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Construção psicopedagógica
versão impressa ISSN 1415-6954
Constr. psicopedag. vol.22 no.23 São Paulo 2014
Linguística e psicopedagogia: contribuições para uma prática não medicalizante
Language and psicopedagogy: contributions to a practice not medicalized
Laura Mullera
Campinas - SP - Brasil
RESUMO
Este artigo busca trazer contribuições da Linguística para o campo da Psicopedagogia no que tange à concepção de linguagem e do processo de aquisição e uso da leitura e escrita, tendo como objetivo orientar uma prática psicopedagógica não medicalizante. Para isso é traçada a crítica à concepção de linguagem presente na definição, diagnóstico e tratamento de Dislexia. Ao mesmo tempo, é proposto, através da análise de dados de leitura e escrita de duas crianças que receberam um diagnóstico equivocado de Dislexia, a descaracterização do que foi interpretado erroneamente como sintoma de patologia a partir de um aporte teórico e metodológico do campo da Linguística.
Palavras-chave: Psicopedagogia, Linguística, Concepção de linguagem, Dislexia, Medicalização.
ABSTRACT
This article seeks to bring contributions of linguistics to the field of Psychopedagogy regarding the conception of language and the process of acquisition and use of reading and writing, aiming to guide a psychopedagogical practice not medicalized. For it, is drawn a critique of the conception of language in the definition, diagnosis and treatment of dyslexia. At the same time, is proposed, by analyzing reading and writing data of two children who have received a misdiagnosis, the mischaracterization of what was misinterpreted as a symptom of pathology from a theoretical and methodological framework of the field of linguistics.
Keywords: Psychopedagogy, Linguistics, Language comprehension, Dyslexia, Medicalization.
Introdução
Este artigo1 pretende discutir algumas possíveis contribuições da ciência Linguística para o campo da Psicopedagogia, principalmente em relação ao debate sobre as concepções de linguagem e do processo de aquisição e uso da leitura e da escrita que orientam práticas medicalizantes como as presentes na definição, diagnóstico e tratamento da Dislexia Específica de Desenvolvimento.
A relevância desta discussão se dá pelo fato de que assumir uma concepção de linguagem implica em várias formas de intervenções psicopedagógicas. Intervenções essas que podem levar a atitudes medicalizantes ou não. Concepções da linguagem enquanto um código, a-histórico, utilizada por sujeitos idealizados como seus meros reprodutores e depositada em um cérebro também idealizado e dividido em áreas específicas que não se articulam para a realização de uma função, estão por detrás de uma série de testes, diagnósticos e práticas da clínica e da escola. É contra essa concepção equivocada de linguagem que este artigo utiliza do aporte teórico da Linguística, em especial do campo teórico e metodológico da Neurolinguística Discursiva (abreviada como ND) para apresentar conceitos dessa área do conhecimento que podem contribuir para uma intervenção psicopedagógica não medicalizante.
Vivemos, atualmente, em um momento em que há um crescente processo de naturalização e ocultamento de problemas sociais que transferidos para os corpos dos sujeitos são transformados em problemas médicos (MOYSÉS & COLLARES, 2009). Esse processo tem sido nomeado criticamente como "processo de medicalização" que é definido como:
Consiste em definir um problema em termos médicos, usando linguagem médica para descrevê-lo, adotando um quadro médico para compreendê-lo, ou ainda usando uma intervenção médica para tratá-lo. Trata-se de um processo sócio-cultural que pode ou não envolver a medicina como profissão, levando a um controle social ou a um tratamento médico, ou ainda ser resultado da expansão intencional da profissão médica (CONRAD, 1992, p.211)
Nesse sentido, temos visto crescentemente que questões próprias do processo de aquisição e uso da leitura e da escrita, envolvendo a escola, a família e a sociedade como um todo, têm se tornado um problema médico, tendo como principal representante a Dislexia. O diagnóstico e tratamento não se restringem à medicina como profissão, mas têm incorporado uma série de profissionais como fonoaudiólogos, psicólogos, neuropsicólogos, psicopedagogos. Há também, pela crescente divulgação na mídia da Dislexia, crianças e jovens que têm sido "diagnosticadas" pelos familiares e professores. Essa tendência de medicalizar o processo de aquisição da escrita tem se expandido muito. Exemplo disso é a incidência do transtorno: de acordo com órgãos oficiais como a Associação Brasileira de Dislexia, entre 5% e 17% da população mundial2 seria composta por indivíduos disléxicos, número bastante expressivo para uma patologia. Considerar que em uma sala de aula de quarenta alunos, pelo menos duas crianças apresentam um transtorno na leitura e na escrita é alarmante, e tem repercutido em diversos segmentos da sociedade: politicamente, vários projetos de lei que obrigariam as escolas a oferecerem atendimentos específicos para os diagnosticados com Dislexia têm sido propostos em todo o país. Economicamente, diversos profissionais como médicos, fonoaudiólogos, psicopedagogos e psicólogos têm se beneficiado com esse novo público. Socialmente, a família e as escolas passam a atribuir ao biológico a razão pelo fracasso no processo de ensino-aprendizagem, isentando-se da responsabilidade (MOYSÉS E COLLARES, 1992).
Em contraposição a esse quadro se situa a ND praticada no IEL (Instituto de Estudos da Linguagem), que tem se posicionado contra essa tendência hegemônica de medicalizar crianças/jovens normais (COUDRY, 1987, 2007; 2010), tanto em suas pesquisas quanto na intervenção junto aos sujeitos que apresentam dificuldades de leitura e escrita e foram diagnosticados com Dislexia, TDAH, Distúrbio de Aprendizagem e/ou Alteração do Processamento Auditivo. A teorização sobre esse tema bem como seu enfrentamento metodológico têm sido realizado no CCazinho3. Nesse Centro, busca-se que os sujeitos, através da interlocução com o outro e com o universo da escrita, possam: compreender e verbalizar seus processos de leitura e escrita, construir, averiguar e reformular hipóteses de escrita e, fundamentalmente, aprender a escrever com sentido e ler com compreensão (FREUD, 1891). Tais possibilidades transformam o processo e o uso da leitura e da escrita em uma prática social que identifica a criança/jovem com um conjunto de outros falantes e com a sociedade em que vive. No trabalho com a linguagem (envolvendo fala, leitura e escrita) realizado no CCazinho, em conjunto com as famílias e a escola, o diagnóstico recebido pela criança não se confirma e o problema de leitura e escrita, antes circunscrito no corpo do sujeito, passa a revelar problemas na escola e na família, antes encobertos por uma suposta patologia (BORDIN, 2009).
Nesse contexto, este artigo procura articular conceitos da Linguística, especialmente da Neurolinguística Discursiva, para criticar a concepção de linguagem da Dislexia e, ao mesmo tempo, propor uma outra concepção de linguagem. Além de, através da análise de dados de leitura e escrita de crianças e jovens, dar visibilidade ao que os estudos linguísticos podem dizer sobre o processo de aquisição da escrita, descaracterizando o que é tido como patológico por concepções reducionistas de linguagem.
Para isso, é abordado os pressupostos teóricos e metodológicos da Neurolinguística Discursiva, sua concepção de sujeito, linguagem, cérebro/mente e a metodologia de pesquisa. Em seguida, inicia-se a discussão da leitura e da escrita propriamente ditas, analisando-se criticamente a concepção de leitura e escrita que pode ser apreendida das definições de Dislexia e a contrapondo com uma concepção de leitura e escrita, desenvolvida pela ND e pelo campo da aquisição da linguagem, que nos possibilita entender as hipóteses de leitura e escrita produzidas pelos sujeitos diagnosticados com Dislexia. Dessa forma, descaracteriza-se o que foi interpretado, na leitura e na escrita, como sintoma de patologia, conforme tem sido proposto pela ND (COUDRY, 1987, 2007, 2009, 2010). Essa discussão é centrada na análise de dados de leitura e escrita, produzidos em acompanhamento longitudinal de crianças e jovens diagnosticados com Dislexia.
Concepção de linguagem
A concepção de linguagem que será aqui discutida é a da Neurolinguística Discursiva fundada e praticada no Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp. Ela inicia sua história a partir da tese de Doutorado de Coudry (1987): Diário de Narciso: discurso e afasia em que é proposta uma crítica a visão a-teórica e a-histórica de concepções de linguagem fundamentadas na noção de código, majoritárias nas práticas de avaliação e acompanhamento de sujeitos afásicos4 até os dias de hoje. Introduz-se também a prática discursiva, na avaliação e acompanhamento longitudinal de sujeitos afásicos, com base em vários domínios da Linguística
Posteriormente, estes procedimentos feitos pela ND foram transpostos para o acompanhamento de crianças e jovens diagnosticados com TDAH - Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade, Dislexia, Alteração no Processamento Auditivo, Distúrbio de Aprendizagem, etc. Já que, tanto na afasia quanto nas patologias relacionadas à aprendizagem os sujeitos são avaliados pela mesma concepção de linguagem pautada na noção de código. A Dislexia Específica de Desenvolvimento5 é um exemplo claro disso, pois surgiu justamente de um desdobramento de casos de afasia pela transposição de um raciocínio clínico tradicional: "se A causa B, B só pode ser causado por A" (MOYSÉS &COLLARES, 1992, p.33). Logo, se uma lesão neurológica pode causar comprometimentos na leitura e na escrita, crianças que apresentam dificuldades na sua aprendizagem, possuem, conforme o momento da história da dislexia, ou uma lesão, ou uma disfunção, ou um transtorno, neurológico (MOYSÉS &COLLARES, 1992).
Outra aproximação possível entre o trabalho com afásicos e crianças/jovens em processo de aquisição da escrita (com ou sem diagnóstico), feita pela ND, reside na própria forma de conceber a reconstrução de aspectos da linguagem alterados e da aprendizagem da leitura e da escrita. Em ambos os casos a interlocução detêm o papel fundamental, pois é na atividade efetiva da linguagem que os sujeitos constroem conjuntamente o sentido do que dizem e/ou escrevem. Na aquisição da escrita o outro mais experiente, representado por mim nos acompanhamentos longitudinais, é o mediador entre o sujeito que aprende e o universo da leitura e escrita (Vygotsky, 1934). Como resultado deste trabalho conjunto, são construídos os sentidos e as relações entre a fala, a leitura e a escrita. Assim, tanto a avaliação, o acompanhamento longitudinal e a análise de dados, levam em conta a interlocução:
as relações que nela se estabelecem entre sujeitos falantes de uma língua, dependentes das histórias particulares de cada um; as condições em que se dão a produção e interpretação do que se diz; as circunstâncias histórico-culturais que condicionam o conhecimento compartilhado e o jogo de imagens que se estabelece entre interlocutores (COUDRY & FREIRE, 2011, p. 23-24)
Sinteticamente, a ND fundamenta-se em quatro pilares: uma concepção de linguagem abrangente/pública e uma concepção de sujeito histórico, não idealizado, constituído na e pela linguagem, baseada em Franchi (1977);uma concepção histórica e funcional de cérebro formulada por Vygotsky (1926; 1934), Luria (1979) e Freud (1891) e, por fim, uma metodologia heurística ancorada no conceito de dado-achado, proposta por Coudry (1996), compatível com o Paradigma Indiciário proposto por Ginzburg (1989) e introduzido por Abaurre et. alli. (1997) nas pesquisas sobre aquisição da escrita. Sujeito, língua e cérebro são entendidos como construtos humanos socioculturais.
Concepção de leitura e escrita na literatura médica.
São diversas as definições de Dislexia e não é foco deste artigo descrevê-las minuciosamente, por isso, foi escolhida, como representativa, a definição da Associação Brasileira de Dislexia (ABD) pela sua importância em âmbito nacional, já que essa associação é responsável por diversas publicações na área, organiza congressos, oferece cursos e, prioritariamente, realiza e emite diagnósticos. Politicamente, milita pela criação de leis que protejam os diagnosticados com Dislexia e mantém vínculos com outras importantes associações internacionais, principalmente americanas e inglesas, que promovem pesquisas na área.
Assim é definida a Dislexia pela ABD:
A DISLEXIA pode se apresentar quando uma criança saudável, inteligente, com estímulos sócio culturais adequados e sem problemas de ordem sensorial ou emocional, tem uma dificuldade acima do comum em aprender a ler. O ideal é realizar o diagnóstico da DISLEXIA o mais cedo possível, para amenizar ou evitar um comprometimento social e emocional do indivíduo ao longo da sua vida, e, ainda, minimizando os aspectos da dificuldade de aprendizagem.
A dislexia é persistente, mas não é uma incapacidade e sim uma dificuldade a ser vencida com sucesso.
A DISLEXIA, de causa genética e hereditária, é um transtorno ou distúrbio neurofuncional, ou seja, o funcionamento cerebral depende da ativação integrada e simultânea de diversas redes neuronais para decodificar as informações, no caso, as letras do alfabeto. Quando isso não acontece adequadamente, há uma desordem no caminho das informações, dificultando o processo da decodificação das letras, o que pode, muitas vezes, acarretar o comprometimento da escrita. (http://www.dislexia.org.br/, acesso em 27/04/2012)
É importante apontar algumas decorrências dessa definição. A primeira delas é que não há nenhum exame específico que averigue esse distúrbio neurofuncional, logo, o critério utilizado, que se apreende do primeiro parágrafo da definição acima, é o de exclusão. Assim, o diagnóstico de base clínica, envolve geralmente: médicos (oftalmologista, neurologista, pediatra), que excluem uma deficiência visual ou lesão neurológica; psicólogos e/ou psicopedagogos, responsáveis por averiguar o padrão de inteligência que deve ser considerado normal ou acima da média e um fonoaudiólogo, a fim de descartar um problema auditivo. Se depois desta jornada não for encontrada uma causa médica para a "dificuldade acima do comum em aprender a ler" do sujeito em questão, uma causa orgânica obscura é estabelecida: a Dislexia Específica de Desenvolvimento.
Dessa forma, o diagnóstico está atrelado ao olhar clínico dos profissionais pautado por uma concepção de leitura como processo de decodificação, tal como fica explicitado no segundo parágrafo da definição pelo uso repetido da palavra decodificar:
A DISLEXIA, de causa genética e hereditária, é um transtorno ou distúrbio neurofuncional, ou seja, o funcionamento cerebral depende da ativação integrada e simultânea de diversas redes neuronais para decodificar as informações, no caso, as letras do alfabeto. Quando isso não acontece adequadamente, há uma desordem no caminho das informações, dificultando o processo da decodificação das letras, o que pode, muitas vezes, acarretar o comprometimento da escrita. (http://www.dislexia.org.br/, acesso em 27/04/2012)6
Esse comprometimento da escrita é denominado genericamente pela ABD e pela literatura sobre Dislexia como "troca de letras na escrita". Mais especificamente, seria o que essa literatura denomina como inversões, omissões, junções e repetições de letras, a segmentação não convencional, a escrita em espelho, a adição de letras ou sílabas e a confusão de letras foneticamente semelhantes.
Sinteticamente, podemos apreender desta definição que a pessoa com Dislexia teria um mau funcionamento cerebral que impediria a decodificação correta das letras, o que seria revelado, na escrita, pelas "trocas de letras".
Concepção de leitura e escrita na ND
A ND interpreta de outra forma o que é caracterizado pela literatura médica tradicional como sintoma de Dislexia (o que é chamado de "trocas de letras") porque assume outra concepção de leitura e escrita contrária à perspectiva que toma o ler e o escrever como um processo de codificação e decodificação de sons em letras e vice versa. Mas por que a leitura não é um processo estritamente de decodificação, ainda mais de "letras do alfabeto"? Conforme a perspectiva assumida pela ND, o processo de leitura e escrita é muito mais complexo do que isso e envolve fundamentalmente o sentido: é ele que distingue uma sequência qualquer de sons e/ou letras de uma palavra e/ou um texto (FREUD, 1891; VYGOTSKY, 1934). "O que faz um conjunto de letras escritas uma palavra é seu reconhecimento pela fala da própria criança, dos adultos que a cercam, da televisão, enfim, da cultura em que está inserida" (COUDRY, 2010, p.95).
Para entender o processo por meio do qual a criança lê com sentido é necessário considerar a relação entre fala, leitura e escrita (COUDRY, 2009, 2010). Freud, em seu período pré-psicanalítico, propôs, em A Afasia, "um aparelho de linguagem destinado a associar as palavras a partir das experiências de sentido do sujeito no corpo e na língua" (BORDIN, 2010, p. 30) e discutiu essas relações durante a entrada da criança no mundo das letras7. Para ele, no momento em que a criança aprende uma letra, "ela aprende um novo som acompanhado de uma imagem visual nova, a qual só ganha existência se ancorada no sentido da imagem sonora da palavra antiga, já conhecida, ou seja, presente na língua falada." (idem, p.6). Assim, ler com compreensão envolve a associação entre a imagem visual da letra acompanhada de sua imagem sonora, resgatada da imagem sonora da palavra antiga, já conhecida pelo sujeito na fala. Podemos ver como essas associações acontecem na leitura do sujeito MZ, de 11 anos, que, na época, cursava a quarta série (quinto ano) do Ensino Fundamental.
O dado abaixo, de 28 de maio de 2012, é a leitura conjunta de uma notícia de jornal presente em uma prova de Língua Portuguesa de MZ em que ele erra a maior parte das questões de interpretação do texto. A proposta era que lêssemos novamente o texto e reescrevêssemos as respostas.
Logo no início do dado, no turno 2, podemos observar que MZ faz uma boa síntese do assunto tratado no texto. Tal fato demonstra que ele já tem uma compreensão do texto possibilitada pela primeira leitura que fez na escola, ainda que não tenha conseguido responder às perguntas de interpretação de texto do modo esperado pela professora. De forma geral, lê sem problemas, fazendo reformulações quando percebe que algumas palavras não fazem sentido ou quando eu interfiro.
Ao ser questionado, MZ mostra ter entendido o que havia lido anteriormente e as minhas perguntas o orientam a selecionar e sintetizar as informações mais relevantes do texto, como em: Pelo que você leu, porque os supermercados estão tendo prejuízo? do turno 15 e também o motivam a "desenrolar" suas respostas, como em Por quê?, no turno 17 e Que mais? no turno 19.
Algumas ocorrências e reformulações de MZ revelam operações de um sujeito que busca compreender o que lê. Logo no turno 12, quando lê garantes por gerentes ele rapidamente se corrige, porque não recupera na sua fala nenhuma palavra correspondente, por isso, retorna ao texto, à imagem visual da palavra, e se corrige. Esse movimento pode ser reafirmado quando pergunto se ele sabe o que é gerente e ele dá uma definição plausível: é o abaixo do chefe. A mesma coisa acontece no turno 36 quando lê estinhas por cestinhas, porém, dessa vez, ele se corrige através da minha interferência, quando pergunto o que é estinha?, ele rapidamente lê cestinhas.
Nesse movimento podemos ver, conforme Freud (1891), que a fala e a leitura estão ligadas intimamente, principalmente porque na leitura não opera simplesmente um processo de decodificação um a um9 entre som e letra. Ler com compreensão envolve também uma entonação, um ritmo. A criança quando lê precisa associar na fala a entonação correspondente para ler com sentido a palavra. Coudry (2010) exemplifica isso da seguinte forma:
Por exemplo, a palavra tabela, para quem está aprendendo a ler/escrever, pode ser lida pela primeira vez (e de forma silabada) como tábela e em seguida retomada como tabela pela fala, e isso mostra que a criança está dentro da leitura - lendo - e não decodificando. Nas primeiras experiências de leitura, as crianças leem palavras velhas como se fossem novas (FREUD, 1891). Esse vai-e-vem leva a criança a reconhecer na escrita o que já conhece na sua fala e na fala dos outros (COUDRY, 2010, p.96).
MZ faz na leitura de recém (turnos 26 a 30) como rec[ε]m, o mesmo processo descrito acima: influenciado pelo acento agudo no segundo e de recém, generaliza a associação da imagem visual é com a imagem sonora [ε]10 e, ao ler a palavra com um ritmo diferente daquele da palavra que conhece na sua fala e na fala dos outros, a lê como uma palavra nova. Diante do meu estranhamento (como? no turno 27), ele retoma a palavra velha, a que reconhece com sentido. Em todos esses momentos da leitura de MZ vemos que ele põe em jogo a relação entre fala, leitura e escrita priorizando reconhecer na fala o velho, o já conhecido:
No caso da criança que entra na linguagem, o já dito pelo outro se torna o já ouvido pela criança e nesse processo se dão novas cadeias associativas que colocam em relação o velho e o novo da língua. Em outras palavras, o velho da língua corresponde ao conhecido, automatizado, irrefletido; o novo, diferentemente, aparece, muitas vezes como indeterminado, desconhecido e também refletido. (COUDRY, 2011, p.381)
Dois dados do início do texto chamam a atenção porque envolvem, por sua vez, o novo, o que ainda não é completamente conhecido e automatizado na relação fala e leitura de MZ: o primeiro é a dificuldade encontrada duas vezes por MZ para ler a palavra clientes (turno 6 e 22) e o segundo é a leitura da palavra contratou ao invés de constatou (turno 6).
Na primeira, temos uma dificuldade oriunda da variedade linguística de MZ, que em contextos como esse produz o rótico (no caso /cri/)11. Assim, a imagem visual de clientes para MZ não corresponde à imagem sonora esperada (clientes) e desliza para a imagem sonora presente na comunidade linguística em que está inserido (crientes). Para ler clientes, MZ precisou superassociar o que estava escrito (clientes) com a sua fala (crientes) e ajustá-la segundo a associação da imagem visual da letra com seu correspondente sonoro. Nesse momento, a escrita se configura como uma entrada que permite a MZ circular na fala padrão, lugar privilegiado de circulação do conhecimento.
Essas associações não estão automatizadas ainda na leitura de MZ e exigem todo um trabalho linguístico-cognitivo complexo, por isso, MZ demora para ler e vai mexendo a boca silenciosamente antes de ler clientes. É interessante notar, também, que no turno 22 MZ tenta ler novamente clientes, não consegue e aponta para mim a palavra. Eu respondo que ele já havia lido anteriormente e MZ recupera na memória a palavra.
A leitura de contratou ao invés de constatou, no turno 6, é um exemplo de que quando lemos, buscamos o sentido da palavra na língua e nesse processo apagamos as letras (imagem visual da palavra). MZ não conhece a palavra constatou, ela é uma palavra nova que ele não recupera na fala, como pude verificar ao perguntar-lhe sobre seu significado e ele não sabia responder. Então, no movimento de associar a imagem visual das letras com a imagem sonora, ele resgata, na sua fala e experiência de vida, a imagem sonora de contratou, parecida com a imagem sonora de constatou.
Ao fim da leitura conjunta com compreensão pudemos responder novamente as questões sem grandes dificuldades. A análise desse dado pôde iluminar alguns processos envolvidos em uma leitura com compreensão, principalmente no que diz respeito ao encontro do sentido na fala, o velho, já conhecido pelo sujeito, no processo de associação entre a imagem visual das letras com sua imagem sonora dentro da palavra. Além das dificuldades e hipóteses que o sujeito constrói quando se depara com o novo.
Hipóteses de escrita e o "tratamento" para as "trocas de letras na escrita".
O dado que discutirei neste item é bastante representativo porque articula a construção pelo sujeito de um conjunto de hipóteses de escrita e os equívocos de tratamentos para uma suposta patologia, que acabam por dificultar mais ainda o processo de aquisição da escrita. GM, no momento da produção desse dado, tinha oito anos e cursava a segunda série do Ensino Fundamental. Ela foi diagnosticada por apresentar "trocas na escrita" (de acordo com o que diz o encaminhamento de uma fonoaudióloga para um tratamento na área de Distúrbios de Aprendizagem).
Os Computadores falantes12
Era uma vez uma sala de mulher que tinha dois computadores que se chamavam Tainá e Thais. Um dia entrou uma mulher para mexer no computador, ela saiu e entrou um homem que se chamava Rubens e ouviu um barulho:
- Fi, fi, fi.
E entrou. Aí os computadores nem ligaram e entrou a Natália e falou para o Rubens:
- O que você está fazendo?
- Eu ouvi um barulho
- Você está ficando louco
A produção textual acima (de 11 de novembro de 2009) é a história para um livro que iríamos confeccionar13. GM a escreve sem muito planejamento, voltando sua atenção mais para o enredo do que para os aspectos formais do texto. Podemos notar que dados como esse revelam a complexidade das operações que o sujeito deve realizar para escrever um texto claro. As estruturas, o encadeamento e o sentido de um texto não são óbvios, assim como as formas ortográficas também não. É dessa complexidade que advêm as dificuldades encontradas na história de GM. Ela, apesar de mostrar seu conhecimento de expressões cristalizadas presentes em histórias de contos de fadas como Era uma vez e Um dia, utiliza majoritariamente de conectivos usados na fala, tais como: e e aí, além de não saber representar, ainda, as pausas e os diálogos do texto, através dos sinais de pontuação que são próprios da escrita. Porém, constrói uma história coerente, com uma situação definida, um conflito e um desfecho, mostrando conhecimento da estrutura narrativa de um texto.
No que diz respeito às formas ortográficas, como GM se apoia na fala, ela faz quase todos os "erros" interpretados, equivocadamente, como sintomas de Dislexia pela literatura especializada. Há o uso de uma segmentação não convencional: em Socomputador para Os computadores, quetinha para que tinha, segamava para se chamava, elasaiu para ela saiu, quesechamava para que se chamava e taficandoloco para está ficando louco. Essas formas revelam que GM não domina ainda algumas regras do sistema alfabético para escrever e baseia-se prioritariamente na prosódia, ou seja, no ritmo da fala, para segmentar alguns trechos de seu texto. Hipossegmentações como em socomputador para os computadores, quetinha para que tinha e segamava para se chamava, são bastante comuns em dados de escrita inicial, já que nesse momento do processo de aquisição da escrita, a criança enfrenta dificuldades em identificar elementos que ocupam a posição de monossílabos átonos (clíticos como artigos, pronomes e conjunções), seguidos de palavras com um acento mais proeminente, como uma palavra independente (ABAURRE E SILVA, 1993).
As inversões de letras são encontradas principalmente nas posições de coda, pois são lugares críticos para o sujeito que, por muitas vezes, resolve a questão invertendo as letras para formar o padrão regular CVCV, majoritário na língua portuguesa, como em so para os, endoru para entrou. Porém, o dado que mais chama a atenção na produção de GM é a sua hesitação entre a letra que representa a consoante surda e a sonora14, principalmente entre o t e o d, como em: conpudador e conbutador por computador, endoru por entrou e foce por você.
É muito comum em crianças em processo de aquisição da escrita a substituição da consoante sonora pela surda. Porém, GM faz justamente o contrário na escrita de conpudador e conbutador para computador e endoru para entrou. Já em foce por você, é curioso observar que, anteriormente, GM havia produzido a forma ortograficamente correta, como pode ocorrer em um processo ainda instável, não automatizado.
A análise que propomos para essas hipóteses é a ocorrência de uma hipercorreção operada pelo sujeito. Ela entende que na representação do /t/ e do /d/, ela costuma errar, então generaliza, em alguns contextos, para ambas as imagens sonoras a letra d. Essa diferença de hipótese pode ser vista no dado do caderno de escola, de 25 de março de 2009, anterior em oito meses a essa história. Nele, podemos encontrar dois casos de ensurdecimento (matona para mandona e fiu para viu) e nenhum de sonorização. Isso mostra, por essa diferença de tempo, que ML está refletindo sobre a representação da surda e da sonora. Ela só vai poder, nesse processo de idas e vindas da aquisição da escrita, automatizar a associação entre a imagem sonora da consoante surda e sonora a sua correspondente imagem visual, quando, por meio do outro, puder retomar o caráter distintivo (SAUSSURE, 1916) que esses dois fonemas têm na fala.
Porém, na contramão deste trabalho estão os intensos treinos de "trocas fonéticas" a que GM foi submetida até o mês de novembro de 2009, no acompanhamento psicopedagógico que fez durante cerca de um semestre.
O dado acima (de 06 de abril de 2009) mostra uma atividade realizada com a psicopedagoga, dentre as inúmeras contidas no caderno de GM, em que treina as "trocas fonéticas", nesse caso do t e do d. Atente-se para a repetição de uma série de palavras e pseudopalavras/logatomas, descontextualizadas e sem sentido. GM escreve a mesma palavra usando a consoante surda e a sonora de forma indistinta. Há uma profusão de palavras sem sentido, dispostas de forma confusa. Esse é um exemplo claro de exercícios mecânicos que se utilizam da concepção de linguagem como um código, a mesma da avaliação que estabeleceu o diagnóstico, por meio da interpretação das "trocas" na escrita como sintomas. Neles, há "uma perda da especificidade da linguagem pelo esvaziamento total da significação" (COUDRY, 1988, p.18). Tarefas como essas parecem provocar mais confusões do que promovem reflexão e reelaborações de hipóteses de escrita, já que é o sentido que distingue uma sequência qualquer de sons e/ou letras de uma palavra (FREUD, 1891; VYGOTSKY, 1934). Como aponta Vygotsky:
Al mismo tiempo, el significado es una parte inseparable de la palavra como tal, y pertenece tanto al domínio del habla como al dominio del pensamiento. Una palavra sin significado no es una palavra, sino un sonido vacío. Una palabra privada de significado no pertenece más al dominio del habla. (VYGOTSKY, 1934, p.19)
Além disso, esse "treino" faz com que a criança permaneça sempre no mesmo estado, sem que conheça suas dificuldades e possibilidades de ultrapassá-las.
Considerações Finais
Buscou-se através da crítica à concepção de linguagem e de leitura e escrita por detrás de práticas medicalizantes, principalmente no recorte da Dislexia, expor e argumentar por uma prática com a linguagem que considere o sujeito, sua história e a leitura e a escrita como práticas significativas.
Ao contrário das concepções que sustentam o diagnóstico e os tratamentos para a Dislexia que entendem a linguagem como um código, argumentou-se que o sentido, que se constrói na interlocução e no contexto sócio histórico, é central no processo de aquisição e uso da leitura e da escrita.
O conhecimento do sistema linguístico para o profissional que avalia e acompanha a criança/jovem é fundamental, pois:
Muitas vezes as crianças (...) recebem o diagnóstico de disléxicas por apresentarem uma escrita onde aparecem claramente hipóteses elaboradas a partir da pronúncia. A importância do conhecimento linguístico, no caso, é evidente. Ela permite rever a avaliação a que normalmente são submetidas essas crianças, levando a interpretar como previsível e normal um comportamento tido geralmente como patológico (ABAURRE, 1987, p.195).
Por fim, espera-se que este artigo possa ter contribuído para a discussão sobre os denominados "distúrbios de aprendizagem", principalmente no que diz respeito à Dislexia, pois costumam envolver o psicopedagogo no diagnóstico e no tratamento. Ao mesmo tempo em que se espera, também, que a contribuição da Linguística, principalmente do campo da Neurolinguística Discursiva, possa possibilitar uma discussão mais profícua em relação à linguagem e àquilo que é do normal e do patológico.
Referências
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a Psicopedagoga, Licenciada em Letras, Bacharel e Mestre em Linguística. Doutoranda em Linguísitica pela Universidade Estadual de Campinas.
1 Este artigo se baseia na minha dissertação de mestrado em Linguística "Sujeitos, histórias e rótulos: a leitura e escrita de crianças e jovens diagnosticos com Dislexia" orientada pela Profa Dra Maria Irma Hadler Coudry e coorientada pela Profa Dra Sônia Sellin Bordin, como também, na monografia de conclusão do curso de Formação em Psicopedagogia Clínica e Institucional do Instituto Sedes Sapientiae, intitulada: "Linguística e Psicopedagogia: uma crítica às práticas medicalizantes" orientada pela Profa Marilda Nogueira Costa de Almeida.
2 Dado retirado do site: www.dislexia.org em acesso no dia 08 de dezembro de 2009.
3 O CCazinho (Centro de Convivência de Linguagens) é uma das fontes de dados e de pesquisas do Projeto Integrado em Neurolinguística: práticas com a linguagem e documentação de dados (coordenado pela Profa. Dra. Maria Irma Hadler Coudry) ativo desde agosto de 1992 e renovado em 2009 - processo: 307227/2009-0. Aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da UNICAMP (CEP: 326/2008), tem como objetivo acompanhar e intervir, com base na perspectiva teórica e metodológica elaborada pela Neurolinguística Discursiva, no processo de aquisição da leitura e da escrita de crianças que receberam diagnósticos como: Transtorno do Déficit de Atenção com ou sem Hiperatividade (TDAH), Dislexia, Alteração no Processamento Auditivo e Distúrbio de Aprendizagem - que não se confirmam ao longo dos acompanhamentos longitudinais.
4 A afasia é definida como uma alteração de processos linguísticos significativos resultante de lesão neurológica.
5 É interessante observar que o próprio nome Dislexia Específica de Desenvolvimento toma como referência a afasia, já que lesões neurológicas que afetam a leitura e a escrita são denominadas de Dislexia
6 Destaque em negrito da autora
7 É importante destacar que a formulação do aparelho de linguagem para Freud objetiva o estudo das afasias. Para o autor, a leitura e a escrita são processos centrados originalmente na fala e que, na afasia, são estudados em estado de dissolução e reorganização.
8 Na transcrição, o símbolo + representa uma pausa longa.
9 Sabemos que as relações entre som e letra não são um a um no português: há sons que podem ser representados pela mesma letra e várias letras que podem representar o mesmo som.
10 O som [ε] é representado na escrita como é.
11 Esta análise toma como referência a de Coudry (2010b).
12 Escrita do texto na norma padrão para facilitar a leitura.
13 GM antes de escrever pediu para fazer um desenho, nele, constrói a situação da história e seus personagens.
14 As consoantes sonoras são aquelas em que há a vibração das cordas vocais para a produção do som, já as surdas são aquelas em que essa vibração não acontece. No português há uma série de fonemas que se distinguem exclusivamente pela vibração das cordas vocais, pois apresentam o mesmo ponto de articulação. Esse é o caso do /p/ e /b/; /t/ e /d/; /f/ e /v/, entre outros. A criança, portanto, precisa perceber essa distinção para poder representar corretamente na escrita essa diferenciação.
15 Grifos meus.