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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH vol.14 no.1 Rio de Janeiro jun. 2011

 

ARTIGOS

 

Internação infantil e sintomas depressivos: intervenção psicológica

 

Admission depressive symptoms and children: psychological intervention

 

 

Marisa Leonetti Marantes Sanchez*; Vanessa de Lourdes Nunes Ebeling**

ULBRA

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Toda a criança, especialmente aquela submetida a um processo de hospitalização, tem a necessidade de expressar seus sentimentos para minimizar seu nível de ansiedade. A pesquisa baseou-se em estudo observacional e descritivo, com foco nos sintomas depressivos apresentados em crianças quando do processo de internação. A coleta de dados teve como universo o Hospital Universitário da Ulbra, no período compreendido entre oito meses. A população foi constituída por dez crianças com idade entre sete á doze anos de idade, de ambos os sexos da Unidade de Internação Pediátrica. Os instrumentos Inventário de Depressão Infantil (CDI) e a Escala Analógica do Humor Infantil foram aplicados após o brinquedo diretivo realizado com o paciente pela estagiária de psicologia, permitindo concluir que há grande beneficio terapêutico na utilização da intervenção psicológica durante a hospitalização. Através do brincar há uma redução na ansiedade e demais sintomas depressivos, minimizando o desgaste emocional, favorecendo o desenvolvimento de estratégias de enfrentamento e o manejo da sintomatologia.

Palavras-chave: Internação pediátrica; Depressão infantil; Psicologia pediátrica.


ABSTRACT

Every child, especially those subjected to a process of hospitalization have the need to express their feelings to minimize your anxiety level. The research was based on qualitative study of a prospective, observational and descriptive, focusing on depressive symptoms in children when the process of admission. Data collection was the universe Ulbras University Hospital over a period of 12 months. The study population consisted of 10 children aged 07 to 12 years old, of both sexes admitted to the pediatric unit. The instruments, Child Depression Inventory (CDI) and the Mood Analog Scale were applied after Child toy steering performed with the patient by a psychology intern, allowing to conclude that there is great therapeutic benefit in the use of psychological intervention during hospitalization. Through the play there is a reduction in anxiety and other depressive symptoms, minimizing the emotional stress by promoting the development of coping strategies and management of symptoms.

Keywords: Pediatric hospitalization; Childhood depression; Pediatric psychology.


 

 

Introdução

Embora tenham por finalidade promover o tratamento e a cura da doença, os procedimentos hospitalares representam para a criança caráter doloroso, ameaçador e invasivo, podendo interferir no desenvolvimento físico, psíquico e intelectual (Parcianello & Felin, 2008). A internação hospitalar pode gerar uma série de traumas para a criança e sua família, muitas vezes irreversíveis. A hospitalização afasta a criança da sua vida social, familiar e escolar, promovendo confrontos com a dor, limitações físicas, desorientação e passividade. A criança desenvolve sentimentos de carência afetiva, culpa, punição e medo da morte. (Monteiro, 2007; Parcianello & Felin, 2008).

A hospitalização geralmente é aceita pelas crianças em virtude da necessidade de tratamento, porém há o reconhecimento de que a vida fica diferente devido às limitações da doença e do próprio hospital, que causam transtornos, medos e apreensões (Monteiro, 2007; Parcianello & Felin, 2008). Elas demonstram compreender a necessidade dos procedimentos hospitalares realizados, com vistas à superação da doença, porém, os identificam como dolorosos. A relação com a equipe de enfermagem também se apresenta de modo ambivalente, visando a dor e ao mesmo tempo a cura (Quintana, Arpini, Pereira & Santos, 2007 ). As principais dificuldades resultantes do processo de hospitalização são: estranhamento do ambiente, inexistência de atividades recreativas no período da noite e finais de semana, restrição ao leito, perda da privacidade, ruptura da identidade, ausência de familiares e a falta de explicação por parte dos profissionais da saúde quando da realização de determinados procedimentos (Monteiro, 2007).

Os distúrbios conseqüentes da hospitalização estão associados à impossibilidade da criança lidar com os acontecimentos. Esses distúrbios podem corresponder à depressão, instabilidade, apatia, agressividade, isolamento social, atraso no desenvolvimento cognitivo, alterações fisiológicas, insônia, inapetência, diminuição das resistências (baixa da imunidade) e manifestações psicossomáticas. Essas reações são de tristeza e levam a criança ao afastamento do meio, dificultando a atuação da equipe de saúde, rejeitando as medicações, exames e demais orientações (Monteiro, 2007).

Durante o processo de internação a criança encontra-se em situação de crise, tristeza, estresse e sofrimento psíquico, expressando insatisfação e ansiedade através da palavra, do comportamento e de reações emocionais, que geralmente são diferentes do habitual (Alcântara, 2007). As diferentes fontes de estresse podem referir-se ao medo da dor, das agulhas, procedimentos invasivos e o receio de ser afastado dos familiares (Ribeiro & Ângelo, 2005). Tais reações podem estar associadas ao seu padrão de funcionamento cognitivo, emocional e comportamental. A falta de estratégias de enfrentamento para esta situação estressante e o esquema de funcionamento estabelecido pode contribuir para o surgimento de sentimentos de ansiedade e sintomas depressivos (Alcântara, 2007; Oliveira, Dantas & Fonseca, 2005).

A depressão infantil apresenta algumas peculiaridades que estão relacionadas à fase do desenvolvimento. Na criança a depressão pode se manifestar (além dos mesmos critérios utilizados para adolescentes e adultos) através de problemas somáticos e alterações de comportamento. (Cruvinel, Boruchovitch & Santos, 2008). De acordo com o DSM IV, os sintomas básicos de um Episódio Depressivo Maior, são os mesmos para crianças e adolescentes. Na depressão infantil o diagnóstico pode ser realizado de acordo com os mesmos critérios utilizados na depressão adulta. Para um diagnóstico de Episódio Depressivo Maior, é necessário que o indivíduo apresente durante ao menos duas semanas, cinco ou mais dos seguintes sintomas: humor deprimido; falta de interesse e prazer nas atividades; perda ou ganho de peso; alterações no sono; agitação ou retardo psicomotor; fadiga ou perda de energia; sentimentos de inutilidade e culpa; indecisão e dificuldades de concentração; suicídio e tentativa de suicídio.

O CDI (Inventário de Depressão Infantil) é o instrumento mais importante e usado atualmente, na identificação de sintomas depressivos na infância. O CDI trata-se de uma escala de vinte e sete questões de auto-avaliação, destinada a identificar sintomas de depressão em crianças e adolescentes com idades compreendidas entre sete e dezessete anos. Cabe salientar que o CDI é um instrumento para avaliação de sintomas e não usado para diagnóstico clinico (Cruvinel, Boruchovitch, & Santos, 2008). De acordo com os autores, o CDI é um instrumento com parâmetros psicométricos aceitáveis sendo bastante útil na avaliação de crianças com sintomas depressivos. A maioria dos estudos brasileiros acerca da depressão infantil que utilizam o CDI, emprega o ponto de corte dezessete para presença de depressão.

Um estudo sobre o impacto da hospitalização na infância mostrou que 11% das crianças hospitalizadas têm depressão e em outras 20% surgiram sintomas de perturbação. Sendo que em 25% das crianças internadas por problemas neurológicos e 33,33% das internadas por problemas respiratórios apresentaram sintomas depressivos (Alcântara, 2007; Pires, 2006). Dessa forma, é necessário atentar para o fato de que, quanto mais sintomas a criança apresentar, maior será a probabilidade de um desenvolvimento atípico, visto que a depressão poderá interferir nas atividades associadas à cognição e à emoção. Quando não tratada a tempo, a criança poderá desenvolver padrões de comportamento que se tornam resistentes a mudanças (Esteves & Galvan, 2006).

O hospital é um ambiente que reforça o comportamento de depressão, neste caso é inevitável encontrar crianças com sintomas depressivos em virtude da hospitalização. A intervenção psicológica juntamente com o brincar são estratégias que promovem um ambiente que não reforça comportamentos de depressão, auxiliando a criança a enfrentar as dificuldades do processo de internação e da doença (Motta & Enumo, 2004). O brincar durante o processo de hospitalização é uma estratégia que possibilita a criança alterar o ambiente em que se encontra (internação), para um contexto da realidade cotidiana. Através da brincadeira, a criança passa de uma posição passiva para uma mais ativa, lidando com a sua realidade interior. A atividade recreativa livre e desinteressada tem um efeito terapêutico uma vez que auxilia na promoção do bem estar do paciente (Ferro & Amorim, 2008).

Na Unidade de Internação Pediátrica do Hospital Universitário da Ulbra, é possível observar que as crianças hospitalizadas, independente da faixa etária e patologia física, apresentam mudanças comportamentais e emocionais, tais como apatia, desânimo, falta de apetite e irritabilidade. Tais alterações geralmente são atenuadas após a intervenção psicológica, justificando assim, a necessidade de estudar a eficácia da atuação do psicólogo na redução dos sintomas depressivos em crianças, ocasionados pela hospitalização. As intervenções realizadas juntamente com as crianças internadas correspondem a brincadeiras no leito, sala de recreação, jogos, desenhos, colagem e leitura. É através do brincar que a criança se transporta do contexto concreto da hospitalização, da doença e de pensamentos aversivos, para um contexto de imaginação e conteúdos prazerosos (Magalhães, 2008).

 

Método

Participantes

Este estudo quantitativo observacional e descritivo, envolveu dez crianças, pacientes do Hospital Universitário da Universidade Luterana do Brasil (HU-ULBRA), na cidade de Canoas, da Unidade de Internação Pediátrica submetidas ou não à cirurgia de pequeno porte. Destas crianças, cinco eram do sexo masculino e cinco do sexo feminino, com idades entre sete a onze anos de idade, todas escolares das series iniciais e de famílias com situação econômica cuja renda salarial varia entre um salário mínimo a três salários mínimos.

A escolha dos participantes ocorreu por conveniência, sendo todos pacientes da Unidade de Internação Pediátrica. Foram considerados critérios de exclusão crianças que apresentaram déficit cognitivo, lesão cerebral e problemas psiquiátricos.

 

Instrumentos

Questionário dos Dados Sócio-demográficos: Foi aplicado um questionário para investigar os dados sócio-demográficos das crianças e seus familiares. Este consiste em duas partes, a primeira se refere às questões de adoecimento da criança (idade, sexo, escolaridade, motivo da internação, internações anteriores, se faz acompanhamento psicológico ou já fez e motivo deste acompanhamento, entre outros). A segunda parte do questionário envolve perguntas referentes aos familiares responsáveis (qual o grau de parentesco, idade, sexo, estado civil, escolaridade e renda familiar).

Inventário de Depressão Infantil (CDI): Instrumento de auto relato constituído por vinte e sete perguntas que avaliam sinais de depressão na criança de ambos os sexos. De acordo com os autores Golfeto, Veiga, Souza e Barbeira (2002), a pressuposição da escala é de que a depressão infantil pode ser descrita pelos mesmos sintomas apresentados no adulto, tais como: culpa, baixa auto-estima, problemas no sono, e apetite, perda de interesse na rotina, retraimento social, idéias suicidas, entre outros. Antes da aplicação do instrumento, foi estabelecido vínculo com o paciente através de apresentação pessoal, diálogo, jogos e brincadeiras. Após o estabelecimento do vínculo e execução de atividades, fora esclarecida a finalidade da pesquisa, sendo apresentado o termo de consentimento livre e esclarecido para autorização mediante assinatura do responsável. As perguntas foram lidas ao paciente pela estagiária e conforme o paciente respondia, era marcada a opção escolhida. O tempo de duração por aplicação correspondeu em média dez minutos.

Escala Analógica do Humor Infantil: Para este estudo, foi elaborada uma Escala Analógica de faces para o monitoramento do humor das crianças hospitalizadas. O instrumento consiste na representação de três faces com expressões de felicidade, raiva e tristeza em que a criança marca nos dias da semana como se sentiu no período do dia, sendo manhã, tarde e noite. Com este instrumento é possível avaliar a mudança no humor da criança, após a intervenção psicológica.

 

Procedimentos Éticos e Coleta de Dados

Conforme as diretrizes e normas regulamentadoras da pesquisa envolvendo seres humanos, esta foi apresentada e aprovada pelo Comitê de Ética do Hospital Universitário da ULBRA - Canoas/RS.

A coleta de dados ocorreu no período entre outubro de 2009 a junho de 2010 .Os instrumentos foram aplicados na medida em que crianças com idades compreendidas entre sete a doze anos, sem déficit cognitivo, lesão cerebral e distúrbios psiquiátricos eram internadas na Unidade de Internação Pediátrica do Hospital Universitário da Ulbra em Canoas/RS. As internações eram monitoradas pela pesquisadora, através de uma lista fornecida pelo hospital de pacientes internados. A pesquisa foi realizada nos leitos e na sala de recreação. Os esclarecimentos foram devidamente prestados, sendo entregue o TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido) para assinatura dos responsáveis. Foram fornecidas as devidas explicações para os participantes (crianças) em relação ao objetivo da aplicação dos instrumentos bem como da pesquisa. Após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, a intervenção junto com a criança, foi realizada. A criança era questionada a respeito da atividade que gostaria de fazer, tais como: jogos, colagens, desenhos, pintura, conto, brinquedo livre e criação de histórias. O brinquedo dirigido possibilitou à criança a expressão de seus pensamentos e sentimentos. Utilizaram-se também contos, através de livros infantis e relacionados ao processo de adoecimento e hospitalização. O tempo para realização de atividades com cada paciente variou de acordo com as condições, desejo e possibilidades do paciente, correspondendo a uma média de trinta minutos.

Após a realização das atividades, a pesquisadora solicitava ao responsável o preenchimento do questionário dos dados sócios demográficos. As perguntas do Inventário de Depressão Infantil (CDI) eram ditadas pela pesquisadora e respondidas pela criança. Depois de respondido o Inventário de Depressão Infantil era solicitado que a criança preenchesse a Escala Analógica de Humor Infantil. O preenchimento da Escala Analógica de Humor Infantil era de acordo com a percepção da criança em relação aos seus sentimentos antes e após a realização das atividades.

 

Análise e Discussão dos Resultados

Para análise dos dados e posterior discussão dos resultados, foi feita a descrição da distribuição de freqüência das variáveis sócio-demográficas, pontuação do CDI, resultados obtidos na Escala Analógica de Humor e registro sobre as observações e intervenções realizadas juntamente com o paciente bem como a coleta de informações realizada com os responsáveis.

Das crianças participantes da amostra, 50% eram do sexo masculino e 50% eram do sexo feminino, com idades compreendias entre sete a doze anos, sendo a idade média 8.5 anos. A média correspondente ao período de internação considerando a data da baixa até o momento da coleta de dados corresponde a três dias de hospitalização. Em relação ao motivo da internação, 50% das crianças foram internadas por problemas respiratórios e processos alérgicos, 30% devido a problemas do aparelho digestivo, 10% com HIV e 10% por causa indefinida à ser investigada. Em estudo realizado no Estado de São Paulo, sobre os fatores associados à internação hospitalar de crianças, foram encontrados dados que apontam as afecções do aparelho respiratório como as maiores causas de adoecimento e de demanda aos serviços de saúde (Molina, Marcon, Uchimura & Lopes, 2008).

Considerando internações anteriores, 60% das crianças já haviam sido internadas e 40% ainda não haviam sido internadas. Das crianças que já haviam sido internadas, 40% são as que estavam hospitalizadas em virtude de problemas respiratórios. As famílias de crianças com doenças crônicas, como bronquite e asma, recorrem freqüentemente aos atendimentos de urgência e emergência em virtude do medo de agir perante a situação ou falta de recursos. As famílias quando não dotadas de recursos ou competências suficientes para lidar com a doença em momentos de crise geradores de ansiedade, recorrem a um local seguro que transmita segurança para solução do problema de saúde do seu filho, diminuindo os medos, ansiedades e preocupações por parte dos pais e/ou responsáveis ( Pereira, 2009).

Em relação aos acompanhantes das crianças hospitalizadas que participaram da amostra, 80% eram mães, cujas idades variaram entre 18 e 34 anos. Durante a intervenção, constatou-se a presença de ansiedade por parte das mães que acompanhavam seus filhos em tempo integral, sem revezar com outros familiares. A preocupação freqüente era em virtude de outros filhos que ficavam sob cuidados de parentes, rotina e trabalho. De acordo com a autora Pereira (2009) freqüentemente é a mãe que acompanha o filho durante a hospitalização, deixando para segundo plano as responsabilidades domésticas, profissionais e outros filhos quando existem.

Quanto à escolaridade das mães, 40% possuem ensino fundamental completo e 20% ensino médio completo. Tratando-se de pacientes usuários do Sistema Único de saúde (SUS), este nível de escolaridade é condizente . No Brasil, conforme dados do Ministério da Saúde (2008), 190 milhões de pessoas são usuárias do SUS, sendo que 80% delas dependem exclusivamente deste sistema para ter acesso aos serviços de saúde.

Em relação à estrutura familiar, 70% das crianças que participaram da amostra, são filhos de pais separados o que diz respeito ao casamento, pode ser notada a tendência de aumento na dissolução de casamentos nas últimas décadas na maioria dos países, incluindo o Brasil (Pinheiro, Lima & Moura, 2005). Dos fatores associados à depressão na adolescência, os que mais se destacam é a exposição aos estressores na infância, entre eles, separação ou divórcio dos pais. A separação dos pais na infância, pode acarretar graves problemas para a criança durante todo o decorrer da sua vida (Macedo, 2007).

Os indicativos de sintomas depressivos perante o processo de hospitalização foram analisados através da observação realizada em dois momentos: 1 – no leito antes da realização das atividades, através do diálogo e o vínculo estabelecidos com a criança 2 – durante a realização das atividades, a partir da intervenção, comportamento da criança e aplicação dos instrumentos (Inventário de Depressão Infantil e Escala Analógica de Humor Infantil).

De acordo com os resultados obtidos através do Inventário de Depressão Infantil, 20% das crianças que participaram da amostra obtiveram pontuação acima do ponto de corte 17, indicando sintomatologia depressiva. Em virtude do número da amostra corresponder a 10 crianças, a prevalência da sintomatologia depressiva não pode ser considerada expressiva.

Foi possível constatar que o Inventário de Depressão Infantil (CDI), apesar de possuir condições de avaliar crianças com sintomas depressivos e auxiliar nos diagnósticos clínicos, não é um instrumento adequado para avaliação de sintomatologia situacional, causada por estressores, neste caso, o adoecimento e internação hospitalar. De acordo com os autores Cruvinel, Boruchovitch & Santos (2008), pedir para uma criança selecionar a melhor alternativa que descreva seus sentimentos nas duas últimas semanas pode ser uma tarefa complexa.

Através da Escala Analógica de Humor, foi possível avaliar os sentimentos das crianças frente ao processo de adoecimento e hospitalização. A EAH avalia e monitora diariamente o humor percebido e sentido pela criança em diferentes momentos da hospitalização. Quando da internação, oito crianças (80%) apontaram humor triste, uma criança (10%) apontou raiva e uma (10%) mencionou humor feliz. Considerando o dia da intervenção, antes da mesma ser realizada, sete crianças (70%) apontaram humor feliz, duas crianças (20%) mencionaram humor triste, sendo uma (10%) mencionou raiva. Após a intervenção psicológica 100% das crianças apontaram humor feliz. Em relação a oscilação de humor 70% das crianças mencionaram tristeza, raiva e felicidade ao longo dos dois dias (manhã, tarde e noite) que antecederam a intervenção psicológica ( prevalecendo o sentimento de tristeza).

De acordo com os resultados obtidos através da EAH, percebe-se que o processo de adoecimento e hospitalização são estressores que deprimem o humor, prevalecendo o sentimento de tristeza quando da internação. É freqüente a oscilação de humor ao longo dos dias que sucedem a data da baixa hospitalar e bem evidente a melhora após a intervenção psicológica. A intervenção psicológica, realizada através do brinquedo livre, jogos, colagens, desenho, pintura e histórias, auxilia a criança internada no manejo de seus sentimentos, ansiedade, crenças e percepção em relação ao processo de hospitalização e adoecimento. De acordo com o autor Magalhães (2008) é evidente a necessidade de a criança poder brincar no período de internação como forma de elaboração da própria doença, limites e possibilidades.

Através da observação e diálogo realizado com as mães e paciente, existem alterações cognitivas, afetivas e comportamentais quando da internação. As crianças encontram dificuldades para lidar com as ameaças que a doença , o ambiente hospitalar e suas conseqüências representam. De acordo com os autores Oliveira, Dantas & Fonseca (2005), tratando da assistência prestada à criança hospitalizada, o psicólogo é o profissional que trabalha com medidas preventivas na compreensão da situação de enfermidade referente aos aspectos psicológicos que surgem, desenvolvendo intervenções precoces e rápidas na modificação de comportamento e aceitação da própria realidade.

 

Conclusão

Grande parte das questões do CDI corresponde aos sentimentos vivenciados perante a vida da criança de um modo geral, visando principalmente sua rotina. Seria interessante que a questão fosse investigada de forma que a criança selecionasse a melhor alternativa que descrevesse os sentimentos considerando a situação presente. Recomenda-se que sejam realizados novos estudos a respeito da sintomatologia depressiva associada à internação, através de pesquisas com amostras maiores e mais representativas bem como a utilização de instrumentos que possam avaliar os sentimentos relacionados ao processo de adoecimento e internação.

Com base nesta pesquisa é possível afirmar o quanto se faz pertinente a presença do psicólogo na unidade de internação pediátrica. A ansiedade é inerente na situação de hospitalização, tanto por parte das mães que acompanham como por parte dos pacientes. Através da intervenção psicológica é possível amenizar os medos, ansiedades e crenças disfuncionais objetivando a colaboração do paciente no processo de hospitalização bem como sua pronta recuperação.

Espera-se que esta pesquisa acrescente dados importantes para produções cientificas da área, subsidiando os profissionais que analisam e descrevem cognições, sentimentos e comportamentos de crianças hospitalizadas.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Marisa Leonetti Marantes Sanchez
E-mail: marisa.sanchez@ig.com.br

 

 

* Mestre em Psicologia, PUCRS. Docente da ULBRA. Tutora Regional em Humanização de Recém Nascidos Baixo Peso pelo MS. Membro da Diretoria da SBPH, gestão 2009/2011. Responsável pelo Serviço de Psicologia do Hospital Universitário Ulbra.
** Acadêmica Egressa do Curso de Psicologia da Ulbra. Especialista em formação em Psicoterapia de Técnicas Integradas pelo Instituto Fernando Pessoa/RS. E-mail: vanessanu@hotmail.com

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