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versão impressa ISSN 1415-8809
Psicol inf. vol.16 no.16 São Paulo dez. 2012
Artigo
Qualidade de vida de mulheres pacientes de um ambulatório de reprodução humana*
The quality of life of women patients in a clinic for human reproduction
Leonilde Rodrigues de Sousa Paludetti**; Maria Geralda Viana Heleno***
*Esse estudo foi realizado como "Projeto PIBIC" de iniciação científica, financiado pelo CNPq.
**Psicóloga pela Universidade Metodista de São Paulo. (leonildepaludetti@yahoo.com.br).
***Psicóloga e doutora em Psicologia da pela Universidade Metodista de São Paulo. Coordenadora. do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Saúde na. Universidade Metodista de São Paulo (Umesp). (maria.heleno@metodista.br).
RESUMO
O presente estudo objetiva avaliar a qualidade de vida (QV) de mulheres pacientes de um ambulatório de reprodução humana. Trata-se de uma pesquisa descritiva de corte transversal com enfoque quantitativo utilizando como instrumento o WHOQOL-bref, a ficha de avaliação socioeconômica (Abipeme) e o prontuário das pacientes, sendo elas 124. Para a análise estatística, foi utilizado o SPSS e para o WHOQOL-bref fez-se avaliação conforme recomendação da OMS. A média de idade das pacientes foi de 35 anos e o tempo de infertilidade, em média, foi de quatro anos, sendo que 22 (18%) tiveram aborto espontâneo e em duas (2%) o aborto foi provocado; 11 (9%) têm filhos da união anterior e seis (5%) têm filhos da união atual. Quanto ao tratamento para engravidar, 37 (30%) já os haviam procurado anteriormente. No que se refere à situação socioeconômica, cinco participantes (4%) pertencem às classes A e B; 73 (59%), à classe C; 41 (33%), à classe D; e 5 (4%) à classe E. Quanto à QV, os resultados foram: Físico (dom1) 75,92, Psicológico (dom2) 69,72, Relações Sociais (dom3) 74,66 e Meio Ambiente (dom4) 63,00. Observa-se que a QV das mulheres deste estudo apresenta-se um pouco acima de regular. Na comparação múltipla, evidenciou-se, de modo estatisticamente significativo, que elas apresentam menor satisfação quando se referem ao meio ambiente.
Palavras-chave: infertilidade; qualidade de vida; promoção de saúde.ABSTRACT
This paper aims to evaluate the QOL of female patients in a Human Reproduction clinic. This is a quantitative, descriptive and cross- -sectional study that used as instruments the WHOQOL-bref, the socioeconomic evaluation form (Abipeme) and the patients' medical records. The sample was composed by 124 women with 35 years old in average. The SPSS was used as reference for the statistical analysis and the WHOQOL-bref was used as recommended by the WHO. The average infertility period was of 4 years, while 22 (18%) had miscarriages and two (2%) had induced abortions; 11 (9%) had children from a previous marriage, and six (5%) had children from the present marriage. As to the treatment, 37 (30%) had already been through treatment before. Regarding the socioeconomic status, five participants (4%) belonged to classes A and B, 73 (59%) belonged to class C, 41 (33%) were in class D, and 5 (4%) in Class E. Overall, it was observed that the QOL of the women in this study was just above regular. In multiple comparison, there was significant statistical evidence that the women had less satisfaction when referring to the safety of the environment. We conclude that several areas of these women's life are impacted considering QoL, including the economic area.
Keywords: infertility; quality of life, health promotion.
Alguns estudos (FREEMAN et al., 1985; MAHLSTEDT; MACDUFF; BERNSTEIN, 1987) mostram que a infertilidade e a necessidade de tratamento são consideradas fatores de impacto na qualidade de vida das pessoas. Estudar a qualidade de vida destas pacientes, portanto, pode identificar fatores determinantes deste sofrimento e medidas para atenuá-lo.
Além disso, a importância do atendimento às mulheres com problemas ligados à infertilidade deve-se ao fato de que este evento modifica toda a vida da pessoa, e a melhoria da qualidade de vida passou a ser um dos resultados esperados, tanto das práticas assistenciais quanto das políticas públicas para o setor nos campos da promoção da saúde e da prevenção de doenças. A compreensão das variáveis que determinam a qualidade de vida das mulheres inférteis e suas repercussões em suas vidas torna-se um fator fundamental para a prevenção e promoção de saúde.
A infertilidade é definida como a falta de concepção depois de pelo menos um ano de tentativas, apesar da prática de coitos regulares sem anticoncepção. A infertilidade afeta cerca de 80 milhões de pessoas no mundo. De cada dez casais, um experimenta infertilidade primária (sem histórico de gestação) ou secundária (quando a paciente já engravidou pelo menos uma vez). Os problemas de infertilidade geram sofrimento psicológico e social (WHO, 2002).
Socialmente, existe uma pressão sobre a mulher para que ela torne-se mãe, e é esta, muitas vezes, considerada sua principal e mais nobre função. A maternidade pode ser compreendida como a função social mais importante e realizadora da mulher (SUNDERLAND, 1990). Além da questão social mais ampla, a infertilidade pode gerar problemas familiares e conjugais de difícil superação.
A associação destes fatores pode levar a mulher que não consegue engravidar a apresentar sentimentos como ansiedade, angústia, culpa, inveja, perda da autoestima, entre outros (AVELAR et al., 2000; DOMINGUEZ, 2002; MOREIRA; MAIA; TOMAZ, 2002; PALÁCIO; JADRESIC, 2000).
Pines (1990) aponta que o fracasso da gravidez traz sentimentos de vergonha e culpa. A vergonha é pelo fato de se sentir diferente, por não conseguir engravidar como outras pessoas, e a culpa, por não dar netos aos pais.
Do ponto de vista da psicanálise, Klein (1921-1945) já havia descrito que o desejo da mulher de ter filhos surge na infância, pois desde muito pequena a menina possui um desejo intenso de ter seus próprios bebês. Esse desejo permanece e é o protótipo do amor maduro que a mulher grávida sente pelo bebê desde a sua concepção. Engravidar e ter um bebê significam a realização da feminilidade. Também dissipam as fantasias de um corpo danificado e garantem à mulher a sua capacidade de reparação. A capacidade de amar e cuidar de um filho cria, na mulher, a condição de vivenciar novamente suas primeiras experiências com a mãe, aplacando sentimentos ruins e experimentando sentimentos bons; esta é a capacidade de reparação do vínculo materno. A maternidade, quando a reparação é possível, proporciona uma aproximação genuína da mulher com sua mãe e com seu filho.
Considerando o exposto, a infertilidade gera um impacto negativo na saúde mental e, portanto, na qualidade de vida das mulheres. Conviver com a infertilidade é o mesmo que ter uma doença crônica grave, que implica um tratamento intensivo.
Segundo Corrêa, Vizzotto e Cury (2007), a infertilidade pode gerar conflitos que afetam o casal, desencadeando um estado de instabilidade emocional que pode levar a uma crise no relacionamento, de forma que o indivíduo não consegue utilizar seus métodos habituais para buscar soluções para os problemas. Os mesmos autores apontam ainda que, não só o ajuste emocional do casal infértil afeta sua relação, mas também o impacto do tratamento, seja ele bem ou mal-sucedido.
Para Ribeiro (2004), a infertilidade representa uma ferida narcísica. O filho é a continuidade do Eu; a transmissão da herança genética pode ser considerada uma aproximação da imortalidade do Eu. A infertilidade põe fim a estes desejos e reativa conflitos psíquicos.
Nestes casos, muitos pacientes concentram todos os seus investimentos no tratamento médico, esquecendo todos os outros setores de sua vida. A infertilidade intensifica o desejo de ter um filho. As novas técnicas de reprodução assistida trazem a esperança da gravidez. Mas, por outro lado, a mulher que não consegue engravidar por meio das técnicas, e que já enfrentava conflitos emocionais importantes, fica, a cada tentativa, mais deprimida e angustiada.
Em relação às técnicas de reprodução assistida, a taxa de sucesso por tentativa gira em torno de 25%. Isso significa que a probabilidade de insucesso é de 75%, o que gera grande expectativa e frustração nos casais. Os pacientes que procuram os centros de reprodução humana buscando uma solução para sua problemática deparam com novos problemas, como os fracassos nas tentativas e os custos financeiros altos (WHO, 2002).
Para Apfel e Keylor (2002), as sucessivas tentativas frustradas geram impacto muito negativo na vida destas mulheres. Por isso, a importância de se oferecer atendimento psicológico à paciente para ela ter a oportunidade de elaborar os dilemas relacionados à infertilidade e ao tratamento.
Fekkes et al. (2003) mostraram que pacientes com problemas de infertilidade experimentam grande tensão emocional. Esses autores concluem que as pacientes precisam receber aconselhamento psicológico antes de iniciarem o tratamento, considerando os prejuízos, não só da infertilidade, mas também do próprio tratamento, que é doloroso, oneroso e invasivo. Descrevem, também, que mulheres inférteis com idades entre 21 e 30 anos apresentam maiores problemas sociais e emocionais quando comparadas à população normal, ao contrário das mulheres inférteis mais velhas. A estas eles atribuem mais experiência de vida e estratégias de enfrentamento, tornando- -as mais capazes de lidar com a situação de infertilidade.
Os estudos realizados por Mazzotti (2007) mostraram, também, que a psicoterapia breve operacionalizada pode auxiliar a paciente a lidar de forma mais adequada com os conflitos vividos no tratamento, podendo, assim, melhorar a qualidade de vida.
O conceito de qualidade de vida está sendo gradativamente construído. Sua definição é constituída de fatores objetivos e subjetivos que variam de pessoa para pessoa e sofrem influência de valores culturais, religiosos e étnicos (MORAG, 1995).
Quanto à origem, o termo "qualidade de vida" surgiu nas ciências sociais a partir de uma visão baseada nos conceitos de saúde derivados do modelo biomédico. A alteração do modelo de saúde para uma visão ecológica também altera o conceito de qualidade de vida, que passa a ser compreendido por meio de uma visão multidimensional. Por isso, a descrição de qualidade de vida engloba múltiplos aspectos, como as características das populações e a influência da promoção da saúde e prevenção das doenças nos níveis primário, secundário e terciário.
O conceito de "qualidade de vida" tem sido utilizado em muitas pesquisas na área da saúde. De acordo com Seidl e Zannon (2004), o interesse pelo conceito "qualidade de vida" decorre dos novos paradigmas que têm influenciado as políticas e as práticas do setor nas últimas décadas. A subjetividade é um dos conceitos importantes relacionados com o termo qualidade de vida (QV). A subjetividade refere-se à percepção da pessoa sobre seu estado de saúde e em outros contextos de sua vida. As informações sobre QV são importantes indicadores para avaliação da eficácia, eficiência e impacto de determinados tratamentos para grupos de portadores de diversas doenças.
A definição do conceito e a possibilidade de avaliação, não só qualitativa, como quantitativa, levou à criação de diversos instrumentos ou índices com a finalidade de avaliar a qualidade de vida de pessoas saudáveis e/ou com os mais diversos problemas de saúde. Patrick e Deyo (1989) e Guyatt (1995) informam que estas avaliações podem ser feitas de dois modos: específico, capazes de avaliar determinados aspectos da qualidade de vida de forma específica e individual; e genérico, capacitados a demonstrar o impacto de uma doença na vida de indivíduos em diversas populações.
Em 1995 foi criado o The WHOQOL Group, pela Organização Mundial da Saúde (OMS), baseado nos pressupostos de que QV é uma construção subjetiva (percepção do indivíduo em questão), multidimensional e composta por elementos positivos (mobilidade) e negativos (dor).
Segundo Fleck et al. (2000), a necessidade de instrumentos de rápida aplicação determinou que o Grupo de Qualidade de Vida da Organização Mundial de Saúde desenvolvesse a versão abreviada do WHOQOL-100, o WHOQOL-bref, composta por 26 questões distribuídas nos domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente (THE WHOQOL GROUP, 1995), a qual será utilizada neste trabalho.
Com a atenção da área da saúde cada vez mais voltada à QV, e com a criação, por parte da OMS, do WHOQOL GROUP, a melhoria da qualidade de vida passou a ser um dos resultados esperados, tanto das práticas assistenciais quanto das políticas públicas para o setor, nos campos da promoção da saúde e da prevenção de doenças. Nesse raciocínio, ao pensar em mulheres com dificuldades de engravidar, a compreensão da qualidade de vida delas torna-se fundamental para direcionar possíveis estratégias no campo do atendimento especializado a elas.
Chachamovick (2006) mostra que identificar as variáveis preditoras da QV em pacientes com dificuldades para engravidar é de fundamental importância para planejar intervenções que abordem, de forma global, a vida da pessoa. A análise da QV contempla os seguintes domínios:
• domínio físico (Dom1): dor e desconforto, energia e fadiga, sono e repouso, mobilidade, atividades da vida cotidiana, dependência de medicação ou de tratamentos e capacidade de trabalho;
• domínio psicológico (Dom2): sentimentos positivos, pensamento, aprendizagem, memória e concentração, autoestima, imagem corporal e aparência, sentimentos negativos e espiritualidade/ religião/crenças pessoais;
• relações sociais (Dom3): relações pessoais, suporte (apoio) social e atividade sexual;
• meio ambiente (Dom4): segurança física e proteção, ambiente no lar, recursos financeiros, cuidados de saúde e sociais, disponibilidade e qualidade, oportunidades de adquirir novas informações e habilidades, participação em, e oportunidades de recreação/lazer, ambiente físico (poluição/ruído/ trânsito/clima) e transporte.
Desta forma, esta pesquisa teve como objetivo avaliar a qualidade de vida de mulheres pacientes de um ambulatório de reprodução humana. Por isso, neste estudo optou-se pela utilização de uma escala de avaliação de qualidade de vida genérica e breve. Assim, pode-se avaliar os vários domínios, o que nos possibilitou a compreensão global da qualidade de vida destas pacientes.
Método
Trata-se de uma pesquisa descritiva de corte transversal com enfoque quantitativo. Segundo Cervo e Bervian (2002, p. 66), "este tipo de pesquisa procura conhecer situações e relações que ocorrem na vida social, aspectos do comportamento humano, tanto do indivíduo isolado ou em grupos". De acordo com Gil (2002), a pesquisa tem como objetivo primordial a descrição das características de determinadas populações ou fenômenos; portanto, ela é descritiva na medida em que tem por finalidade descrever a qualidade de vida de mulheres com dificuldades para engravidar.
Sujeitos – Foram sujeitos desta pesquisa 124 mulheres com dificuldades para engravidar e que realizavam tratamento num ambulatório de reprodução humana da Faculdade de Medicina ABC (FMABC), na cidade de Santo André. A amostra foi escolhida por conveniência, a participação foi voluntária e a amostragem foi constituída por meio de técnica não probabilística (REA; PARKER, 2000).
Local – A pesquisa foi realizada no ambulatório de reprodução humana da FMABC, localizado na cidade de Santo André. Os dados foram coletados na recepção do ambulatório e na sala destinada aos atendimentos psicológicos.
Material / Instrumentos - Foram utilizados os prontuários das pacientes do ambulatório de reprodução humana, dos quais foram coletados os dados demográficos. Para avaliação do nível socioeconômico utilizou-se o questionário de avaliação do nível socioeconômico da Associação Brasileira dos Institutos de Pesquisa de Mercado (Abipeme). Esse critério cria uma escala, ou classificação socioeconômica, pela atribuição de pesos a um conjunto de itens de conforto doméstico, além do nível de escolaridade do chefe de família. Enfim, foi utilizado o WHOQOL-bref – Instrumento Abreviado de Avaliação da Qualidade de Vida. Este instrumento consta de 26 questões divididas em quatro domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente. Os dados coletados por meio desses instrumentos foram avaliados de acordo com a indicação dos autores dos instrumentos.
Procedimentos – As participantes foram informadas dos objetivos da pesquisa e convidadas a colaborar. Após a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, procedeu-se à aplicação dos instrumentos, na seguinte ordem: Abipeme, WHOQOL-bref. Em seguida, foi feita a coletada dos dados dos prontuários das pacientes.
Aspectos éticos - O projeto foi encaminhado ao comitê de ética e pesquisa da Faculdade de Medicina do ABC e foi aprovado sob nº 208/2010.
Análise dos dados – Por se tratar de um estudo quantitativo, a análise dos dados foi realizada com a utilização do software estatístico SPSS – Statistical Package for the Social Science, versão 14.0 para Windows. Utilizou-se a estatística descritiva e teste F ou ANOVA (comparação múltipla, teste de Tukey HSD).
Resultados e discussão
A análise descritiva das 124 mulheres do ambulatório de reprodução humana mostrou os resultados apresentados abaixo (Tabela 1).
A amostra foi constituída por 124 mulheres pacientes de um ambulatório de reprodução humana, com média de idade de 35 anos. O tempo de infertilidade das pacientes era, em média, de quatro anos, sendo que 22 (18%) tiveram aborto espontâneo e em duas (2%) o aborto foi provocado; 11 (9%) têm filhos da união anterior e seis (5%) têm filhos da união atual. Quanto ao tratamento, 37 (30%) pacientes já haviam procurado por tratamentos anteriores para engravidar. No que se refere à situação socioeconômica, cinco participantes (4%) pertencem à classe A e B; 73 (59%), à classe C; 41 (33%). à classe D; e 5 (4%), à classe E (Tabela 1).
O critério utilizado para caracterizar a infertilidade foi o da World Health Organization (WHO, 2002), que considera que a infertilidade é definida como a falta de concepção depois de pelo menos um ano de tentativas.
A análise dos domínios da QV (tabela 2) revelou as seguintes médias: Físico (dom1) 75,92, Psicológico (dom2) 69,72, Relações Sociais (dom3) 74,66 e Meio Ambiente (dom4) 63,00. Quanto maior a média, (em 100%) melhor é a qualidade de vida.
É de consenso na literatura que variáveis psicológicas (representadas pelo domínio 2 do Whooquol) e expressadas em ansiedade, angústia, culpa, inveja, perda da autoestima, além da A associação destes fatores (mais de um domínio) podem interfeir no levar a mulher q fato daue não mulher não conseguire engravidar a apresentar sentimentos como ansiedade, angústia, culpa, inveja, perda da autoestima, entre outros (AVELAR et al., 2000; DOMINGUEZ, 2002; MOREIRA; MAIA; TOMAZ, 2002; PALÁCIO; JADRESIC, 2000).
Assim, foi possível observar que pacientes com problemas de infertilidade experimentaram tensão emocional, havendo necessidade de receberem aconselhamento psicológico antes de iniciarem o tratamento. Aspecto corroborado pela literatura que considera as tensões como prejuízos não só da infertilidade, mas, também, do próprio tratamento, que é doloroso, oneroso e invasivo (FEKKES et al., 2003).
Cabe aqui ressaltar que, entendeu-se, tal como a OMS (2002) que os pacientes que procuram os centros de reprodução humana necessitam ter condições financeiras para arcar com os altos custos da medicação e dos procedimentos em reprodução assistida. Além disso, as dificuldades relacionadas ao casal e ao ambiente no lar devem ser consideradas quando se trata de problemas relacionados à infertilidade, pois, como apontaram Corrêa, Vizzotto e Cury (2007) a infertilidade pode desencadear no casal um estado de instabilidade emocional, gerando crise e o. O impacto do tratamento, bem ou malsucedido, também pode afetá-los.
Na comparação múltipla (teste de Tukey HSD) foram observadas diferenças estatisticamente significativas (p= 0,001) entre as classes sociais C e D no Dom4, revelando que a QV, no domínio "meio ambiente", é menor na classe D do que na classe C (tabela 3).
Os resultados mostraram que as pacientes têm melhor QV no domínio físico (75,92), destinado a aferir dor e desconforto, energia e fadiga, sono e repouso, mobilidade, atividades da vida cotidiana, dependência de medicação ou de tratamentos e capacidade de trabalho. O domínio meio ambiente, destinado a aferir sentimentos de segurança, ambiente do lar, recursos financeiros, acesso a informações e atendimentos de saúde, lazer e transporte, apresentou-se com a menor média (63,00), indicando que as mulheres apresentam menor satisfação com os componentes do meio ambiente (Dom 4). Quanto aos domínios psicológico, (dom2), 69,72, e relações sociais (dom3) ,74,66, apresentaram-se dentro da média. Quanto à idade, foi observado que a média era de 35 anos e, destas, apenas 37 pacientes já haviam realizado tratamento para engravidar. Associando a média de idade e a média da QV no domínio psicológico, podemos inferir que, assim como mostra o estudo de Fekkes et al. (2003), as mulheres inférteis mais velhas possuem mais experiência de vida e estratégias de enfrentamento que as torna mais capazes de lidar com a situação de infertilidade.
No domínio meio ambiente (Dom 4) os resultados obtidos na classe social C (66,35%), quando comparados aos resultados da classe social D (57,24%), mostraram que a QV é pior nesta última. Este resultado indica que o domínio meio ambiente, que se refere, entre outras facetas, à situação econômica e ao ambiente no lar, está mais comprometido quanto mais baixa é a classe social.
Conclusão
O presente estudo avaliou a QV de mulheres pacientes de um ambulatório de reprodução humana. Observa-se que, na média, a QV tende a ser regular, mas quando se analisam os pontos máximos e mínimos e as análises por sujeito, os resultados são muito ruins. Entretanto, de 100 pontos possíveis, algumas mulheres obtiveram apenas 25; de modo que, vistos individualmente, estes casos merecem atenção especial e intervenções imediatas.
Os serviços de reprodução humana devem dar atenção especial ao fato de que muitos recursos econômicos podem ser despendidos, muitas vezes por pacientes sem condições financeiras, fato que pode agravar ainda mais sua qualidade de vida, visto que muitos concentram todos os seus investimentos no tratamento médico, esquecendo-se de todos os outros setores de sua vida.
A comparação múltipla evidenciou, de modo estatisticamente significativo, que as mulheres pacientes de um ambulatório de reprodução humana apresentam menor satisfação no que se refere ao domínio meio ambiente. O que pode levar a pensar que a infertilidade pode ter consequências diversas, afetando a mulher em várias áreas de sua vida; os outros domínios apontaram tendência estatística não significativa.
Pode-se concluir que, por meio do Whoqol-bref , identificou-se, em seus domínios, fatores positivos e negativos que estão envolvidos nesse sofrimento e, a partir deles, pode-se pensar em medidas para atenuá-los.
Considera-se que esta pesquisa trouxe uma melhor compreensão das facetas que representam os domínios que medeiam a qualidade de vida das mulheres pacientes de um ambulatório de reprodução humana.
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Contato dos Autores:
Maria Geralda Viana Heleno – maria.heleno@metodista.br
Leonilde R.Paludetti
Universidade Metodista de São Paulo
Mestrado em Psicologia da Saúde
Rua Dom Jaime de Barros Câmara, 1000
Cep: 09895-400
São Bernardo do Campo, SP
Recebido em: 17-06-2012
Aceito em: 08-11-2012