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Boletim - Academia Paulista de Psicologia
versão impressa ISSN 1415-711X
Bol. - Acad. Paul. Psicol. v.27 n.2 São Paulo dez. 2007
TEORIAS, PESQUISAS E RELATOS DE EXPERIÊNCIA
Relevância da gestão de pessoas no clima organizacional de uma empresa de engenharia
The relevance of staff management at the organizational atmosphere of an engineering company
Daniel Balducci I, 1; Roberto Kanaane II, 2
I EMBRAER
II UMC
RESUMO
Este artigo apresenta os principais resultados de uma investigação exploratória, que tem como objetivo analisar uma empresa de engenharia quanto ao nível de gestão de pessoas e se contribui de forma efetiva ao clima organizacional. A pesquisa focaliza os seguintes aspectos: políticas e práticas de RH, gestão de pessoas, processos de liderança, comunicação e motivação (clima organizacional). O instrumento utilizado para a coleta de dados é um questionário de 33 questões, visando obter-se o entendimento sobre as variáveis da pesquisa. Os resultados, aplicados a uma amostra não-probabilística composta de 45 respondentes, mostram que a prática da gestão de pessoas é ainda incipiente; que há dificuldades de comunicação entre os níveis hierárquicos da empresa, impactando o exercício da liderança; que o nível motivacional dos respondentes está aquém de suas expectativas, uma vez que estes sentem-se subvalorizados e que as políticas e práticas de RH não conseguem, por si só, garantir um clima organizacional que atenda às expectativas dos funcionários da empresa.
Palavras-chave: Gestão de pessoas, Clima organizacional, Processo motivacional.
ABSTRACT
This article presents the main results of an exploratory survey with the objective of analysing an engineering company from the level of staff management, and if this contributes effectively toward the organizational atmosphere. The research focuses on the following aspects: the policies and practices of HR, the management of personnel and leadership, communication and motivation (organizational atmosphere) processes. The instrument utilized for collecting data is a questionnaire with 33 questions, in order to obtain the understanding about the variables of the research. The results, applied to a non- probabilistic sample composite of 45 respondents, indicate that the practice of staff management is still incipient; that there are communication difficulties between the hierarchical levels of the organization impacting on the performance of leadership; that the motivational level of the respondents is below their expectations, as they feel underestimated, and that the policies and practices of HR alone cannot guarantee an organizational atmosphere that could fulfill the expectations of the organization's employees.
Keywords: Staff management, Organizational atmosphere, Motivational process.
1. Introdução
No decorrer da história, as pessoas contribuíram de forma incontestável para o progresso das organizações. Tal contribuição, porém, sempre esteve associada ao estigma de que elas são recursos a serem administrados, tão essenciais nas atividades organizacionais, como um bem de consumo ou um bem de produção.
Embora haja registros de que a gestão de pessoas remonte à antigüidade, somente no final do século passado essa questão passou a ter relevância e a ser sistematizada. Porém, quando se pensa nesse tipo de gestão como prática nas organizações brasileiras, conclui-se que pouco se evoluiu desde então, fato que justifica o esforço em repensar, no Brasil, a partir da década de 90 do século passado, na importância das pessoas e das organizações nas relações de trabalho.
Conforme Dutra (2002:17), a gestão de pessoas pode ser entendida como:
[...] um conjunto de políticas e práticas que permitem a conciliação de expectativas entre a organização e as pessoas para que ambas possam realizá- las ao longo do tempo.
Dessa maneira, pode-se afirmar que as pessoas exercem um papel fundamental na sua relação com as empresas. Cabe àquelas administrar a sua carreira, levando em conta aspectos internos e externos da organização, a qual, por sua vez, dará suporte adequado para que possam utilizar o que têm de melhor.
Assim, define-se o problema da pesquisa em pauta:
Como as políticas e as práticas da gestão de pessoas podem influenciar no clima organizacional de uma empresa de engenharia?
2. Delimitação da Pesquisa
Entre as inúmeras variáveis que podem ser abordadas na gestão de pessoas, o presente estudo circunscreve-se, fundamentalmente, naquelas que se mostram mais vulneráveis no dia-a-dia da organização. Desse modo, levam- se em conta as políticas e práticas do RH (Recursos Humanos) presentes em uma organização, os aspectos do seu clima organizacional expressos pelo nível da motivação dos funcionários, além dos processos de liderança e comunicações vigentes.
Inicia-se por caracterizar o posicionamento dos autores sobre gestão de pessoas nas organizações para, posteriormente, considerar-se aqueles aspectos a ela relacionados, os quais são os supracitados.
Para fins desta pesquisa, entende-se que a melhor gestão empresarial é voltada para a otimização do aproveitamento do potencial e das competências dos recursos humanos, como força agregada destinada a utilizar estratégias de confronto às pressões e mudanças do mercado competitivo através do saber e do fazer acontecer.
Albuquerque (2002) amplia essa visão face às constantes mudanças na atualidade. Destaca a necessidade de constante atualização dos profissionais das empresas, por conseguinte das implicações diretas na gestão de pessoas e dos modelos de utilização em sua administração. Essas freqüentes adaptações são devidas principalmente ao ritmo acelerado das mudanças tecnológicas, à globalização da economia e ao acirramento da competição entre as empresas e mesmo entre os países, que geram impactos significativos nas organizações.
Para compreender esse panorama, é necessário visualizar as fases por que passou a evolução da administração empresarial voltada para pessoas e respondendo às necessidades e pressões impostas pelo ambiente (macro e micro) em que essas organizações estão inseridas.
A primeira é a era da industrialização clássica (de 1900 a 1950), em que as pessoas eram tratadas como mão-de-obra, fornecedoras de esforço físico e muscular, verdadeiros zeladores das máquinas. O departamento que as supervisionavam identificava-se como de relações industriais, dando ênfase às atividades operacionais e burocráticas, e funcionando como mero repetidor das instruções advindas da cúpula. A seguinte etapa é da industrialização neoclássica (de 1950 a 1990) em que as pessoas eram vistas como recursos humanos, sendo que o departamento passou a ser de RH, ampliando as atividades para além das operacionais e burocráticas: cuidando do recrutamento, da seleção, higiene e segurança do trabalho, relações trabalhistas etc. Depois vem a fase da informação (após 1990), tendo as pessoas como parceiras, quando surgem equipes de gestão de pessoal com administração descentralizadora e terceirizando as atividades burocráticas (Chiavenato, 1999).
Tem-se a considerar que as pessoas passam grande parte de suas vidas em seu local de trabalho, dependendo, portanto, das organizações em que atuam para satisfazer suas necessidades ou atingir seus objetivos pessoais (tais como qualidade de vida, oportunidade de crescimento, melhor remuneração, status etc.). Concomitantemente, as empresas necessitam das pessoas as quais lhes dão vida, possibilitando atingir seus objetivos (tais como sobrevivência, expansão, lucratividade, liquidez, novos mercados ou produtos etc.) e cumprir sua missão (razão da existência da empresa). Fica caracterizada a interdependência entre ambas as partes, e beneficiando-se mutuamente. Isso possibilita entender o motivo pelo qual se diz que não há nada que possa ser bom somente para uma dessas partes, uma vez que se tenha abraçado a visão da solução do tipo de negociação "ganha-ganha", no qual as partes interessadas são beneficiadas através da negociação, da participação e da sinergia de esforços, seguindo padrões éticos e de responsabilidade social.
Assim, cabe à empresa cultivar a capacidade de atrair, desenvolver e utilizar o potencial e as habilidades intelectuais e competitivas de seu pessoal - empresabilidade - e, às pessoas, a capacidade de manter-se atualizadas intelectualmente para atrair o interesse das empresas e manter-se empregadas - empregabilidade.
No estágio de integração externa das áreas funcionais, as empresas esforçam-se para responder ao ambiente competitivo e para posicionar-se estrategicamente no futuro. A gestão humana (recursos humanos) necessita alinhar-se constantemente à direção estratégica dos negócios e isso exige postura pró-ativa dessa área funcional, obtida por meio de um alto nível de envolvimento na organização e habilidade em tratar as macroquestões. A área de recursos humanos busca antecipar sistematicamente os impactos de novos negócios sobre suas atividades, propondo medidas relativas à conexão interativa, integradora e dinâmica entre a gestão de recursos humanos e o planejamento estratégico.
Para garantir que haja contínuo equilíbrio entre empresa e pessoas, é necessário um conjunto de políticas e práticas organizacionais que sirvam de base na sustentação do equilíbrio e dos processos (bases estruturais), conforme o modelo adaptado por Dutra (2002). Neste as pessoas e a empresa localizam- se nos pratos de uma balança e em suas bases encontram-se as estruturais que se relacionam mutuamente com o processo de gestão.
Avançando na compreensão desse modelo, Dutra (2002) destaca as bases para um novo modelo de gestão de pessoas, assentada em conceitos: entrega, padrões de complexidade e espaço ocupacional.
O conceito de entrega corresponde à capacidade do colaborador em colocar à disposição da empresa suas realizações, sua forma de atuar.
O conceito de padrões de complexidade remete à compreensão das habilidades e competências desenvolvidas pelo funcionário decorrente das atribuições inerentes ao cargo ocupado, implicando numa relação entre desenvolvimento profissional e remuneração.
O conceito de espaço ocupacional decorre dos conceitos anteriores, visto que o espaço ocupacional corresponde ao desenvolvimento do funcionário e de sua capacidade em agregar valor ao trabalho.
A compreensão dos conceitos supracitados e sua conseqüente associação ao modelo de gestão de pessoas poderá contribuir para a melhoria do clima organizacional, estritamente relacionado aos processos de motivação, liderança e comunicação e, conseqüentemente, para a melhoria do alcance de melhores patamares de desenvolvimento no cenário das organizações.
a) O Clima organizacional
O clima organizacional influencia o comportamento dos membros da organização, podendo afetar os seus níveis de motivação e satisfação no trabalho. Conforme Luz (1996), (...) é o reflexo do estado de espírito ou do ânimo das pessoas, que predomina numa organização em um determinado período.
De acordo com Fleury e Sampaio (2002: 291):
[...] o clima organizacional refere-se à percepção que as pessoas têm da organização em que trabalham, percepção que pode ser influenciada pelos fatores conjunturais externos e internos à organização. A idéia do clima organizacional remete à noção de clima meteorológico e retrata um estado momentâneo da organização[...].
Ele reflete a consistência entre a cultura prevalecente e os valores individuais dos funcionários da empresa. Ambientes em que há um clima organizacional inadequo, este é gerador de problemas para as empresas. Dessa forma, a manutenção de um bom clima organizacional justifica-se, pois:
. Influencia a motivação e integração das pessoas e equipes;
. Facilita o alcance dos objetivos individuais e coletivos;
. Reduz os conflitos entre chefias e pessoas;
. Promove o comprometimento das pessoas com o negócio;
. Valoriza o respeito ao ser humano;
. Melhora a comunicação entre os níveis hierárquicos da organização.
O clima organizacional é um diferencial competitivo que as empresas necessitam valorizar para que possam competir adequadamente no mercado e gerarem satisfação interna. Para isso, é necessário investir na sua melhoria, adotando-se práticas de gestão abertas e transparentes, que privilegiem as pessoas na busca do comprometimento e do envolvimento com os objetivos daquelas.
Destacam-se, a seguir, algumas variáveis que influenciam o clima organizacional: os processos de motivação, liderança e comunicação.
b) O Processo de motivação
Segundo Casado (2002), A motivação tem sido vista como uma saída para melhorar o desempenho profissional no que diz respeito tanto à produtividade quanto à saúde organizacional e à satisfação dos trabalhadores.
É preciso conceber a motivação sob a óptica do caráter do ser humano, da ética, do companheirismo, do espírito empreendedor de cada um e mesmo de um sadio clima de competição. A motivação é um processo que mobiliza o comportamento dos funcionários, possibilitando-lhes um direcionamento de suas atitudes, intenções e condutas. É um fenômeno intrínseco, pois depende das necessidades, expectativas e anseios de cada pessoa. (Bergamini, 1997).
Entretanto, fatores extrínsecos ao indivíduo, ou seja, estímulos por parte das lideranças, recompensas, prêmios, ambiente de trabalho saudável, entre outros, tendem a mobilizar, direcionar e motivar o funcionário diante dos propósitos e desafios que o trabalho oferece.
Diversos estudiosos têm-se dedicado a compreender o processo de motivação aplicado ao ambiente de trabalho. Dentre eles, destacam-se: Maslow (Hierarquia das Necessidades), Herzberg (Teoria dos Dois Fatores), David McLeland (Necessidades de Poder, Afiliação e Realização) e Vitor Vroom (Teoria da Expectativa) (Casado, 2002). Os resultados decorrentes desses estudiosos têm possibilitado a compreensão conceitual do processo de motivação no trabalho. Tais abordagens sinalizam tendências e perspectivas quanto ao comportamento motivacional individual e coletivo, tanto no ambiente organizacional como no ambiente social.
No referente às empresas em geral, estimulam pouco a motivação, a qual precisa ser revista continuamente para então poder implementar o planejamento e as ações decorrentes dele. Uma política de gestão de pessoas estruturada seria o primeiro passo para estimular a motivação entre os funcionários. Um dos grandes atributos das lideranças é estimular a motivação para o aprendizado, buscando a melhoria contínua e a preparação de mudanças de paradigmas comportamentais e atitudinais.
A busca de novas técnicas, de maior colaboração entre equipes, uma integração maior com os outros departamentos e a necessidade de ser ágil em relação ao mercado é vital para as empresas. É necessário que elas reconheçam que sobreviverão e ganharão espaço na medida em que incentivarem a motivação individual e de equipe, que tendem a ser um grande elo de ligação com a produtividade, qualidade dos produtos e serviços e alcance dos resultados financeiros.
Questiona-se o fato de as empresas desejarem manter a motivação das pessoas associada somente ao pagamento de prêmios ou ao estímulo à competição. Os planos de incentivo, por si só, não bastam, não geram comprometimento e, a médio prazo, podem gerar frustração. É importante, para esse fim, analisar a motivação das pessoas, despertar a vontade de fazer e vencer, compartilhar ideais e objetivos, ouvir a equipe, mas acima de tudo, evidenciar a potencialidade de cada um, assim, contribuir para que elas tornem- se mais independentes e mais capacitadas para o desenvolvimento de suas potencialidades, colaborando para o efetivo resultado das organizações.
c) O Processo de liderança
A liderança constitui-se como estratégia fundamental na gestão de pessoas. Historicamente tem-se constatado mudanças nas concepções de liderança, ou seja, desde a abordagem na qual os líderes tinham como objetivo conduzir os seus seguidores, adotando posturas autoritárias, até aquela que valoriza as competências do líder em unir as pessoas, mobilizando-as e capacitando-as para o alcance de resultados.
Se antes as lideranças pautavam-se em estilos autoritários, hoje as empresas procuram gestores com perfis totalmente diferentes: buscam líderes participativos e que saibam valorizar a prática do feedback; líderes empreendedores, que saibam trabalhar em equipe, que assumam riscos calculados e tenham capacidade de mobilização; líderes que reconheçam o êxito dos outros, estimulem as habilidades e que tenham capacidade de apoiar as pessoas, sejam inovadores, criativos e comunicativos.
A liderança emana do conhecimento, da perícia, das habilidades interpessoais e não da atuação da autoridade. Os líderes removem as barreiras que impedem as pessoas e as organizações de atingirem a excelência. No processo do trabalho, são os que assumem papel de relevância, pois são aqueles que devem planejar, organizar, coordenar e controlar os esforços dos indivíduos e determinar o melhor caminho a seguir. É aquele que consegue a confiança da empresa a curto prazo e a confiança das pessoas a longo prazo.
A figura do líder e o processo de liderança constituem-se como estratégia eficaz para o alcance dos resultados empresariais. Tal estratégia implica na gestão participativa na qual os anseios e expectativas dos líderes e liderados possam conjugar-se com as metas organizacionais.
Observa-se presentemente a importância da ética para a liderança empresarial, uma vez que se evidencia de maneira acentuada, a necessidade dos líderes em atuarem segundo os parâmetros da competência interpessoal, estimulando os liderados a manifestarem os seus talentos em prol da empresa. Ao mesmo tempo, entende-se que a ética do líder influencia diretamente a ética dos funcionários, levando os liderados a aceitarem a liderança exercida pelo líder, em função do seu conhecimento, da sua dignidade e da sua responsabilidade frente à empresa, à equipe e a si próprio.
Para Navram (Arruda & Navram, 2000: 30), (...) a liderança é um fator crítico de sucesso para as organizações que se esforçam para aumentar a consistência ética. As ações e os comportamentos dos líderes pesam significativamente mais que suas palavras ou escritas (...).
Essa afirmação reflete a importância da postura e conduta como indicadores básicos para a compreensão da liderança ética como variável fundamental no processo de gestão empresarial.
O processo de comunicação constitui-se como um meio pelo qual as lideranças mobilizam as pessoas em busca de resultados que estejam em convergência com os objetivos empresariais.
d) O Processo de comunicação
Este processo refere-se à transferência compartilhada de informação, sobre idéias, fatos, pensamentos, valores e sentimentos entre as pessoas. Nas organizações, a comunicação é um meio de disseminar a cultura empresarial, mas também é maneira de estabelecer e motivar o cumprimento de objetivos e metas. É, portanto, um fator estratégico para as organizações.
Para que a comunicação empresarial seja efetiva, é necessário que haja efetiva relação entre os objetivos empresariais, objetivos pessoais e práticas de feedback, facilitando a troca de idéias e informação.
A clareza e a forma da comunicação são importantes, porém a predisposição para a comunicação dos indivíduos é que faz a diferença. Essa somente ocorre quando as pessoas são consistentes nas suas palavras, são objetivas e confiáveis, sabem ouvir e estão sempre prontas para um feedback, pois sem ele não há retroalimentação. Sem retroalimentação não há desenvolvimento contínuo, sem desenvolvimento contínuo, a aprendizagem organizacional não se faz eficaz.
A comunicação pode fluir de três formas: descendente, quando acontece dos níveis mais altos para os níveis mais baixos; ascendente, quando se dirige aos mais altos escalões, favorecendo um feedback sobre progressos, metas e problemas; e lateral, quando acontece entre os membros de um mesmo grupo. Esses três modelos são importantes para uma empresa, entretanto é necessário que a comunicação descendente seja bem clara, coerente e inovadora no sentido de proporcionar um ambiente aberto à comunicação, para que a ascendente e lateral sejam efetivas e possam influenciar na motivação de todos os funcionários (Barrionovo, 2005).
A posição de Casado (2002:281) sinaliza que (...) o processo de comunicação interpessoal, no âmbito das organizações, deverá ser capaz de abranger todas as mudanças e os desafios propostos pela globalização, pelo avanço tecnológico do setor de transmissão de informações e pela acirrada competitividade. Entretanto, têm sido constatadas falhas no processo de comunicação empresarial, dificultando sobremaneira a interface entre os membros dos setores envolvidos e o alcance de resultados.
Nesse sentido, podem-se identificar alguns problemas de comunicação, sendo esses contingenciais e complexos. Tais problemas estão associados, entre outros pontos, à omissão, à distorção e à sobrecarga de informações. A título de esclarecimento, destacam-se algumas posições que auxiliam a compreensão desse fenômeno, dentre elas: a complexidade do mundo real e como o indivíduo integra-se nesse contexto; a percepção da pessoa sobre uma dada realidade e a mudança repentina de símbolos e significados apreendidos (Argyris, 1994).
A partir do exposto, é importante apreciar as tendências e desafios do processo de comunicação empresarial, em que se destacam: a diversidade de padrões de comunicação no ambiente organizacional e a necessidade de aprendizagem para lidar com tais situações; a otimização da tecnologia disponível na transmissão de informações; a ênfase na criação de redes de comunicação que contribuam para a gestão do conhecimento e o treinamento sistemático para a aquisição de habilidades e competências associadas ao processo de comunicação formal e informal.
3. Procedimentos metodológicos
A investigação aqui apresentada é de natureza exploratório-descritiva. Como afirma Vergara (1997:45),
(...) a investigação exploratória é realizada em área na qual há pouco conhecimento acumulado e sistematizado. (...) a pesquisa descritiva expõe características de determinada população ou de determinado fenômeno. (...) não tem compromisso de explicar os fenômenos que descreve, embora sirva de base para tal explicação.
Dessa forma, a investigação exploratória mostra-se adequada, visto que, na empresa em estudo, o conhecimento sobre o assunto em questão não se encontra sistematizado.
A pesquisa exploratória utiliza métodos amplos e versáteis. Dentre eles, o método adotado neste trabalho é o do estudo de caso, com a utilização de dados quantitativos e qualitativos. Considera-se que esta modalidade de investigação serve para estimular a compreensão e ampliar os conhecimentos sobre uma dada situação, como a da empresa em questão. Optou-se por amostra não- probabilística, por acessibilidade (Vergara, 1997), pelos seguintes fatores: (1) como o presente estudo é de caráter descritivo, não se considerou que houvesse necessidade de tratamento estatístico dos dados; (2) à facilidade de acesso aos respondentes.
O público-alvo da pesquisa constituiu-se de um grupo de participantes heterogêneo quanto ao nível hierárquico de trabalho, estado civil, sexo, escolaridade e tempo de empresa.
O instrumento de pesquisa utilizado para a coleta de dados constituiu-se de um questionário de 33 questões, distribuídas nos seguintes assuntos: políticas e práticas de RH, gestão de pessoas e processos de liderança; comunicação e motivação. Foi dividido em duas partes, sendo a primeira com questões abertas e a segunda, de múltipla escolha. Para cada questão foram solicitados comentários, com o intuito de melhor entender a posição dos respondentes sobre o assunto em pauta.
Os questionários foram enviados a 60 pessoas, de diversos níveis hierárquicos, compostos por engenheiros, técnicos e gestores. Dos 60 questionários enviados, 45 retornaram devidamente preenchidos e comentados, sendo 13 de gestores, 21 de engenheiros e 11 de técnicos. Os dados foram compilados, juntamente com os comentários dos respondentes, para cada uma das questões. Após essa compilação, foram feitos cálculos simples de freqüência para verificar-se como cada uma das respostas de cada questão estava distribuída no total dos seus resultados.
4. Resultados
Eles são divididos conforme as unidades analisadas, a saber:
a) Políticas/ práticas de RH e gestão de pessoas
Analisando-se as respostas da pesquisa (Tabela 1), constatou-se que aproximadamente 90% dos respondentes não têm uma visão clara sobre as políticas de RH. Além disso, 85 % dos pesquisados percebem a necessidade de criação de ações efetivas para um incremento do potencial profissional. As pessoas sentem-se preparadas para desenvolver atividades além das quais são a elas destinadas, sentindo-se muitas vezes subutilizadas. É comum que as oportunidades mais atrativas sejam destinadas àqueles que são mais políticos e não àqueles que cumprem as diretrizes departamentais.
Dos respondentes, 78% visualizam tênue relação entre políticas de RH e práticas departamentais. As políticas de RH acabam-se restringindo aos aspectos mais técnicos da gestão de RH e, mesmo esses, não são divulgados de maneira clara e aberta. Quanto aos critérios de promoção na carreira, 85% das pessoas consideram que ela ocorre, na maioria das vezes, baseada apenas nas competências técnicas e/ou por critérios não transparentes, gerando, assim, insatisfação entre os funcionários.
Com relação ao planejamento de carreira setorial, observou-se que 80% dos respondentes sinalizam que as ações são restritas quanto a essas práticas, ou seja, o planejamento de carreira não existe de maneira formal na empresa. Verificou-se que a conduta profissional, no geral, é expressa de maneira ética, porém há focos de condutas antiéticas em todos os níveis hierárquicos. Constatou-se que a maior parte dos treinamentos existentes são técnicos e, mesmo assim, 74% dos pesquisados sinalizam que tais treinamentos atendem parcialmente às suas necessidades, sendo que, quando ocorrem, são tratados de maneira superficial.
b) Processo de comunicação
Como se pode observar na Tabela 2, 60% dos sujeitos da pesquisa apontam que as práticas de feedback sobre o desempenho profissional são passíveis de melhoria. Os pontos fortes, as deficiências e a evolução na carreira são raramente mencionados, fazendo com que os funcionários não tenham um direcionamento frente ao seu desempenho profissional. Em relação ao desempenho comportamental, 65% das pessoas sinalizam que a prática de feedback não é habitual.
Verificou-se que os processos de comunicação lateral são efetivos, quando se trata de comunicação oral. Os problemas estão mais concentrados na comunicação escrita, como por exemplo, a utilização inadequada de e-mails e a alta incidência de erros de linguagem que comprometem a comunicação. Pode- se observar que as informações tendem a ser disponibilizadas de maneira coletiva, porém, devido à estrutura organizacional verticalizada, tais informações não atingem a totalidade das pessoas, fazendo com que o conhecimento tácito não se torne explícito (Nonaka, 2001).
Ocorre, às vezes, a competição por melhores posições na carreira, conduzindo as pessoas a omitirem informações ou a compartilhá-las somente se questionadas ou ainda a transmitirem informações a grupos restritos, privilegiando-os em relação aos demais. Há relatos de líderes que preferem não se relacionar com outros grupos, pois julgam que somente a comunicação interna ao seu grupo é importante para a efetividade do negócio.
c) Processo de motivação
Com base na análise da Tabela 3, constatou-se que 75% dos respondentes destacam que os funcionários da empresa em estudo são parcialmente reconhecidos em função do desempenho profissional. Outro aspecto relevante refere-se à formação de ambientes fechados de influência (corporativismo), em que um grupo, através da troca de favores e confidências, obtém mais estímulo para atingir resultados. Tal prática tende a prejudicar uma eventual cultura de valorização das pessoas.
Conforme comentários dos pesquisados, percebe-se que o nível salarial dos funcionários não está associado ao desempenho ao nível de responsabilidade, ou seja, há casos de pessoas com desempenho satisfatório, alto nível de colaboração e participação nos processos, mas têm um nível salarial inferior ao das pessoas que realizam apenas tarefas rotineiras. Os respondentes assinalam ainda que, embora os benefícios existentes sejam motivadores, pensaram em procurar outras empresas para trabalharem, fazendo menção com isso, que estão insatisfeitos com o ambiente de trabalho.
As oportunidades de desenvolvimento profissional, de acordo com os respondentes, são direcionadas sem que haja critérios de decisão transparentes. Há contudo, conforme outros relatos, espaço para o desenvolvimento da carreira para os funcionários que têm iniciativas.
Os respondentes apontam que a distribuição de atividades não é feita de forma igualitária, prevalecendo o maior desenvolvimento para um grupo pequeno de pessoas. Muitas vezes as melhores oportunidades são destinadas às pessoas com maior competência interpessoal, ou seja, pessoas mais hábeis na comunicação, na negociação e na articulação de suas aspirações conseguem, por esse motivo, realizar tarefas mais desafiadoras e que causam maior satisfação pessoal. Conseqüentemente, pessoas menos articuladas no que diz respeito ao relacionamento interpessoal acabam restringindo as suas atividades a tarefas rotineiras, não vislumbrando desenvolvimento pessoal e profissional, tornando-se desmotivadas.
d) Processo de Liderança
Ao analisar os dados da Tabela 4, verificou-se que 80% dos respondentes têm a percepção de que o estímulo das lideranças no ambiente de trabalho, gerando motivação e desenvolvimento profissional não é prática constante. As lideranças costumam manter-se distantes dos liderados. Às vezes ocorre que um determinado líder é voltado para a gestão de pessoas, mas o mesmo não acontece entre ele e outros níveis de lideranças.
No que diz respeito à orientação de carreira, 65% dos respondentes demonstram que tal prática raramente ocorre. A periodicidade das avaliações de desempenho é muito pequena e quando se dá, o plano de carreira não é discutido de forma eficaz, ou seja, não há um direcionamento na carreira do funcionário que considere as suas expectativas, habilidades e qualificações, em conjunção com as necessidades da empresa. Ou ainda, às vezes leva-se em conta somente a necessidade da empresa, comprometendo o desenvolvimento profissional dos envolvidos.
Os respondentes sinalizam que há diferentes estilos de liderança na empresa em estudo, ou seja, há líderes que delegam boa parte das atividades de seu departamento, mas também há outros que centralizam qualquer tipo de atividade ou monitoram os mínimos detalhes das atividades da sua equipe. Tal prática inibe o desenvolvimento das pessoas e retira-lhes o espírito de inovação. Há também lideranças participativas que conseguem mobilizar e engajar os funcionários e geralmente atingem os resultados de forma mais efetiva.
Há ainda um aspecto importante, o qual diz que as boas oportunidades surgem de diversas maneiras. Coexistem oportunidades devido a afinidades com as lideranças, oportunidades por tempo de casa e oportunidades por competência, seja ela técnica ou interpessoal. Se o funcionário é prático, possui um bom relacionamento, empenha-se para que as suas atividades sejam bem- sucedidas e tem um nível de envolvimento relevante nas atividades do seu grupo e intergrupos, acaba-se destacando e as oportunidades acontecem, mesmo que a longo prazo.
4. Discussão
As percepções dos respondentes quanto às políticas e práticas de recursos humanos sinalizam que estas são pouco definidas e que há a predominância da valorização da competência técnica como pré-requisito para futuras promoções, em detrimento à competência interpessoal. As políticas de cargos e salários, planejamento de carreira, treinamento de pessoal e avaliação de desempenho estão vinculadas a aspectos burocráticos e técnicos.
Há dificuldades de comunicação entre os departamentos, bem como restrições no sistema de feedback vigente. Há indícios de que a comunicação descendente (líderes-liderados) processa-se de forma autocrática, limitando, desse modo, a comunicação ascendente que se manifesta de maneira tímida e pouco expressiva.
Há a tendência da liderança em manter-se distante dos liderados, sendo raros os líderes que estão mobilizados para a implementação da gestão de pessoas. Constatou-se também que os líderes sequer participam efetivamente do processo seletivo dos seus futuros liderados, bem como na sua orientação frente ao planejamento de carreira.
Um outro fator de destaque refere-se ao estilo de liderança que é predominantemente centralizador, havendo, contudo, delegação de tarefas quando corriqueiras. Há indícios de que a liderança assume uma postura operacional, dificultando o desempenho profissional do funcionário.
Há uma tendência acentuada em valorizar o tempo de permanência do funcionário na empresa e o quanto ele insere-se aos padrões já estabelecidos, havendo pouco espaço para a manifestação do potencial criativo. Por outro lado, há, por parte da empresa, uma tendência em incluir a política salarial e o plano de benefícios como fatores motivacionais, ao invés de incluir também a valorização e o reconhecimento funcional. Tais aspectos influenciam, conforme Luz (1996:6), o estado de espírito ou o ânimo das pessoas, impactando diretamente no clima organizacional da empresa.
Os resultados supracitados sugerem que a gestão de pessoas na empresa em estudo é ainda incipiente e que os processos de comunicação, liderança e motivação, aliados à gestão de pessoas, necessitam ser revistos para que, conforme a posição de Dutra (2002:17), (...) permitam a conciliação de expectativas entre a organização e as pessoas para que ambas possam realizá- las ao longo do tempo e assim promovam uma melhoria no clima organizacional da empresa em estudo.
5. Considerações finais
A partir dos resultados desta pesquisa, elaboraram-se algumas sugestões para a empresa em questão com o intuito de contribuir para a melhoria do clima organizacional:
• Implantar programas de treinamento focados na competência técnica, competência interpessoal e intercultural, garantindo maior flexibilidade e disponibilidade das lideranças diante do processo de motivação e estimulação do potencial criativo dos funcionários de sua equipe;
• Estimular o hábito de pesquisa de clima organizacional periódico, com o intuito de identificar os anseios, necessidades e expectativas dos funcionários, criando condições para que eles possam expressar-se frente ao ambiente organizacional;
• Realizar a prática do benchmarking, com a finalidade de que a empresa possa identificar, no mercado, as melhores práticas voltadas à gestão de pessoas e concomitantemente possam incorporá-las, objetivando a eficiência e eficácia nos processos empresariais e em específico, àqueles voltados à gestão de pessoas.
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Enviado em: 30/04/2007
Aceito em: 10/06/2007
1 MBA em Gestão de Negócios pelo IBMEC. Atuação profissional na Empresa Brasileira de Aeronáutica. Contato: E-mail - dbaducc@gmail.com.
2 Contato: Rua Duarte de Azevedo, 284, Cj 38 - CEP 02036-021 - São Paulo - SP. E-mail: roka@roka.com.br. Tel.: 6950-3230