criança. Aponta a importância dos registros atenderem aos quesitos governamentais. A necessidade de moderação ao se tratar da avaliação autêntica na escola como um todo é a preocupação de John Davidson em sua breve comunicação. Lembra que o Registro Cumulativo é uma estratégia em uso por muitos anos que vem sendo completada por sínteses (Profiles) para leitura e matemática, com um progressivo caráter cumulativo. Os registros feitos pelos alunos devem ser considerados com muita moderação uma vez que não se tem segurança quanto a autenticidade, segurança, fidedignidade e validade dos mesmos. Nas últimas décadas o uso de “portfolios” para acompanhar a aprendizagem feita pelas crianças tornouse uma prática bastante difundida especialmente na área da leitura e escrita. Jeff Wilson tece algumas considerações sobre a matéria de forma clara e sintética. Lembra que se está falando de coleção de trabalhos produzidos pelas crianças ao longo do período escolar, usados para fornecer evidências de seu desenvolvimento ao longo do ano, fornecer informações aos pais, elementos sobre o desenvolvimento curricular e manter um arquivo sobre o desenvolvimento da criança ao longo da escolarização primária, portanto, é mais do que um instrumento de avaliação. É um ótimo texto didático. Greer Johson em seu artigo trata das tarefas de avaliação da linguagem e o que está subjacente às mesmas. Lembra que medir a fala em sala de aula é ainda uma questão problemática e que tem implícito o conceito de leitura quando se enfoca também a alfabetização crítica e a posição da leitura no próprio ensino. Relata a mudança de posição registrada em um estudo de caso indo de um controle da classe, para uma resposta pessoal até alcançar um padrão de análise tanto do texto como do autor. Michal McNamara descreve as opções de avaliação da leitura disponíveis para os professores do ensino médio cujos propósitos devem estar muito claros para os professores que também devem estar seguros para escolher os meios de avaliar os estudantes que satisfaçam suas necessidades específicas. Como instrumentos sugere: observação, escrutínio do processo de leitura, colaboração, avaliação do currículo por testes padronizados, avaliação da comunicação, comparação dos objetivos previstos e efetivamente alcançados, uma ampla mensuração. Os critérios incluem os definidos pelo especialista em leitura, o comportamento de leitura anterior do estudante (nível operante ou inicial) e o critério acadêmico pré-definido. Hoje a auto-avaliação é considerada como aspecto importante do processo. É deste tópico que Kaye Lowe trata no seu artigo, mas voltada para a educação secundária e tendo por base pesquisa realizada com 1200 alunos que se auto-avaliaram, demonstrando estarem cientes de que a alfabetização mudou suas vidas. Destaca que os princípios básicos do ensinaraprender devem estar presentes. Os alunos precisam realmente estar querendo aprender, o respeito e a verdade devem ser preservados, o ambiente de aprendizagem precisa ser cuidado, bem como aprendizagem e avaliação devem estar interligadas. O processo de avaliação de aprendizado precisa ser explícito para que funcione bem. Também não se pode esquecer que todos precisam monitorar a qualidade do que fazem. Alguns autores trataram dos testes como instrumento de avaliação. O primeiro deles incluído no livro foi o texto de Brian Cambourne que lembra a receptividade das comunidades na avaliação sistemática da leitura recorrendo a testes, realizada pelo governo. Os testes aplicados têm por características: aplicação coletiva, padronização (de nível, de aplicação e de interpretação), são comparativos (têm normas) e orientam o produto. Os pressupostos estabelecidos são: avaliação é sinônimo de medida; deve ser objetivo; os resultados de testes padronizados podem ser amplamente generalizados para o mundo real; o processo ocupa uma parte mínima no desempenho efetivo em alfabetização (leitura) e em comportamentos correlatos e os resultados dos testes são úteis e utilizáveis por professores e alunos. O mesmo autor é responsável pelo breve texto que se segue, sendo que, desta feita, aponta cinco itens que esclarecem os pontos obtidos quando se recorre a testes no sistema educacional. São repetição do dito anteriormente, sobre as características fundamentais deste recurso. É mera redundância de parte do capítulo anterior e não precisaria ser incluído na presente seleção já que não há qualquer acréscimo apreciável. Claire M. Wyatt Smith em seu texto explora as relações entre os amplos programas de escalas de avaliação da alfabetização e a sala de aula baseada na avaliação, enfocando prioritariamente o professor. Apresenta dados de pesquisa realizada com professores da 1ª até a 7ª série que foram entrevistados sobre como viam o ensino de leitura com base na avaliação em sala de aula e o programa de avaliação governamental. Apontam vários pontos convergentes e concluem que há necessidade de aproveitar melhor as relações entre as avaliações. A autora destaca a necessidade de levar em consideração as observações feitas pelos docentes. Nola Alloway e Pam Gilbert analisam os dados da avaliação geral da leitura nas escolas da Austrália, conduzida por meio de teste sob a responsabilidade do governo e que constaram do Literacy Standards in Austrália. Fazem uma análise qualitativa tendo por base os resultados quantitativos obtidos. Concluem que os resultados descritivos embora úteis não permitem esclarecer muitos dos porquês que emergem de sua leitura. O acompanhamento de séries de testes mostram a necessidade dos responsáveis pesquisarem as causas do baixo desempenho sistemático em algumas regiões. Há necessidade de investimento nos docentes para mudar a realidade. Os professores devem cuidar tanto dos indicadores individuais como estarem atentos aos padrões esperados. O último trabalho é assinado por Marion Meiers e foi primeiramente apresentado em um evento sobre alfabetização sob a forma de conferência. A autora tenta traçar um mapa geral, com alguns poucos detalhes da educação australiana nos anos 90 do século XX. Lembra que o público passou a se interessar e a acompanhar a avaliação e os relatórios das avaliações feitas em termos nacionais e a tomar ciência das suas vantagens e limites. Inicialmente despontaram os professores como os principais personagens para em seguida serem destacados também o Estado, a mídia, os pais e os empregadores. O Estado como maior provedor de fundos para a escolarização deve estar profundamente envolvido com os objetivos e a natureza da alfabetização e do ensino da língua, fornecer os padrões (ou resultados esperados) a serem alcançados pelos alunos. Há necessidade de mudanças no setor público, na participação dos pais, nos resultados esperados e nas avaliações a serem feitas periodicamente. Embora o cenário educacional e cultural tratado no livro seja australiano, pode-se dizer que há muita informação que poderia ser útil quer aos pais, professores e administradores quer para romper a resistência à avaliação, especialmente as realizadas por pesquisadores e pelo governo no âmbito nacional de qualquer país. A despeito das limitações apresentadas o livro é uma leitura enriquecedora para quantos se preocupem com leitura, escrita e avaliação educacional.

 

Geraldina Porto Witter
UMC/PUC-Campinas