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Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva
versão impressa ISSN 1517-5545
Rev. bras. ter. comport. cogn. vol.1 no.1 São Paulo jun. 1999
ARTIGOS
A avaliação de um programa de treinamento da empatia com universitários
Assessment of a training program to develop empathy for university students
Eliane Falcone
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
RESUMO
Este estudo avaliou a eficácia de um Programa de Treinamento da Empatia (PTE) no desenvolvimento do comportamento empático de estudantes universitários. Foram designados, randomicamente, dez sujeitos (três do sexo masculino e sete do sexo feminino) para o grupo experimental e sete sujeitos (quatro do sexo masculino e três do sexo feminino) para o grupo controle. Os sujeitos foram filmados em situações de jogos de papéis, antes e depois do treinamento, com follow up de 30 dias. Os conteúdos verbal e não-verbal de seus comportamentos foram avaliados por seis juizes previamente treinados e cegos para ambos os grupos. O PTE foi realizado em 11 encontros de duas horas. Os testes t de Student e Mann-Whitney revelaram mudança significativa entre os sujeitos experimentais em relação aos sujeitos controle, na comunicação verbal e em quatro dos 12 aspectos da comunicação não-verbal.
Palavras-chave: Treinamento da empatia, Empatia e comunicação, Habilidades sociais, Empatia.
ABSTRACT
Assessment of a training program to develop empathy for university students. This study evaluated the effectiveness of an empathy training (ETP) program in developing empathic behavior among university students. The experimental group consisted of 10 ramdomly designated subjects (three male and seven female) and the control group comprised seven subjects (four male and three female). The subjects were filmed in role play situations, before and after training, with follow up at 30 to 45 days. The verbal and non-verbal content of their behavior of both groups was evaluated by six previously trained, blind adjudicators. The ETP was carried out at I I two-hour encounters. The Student-t and Mann-Whitney tests revealed significant change among the experimental subjects in relation to the control subjects in verbal communication and in four of the 12 aspects of non-verbal communication.
Keywords: Empathy training, Empaty and communication, Social skills, Empathy.
A empatia tem sido considerada como um atributo necessário aos psicoterapeutas e profissionais de ajuda. Ao adotarem uma atitude empática, esses profissionais contribuem para aumentar a auto-estima de seus pacientes, favorecendo a auto-revelação, o vínculo terapêutico e a adesão ao tratamento (Bohart & Greenberg, 1977; Bohart & Tallman, 1997; Jordan, 1997; Safran & Segal, 1990).
Atualmente, uma variedade de pesquisas sobre os efeitos sociais da empatia sugere que essa habilidade social: é mais útil do que a assertividade na manutenção da qualidade dos relacionamentos (Hansson et al., 1984, in Davis & Oathout, 1987); mostra uma tendência para provocar efeitos interpessoais mais positivos do que a auto-revelação (revisão de Brems, Fromme & Jonhson, 1992); pode afetar efeitos sociais importantes, tais como: popularidade com os amigos, solidão e satisfação em relações românticas (revisão de Davis e Oathout, 1992); ajuda a desenvolver habilidades de enfrentamento e reduz problemas emocionais e psicossomáticos nos amigos e familiares (revisão de Burleson, 1985); é preditiva de ajustamento marital (Long & Andrews, 1990) e afeta a satisfação na relação conjugal, através de suas influências sobre comportamentos específicos de mediação (Davis & Oathout, 1987); é positiva para o ajustamento conjugal (revisão de Ickes & Simpson, 1997).
Todos esses estudos propõem que os indivíduos empáticos tornam as relações mais agradáveis, reduzindo o conflito e o rompimento (Davis, 1983 a, 1983 b). A habilidade em "ler" e valorizar os pensamentos e sentimentos das outras pessoas é o que, provavelmente, torna esses indivíduos mais bem sucedidos em suas relações pessoais e profissionais (Ickes, 1997). Por outro lado, indivíduos não empáticos parecem carecer de inteligência social e podem se tornar prejudicados no trabalho, na escola, na vida conjugal, nas amizades e nas relações familiares, além de correrem o risco de viver à margem da sociedade (Goleman, 1995).
A empatia é definida como uma habilidade de comunicação, que inclui três componentes: (1) um componente cognitivo, caracterizado pela capacidade de compreender, acuradamente, os sentimentos e perspectivas de outra pessoa; (2) um componente afetivo, identificado por sentimentos de compaixão e simpatia pela outra pessoa, além de preocupação com o bem-estar desta; (3) um componente comportamental, que consiste em transmitir um entendimento explícito do sentimento e da perspectiva da outra pessoa, de tal maneira que esta se sinta profundamente compreendida (Ver Davis, 1980, 1983a, 1983 b; Barrett-Lennard, 1993; Egan, 1994).
Em uma situação de interação, a habilidade empática ocorre em duas etapas. Na primeira etapa, o indivíduo que empatiza está envolvido em compreender a perspectiva e os sentimentos da pessoa-alvo e, de algum modo, experienciar o que está acontecendo com ela naquele momento. A segunda etapa consiste em comunicar esse entendimento de forma sensível (Barrett-Lennard, 1981; Greenberg & Elliot, 1997). A compreensão empática inclui prestar atenção e ouvir sensivelmente. A comunicação empática de entendimento inclui verbalizar sensivelmente.
Prestar atenção - a atenção empática envolve "estar com" a outra pessoa, física e psicologicamente. Os comportamentos que demonstram atenção empática são predominantemente não-verbais: (a) fitar diretamente a outra pessoa, adotando uma postura que identifique envolvimento; (b) adotar uma postura aberta, evitando cruzar os braços e as pernas; (c) inclinar-se levemente em direção à pessoa alvo; (d) acenar com a cabeça e/ou usar vocalizações breves (ex.: "hum-hum") quando a pessoa está revelando algo importante; (e) adotar uma postura descontraída - gestos nervosos, tais como: tamborilar, balançar a perna ou remexer-se na cadeira demonstram impaciência e desinteresse.
A atenção empática também envolve procurar identificar as mensagens não-verbais da pessoa-alvo, que expressam emoções, tais como: comportamento corporal (postura, movimentos corporais), expressões faciais (sorrisos, cenho franzido, sobrancelhas arqueadas, lábios contraídos); relação entre a voz e o comportamento (tom de voz, intensidade, inflexão, espaço entre as palavras, fluência etc.); respostas autonômicas observáveis (respiração acelerada, rubor, palidez, dilatação da pupila), aparência geral.
Ouvir sensivelmente - ouvir sensivelmente não significa ser capaz de reproduzir o que alguém acabou de falar. O ouvir sensível envolve dar ao outro a oportunidade de ser ouvido em seus próprios termos, sem ser julgado. O bom ouvinte é aquele que aprecia a outra pessoa tal como ela é, aceitando os seus sentimentos e idéias, tais como eles são. Como conseqüência, a pessoa se sente entendida, reconhecida, aceita e valorizada (Nichols, 1995).
Em situações de conflito, o ouvir sensível também promove efeitos positivos na interação, na medida em que reduz a querela e a probabilidade de rompimento. Ouvir sensivelmente, demonstrar compreensão e aceitação a uma pessoa que está furiosa, tem o poder de reduzir a raiva dessa pessoa, tornando-a mais disponível para ouvir também. Da mesma maneira, procurar compreender as razões do comportamento de alguém que provocou mágoa e raiva, pode reduzir a intensidade desses sentimentos e facilitar um diálogo de entendimento (Goleman, 1995; Nichols, 1995).
Os comportamentos envolvidos no ouvir sensível são: (a) deixar de lado as próprias perspectivas, desejos e sentimentos, por alguns instantes e se voltar inteiramente para as perspectivas, desejos e sentimentos da outra pessoa; (b) observar e "ler" os comportamentos não-verbais que a pessoa-alvo está manifestando enquanto fala, através dos quais sejam identificadas as emoções; (c) colocar-se no lugar da outra pessoa, identificando-se com os sentimentos, perspectivas e desejos desta; (d) elaborar, mentalmente, uma relação existente entre o sentimento, o contexto e o significado deste contexto para a outra pessoa (Egan, 1994).
Verbalizar sensivelmente - a função da verbalização empática é fazer com que a outra pessoa se sinta compreendida, encorajando-a a explorar as suas preocupações de forma mais completa. As estratégias de verbalização empática: (a) tentam explicar e validar os sentimentos e perspectivas da outra pessoa, sem julgar; (b) relacionam o contexto, a perspectiva e os sentimentos da outra pessoa.
Um exemplo de verbalização empática dirigida a uma pessoa que está triste por não haver conseguido passar em um concurso público, poderia ser: "É muito duro estudar tanto para um concurso e não passar. Eu sei o quanto você investiu em seus estudos. Você deve estar se sentindo magoado e injustiçado por não ver os seus esforços reconhecidos, não é mesmo? " Neste caso, os sentimentos e perspectiva da pessoa são identificados, validados e relacionados. Um exemplo de verbalização não empática poderia ser: "Não há razão para ficar deprimido. Você poderá fazer outros concursos." Neste tipo de verbalização, o sentimento e a perspectiva da outra pessoa são desvalorizados. O indivíduo é considerado inadequado por "exagerar" no seu sentimento e por "supervalorizar" a importância do concurso.
Em situações de conflito, quanto maior é a divergência de opiniões, mais importante é reconhecer o que a outra pessoa diz, antes de apresentar o próprio ponto de vista. Ouvir sensivelmente, demonstrar compreensão e aceitação a uma pessoa que está furiosa, tem o poder de reduzir a raiva dessa pessoa, tornando-a mais disponível para ouvir também. Da mesma maneira, procurar compreender as razões do comportamento de alguém que provocou mágoa e raiva, pode reduzir esses sentimentos e facilitar um diálogo de entendimento (Goleman, 1995; Nichols, 1995). Quando a outra pessoa está raivosa ou magoada, torna-se fundamental demonstrar compreensão e aceitação dos sentimentos e perspectivas desta, sem apresentar qualquer justificativa, antes de se certificar de que a outra pessoa se sentiu realmente compreendida.
Um exemplo de declaração empática em situação de conflito, pode incluir: "Então, todo esse tempo você vem sentindo que eu estou com raiva de você e por essa razão eu deixei de ser afetuosa. Não é de admirar que você esteja magoado comigo." declarações desse tipo tendem a reduzir a ansiedade da outra pessoa, tornando-a mais disponível para ouvir.
A constatação da importância do comportamento empático na qualidade das relações interpessoais tem motivado a criação de programas de treinamento da empatia para crianças e adultos. A crescente realização de pesquisas sobre esse tema tem permitido uma conceitualização mais clara dos componentes dessa habilidade, bem como das suas formas verbal e não-verbal de comunicação.
Considerando-se que os problemas de desempenho social são comuns na população geral (Collins & Collins, 1992), o treinamento da empatia pode ser benéfico para qualquer pessoa. Atualmente, os programas de aprendizagem de competências sociais focalizam-se no desenvolvimento máximo das capacidades pessoais e relacionais, bem como da generalização dessas aquisições para o contexto relacional do indivíduo (Matos, 1997). Assim, qualquer pessoa que aprenda a se comportar empaticamente, poderá generalizar essa habilidade para as suas relações pessoais e profissionais.
Esse estudo pretendeu avaliar a eficácia de um programa de treinamento da empatia (PTE) no desenvolvimento do comportamento empático de estudantes universitários e na generalização dessa aprendizagem para o contexto relacional desses estudantes.
Método
Foram sujeitos dessa pesquisa 17 estudantes de graduação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que responderam a um recrutamento através de cartazes. desses estudantes, 10 constituíram o grupo experimental (3 do sexo masculino e 7 do sexo feminino) e 7 constituíram o grupo controle (4 do sexo masculino e 3 do sexo feminino). Os sujeitos de ambos os grupos foram avaliados antes do treinamento (linha de base), após o treinamento (pós-treinamento) e um três após o treinamento (follow up).
A avaliação dos estudantes consistiu de uma entrevista estruturada, construída a partir de uma adaptação da Entrevista Dirigida para Habilidades Sociales (Caballo, 1993) e da observação do desempenho dos sujeitos, que foram filmados em situações de interação, através de desempenho de papéis.
A medida dos desempenhos verbal e não-verbal dos sujeitos nas situações de interação foram obtidas de acordo com dois sistemas de avaliação: no primeiro, o Sistema de Avaliação do Comportamento Empático - Forma Verbal (SACE-V), as respostas dos sujeitos eram codificadas de acordo com cinco níveis de respostas empáticas, distribuídas hierarquicamente. No segundo, o Sistema de Avaliação do Comportamento Empático - Forma não-verbal (SACENV), 12 componentes moleculares de comunicação não-verbal foram avaliados, de acordo com uma escala de 5 pontos. Os componentes avaliados foram: (1) olhar; (2) posição do corpo; (3) braços e pernas; (4) posição da cabeça; (5) proximidade; (6) orientação; (7) gestos e movimentos, (8) autotoques e gestos nervosos; (9) volume da voz; (10) entonação da voz; (11) velocidade da fala e (12) tempo de fala (para uma leitura mais detalhada, ver Falcone, 1998).
Um questionário de avaliação do treinamento da empatia (QUATE) foi utilizado após o treinamento e no follow up para avaliar os efeitos do treinamento, de acordo com a observação dos sujeitos experimentais.
Após passarem por uma entrevista individual, os sujeitos foram filmados interagindo em quatro situações de desempenho de papéis (duas situações de interação envolvendo ajuda e duas situações envolvendo conflito). Os componentes verbal e não-verbal dos comportamentos dos sujeitos foram avaliados por seis juízes previamente treinados em comportamento empático e cegos quanto aos grupos experimental e controle. O teste Qui-Quadrado para K Amostras Independentes revelou concordância entre e intrajuízes, nos componentes verbal e não-verbal do comportamento de sujeitos voluntários.
Os procedimentos utilizados no programa de treinamento da empatia (PTE) focalizaram o desenvolvimento de capacidades de: (1) identificar sinais emocionais não-verbais no comportamento dos outros; (2) ouvir e compreender a perspectiva e os sentimentos da pessoa-alvo, sem julgar; (3) declarar entendimento da perspectiva e dos sentimentos da pessoa-alvo; (4) demonstrar compreensão e aceitação através de comunicação não-verbal.
O PTE foi realizado em 11 encontros, com duas horas de duração para cada encontro e com uma freqüência de duas vezes por semana. As técnicas empregadas no treinamento incluíram: (1) explicação sobre como se comportar empaticamente em situações de ajuda e em situações de conflito; (2) identificação dos motivos que podem dificultar ouvir e compreender os outros, impedindo a manifestação de empatia; (3) imaginação de cenas envolvendo situações de interação, vivenciadas pelos sujeitos; (4) dramatização ou desempenho de papéis, onde os sujeitos tentavam manifestar empatia; (5) prática das habilidades aprendidas no contexto relacional dos estudantes.
O primeiro encontro teve como objetivos: (1) facilitar a integração entre os membros do grupo, através de exercícios de apresentação e de fixação dos nomes das pessoas; (2) dar uma visão geral sobre o que é empatia e sobre como se comportar empaticamente; (3) definir as normas do grupo (enfatizando a importância da freqüência, pontualidade e participação nas sessões e especificando o que se espera de cada membro para o bom funcionamento do treinamento).
Os outros encontros seguiam basicamente o mesmo formato. A sessão começava com uma breve explicação sobre a etapa que seria trabalhada naquele dia (identificação de sinais não-verbais, ouvir e compreender sensivelmente, adotar a perspectiva e os sentimentos da outra pessoa em situações de conflito e verbalizar empaticamente). Os membros do grupo treinavam, em situações de jogos de papéis, cada uma dessas etapas separadamente, durante os primeiros encontros, para depois, utilizá-las em conjunto. Ao final de cada sessão, todos eram solicitados a praticar a etapa aprendida com as pessoas de seu convívio.
depois de aprender cada uma das etapas necessárias para interagir empaticamente, os participantes interagiam em situações de jogos de papéis, empregando todas as etapas da empatia, em situações de ajuda e de conflito.
Resultados
Foram utilizados, para a comparação entre os grupos, os testes paramétrico t de Student e não-paramétrico Mann-Whitney, ambos para amostras independentes, através do software Primer of Biostatistics.
Para a comparação dos sujeitos (análise intra-sujeitos) foram empregados os testes paramétrico t de Student pareado e não-paramétrico de Wilcoxon, ambos para amostras relacionadas ou dependentes, também através do software Primer of Biostatistics. O teste não-paramétrico Exato de Fisher (software Epi-Info) foi aplicado na comparação dos dados do sexo.
O nível de significância (ou probabilidade de significância) mínimo adotado foi de 5%.
Com relação à comunicação verbal, a comparação entre os grupos experimental e controle, nas quatro situações de desempenho de papéis revelou superioridade do desempenho do grupo experimental sobre o grupo controle, no comportamento de verbalizar empaticamente, após o treinamento e no follow up. As diferenças entre os dois grupos que alcançaram significância estatística no pós-treinamento foram de p,0001 (situação 1); p=0,001 (situação 2); p=0,004 (situação 3) e p,001 (situação 4). No follow up, as diferenças com significância estatística foram de p,0001 (situação 1); p=0,003 (situação 2); p=0,002 (situação 3) e p=0,004 (situação 4).
A comparação dos resultados entre os sujeitos do grupo experimental e do grupo controle de acordo com a avaliação dos juízes nas quatro situações de jogos de papéis em cada fase da intervenção (linha de base X pós-treinamento e treinamento X follow up) também revelou diferença significativa entre os dois grupos de sujeitos (experimentais e controle). As diferenças estatísticas que alcançaram nível de significância estatístico, apontadas na linha de base X pós-treinamento foram de p,0001 para todas as quatro situações. No pós-treinamento X follow up não ocorreu mudança significativa, indicando que os resultados se mantiveram: p=0,147 (situação 1); p=0,755 (situação 2); p=0,344 (situação 3) e p=0,261 (situação 4).
A análise intra-sujeito demonstrou que, após o treinamento, 80% dos sujeitos experimentais demonstraram melhora significativa do desempenho verbal na situação 1; 70% na situação 2; 90% na situação 3 e 100% na situação 4. Com relação ao grupo controle, 100% dos sujeitos mantiveram desempenho inalterado após o treinamento e no follow up.
Todos esses dados mostram que o treinamento da empatia foi eficaz em melhorar significativamente o desempenho dos sujeitos experimentais na comunicação empática verbal e que essa melhora se manteve após o follow up.
Com relação à comunicação não-verbal, a comparação dos dados entre os sujeitos dos grupos experimental e controle (avaliação dos juízes), referente aos 12 aspectos da comunicação não verbal, nas 4 situações e em cada fase do experimento, revelou diferença estatística significativa entre os sujeitos experimentais, apenas nos aspectos referentes a braços e pernas, posição da cabeça, proximidade e orientação. Com relação aos aspectos braços e pernas, posição da cabeça e orientação, os sujeitos experimentais apresentaram melhora significativa em relação aos sujeitos controle em todas as situações e esses resultados permaneceram estáveis no follow up Quanto ao aspecto proximidade, houve melhora significativa do grupo experimental em relação ao grupo controle no pós-treinamento e essa melhora tornou a ocorrer no follow up. A tabela abaixo mostra os valores de p desses quatro aspectos, nas diferentes fases do experimento:
A análise intra-sujeito referente aos aspectos da comunicação não-verbal revelou, após o treinamento, superioridade no desempenho dos sujeitos experimentais sobre os sujeitos controle. No aspecto braços e pernas, 50% dos sujeitos experimentais apresentaram melhora significativa na situação 1; 80% na situação 2; 70% na situação 3 e 70% na situação 4, enquanto 100% dos sujeitos do grupo controle não apresentaram mudança. No aspecto posição da cabeça, 70% dos sujeitos experimentais apresentaram mudança significativa na situação 1; 90% na situação 2; 90% na situação 3 e 90% na situação 4, enquanto 100% dos sujeitos controle mantiveram-se na mesma situação. No aspecto proximidade, 70% dos sujeitos experimentais apresentaram melhora na situação 1; 70% na situação 2; 80% na situação 3 e 70% na situação 4, enquanto 100% dos sujeitos controle não manifestaram nenhuma mudança. No aspecto referente à orientação, 60% dos sujeitos experimentais apresentaram melhora significativa na situação l; 70% na situação 2; 70% na situação 3 e 70% na situação 4, enquanto 100% dos sujeitos do grupo controle não manifestaram nenhuma mudança.
O aspecto referente à posição do corpo apresentou mudança significativa nas situações 2, 3 e 4, na linha de base X pós-treinamento (p=0,008; p,0001 e p=0,005 respectivamente) e essa melhora se manteve no pós-treinamento X follow up (p=0,732; p=0,845 e p=0,946 respectivamente). A análise intra-sujeito revelou melhora significativa entre os sujeitos experimentais nas situações 2 (80%), 3 (90%) e 4 (80%), enquanto 100% dos sujeitos controle permaneceram inalterados.
Os outros aspectos da comunicação não-verbal mostraram-se inalterados (gestos nervosos, volume da voz, tempo de fala e entonação de voz) ou decaíram (gestos e movimentos e velocidade da fala), sugerindo que não foram beneficiados pelo treinamento. 0 aspecto em relação ao olhar evoluiu apenas em duas situações.
A análise dos dados obtida através da avaliação dos juizes, referente à comunicação não-verbal, sugere que o PTE foi eficaz em melhorar significativamente quatro aspectos da comunicação não-verbal (braços e pernas, posição da cabeça, proximidade e orientação), não sendo suficiente para melhorar os oito aspectos restantes. Assim, os sujeitos experimentais obtiveram melhor aproveitamento no desempenho verbal do que no não-verbal.
A avaliação do PTA a partir da observação dos próprios sujeitos experimentais revelou que, após o treinamento, estes passaram a comunicar empatia não-verbal regularmente (50%) ou freqüentemente (50%); a ouvir empaticamente de forma regular (60%) ou freqüente (30%); a demonstrar entendimento de forma regular (60%) ou freqüente (30%); e a prestar atenção na pessoa-alvo regularmente (20%) ou freqüentemente (80%).
Em resposta a uma pergunta aberta sobre os efeitos sociais do PTE no contexto relacional dos sujeitos experimentais, as declarações mais freqüentes referiam-se à redução de conflitos interpessoais (50%); reconhecimento espontâneo de amigos e/ou familiares da mudança do comportamento dos sujeitos (50%); melhora na qualidade dos relacionamentos (110%) e aumento da capacidade de ouvir e compreender, sem julgar e sem dar opiniões ou conselhos precipitados (130%).
Discussão
A avaliação do desempenho dos sujeitos nas situações de jogos de papéis e a avaliação baseada na observação do próprio comportamento feita pelos sujeitos experimentais mostram que o PTE foi eficaz em desenvolver comportamento empático nos estudantes e em generalizar esses efeitos para o contexto relacional dos mesmos.
Os efeitos do PTE foram maiores no desenvolvimento da comunicação verbal do que na comunicação não verbal. Esses resultados sugerem que são necessários procedimentos mais eficientes para desenvolver comunicação empática não-verbal, e/ou deve-se aumentar o número de exercícios com essa finalidade.
As mudanças identificadas no convívio social dos estudantes (redução de conflitos interpessoais, reconhecimento de mudança dos sujeitos por parte de parentes e amigos, além de melhora qualitativa dos relacionamentos) sugerem que estes aumentaram as suas capacidades em ouvir e compreender as perspectivas e sentimentos dos outros, além de comunicar apropriadamente essa compreensão e de aplicar as habilidades aprendidas no treinamento em seus contextos interacionais.
Os estudos baseados na avaliação do sujeito sobre o seu próprio desempenho como um suplemento dos métodos experimentais constituem um recurso amplamente aceito (Good & Watts, 1996) e têm sido empregados mais recentemente na literatura psicológica (Neufeld & Nelson, 1998). Os modelos de investigação baseados na narrativa do cliente, do supervisor ou do terapeuta fornecem dados que podem se juntar a outras medidas de resultado para prover um quadro mais completo de como os pacientes se beneficiam com uma intervenção (Neufeld & Nelson, 1988). desse modo, o Questionário de Avaliação do Treinamento da Empatia (QUATE) contribuiu como um recurso suplementar à observação do desempenho dos sujeitos nas situações de jogos de papéis, para a avaliação dos efeitos do treinamento.
Os comentários sobre as tarefas realizadas entre as sessões também contribuíram para avaliar o progresso dos membros do grupo. Referências espontâneas por parte de alguns componentes acerca de interações bem-sucedidas após manifestação de empatia, assim como de declarações espontâneas de amigos ou familiares sobre a mudança do comportamento de alguns sujeitos também indicaram a eficácia do PTE.
Finalmente, não houve diferença entre os gêneros e idades quanto aos efeitos do PTE, o que indica que este beneficiou igualmente os sujeitos de ambos os sexos e de todas as idades.
Um dado interessante fornecido pelas respostas de alguns sujeitos ao QUATE sobre os efeitos do PTE em suas relações sociais, refere-se ao reconhecimento de parentes e amigos próximos de que estes estavam "mais calmos". Esse achado parece coerente com as afirmações de Nichols (1995) e de Goleman (1995) sobre os efeitos positivos de ouvir empaticamente em situações de conflito, através de redução da querela e da possibilidade de rompimento. É possível que esse efeito provoque também, naquele que empatiza, redução de ansiedade e de raiva, ao compreender melhor as razões e sentimentos da outra pessoa, corrigindo possíveis distorções de interpretação. Se isso for verdadeiro, então o PTE poderia também beneficiar indivíduos com ansiedade social. de acordo com os estudos de Davis (1983b), a ansiedade social dificulta a adoção de perspectiva por causa da atenção autofocada e do desconforto correspondente, característicos de indivíduos com fobia e ansiedade social. Por outro lado, ao aprender a concentrar a atenção na outra pessoa, esses indivíduos poderiam reduzir a atenção autofocada e corrigir distorções de interpretação, o que provavelmente contribuiria para a redução da ansiedade social.
Indivíduos com transtorno de personalidade , cujos esquemas disfuncionais comprometem a qualidade das suas interações socias (Beck & Freeman, 1993), poderiam também ser beneficiados com o PTE. Crenças básicas características de alguns transtornos tais como: "Posso ferir-me" (evitativo); "Posso ser dominado" (passivo-agressivo); "As pessoas são adversários em potencial" (paranóide); "Eu sou especial" (narcisista); "Preciso impressionar" (histriônico); "As pessoas estão aí para serem usadas" (anti-social); "Erros são maus" (obsessivo-compulsivo) (Beck & Freeman, 1993) poderiam ser enfraquecidas através do treino em ouvir, sem julgar, em compreender e manifestar compreensão, para ser compreendido e aceito.
Mais estudos são necessários para avaliar o impacto da aprendizagem da habilidade empática na redução da ansiedade social e no tratamento dos transtornos de personalidade.
Como contribuição para estudos posteriores , algumas estratégias sugeridas para melhorar a eficácia do PTE são: o aumento do número de encontros, proporcionando mais ensaios e fortalecendo a aprendizagem; a criação de mais exercícios, visando desenvolver a comunicação empática não-verbal; a utilização de modelação através de fitas de vídeo e o uso do videotape nos exercícios de jogos de papéis, para facilitar o feedback.
Concluindo, a empatia corresponde a urna habilidade de comunicação que parece se adequar cada vez mais às necessidades do mundo atual. A capacidade de compreender acuradamente os sentimentos e pensamentos das outras pessoas e de manifestar essa compreensão de forma sensível e apropriada, tem sido bastante valorizada nas relações pessoais e profissionais. Considerando-se que essa habilidade pode ser desenvolvida através de treinamento específico, promovendo resultados satisfatórios na qualidade das relações interpessoais (aumento do vínculo, redução de conflitos e de rompimento), seria recomendável incluir programas de treinamento da empatia nas escolas como um recurso preventivo importante no desenvolvimento moral e interacional, contribuindo para a formação de pessoas mais saudáveis e felizes.
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