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Psicologia da Educação
versão impressa ISSN 1414-6975versão On-line ISSN 2175-3520
Psicol. educ. no.47 São Paulo jul./dez. 2018
https://doi.org/10.5935/2175-3520.20180012
ARTIGOS
Avaliação de desempenho escolar após exposição a um programa informatizado de leitura e escrita*
Evaluation of school performance after exposure to a computerized reading and writing program
Evaluación de rendimento escolar después de la exposición a un programa computarizado de lectura y escritura
Felipe Augusto Monteiro CravoI; Ana Cláudia Moreira Almeida-VerduII
IORCID: 0000-0002-5572-4239. Mestre em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem, Laboratório de Aprendizagem Desenvolvimento e Saúde Pós-Graduação Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Comportamento, Cognição e Ensino (INCT-ECCE). Apoio CAPES. felipemacravo@gmail. com
IIORCID: 0000-0001-5202-0263. Departamento de Psicologia, Laboratório de Aprendizagem Desenvolvimento e Saúde Pós-Graduação Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Comportamento, Cognição e Ensino (INCT-ECCE)
RESUMO
Esta pesquisa verificou os efeitos de um programa de ensino de leitura e escrita, o ALEPP® (Aprendendo a Ler e Escrever em Pequenos Passos)sobre o repertório acadêmico inicial de alunos de uma sala de recursos. Participaram 14 alunos de uma sala de recursos de escola pública, sendo 11 meninos e três meninas,com idade média de 10 anos e diferentes diagnósticos. Os alunos foram divididos em dois grupos (GM1 e GM2) de acordo com seus repertórios iniciais em leitura e escrita e expostos aos módulos de ensino específicos no ALEPP; GM1, com sete participantes, expostos ao ensino com palavras simples; GM2, com sete participantes, expostos ao ensino com palavras com complexidades ortográficas. O ALEPP é composto por passos que ensinam de três a quatro palavras por vez, por procedimentos que visam minimizar erros e que requerem precisão no desempenho para mudança de passo. Medidas de desempenho foram tomadas após a exposição a cada passo de ensino (internas ao ALEPP) e antes e após a intervenção pelo ALEPP pelo Teste de Desempenho Escolar (externas ao ALEPP). Os resultados demonstraram progressão nos passos do ALEPP, com baixo custo de resposta pelos participantes, e as medidas do desempenho pelo TDE indicaram diferença estatisticamente significativa sobre a melhora no repertório de leitura de ambos os grupos. O repertório de escrita melhorou, mas sem significância estatística. Discutem-se as vantagens do ALEPP em contextos aplicados, bem como modificações necessárias para estender os bons resultados em leitura para escrita.
Palavras-chave: leitura; escrita; educação especial; sala de recursos; avaliação.
ABSTRACT
This research verified the effects of a reading and writing teaching program, ALEPP® (Aprendendo a Ler e Escrever em Pequenos Passos; in English: "Learning to Read and Write in Small Steps") on the initial academic repertoire of students in multifunctional space. A total of 14 students participated from a public school multifunctional space, 11 boys and three girls, with an average age of 10 years and different diagnoses. The students were divided into two groups (GM1 and GM2) according to their initial repertoires in reading and writing and exposed to specific teaching modules of ALEPP; GM1, 7 participants, exposed to teaching with simple words; GM2, 7 participants, exposed to teaching with words with spelling complexities. ALEPP consists of steps that teach three to four words at a time, minimizing errors and requiring mastery of step change. Performance measures were taken after exposure to each step of teaching (internal to ALEPP) and before and after intervention by ALEPP measures by the School Performance Test (external to ALEPP). The results demonstrated progression in ALEPP steps by participants with low cost of response and performance measurements by TDE indicated a statistically significant difference on the improvement in the reading repertoire of both groups. The writing repertoire improved, but without statistical significance. The advantages of ALEPP in applied contexts is discussed, as well as the modifications necessary to extend the good results in reading for writing.
Keywords: reading; writing; remedial teaching; special education; evaluation.
RESUMEN
Este estudio examinó los efectos de un programa de enseñanza de la lectura y la escritura, ALEPP® (Aprender a Ler e Escrever em Pequenos Passos) en el repertorio académico inicial de los estudiantes en un salón de recursos. Se consideraron las medidas de rendimiento ofrecidas por el ALEPP y por la Prueba de Rendimiento Académico (TDE). 14 estudiantes asistieron a una sala de recursos de la escuela pública, 11 varones y tres mujeres, con edades entre los 10 años y los diferentes diagnósticos. Los estudiantes fueron divididos en dos grupos (GM1 y GM2) en función de sus repertorios iniciales en la lectura y escritura y se exponen a los módulos de enseñanza específica ALEPP; GM1, 7 participantes expuestos a la educación con palabras sencillas; GM2, 7 participantes expuestos a la enseñanza con complejidades en las palabras de ortografía. El ALEPP comprende las etapas de enseñanza de tres a cuatro palabras a la vez, para los procedimientos para minimizar los errores y requieren el dominio de cambio de paso. Las medidas de desempeño se tomaron después de la exposición a cada paso de enseñanza (internas al ALEPP) y antes y después de la intervención por el ALEPP por la Prueba de Desempeño Escolar (externas al ALEPP). Los resultados mostraron progresión en pasos ALEPP los participantes con un bajo costo de respuesta y las mediciones de rendimiento por el TDE indicaron una diferencia estadísticamente significativa en la mejora en la lectura de repertorio de ambos grupos. El repertorio de la escritura ha mejorado, pero no estadísticamente significativa. Se analizan las ventajas ALEPP, así como las modificaciones necesarias para extender los buenos resultados por escrito a la lectura.
Palavras clave: lectura; escritura; programa de enseñanza; sala de recursos; medidas de rendimiento.
Um componente do planejamento de ensino é avaliar se as condições ofertadas estão atendendo aos objetivos estabelecidos, modificando o desempenho dos alunos na direção especificada pelo educador (Zanotto, 2002; Skinner, 1972). Medidas de eficácia e de eficiência auxiliam esse processo de avaliação. Medidas de eficácia são aferidas continuamente sobre o desempenho de um indivíduo antes, durante e depois de uma intervenção (Leonardi & Mayer, 2016) e medidas de eficiência fornecem características complementares ao desempenho durante uma intervenção, tais como o tempo gasto pelo indivíduo, repetições necessárias para atingir o objetivo (Henklain, Carmo, & Lopes Jr, 2016).
Considerando a necessidade de medidas complementares à medida de eficácia na produção de conclusões mais acuradas sobre procedimentos de ensino (Henklain et al. , 2016), medidas de generalização (de extensão dos resultados obtidos para situações similares, mas não treinadas diretamente), aliadas às medidas sobre o custo de resposta para avançar nos passos de um currículo de ensino,podem ser tomadas como indicativas da eficiência do procedimento de ensino.
Este estudo investigou a eficácia e a eficiência de um programa informatizado para o ensino de leitura e de escrita a alunos que frequentavam uma sala de recursos multifuncional de escola pública. Os resultados foram avaliados por meio de medidas internas (testes do programa) e externas, neste caso utilizando-se o Teste de Desempenho Escolar - TDE (Stein, 1994). A criação de salas de recursos tem sido uma proposta de dirimir a baixa qualidade em desempenhos acadêmicos de alunos que apresentem necessidades educacionais especiais advindas de deficiências (físicas, sensoriais, mentais e intelectuais),
Adotou-se nesta pesquisa o paradigma de relações de equivalência, proposto por Sidman (1971) e cujas propriedades foram descritas por Sidman e Tailby (1982). O experimento clássico de Sidman (1971) consistiu em ensinar leitura a um adolescente de 17 anos com deficiência intelectual severa, que sabia relacionar palavras ditadas a figuras e nomear as mesmas figuras. Sidman ensinou-o a selecionar palavras impressas quando estas eram ditadas. Após o ensino verificou-se que o rapaz não só conseguiu selecionar as palavras impressas diante das figuras e vice-versa, mas também conseguiu ler oralmente as palavras impressas. Esse estudo foi base para a proposição de um modelo de descrição do comportamento simbólico, permitindo descrever sob quais condições estímulos, previamente considerados neutros (por exemplo, "vogel" uma palavra em alemão), passam a adquirir função simbólica (por exemplo, quando "vogel" passa a ser relacionada a um estímulo cujo significado já é conhecido, pássaro, em português).
Uma característica fundamental de instruções baseadas em equivalência - do inglês Equivalence Based Instruction - EBI (Fienup, Covey, & Critchfield, 2010) - é o ensino de relações condicionais entre estímulos de conjuntos distintos e que essas relações ensinadas tenham um nódulo em comum(por exemplo, se forem ensinadas as relações palavra ditada-figura e palavra ditada-palavra impressa, espera-se que as relações palavra impressa - figura e vice-versa sejam aprendidas, sem terem sido diretamente ensinadas). Considerando que o paradigma permite o estudo de relações entre estímulos e entre estímulos e respostas (Sidman, 2000), espera-se também a produção oral diante da palavra impressa, ou seja, a leitura da palavra.
Um dos procedimentos de ensino de relações é o emparelhamento de acordo com o modelo, no qual há um estímulo modelo e, no mínimo, dois estímulos de comparação. Por exemplo, apresenta-se uma palavra ditada (/bola/) e o aprendiz seleciona uma palavra impressa (BOLA) e não outra (MATO) (Saunders & Green, 1999; Mackay, Wilkinson, Farrell, & Serna, 2011).
Tomando como base o paradigma das relações de equivalência para o ensino de leitura e escrita generalizada (ler novas palavras derivadas das ensinadas), outro aspecto a ser considerado é a capacidade de segmentar uma palavra e recombinar suas unidades gerando uma nova palavra (Bernadino Jr, Freitas, de Souza, Maranhe & Bandini, 2006; Hanna et al. , 2010). Dessa forma, adicionalmente ao ensino das relações entre palavra ditada, figura e palavra escrita, pode-se ensinar o indivíduo a identificar unidades menores da palavra. Para tanto, um procedimento utilizado é o emparelhamento de acordo com o modelo com resposta de construção das palavras a partir da seleção de letras ou silabas. Por exemplo, a palavra ditada /bola/ é apresentada para que o aprendiz selecione, num conjunto de sílabas, algumas e em determinada ordem (BO-LA), mas não outras (VE-LA) (Hanna, Karino, Araújo, & de Souza, 2010; Mackay, 1985). Com a aprendizagem desses repertórios, pode-se ampliar o número dos estímulos de cada conjunto, bem como o número de conjuntos, ampliando-se o repertório de leitura.
Um dos programas de ensino de leitura e escrita baseado em equivalência é o Aprendendo a Ler e Escrever em Pequenos Passos - ALEPP® (Orlando, de Souza, Souza, Pimentel, Teixeira, de Rose, Golfeto, Hanna, & Marques, 2016). Esse programa é dividido em três módulos que são organizados em passos e blocos de ensino, os quais apresentam tentativas discretas com múltiplas tarefas: seleção da palavra impressa diante do ditado da mesma, seleção de figuras diante de ditado, construção de palavras a partir de ditado (escrita por seleção de caracteres). Note que a palavra ditada funciona como nódulo comum que permite avaliar tarefas que envolvem relações que não foram diretamente ensinadas, como seleção de figuras diante de palavra impressa e vice-versa; os estímulos são conhecidos, mas a relação entre eles não. Também permite avaliar se os estímulos que controlavam as respostas de nomeação de figuras (frequentemente já estabelecida em ouvintes)passam a controlar a resposta de leitura de palavras.
O módulo 1 do ALEPP ensina 60 palavras simples do tipo CVCV (consoante-vogal); o módulo 2 ensina de 160 palavras com complexidades ortográficas (ch, lh, nh, ç, ge/gi, ce/ci e l, s, n, r entre vogal e consoante), e o último módulo ensina sentenças baseadas em livro de histórias infantis (de Souza & de Rose, 2006; Reis, de Souza, & de Rose, 2009).
As atividades de ensino são planejadas de modo que um conjunto de tarefas (de emparelhamento com o modelo e de emparelhamento com construção de resposta) formam um bloco. Vários blocos de ensino formam um passo, no qual o aprendiz aprende relações condicionais envolvendo três (módulo 1) ou quatro palavras (módulo 2). Um conjunto de passos forma uma unidade de ensino.
As tarefas são configuradas para avançar de acordo com os acertos dos aprendizes. Em cada tarefa de ensino, os aprendizes recebem consequências diferenciais para seus acertos ou erros,porém nos testes não.
O ALEPP tem produzido mudanças significativas em repertórios de leitura de aprendizes com diferentes participantes, em contexto de laboratório, havendo estudos com pessoas com deficiência auditiva (Lucchesi, Almeida-Verdu, Buffa, & Bevilacqua, 2015), Síndrome de Asperger (Carvalho, 2013),adultos iletrados (Bandini, Bandini, Sella, & de Souza, 2014), crianças com dificuldades de aprendizagem (Felippe, Roca, Postalli, & Domeniconi, 2011). Pesquisas mais recentes têm verificado o potencial de aplicação do ALEPP por pais e professores (Calcagno, Barros, & de Souza, 2016;Benitez, & Domeniconi, 2012) e em sala de recursos (Fava-Menzori, Lucchesi, & Almeida-Verdu, 2018; Tizo, 2016).
As medidas de eficácia do ALEPP são internas e tomadas ao final de cada passo de ensino com a finalidade de verificar a retenção das palavras aprendidas; há outras medidas como pré e pós-testes,que intercalam as unidades de ensino. O que se propõe nesse trabalho é que medidas externas sejam tomadas como, por exemplo,a resposta a testes padronizados, visando verificar as extensões do programa e sua eficiência.
Uma possível medida complementar sobre a eficiência do ensino por meio do ALEPP pode ser o Teste de Desempenho Escolar -TDE (Stein, 1994). O TDE é único instrumento psicométrico brasileiro validado, e cujo uso não é de domínio somente de psicólogo;tem o objetivo de aferir objetivamente o desempenho de escolares em três habilidades básicas: leitura, escrita e aritmética (Knijnik, Giacomoni, & Stein, 2013). O instrumento é validado para aplicação individual em crianças de ambos os sexos cursando entre a 1ª e a 6ª série (ou seus respectivos anos de acordo com a nova organização curricular) do ensino fundamental e é constituído por três subtestes: Escrita com 34 palavras simples e com complexidades ortográficas que são lidas isoladamente pelo experimentador e, depois,contextualizadas para então ser escrita pela criança; Leitura com 70 palavras com e sem complexidades ortográficas, apresentadas em uma ficha que deve ser lida pela criança; Aritméticacom35 problemas envolvendo sentenças e operações de resolução oral ou escrita (Knijinik, Giacomoni, Zanon, & Stein, 2014).
O TDE não sofreu nenhuma alteração em seu sistema de análise dos escores, conteúdo e organização dos subtestes, e uma revisão de literatura realizada por Knijinik et al. (2013) identificou um número expressivo de publicações científicas, nacionais e internacionais, que utilizam o TDE para avaliação do desempenho escolar de crianças atendendo, até o momento, ao que se espera dele em termos de propriedades psicométricas.
Machado e Almeida (2013) utilizaram o TDE como um dos instrumentos para avaliar a necessidade de encaminhamento a intervenções especializadas de crianças com dificuldade de aprendizagem. Prates, de Lima e Ciasca (2016) por meio do TDE encontraram correlação estatística significativa entre as estratégias de aprendizagem utilizadas por alunos e seus respectivos desempenhos escolares obtidos no teste, indicando a possibilidade de utilização do instrumento na identificação das características de aprendizagem de crianças. De Novaes, Mashima e dos Santos (2013) utilizaram o TDE, junto a dois outros instrumentos, para verificar o efeito de um treino específico sobre consciência fonológica de crianças em processo de alfabetização, o instrumento mostrou-se sensível a mudanças no repertório das crianças com medidas pré e pós treino. Sumariando, o TDE tem sido um instrumento adotado não só como medida de caracterização inicial de repertórios acadêmico, mas também para verificar aprendizagem depois que estratégias de ensino específicas foram adotadas, podendo se constituir em uma medida de validade externa.
Considerando o ALEPP como um programa de ensino cuja efetividade tem sido demonstrada em diferentes populações em situações controladas e a carência de estudos em situações aplicadas, o presente estudo objetivou verificar a eficácia do ALEPP no ensino de leitura e escrita, em contexto de sala de recursos. Adicionalmente utilizou-se o TDE como instrumento de verificação de validade de externa. Este estudo também objetivou verificar se houve mudança estatisticamente significativa nos escores brutos do Teste de Desempenho Escolar aferidos antes e depois da exposição ao ALEPP.
MÉTODO
Este trabalho foi autorizado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências da Universidade Estadual Paulista, Processo nº 13653/46/01/12.
Participantes
Participaram da pesquisa 14 alunos matriculados no ensino regular de uma escola pública do interior do Estado de São Paulo, dentre eles 11 do sexo masculino e três do feminino, com idade média de 10 anos. Os participantes frequentavam a sala de recursos da escola por não terem aprendido leitura sob as condições regulares.
Esses alunos foram encaminhados à sala de recursos após avaliação especializada externa à escola, que identificou dificuldades específicas de aprendizagem. Os 14 participantes foram avaliados por um programa que avalia a rede de relações envolvidas em leitura e escrita (ARLE) e pelo TDE e divididos em dois grupos, de acordo com o desempenho inicial e conforme os módulos de ensino do ALEPP, 1 ou 2.
Dentre os alunos,sete compuseram o Grupo Módulo 1 (GM1), sendo eles Der, Lea, Mat, Gus, Luc, Jés e Kés, e sete alunos o Grupo Módulo 2 (GM2), Gui, Van, Al, Ali, Gab, Jes e Ju. Garantiu-se relativa homogeneidade intra-grupo e heterogeneidade entre os grupos, de acordo com suas habilidades iniciais.
Local
As intervenções bem como as avaliações aconteciam individualmente na sala de recursos da escola.
Material
O ALEPP é acessível por meio da plataforma GEIC (Gerenciador de ensino Individualizado por Computador) cuja manutenção é uma parceria entre o LECH (Laboratório de Estudos do Comportamento Humano) e do LINCE (Laboratório de Inovação em Computação e Engenharia), ambos sediados na UFSCar.
Os estímulos do módulo 1 são palavras simples (ex. boca, mato, vela, cabide, dentre outras) sendo três palavras por passo de ensino, totalizando 12 palavras por unidade.
No módulo 2, os estímulos são palavras com complexidades ortográficas (ex. bolha, paçoca, girafa, cinema, pinha, dentre outras), sendo uma dificuldade ortográfica por unidade de ensino, quatro palavras por passo, totalizando 16 palavras por unidade.
Os módulos têm em comum a organização por passos de ensino; cada passo ensinou três palavras no módulo 1 e quatro palavras de um mesmo grupo de complexidades ortográficas no módulo 2. No módulo 1, com 17 passos (quatro por unidade, exceto unidade 1 que tem cinco passos). O módulo 2 é composto por 40 passos sendo quatro passos por unidade; cada unidade ensina 16 palavras com complexidade ortográfica.
Teste de Desempenho Escolar - TDE - é um instrumento impresso no qual a criança em avaliação deve transcrever o ditado do avaliador (subteste de ditado), responder as perguntas de aritmética e resolver operações (subteste de aritmética), e ler uma lista de palavras (subteste de escrita). Seus escores podem ser lidos no geral, por uma média em todas as tarefas, ou em cada uma delas separadamente (Stein, 1994).
Avaliação da Rede de Leitura e Escrita - ARLE - é um instrumento que avalia todas as relações entre estímulos (palavra ditada e palavra impressa; palavra impressa e figura; palavra ditada de figura; dentre outras) e entre estímulos e respostas (palavra impressa e leitura desta; palavra ditada e escrita por composição desta; dentre outras) referentes à leitura e escrita de uma amostradas palavras de ensino. Também está sediado na plataforma GEIC (Gerenciador de Ensino Individualizado por Computador).
Procedimento
No início do ano letivo o repertório de leitura e escrita dos alunos foram avaliados pelo TDE e pela ARLE, esta realizada com a finalidade de conhecer quais relações envolvidas nos repertórios de leitura e escrita estavam bem estabelecidas e quais necessitavam ser ensinadas.
Resultados inferiores a 80% de acertos em leitura e em escrita geravam encaminhamento dos alunos ao módulo 1 (palavras sem dificuldades ortográficas); resultados superiores a 80% na ARLE gerava um encaminhamento para o módulo 2 (palavras com dificuldades ortográficas).
As atividades aconteciam na sala de recursos, durante o período de atendimento da criança na escola. Cada criança, individualmente, sentava-se em uma cadeira em frente a um computador conectado à rede de internet da escola. Utilizava-se um fone de ouvido para abafar os ruídos externos e garantir que a criança ouvisse as palavras ditadas pelo programa, um mouse para que a mesma selecionasse os estímulos que cada tentativa propunha, selecionando palavras ou compondo a partir da seleção de sílabas ou letras e o teclado no qual o aplicador faria observações e transcreveria a fala da criança em atividades de leitura de palavras e nomeação de figuras.
Após a avaliação do repertório inicial os participantes foram expostos aos módulo1 ou módulo 2 do ALEPP. No módulo 1, ensina-se a seleção de palavras impressas diante de palavras ditadas e de sílabas impressas condicionadas às sílabas ditada sem determinada ordem; nas tarefas de seleção de palavras, no rol de escolha havia sempre palavras com diferenças múltiplas, entre si. No módulo 2, nas relações entre palavra ditada e palavra impressa,no rol de escolhas as palavras eram com diferenças múltiplas (ex. poço, vela e mato) e com diferenças críticas (ex. poço, poça e pouco). Ao final de cada passo de ensino uma avaliação da aprendizagem era realizada; no caso de obter 100% de acertos, o aluno era exposto ao próximo passo do ensino. No caso de o aluno não atingir o critério (100% de acertos) o mesmo passo de ensino era repetido.
A avaliação com o TDE foi refeita ao final do ano, independente da unidade ou passo em que o aluno se encontrasse no ALEPP.
Ao final das sessões pequenas conversas, jogos e pinturas eram realizadas. Durante a semana cada participante era exposto ao ALEPP no mínimo duas vezes, e cada sessão tinha entre 30 e 40 minutos de duração.
Procedimento de análise dos resultados
A progressão individual dos alunos nas atividades de cada módulo foi analisada com base na quantidade de repetições necessárias aos passos de ensino do ALEPP para atingir o critério de precisão.
Calcularam-se os escores brutos dos participantes no TDE, antes e após a exposição às tarefas de ensino propostas pelo ALEPP, independente do passo de ensino que o aluno estava; o critério para obtenção dessa medida foi o final do ano letivo. Os resultados iniciais e finais dos três subtestes do TDE foram tabulados e analisados estatisticamente. Os resultados nos subtestes de leitura e escrita se apresentam como uma medida do efeito do procedimento de ensino sobre tais repertórios. A análise recaiu sobre esses resultados. O subteste aritmética também foi tabulado e atuou nos resultados como um subteste controle, pois não houve intervenção para o conteúdo de aritmética. Utilizou-se o teste estatístico para amostras sem normalidade Wilcoxon para verificar se houve diferença estatisticamente significativa entre os resultados obtidos nos pré e pós-testes, considerando o nível de significância de 5% (p=0. 05). Os testes estatísticos foram trabalhados com o software BioEstat 5. 3.
RESULTADOS
A Figura 1 apresenta a frequência acumulada da exposição dos participantes do GM 1 (painel superior) e do GM2 (painel inferior) aos passos de seus respectivos módulos de ensino. Observa-se na figura uma linha de resultado ótimo (linha tracejada) que representa a passagem sem erros de um passo ao outro.
Resultados que se aproximem desta linha representam pouco custo de resposta pelos participantes como Der, Lea, Jes, Kes e Luc (GM1) e Gab, Al, Van e Ju (GM2) na progressão dos passos de ensino. Já os resultados que se distanciam dessa linha em direção ao eixo y, representam maior custo de resposta dos participantes como Mat e Gus (GM1) e Ali e Jes (GM2).
Dos participantes que apresentaram alto custo de resposta, Gus apresentou muitas repetições nos passos de ensino 3, 4 e 5 da Unidade 1 e concluiu essa unidade com 20 exposições aos passos de ensino. No GM2, Jes e Ali concluíram quatro passos de ensino da Unidade 1, necessitando de 15 e 17 exposições aos passos de ensino, respectivamente. Somente o participante Ju foi exposto às nove unidades de ensino do Módulo 2. A maior repetição de passos de ensino foi nas Unidades 1 e 2, nas quais se observa a aceleração positiva da curva. Nas unidades 3 e 4 o desempenho de Ju segue paralelo à linha de desempenho ótimo. A aceleração negativa observada nas unidades 5 e 6 refere-se aos passos de ensino que o participante não foi exposto, pois testes específicos revelaram que esse repertório já estava bem estabelecido. A partir da unidade 7 o desempenho do participante volta a seguir paralelo à linha de resultado ótimo, demonstrando baixo custo de resposta para progredir no ensino.
Ainda como medida interna do ALEPP, verificou-se que, à exceção de Mat e Gus, que não foram expostos aos pós-testes de unidade em função de suas dificuldades durante o ensino, os demais participantes demonstraram a leitura generalizada, isto é, passaram a ler a maior parte das palavras não ensinadas diretamente (ex. bolota ou tulipa), mas que eram derivadas da recombinação de unidades silábicas ensinadas (ex. bolo, pato, tatu). Para o GM2 também foi registrada a leitura generalizada em palavras com dificuldades ortográficas.
A Tabela 1 apresenta os resultados de Escore Bruto do Teste de Desempenho Escolar (Stein, 1994) antes e depois dos participantes passarem pelo ensino. De maneira geral, para a quase totalidade dos participantes (Mat e Gus do GM1 são exceções), os escores brutos nos subtestes de leitura e de escrita são superiores nos pós-testes quando comparados aos pré-testes. No entanto, essa diferença somente foi estatisticamente significativa (valores de P < 0,05) no subteste de leitura para o GM1 (T = 0; p = 0. 01) e para o GM2(T =0; p = 0. 009).
Em escrita, os escores de ambos os grupos apresentaram aumento, porém sem significância estatística para o GM1 (T = 0; p = 0. 05) e para o GM2 (T = 5; p = 0. 05). Nos escores de aritmética não se verificou melhora os valores obtidos para o GM1 (T = 6; p = 0. 14) e para o GM2 (T = 8; p =0. 13) não demonstraram significância estatística.
DISCUSSÃO
Os resultados apresentados na Figura 1 apontam a eficácia do ALEPP aferido por seus testes internos. Uma vez que o ALEPP foi planejado para produzir uma aprendizagem minimizando erros, 11 alunos apresentaram desempenho satisfatório, isto é, ainda que tenham necessitado mais que uma exposição aos passos de ensino até obter 100% de acertos nas palavras do passo e avançar para o próximo, esse resultado foi obtido com duas a três exposições. Esse resultado assemelha-se aos já obtidos por Fava-Menzori, Lucchesi e Almeida-Verdu (2018) em que foram observadas repetidas exposições aos passos de ensino até a aprendizagem de um conjunto de palavras do módulo 1 do ALEPP em alunos de sala de recursos, replicando-os e estendendo-os para palavras do módulo 2, com palavras de maior complexidade.
Outra característica importante do ALEPP pode ser verificada na Figura 2 sobre a variabilidade do repertório de entrada de cada participante. Cada criança apresentou pontuação de escore bruto (conhecimentos prévios) diferentes nos subtestes do TDE. Essa diversidade entre os repertórios de entrada dos alunos implica a elaboração de currículos individuais. A mudança dos escores brutos nos subtestes de leitura e de escrita demonstrou potencial do ALEPP como tecnologias de ensino individualizada e baseada no modelo das relações de equivalência (Fienup, Covey, & Critchfield, 2010).
Considerando especificamente o TDE como medida externa dos efeitos do ALEPP, os escores brutos revelaram significância estatística somente nos subtestes de leitura. Considerando que as palavras do TDE não são as mesmas palavras adotadas durante o ensino pelo ALEPP, resultados positivos no TDE fornecem uma medida de generalização. A significância estatística no subteste de leitura no TDE pode ser explicada pela configuração dos procedimentos de ensino dos passos do ALEPP que favorecem o aprendizado por unidades menores que a palavra, promovendo segmentação e recombinação de sílabas e letras, favorecendo leitura de palavras não ensinadas diretamente. Esse potencial gerativo da programação de ensino já foi descrito e demonstrado por outros pesquisadores (Hannaet al. 2010; de Rose, 2005; de Souza & de Rose, 2006).
No que concerne as habilidades de escrita, contudo não houve aumentos estatisticamente significativos neste repertório e esse aspecto merece uma discussão mais detalhada em termos das variáveis de controle e topografias de respostas exigidas nas tarefas do ALEPP e do TDE. Enquanto no ALEPP as respostas são de seleção (tarefas de emparelhamento com o modelo) e de construção (seleção de sílabas em determinada ordem), ambas com o uso do mouse, no TDE a resposta de escrita é a manuscrita. A escrita cursiva requer um conjunto de habilidades complexas desde organização espacial, conhecimento sobre a sequência em que as letras serão grafadas, lembrar da topografia das letras, lembrar da relação sílaba e fonema (de Rose, 2005; Stevenson & Just, 2014). As tarefas de construção de palavras proposta pelo ALEPP guardam pouca similaridade com uma tarefa de escrita cotidiana. Desta forma, nas tarefas de ditado, pode não haver transferência de controle de estímulos entre construir palavras a partir de sílabas já dispostas na tela do computador como proposta pelo ALEPP para a escrita cursiva, somente a partir da palavra ditada tal como exigida pelo TDE. Futuras pesquisas poderiam manipular a quantidade de tarefas de ditado e cópia manuscrita no ALEPP para verificar as extensões que tais treinos podem obter para a escrita cursiva dos alunos aferidas pelo TDE. O ALEPP não expôs os participantes ao ensino de mátematica, portanto a manutenção de baixos escores nos pós-testes era previsível e funcionam aqui como um conjunto controle, pois por não haver intervenção direta sobre tal repertório não ocorreu nenhum tipo de mudança.
Um dos limites do presente estudo foia falta de um grupo controle. Futuras investigações podem ampliar o número de participantes, bem como contrastar os resultados dos alunos submetidos à intervenção com os de um grupo controle que não receberiam a intervenção pelo ALEPP, excluindo-se a possibilidade do ganho no repertório final do aluno ter advindo da escolarização regular. Outros controles poderiam ser realizados como com alunos regulares sem dificuldades de aprendizagem ou de alunos com deficiências, público-alvo do Atendimento Educacional Especializado, verificando se o TDE é competente na avaliação da efetividade das atividades do ALEPP como procedimento de ensino.
Pesquisas sobre a aplicabilidade de tecnologias educacionais em contextos pouco controlados, como salas de aula e salas de recursos, favorecem a expansão dos conhecimentos científicos que visam auxiliar e melhorar relações sociais complexas, como as presentes na educação. Este estudo, aliado a outros como Tizo (2016), Calcagno et al. (2016), Fava-Menzori, Lucchesi e Almeida-Verdu (2018), Reis et al. (2009), Fernandeze Moroz (2011) colocam o ALEPP como um exemplo bem-sucedido de aplicação tecnológica e extensão dos efeitos do paradigma das relações de equivalência à educação, como proposto por Stoddard, Mackay e Strommer (1992). Diferentemente dos estudos anteriores, demonstra que os efeitos do ensino de leitura pelo ALEPP podem ser aferidos por medidas externas, no caso, o TDE.
REFERÊNCIAS
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* A pesquisa foi desenvolvida no Laboratório de Aprendizagem Desenvolvimento e Saúde (UNESP), que faz parte do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia sobre Comportamento, Cognição e Ensino, com recursos da FAPESP (Processo 2014/50909-8) e do CNPq (Processo No. 465686/2014-1).