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Cadernos de Pós-Graduação em Distúrbios do Desenvolvimento

versão impressa ISSN 1519-0307versão On-line ISSN 1809-4139

Cad. Pós-Grad. Distúrb. Desenvolv. vol.20 no.2 São Paulo jul./dez. 2020

https://doi.org/10.5935/cadernosdisturbios.v20n2p9-63 

Neurotoxicidade do nascimento à puberdade em roedores: revisão dos principais agentes tóxicos e suas implicações

 

Neurotoxicity from birth to puberty in rodents: review of the main toxic agents and their implications

 

Neurotoxicidad desde el nacimiento a la pubertad en rodantes: una revisión de los principales agentes tóxicos y sus implicaciones

 

 

Julia Zaccarelli-MagalhãesI; Gabriel Ramos de AbreuII; Maria Martha BernardiIII; Helenice de Souza SpinosaIV; Esther Lopes RicciV

IUniversidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: julia.zaccarelli@usp.br
IIUniversidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: ramosabreug@usp.br
IIIUniversidade Paulista (Unip), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: marthabernardi@gmail.com
IVUniversidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: hspinosa@usp.br
VUniversidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) e Faculdade de Ciências da Saúde Igesp (Fasig), São Paulo, SP, Brasil. E-mail: estherlopesricci@gmail.com

 

 


RESUMO

Esta revisão teve como objetivos apresentar os principais parâmetros empregados para a avaliação de neurotoxicidade durante o período inicial da vida de roedores até a puberdade e realizar um levantamento da literatura mais atual dos efeitos tóxicos de praguicidas, medicamentos, drogas lícitas e ilícitas, toxinas e agentes ambientais em filhotes de roedores. No levantamento bibliográfico, feito por meio da base de dados PubMed, empregaram-se os seguintes termos: desenvolvimento pós-natal, toxicidade, roedores e parâmetros físicos e reflexológicos. Os critérios de inclusão foram: 1) língua inglesa; 2) espécies: ratos e camundongos; 3) artigos de revisão e originais; 4) publicações entre 2000 e 2020. Os trabalhos selecionados mostraram quais são os principais parâmetros do desenvolvimento físico e reflexos inatos utilizados para a avaliação de neurotoxicidade, durante o período inicial da vida de um roedor até a puberdade, que podem apontar alterações comportamentais e neurológicas na idade adulta. Os parâmetros de abertura dos olhos e abertura vaginal foram os marcos de desenvolvimento físico mais citados; e os de endireitamento postural em superfície e a geotaxia negativa, os reflexos mais empregados. Os resultados mostraram os diferentes agentes tóxicos capazes de alterar o desenvolvimento de filhotes de roedores, causando danos reversíveis e, em alguns casos, irreversíveis nesses animais. Esses agentes possuem interesse econômico, pois são empregados como praguicidas, medicamentos e drogas lícitas e ilícitas, além de serem toxinas e contaminantes ambientais. Assim, esse levantamento contribui para o uso seguro desses agentes durante o período gestacional e de lactação, períodos cruciais para o desenvolvimento pleno de um ser vivo.

Palavras-chave: Toxicologia do desenvolvimento. Praguicidas. Medicamentos. Toxinas. Contaminantes ambientais.


ABSTRACT

The aim of this review was to present the main parameters used for the assessment of neurotoxicity during the initial period of life of rodents until puberty and to carry out a review of the most current literature on the toxic effects of pesticides, medications, licit and illicit drugs, toxins and environmental agents in rodent offspring. The bibliographic survey was done through the PubMed database; the terms used were postnatal development, toxicity, rodents and physical and reflexological parameters. The filters included were: 1) English language; 2) species: rats and mice; 3) review and original articles; 4) publications between 2000 and 2020. The selected works showed the main parameters of physical development and innate reflexes used for the assessment of neurotoxicity during the initial period of a rodent's life until puberty; these parameters may point out behavioral and neurological changes in adulthood. The eye and vaginal opening were the most cited physical milestones, and the surface righting reflex and negative geotaxis were the most used reflexes. The results showed the different toxic agents capable of altering the development of rodent pups, causing reversible and, in some cases, irreversible damage in these animals. These agents have an economic interest, as they are used as pesticides, medications and legal and illegal drugs, in addition to being toxins and environmental contaminants. Thus, this review contributes to the safe use of these agents during the gestational and lactation period, crucial periods for the correct development of a living being.

Keywords: Developmental toxicology. Pesticides. Medicines. Toxins. Environment contaminant.


RESUMEN

El objetivo de esta revisión fue presentar los principales parámetros utilizados para la evaluación de la neurotoxicidad durante el período inicial de vida de los roedores hasta la pubertad y realizar una encuesta de la literatura más actualizada sobre los efectos tóxicos de los pesticidas, medicamentos, drogas legales e ilegales, toxinas y agentes ambientales en roedores descendientes. En la encuesta bibliográfica, realizada utilizando la base de datos PubMed, los términos utilizados fueron: desarrollo postnatal, toxicidad, roedores y parámetros físicos y reflexológicos. Los criterios de inclusión fueron: 1) idioma inglés; 2) especies: ratas y ratones; 3) revisar artículos y originales; 4) publicaciones entre 2000 y 2020. Los estudios seleccionados mostraron los principales parámetros de desarrollo físico y reflejos innatos utilizados para la evaluación de la neurotoxicidad, durante el período inicial de la vida de un roedor hasta la pubertad, lo que puede señalar cambios conductuales y neurológicos en la edad adulta. Los parámetros de apertura ocular y vaginal fueron los hitos de desarrollo físico más citados, y los de enderezamiento postural de superficie y geotaxis negativa fueron los reflejos más utilizados. Los resultados mostraron los diferentes agentes tóxicos capaces de alterar el desarrollo de las crías de roedores, causando daños reversibles y, en algunos casos, irreversibles en estos animales. Estos agentes tienen un interés económico, ya que se usan como pesticidas, medicamentos y drogas legales e ilegales, además de ser toxinas y contaminantes ambientales. Por lo tanto, esta encuesta contribuye al uso seguro de estos agentes durante el período de gestación y lactancia, períodos cruciales para el desarrollo completo de un ser vivo.

Palabras clave: Toxicología del desarrollo. Pesticidas. Medicamentos. Toxinas. Contaminantes ambientales.


 

 

INTRODUÇÃO

A toxicologia é uma ciência multidisciplinar, interdisciplinar e multiprofissional que estuda os efeitos nocivos decorrentes da interação de substâncias químicas e/ou agentes físicos com um organismo biológico (SPINOSA; FUKUSHIMA, 2020).

Uma das grandes áreas da toxicologia é a que se refere ao desenvolvimento. A toxicologia do desenvolvimento estuda os efeitos nocivos causados por agentes tóxicos em um organismo em desenvolvimento, sendo eles anomalias morfológicas (teratologia), retardo no crescimento, alterações funcionais, alterações comportamentais e/ou morte da prole (CAMARGO et al., 2017; GOTARDO; GÓRNIAK, 2020). Esses efeitos podem ser causados pela ação direta do agente tóxico sobre o feto em desenvolvimento ou pela ação indireta, através do organismo materno (BERNARDI; SPINOSA, 2017; CAMARGO et al., 2017).

Em 1977, James Wilson propôs seis princípios básicos da teratologia que são utilizados até hoje na toxicologia do desenvolvimento. São eles: 1) as espécies animais possuem sensibilidades diferentes à exposição a um mesmo agente tóxico; 2) a susceptibilidade de um organismo a um agente tóxico varia de acordo com o estágio de desenvolvimento e o tempo de exposição; 3) os agentes tóxicos atuam de forma específica em células e tecidos; 4) a exposição do feto a um agente tóxico depende de suas propriedades físico-químicas, uma vez que a placenta permite a passagem bidirecional de determinadas substâncias; 5) os diferentes tipos de manifestações de alteração no desenvolvimento estão relacionados com o período do desenvolvimento fetal em que o organismo foi exposto ao agente tóxico; e 6) as manifestações de alteração no desenvolvimento estão relacionadas com a dose de exposição ao agente tóxico (FRIEDMAN, 2010).

Os efeitos tóxicos de uma substância podem ocorrer durante todo o período do desenvolvimento embrionário e fetal de um organismo, contudo o tipo de alteração ocasionado varia de acordo com o período de exposição. Exposições a agentes tóxicos nos períodos de pré-implantação e implantação acarretam embrioletalidade ou completo reparo do dano; esse é um período denominado de efeito "tudo ou nada". Já a exposição a agentes tóxicos no período de organogênese leva a malformações, uma vez que nesse período as estruturas básicas do organismo estão em formação, enquanto durante o período fetal causa anomalias estruturais e funcionais (CAMARGO et al., 2017).

As agências reguladoras internacionais possuem protocolos para a avaliação da toxicidade de agentes no período embrionário e fetal. Destacam-se a Food and Drug Administration (FDA) e a Organisation for Economic Cooperation and Development (OECD), que propõem estudos in vitro ein vivo em animais durante o período pré-acasalamento até o parto. Esses estudos são realizados em pelo menos duas espécies, uma roedora e uma não roedora, com o uso de três doses do agente tóxico a ser avaliado: uma que produz efeito tóxico materno, uma que não promove efeito tóxico e uma intermediária entre elas. A via de administração escolhida para o estudo deve ser a mesma pela qual o indivíduo possa ser exposto ao agente tóxico em condições naturais (UNITED STATES ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY, 1991; ORGANISATION FOR ECONOMIC COOPERATION AND DEVELOPMENT, 2018).

Atualmente, essas agências vêm incorporando a seus protocolos a avaliação de neurotoxicidade, imunotoxicidade e de desreguladores endócrinos. Assim, em estudos pré-clínicos, as proles são mantidas vivas até a vida adulta para a realização de diferentes testes, uma vez que diversos sistemas não estão completamente desenvolvidos no nascimento (GOTARDO; GÓRNIAK, 2020).

A neurotoxicidade, em particular, refere-se ao dano causado ao sistema nervoso central e/ou periférico por conta da exposição às substâncias tóxicas. A complexidade das funções do sistema nervoso, os eventos neurotóxicos de natureza múltipla e a variabilidade e inacessibilidade dos sítios celulares e moleculares do sistema nervoso são fatores que limitam o estabelecimento de indicadores para se avaliar a ação neurotóxica das substâncias químicas (AMORIM, 2003). Vários indicadores têm sido utilizados para avaliar o risco e a exposição a uma substância neurotóxica, empregando enfoques neurofisiológicos, comportamentais, neuroquímicos, entre outros. A presente revisão teve como objetivos: 1) apresentar os principais parâmetros utilizados para a avaliação de neurotoxicidade durante o período inicial da vida de roedores até a puberdade; e 2) realizar um levantamento da literatura mais atual dos efeitos tóxicos de praguicidas, medicamentos, drogas lícitas e ilícitas, toxinas e agentes ambientais em filhotes de roedores.

 

MÉTODO

Para a elaboração desta revisão, foi feito levantamento bibliográfico de artigos de revisão e artigos originais por meio da base de dados PubMed. Para a realização da pesquisa, utilizaram-se os seguintes:postnatal development, toxicity, rodent, hair growth, pinna detachment, eruption of incisor teeth, auditive channel opening, eye opening, adult gait, testis descent, balanopreputial separation, vaginal opening, surface righting reflex, palmar grasp reflex, negative geotaxis, cliff avoidance, air righting reflex, auditory startle reflex, vibrissa placing, grip strengthe ascending wire mesh. Adotaram-se como critério de inclusão os seguintes filtros:

• Língua: inglês.

• Espécies: roedores (ratos e camundongos).

• Tipos de artigo: revisões da literatura e artigos originais.

• Período de publicação dos artigos: de 2000 a 2020.

A busca dos artigos foi realizada no período de 30 de março a 6 de abril de 2020 pelo método avançado, no qual foram correlacionados os termos postnatal development, toxicitye rodentcom os termos mencionados anteriormente. A partir de todas as correlações de termos utilizadas, encontraram-se 792 artigos. Utilizaram-se os seguintes critérios de exclusão:

• Artigos duplicados.

• Artigos em outros idiomas.

• Artigos não disponíveis no formato on-line.

• Artigos com metodologia incompleta (não continham dose, via de administração e/ou período de tratamento).

• Artigos sem enfoque no desenvolvimento pós-natal de roedores.

Feita a exclusão, selecionaram-se 162 artigos que foram utilizados na discussão de resultados. Para essa discussão, os artigos foram classificados em cinco grupos de acordo com a toxicidade da substância analisada (praguicidas, medicamentos, drogas lícitas e ilícitas, toxinas e ambiental). Considerou-se também a classificação adotada pelos autores. Alguns artigos estudaram mais de uma substância, de mesma classificação de toxicidade ou não, e, portanto, aparecem mais de uma vez nos tópicos da discussão.

 

DISCUSSÃO DE RESULTADOS

Desenvolvimento físico

O desenvolvimento físico consiste em uma série de mudanças que ocorrem nos filhotes no período do nascimento ao início da puberdade e que servem de marcos para a maturação fisiológica desses animais (MEEK et al., 2007). A Tabela 1 mostra a descrição dos principais parâmetros utilizados para a avaliação do desenvolvimento físico e o dia pós-natal (DPN) de aparecimento que geralmente ocorrem em ratos e camundongos.

 

 

Deve ser destacado que a abertura dos olhos (101/162) e a abertura vaginal (92/162) foram os parâmetros mais utilizados nos trabalhos selecionados, enquanto o andar adulto (7/162) foi o menos empregado.

Parâmetros envolvidos no crescimento corporal

Entre os parâmetros citados na Tabela 1, destacam-se o desdobramento da orelha, o aparecimento de pelos, a erupção dos dentes incisivos, a abertura do canal auditivo e a abertura dos olhos como marcos do crescimento corporal dos roedores (Figura 1). O desenvolvimento desses parâmetros ocorre devido à influência de fatores de crescimento, os quais estão envolvidos em diferentes processos fisiológicos, como crescimento, reparo, diferenciação e desenvolvimento de populações de células específicas (DORCE et al., 2009).

 

 

Entre os fatores de crescimento já conhecidos, destaca-se o fator de crescimento epidérmico. Isolado pela primeira vez em 1962 por Cohen, ele foi caracterizado como um polipeptídio promotor da divisão e diferenciação celular dos tecidos epidérmicos. Estudos demonstraram que a administração desse fator de crescimento em ratos, camundongos e hamsters promove a aceleração do desdobramento da orelha, do aparecimento de pelos, da erupção dos dentes incisivos e da abertura dos olhos (HOATH, 1986; SMART et al., 1989; GERENUTTI et al., 2008; SANDINI et al., 2014). Por sua vez, Smart et al. (1989) mostraram que a administração desse fator de crescimento em camundongos recém-nascidos acelera a erupção dos dentes incisivos e a abertura dos olhos, além de atrasar a abertura do canal auditivo e da vagina.

Além do envolvimento dos fatores de crescimento, as alterações no desenvolvimento físico causadas pela exposição a agentes tóxicos também estão relacionadas a alterações no sistema serotoninérgico cerebral (BHARATHI; NATESH; REDDY, 2012). A serotonina possui papel fundamental no desenvolvimento cerebral, pois, além de ser um neurotransmissor, também atua como fator de crescimento, direcionando a proliferação e a maturação de células no cérebro imaturo (KATAKURA et al., 2001).

Dentre todos os parâmetros relacionados com o crescimento corporal, a abertura dos olhos é o parâmetro mais frequente na avaliação do desenvolvimento pós-natal, por ser, além de um marco do crescimento corporal, um sinal externo de maturação do sistema nervoso central em vertebrados e ser extremamente vulnerável à exposição a agentes tóxicos (PODGORAC et al., 2016; ŠEVČÍKOVÁ et al., 2017). O desenvolvimento dos olhos e de suas estruturas anexas (órbita, pálpebras e estruturas nasolacrimais) começa por volta do dia 10 do período embrionário e termina no período pós-natal (POMETLOVÁ et al., 2009).

Além da atuação do fator de crescimento epidérmico, o desenvolvimento dos olhos também depende da atuação dos hormônios tireoidianos para ocorrer (BARKUR; BAIRY, 2016). Esses hormônios estimulam populações celulares específicas, contribuindo para o crescimento dos tecidos oculares, sendo fundamentais para a formação da neurorretina e das estruturas anexas (órbita, pálpebras e estruturas nasolacrimais) (PINAZO-DURÁN et al., 2011; BARKUR; BAIRY, 2016).

Além desses estímulos endócrinos, a abertura dos olhos também está sujeita a alterações por causa dos estímulos ambientais: por exemplo, ambientes enriquecidos podem acelerar a abertura dos olhos, enquanto a separação dos filhotes de suas ninhadas pode atrasar o desenvolvimento desse marco (POMETLOVÁ et al., 2009).

Parâmetros envolvidos na maturação sexual

A descida dos testículos e a separação prepucial em machos, bem como a abertura vaginal em fêmeas, são marcos externos do desenvolvimento sexual em roedores (SINGH et al., 2017). Esses processos são regulados pela ação dos hormônios estrógenos e andrógenos (NASSR et al., 2010; SI et al., 2011; CASTRO; MAIA, 2012; SHEN et al., 2016). Assim, alterações nos níveis hormonais ou na sensibilidade dos tecidos-alvo em momentos críticos podem interferir no desenvolvimento sexual dos animais (WEISENBURGER; HAGLER; TASSINARI, 2004).

A maturação sexual em machos ocorre por causa das interações complexas entre o hipotálamo, a hipófise anterior, os testículos e os órgãos sexuais secundários (NEGRO-VILLAR; OJEDA; MCCANN, 1973; MORAES et al., 2004). O início da puberdade ocorre por conta de alterações sensitivas no eixo hipotálamo-hipófise em razão do feedback negativo dos hormônios andrógenos (SMITH; DAMASSA; DAVIDSON, 1977). Como consequência, ocorre aumento na liberação de gonadotrofina, resultando em aumento na secreção de testosterona pelas células de Leydig, até que um novo estado de equilíbrio seja alcançado (SODERSTEIN; ENEROTH, 1984).

A descida dos testículos é um processo de desenvolvimento obrigatório para promoção da espermatogênese normal dos roedores, que ocorre em duas etapas distintas: 1) fase transabdominal – durante o período de embriogênese, os testículos migram do polo inferior do rim para uma região próxima à bexiga; e 2) fase inguinoscrotal – após o nascimento, os testículos migram da região próxima à bexiga para a bolsa escrotal pelo canal inguinal (HEYNS; HUTSON, 1995; SI et al., 2011; CASTRO; MAIA, 2012). Alterações na descida dos testículos podem ser atribuídas a modificações no desenvolvimento pós-natal do eixo hipotálamo-hipófise-testicular (SUPRIYA; REDDY, 2015).

Outro aspecto importante é o papel exercido pela mãe para a descida dos testículos do filhote. As mães durante a lactação lambem a área genital dos filhotes machos com mais frequência do que a das fêmeas; esse procedimento estimula a liberação de testosterona nos filhotes, hormônio fundamental para a maturação sexual dos machos (ALMEIDA et al., 1996).

Em fêmeas, o único marco externo da puberdade é a canalização da vagina, inicialmente imperfurada, que, por meio da estimulação estrogênica, se torna acessível; a abertura vaginal é, portanto, um processo em que ocorre a apoptose das células epiteliais vaginais desencadeadas pelo aumento da concentração de estradiol (SODERSTEIN; ENEROTH, 1984; MÜLLER et al., 2016). Esse processo ocorre um dia após o primeiro ciclo pré-ovulatório de secreção de gonadotrofinas (SODERSTEIN; ENEROTH, 1984; SANDINI et al., 2014).

A puberdade das fêmeas é regulada pela liberação de hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) por meio do leite materno; esse hormônio inibe a função ovariana dos filhotes, e, à medida que eles crescem e começam a alimentar-se regularmente, a amamentação torna-se menos frequente, levando à redução natural do aporte de GnRH pelo leite materno e permitindo o desenvolvimento ovariano (SODERSTEIN; ENEROTH, 1984).

A puberdade é um período do desenvolvimento em que os animais estão susceptíveis a exposições a agentes ambientais nocivos, como a ação de desreguladores endócrinos. A exposição a compostos de ação estrogênica – como etoxicloro – pode acelerar a abertura vaginal, enquanto a exposição a antiestrógenos – por exemplo, lindano – ou andrógenos – por exemplo, testosterona – pode atrasar a abertura vaginal (OGATA et al., 2001; ROCKETT et al., 2006).

Desenvolvimento reflexológico

Os reflexos são respostas instintivas de um organismo ao ambiente em que ele vive, constituindo respostas específicas, previsíveis e involuntárias a um tipo específico de estímulo (FOX, 1965). A ontogenia dos reflexos é um indicador da adaptação do neonato à vida extrauterina nos estágios iniciais do desenvolvimento (KHALKI et al., 2012; LI et al., 2015). Alterações em sua expressão podem refletir em alterações comportamentais e neurológicas na idade adulta (KHALKI et al., 2012; GALLEGOS et al., 2016). Nesta seção, são discutidos os principais reflexos usados para avaliar o desenvolvimento de filhotes de roedores, bem como os mecanismos que causam essas respostas.

Controle postural

Durante a ontogenia, o desenvolvimento do controle da postura está sujeito a diversos processos neurobiológicos e à percepção do animal sobre o mundo externo, sendo pré-requisito para o desenvolvimento motor (ALTMAN; SUDARSHAN, 1975). Além disso, o controle postural interfere no desenvolvimento cognitivo, bem como no desenvolvimento da comunicação verbal e não verbal (SILVA et al., 1987).

Altman e Sudarshan (1975) destacam em seu trabalho três sistemas periféricos envolvidos na regulação da postura: vestibular, extereoceptivo e proprioceptivo. Além disso, o sistema visual também possui papel importante na aquisição da postura. Os principais reflexos utilizados para avaliar o desenvolvimento do controle postural são: o endireitamento postural (em superfície e aéreo), a geotaxia negativa e o cliff avoidance. Vale ressaltar que os reflexos de endireitamento postural em superfície (83/162) e a geotaxia negativa (70/162) foram os mais empregados nos trabalhos selecionados.

Para a avaliação do endireitamento postural em superfície, os filhotes são colocados sob uma superfície lisa em decúbito dorsal, uma posição corpórea anormal para esses animais, e é observado se eles são capazes de retornar à posição correta, em decúbito ventral, com as quatro patas em contato com a superfície (BEDADA; ENGIDAWORK, 2010; BARKUR; BAIRY, 2016) – Figura 2. Animais recém-nascidos levam mais tempo para retornar à posição correta, e, à medida que vão crescendo, esse tempo diminui gradativamente (PATIN et al., 2004).

 

 

O reflexo de endireitamento postural surge logo após o nascimento (entre os DPN 1 e 3) e se estabelece na primeira semana de vida do animal, sendo um indicativo da maturação subcortical, da integridade da função vestibular e cerebelar, bem como da integração da atividade neuromuscular (POMETLOVÁ et al., 2009; SI et al., 2011; BHARATHI; NATESH; REDDY, 2012; CRÉPEAUX et al., 2014; BARKUR; BAIRY, 2016). O atraso no desenvolvimento desse reflexo pode ser sugestivo de atraso no processo de mielinização dos neurônios (DORCE et al., 2009; SANDINI et al., 2014).

Além do tempo necessário para que o animal mude de posição, também é possível analisar a postura do animal durante o processo de endireitamento postural. Podgorac et al. (2016) dividiram a postura desse reflexo em três categorias de progressão sobrepostas: 1) postura em U; 2) postura de saca-rolhas; e 3) endireitamento axial. A postura em U é observada em animais mais jovens, em que o animal faz uma ventroflexão antes de girar a cabeça e o corpo na mesma direção. A postura saca-rolhas é uma forma intermediária do endireitamento postural em que o animal primeiro gira a cabeça e os membros anteriores para uma direção, enquanto gira os membros posteriores para a direção oposta, e, em seguida, gira os membros posteriores para a mesma direção da cabeça e dos membros anteriores. O endireitamento axial é observado em animais adultos, em que o animal corrige sua postura por meio de uma rotação axial cefalocaudal.

Para a observação do reflexo de endireitamento postural aéreo, também denominado reflexo de endireitamento em queda livre, o observador deve suspender os animais a 10 cm de uma almofada, com a parte dorsal voltada para baixo, e soltá-los; os animais devem, então, girar o corpo para cair com a parte ventral do corpo em cima da almofada (DOMMETT; ROSTRON, 2011). A execução desse reflexo está relacionada com os circuitos neuronais vestibulares e visuais, em particular, com as regiões cerebrais do colículo superior, corpo estriado e cerebelo (DIAZ et al., 2014), mas não com o córtex visual (PELLIS et al., 1989).

Após a instalação do reflexo de endireitamento postural em superfície, os filhotes passam a desenvolver o reflexo de geotaxia negativa. Para a avaliação desse reflexo, os filhotes são colocados em uma plataforma inclinada, de 30º a 45º, com a cabeça voltada para baixo e é observado se eles são capazes de voltar à posição original, girando o corpo 180º (SUGAWARA et al., 2008; BHARATHI; NATESH; REDDY, 2012; GUMILAR et al., 2015; BARKUR; BAIRY, 2016; MOORE et al., 2019) – Figura 3. Esse reflexo normalmente se instala entre os DPN 6 e 8 e é uma resposta a estímulos gravitacionais envolvida na relação espacial do animal (DORCE et al., 2009).

 

 

O reflexo de geotaxia negativa reflete o desenvolvimento do ajuste postural dinâmico (UDO et al., 2014) e, portanto, é muito utilizado como avaliação das funções vestibular e proprioceptiva (DE CASTRO et al., 2007a; ŠEVČÍKOVÁ et al., 2017). Assim, é um indicativo de déficits de desenvolvimento no mecanismo de endireitamento corporal, bem como na coordenação e/ou integração da atividade neuromuscular (BHARATHI; NATESH; REDDY, 2012). Atraso no desenvolvimento desse reflexo sugere alterações na maturação das estruturas cerebrais envolvidas na função motora, em especial do cerebelo (DORCE et al., 2009).

O reflexo de cliff avoidance(reflexo de esquiva do abismo) é outro reflexo relacionado com o controle postural dos roedores. A observação desse reflexo é realizada colocando os filhotes na borda de uma plataforma suspensa, com as patas dianteiras e o focinho acima da borda, e é observado o tempo que o animal leva para se afastar dessa borda; é considerado que o animal adquiriu esse reflexo quando ele realiza a resposta de se afastar da borda em até 5 segundos (BEDADA; ENGIDAWORK, 2010; SI et al., 2011; GUMILAR et al., 2015).

O desenvolvimento do reflexo do cliff avoidance acontece entre os DPN 6 e 10 e é um indicativo do desenvolvimento físico e motor dos animais, refletindo alterações nas funções sensorial e/ou de processamento (PALANZA; PARMIGIANI; VOM SAAL, 2001; SI et al., 2011; GUMILAR et al., 2015; LI et al.,2015). Ele é usado para avaliar a integração do estímulo extereoceptivo (as vibrissas) com a resposta locomotora (retirar o corpo da borda) (ALTMAN; SUDARSHAN, 1975; KAIZAKI et al., 2014). Além disso, esse reflexo também pode ser usado como uma medida de ansiedade, uma vez que animais que apresentam comportamento do tipo ansioso demoram mais para retirar o corpo da borda; esse reflexo é, portanto, útil na avaliação de medicamentos para redução de ansiedade (PALANZA; PARMIGIANI; VOM SAAL, 2001; SI et al., 2011).

Respostas motoras

A preensão palmar é um reflexo motor primitivo que envolve a maturação dos sistemas nervosos central e periférico (SANDINI et al., 2014). A observação desse reflexo é feita com o auxílio de um objeto fino, como um clipe, com o qual o observador toca o coxim plantar do animal e observa se o filhote fecha a pata em resposta ao contato físico (UDO et al., 2014) – Figura 4. Os filhotes de roedores nascem com esse reflexo e ele deve desaparecer à medida que o animal se desenvolve, geralmente entre os DPN 8 e 10 (DORCE et al., 2009). Esse reflexo é equivalente ao reflexo de Babinski em seres humanos (ALDER; ZBINDEN, 1977) e, quando persiste mais tardiamente, pode indicar a presença de lesão neurológica (KAKITANI et al., 2010).

 

 

Força muscular

Os reflexos mais utilizados para medir a força muscular em roedores são a força de agarrar e o ascending wire mesh (subir em uma grade de metal inclinada) (BOUAYED et al., 2009). A força de agarrar normalmente se instala entre o DPN 10 e o DPN 16 e pode ser avaliada de duas formas: suspensão na barra ou utilizando o aparato de medição de tensão (BOWEN; HANNIGAN, 2013).

Para a avaliação por suspensão na barra, os filhotes são suspensos segurando uma haste de metal com as patas dianteiras, sendo observado o tempo que os animais permanecem pendurados (SUGAWARA et al., 2008; BOWEN; HANNIGAN, 2013; CRÉPEAUX et al., 2014; BRYS; PUPE; BIZARRO, 2014). Já para o método utilizando o aparato de medição de tensão, os filhotes são segurados pela base da cauda e as patas dianteiras são posicionadas na barra móvel do aparato; em seguida, os animais são puxados pela cauda e é mensurada a força máxima de agarrar no ponto em que o animal solta a barra (BOWEN; HANNIGAN, 2013).

Atraso no desenvolvimento no reflexo de força de agarrar é indicativo de prejuízo no desenvolvimento de força muscular e do reflexo de suspensão (BRYS; PUPE; BIZARRO, 2014). Déficits no desenvolvimento desses reflexos também podem estar relacionados com alterações no peso corpóreo materno e no consumo de ração durante os períodos gestacional e de lactação (COLOMINA et al., 2005).

Para a avaliação do reflexo de ascending wire mesh, é utilizada uma malha de arame (50 x 30 cm) de modo que metade da malha fique imersa em água a 26º C e metade fique fora da superfície; os filhotes são posicionados em cima da malha com apenas a cauda em contato com a água, sendo observado o dia do desenvolvimento em que o filhote consegue alcançar o topo da malha de arame (BARKUR; BAIRY, 2016). Esse reflexo se instala entre o DPN 14 e o DPN 18 (BHARATHI; NATESH; REDDY, 2012).

O reflexo de ascending wire meshavalia o desenvolvimento de habilidades motoras complexas e é indicativo de déficits motores sutis (ALTMAN; SUDARSHAN, 1975; BARKUR; BAIRY, 2016), estando relacionado com funções locomotoras cerebelares (NAM et al., 2019). O cerebelo é responsável por receber informações e nível inconsciente e coordenar atividades de função motora e sensitiva, como o domínio dos músculos, da visão, do tato e da audição; déficits nessa área podem se manifestar como ataxia (D'ANGELO, 2018).

Sistema auditivo

O reflexo de sobressalto avalia o desenvolvimento do sistema auditivo de roedores. Para a observação desse reflexo, o observador faz um estalido alto com os dedos a aproximadamente 10 cm de distância da cabeça do animal e deve observar se o filhote manifesta o comportamento de sobressalto de corpo inteiro em resposta ao estalido (Figura 5); o desenvolvimento desse reflexo ocorre entre os DPN 10 e 15 (SANDINI et al., 2014).

 

 

Esse reflexo ocorre em paralelo com a abertura do ducto auditivo, sendo o início do processo de percepção de sons do ambiente (ALTMAN; SUDARSHAN, 1975). Ele é uma resposta à estimulação do complexo do núcleo coclear e à ativação do sistema trigêmeos e/ou vestibular (SANDINI et al., 2014).

Vibrissa placing

O vibrissa placing (estímulo da vibrissa) é um reflexo comportamental sensorial de orientação que está relacionado, entre outros, com a captação de movimento e com a busca pelo alimento (PATIN et al., 2004). Para a observação desse reflexo, o observador deve segurar o filhote pela cauda e tocar suas vibrissas com um objeto fino, como um clipe. Ao ser tocado, o animal deve levantar a cabeça e estender os membros anteriores com o objetivo de agarrar o objeto. O desenvolvimento desse reflexo se dá entre os DPN 6 e 10 (CHEHIMI et al., 2012). Esse reflexo foi o menos empregado nos trabalhos selecionados no presente estudo (2/162).

Toxicidade de praguicidas

O termo praguicida se refere a uma substância química, de origem natural ou sintética, utilizada para matar, repelir ou mitigar organismos que causam lesão ou que transmitem doenças para plantas e animais (SPINOSA; FUKUSHIMA, 2020). Esses compostos podem ser classificados de diversas formas, mas, do ponto de vista toxicológico, a melhor forma de classificação é por meio da finalidade de sua utilização associada à estrutura química do composto. Assim, há as seguintes classes de praguicidas: inseticidas, herbicidas, fungicidas, acaricidas e raticidas (SPINOSA, 2020).

Dentre os 162 trabalhos analisados nesta revisão, 25 apresentam os efeitos do tratamento com praguicidas no desenvolvimento de filhotes de ratos e camundongos (Quadro 1). Os principais praguicidas estudados nesses trabalhos foram a atrazina (4/25), os organoclorados (4/25), a cipermetrina (2/25), o cloreto de trifenilestanho (2/25), o fipronil (2/25), o glifosato (2/25) e os organofosforados (2/25). A maioria dos trabalhos utilizou o rato como mode-lo animal (22/25) e a exposição ao praguicida foi feita durante os períodos de gestação e lactação (14/25). Os parâmetros físicos mais afetados foram abertura vaginal (8/25), abertura dos olhos (4/25), descida dos testículos (4/25) e separação prepucial (4/25). Os reflexos mais afetados foram endireitamento postural em superfície (3/25), geotaxia negativa (3/25), cliff avoidance(2/25) e força de agarrar (2/25).

Toxicidade de medicamentos

Medicamento é um produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico. Os principais grupos de medicamentos de importância para a toxicologia são: analgésicos, anti-inflamatórios não esteroides, medicamentos com ação no sistema nervoso central e antineoplásicos (SALLES-GOMES; GARCIA; SPINOSA, 2020).

De todos os trabalhos selecionados para esta revisão, 31 avaliaram as implicações do tratamento com medicamentos no desenvolvimento de filhotes ratos e camundongos (Quadro 2). Os principais grupos de medicamentos estudados nesses trabalhos foram: repositores hormonais – dietilestilbestrol e estradiol (10/31); fitoterápicos – astragaloside IV, linhaça, Passiflora incarnata, Pippaliyadi yoga e sapthaparna (5/31); antimicrobianos – etambutol, fluorquinolona, isoniazida, rifampicina e triclosana (3/31); e anticonvulsivantes – ácido valproico e carbamazepina (2/31). A maior parte dos trabalhos utilizou

o rato como modelo animal (27/31) e fez a exposição ao medicamento durante os períodos de gestação e lactação (19/31). Os parâmetros físicos mais afetados foram abertura vaginal (8/31), abertura dos olhos (4/31), descida dos testículos (4/31) e separação prepucial (4/31), enquanto os parâmetros reflexológicos mais afetados foram endireitamento postural em superfície (6/31), geotaxia negativa (5/31) e ascending wire mesh (3/31).

Toxicidade de drogas lícitas e ilícitas

Drogas, na acepção atual, são substâncias químicas que levam a alterações de humor e de comportamento, e que causam disfunções no sistema nervoso central; geralmente são substâncias químicas que levam à tolerância e à dependência (SPINOSA; FUKUSHIMA, 2020). Dentre os trabalhos analisados nesta revisão, 13 avaliaram os efeitos da exposição a drogas lícitas e ilícitas no desenvolvimento de filhotes (Quadro 3). As drogas estudadas nesses trabalhos foram metanfetamina (6/13), álcool (4/13), nicotina (2/13) e cafeína (1/13). O rato foi o modelo animal de escolha em grande parte dos trabalhos (10/13), bem como a gestação foi o período de exposição utilizado em grande parte dos trabalhos (6/13). Os parâmetros físicos mais afetados foram abertura dos olhos (7/13), aparecimento dos pelos (3/13) e erupção dos dentes incisivos (3/13). Os parâmetros reflexológicos mais afetados foram endireitamento postural em superfície (10/13), geotaxia negativa (6/13) e cliff avoidance(4/13).

Toxicidade por toxinas

Toxinas são substâncias tóxicas produzidas por seres vivos, podendo ser classificadas em: 1) toxinas bacterianas – são aquelas produzidas por bactérias; 2) micotoxinas – são aquelas produzidas por fungos; 3) fitotoxinas – são aquelas produzidas por plantas; e 4) zootoxinas – são aquelas produzidas por animais e podem ser classificadas em peçonhas (substância tóxica transmitida a outro animal por meio de um órgão inoculador) e veneno (substância tóxica presente num animal que não possui órgão inocular, podendo atingir outro animal quando tocado, mordido) (SPINOSA; FUKUSHIMA, 2020).

Dos 162 trabalhos selecionados nesta revisão, 11 analisaram os efeitos da exposição a toxinas no desenvolvimento de filhotes (Quadro 4). Esses trabalhos trazem informações sobre os efeitos de toxinas de todos os grupos de classificação: 1) toxinas bacterianas – microcystin-LR; 2) micotoxinas – aflatoxina B1, rubratoxina B e zearalenona; 3) fitotoxinas – Catha edulis, Ipomoea carnea e picrotoxina; e 4) zootoxinas – N-óxido de trimetilamina e Tityus bahiensis. A maior parte dos trabalhos utilizou o rato como modelo animal (8/11) e a gestação como período de exposição a essas toxinas (6/11). Os parâmetros físicos mais afetados foram abertura vaginal (4/11) e abertura dos olhos (3/11), enquanto os parâmetros reflexológicos foram geotaxia negativa (6/11), cliff avoidance (6/11) e endireitamento postural em superfície (4/11).

Toxicidade ambiental

A toxicologia ambiental estuda os efeitos nocivos da exposição de organismos vivos aos agentes tóxicos presentes na água, no solo e no ar (SPINOSA; FUKUSHIMA, 2020). Dentre os artigos selecionados, 85 estudos apresentam as implicações no desenvolvimento de filhotes da exposição aos agentes tóxicos ambientais (Quadro 5). Os principais agentes estudados nesses trabalhos foram ácidos perfluoroalquílicos (12/85), bisfenol A (8/85), mercúrio (8/85) e PCB (8/85). Novamente o rato foi o modelo escolhido pela maioria dos trabalhos (57/85) e os períodos de exposição aos agentes tóxicos foram durante a gestação e a lactação (49/85). Os parâmetros físicos mais afetados foram abertura vaginal (27/85), abertura dos olhos (20/85), separação prepucial (8/85) e erupção dos dentes incisivos (7/85). Os reflexos mais afetados foram geotaxia negativa (21/85), endireitamento postural em superfície (17/85) e força de agarrar (14/85).

 

CONCLUSÕES

Na presente revisão, os trabalhos selecionados mostraram quais são os principais parâmetros utilizados para a avaliação de neurotoxicidade durante o período inicial da vida de um roedor até a puberdade. Esses parâmetros se referem a marcos do desenvolvimento físico desses animais e a reflexos inatos que podem apontar alterações comportamentais e neurológicas em diferentes regiões dos sistemas nervosos central e periférico do organismo em desenvolvimento. Os parâmetros de abertura dos olhos e abertura vaginal foram os marcos de desenvolvimento físico mais utilizados nos trabalhos analisados, enquanto o endireitamento postural em superfície e a geotaxia negativa foram os reflexos mais empregados.

Além disso, os trabalhos mostraram os diferentes agentes tóxicos capazes de alterar o desenvolvimento de filhotes de roedores, causando danos reversíveis e, em alguns casos, irreversíveis nesses animais. Esses agentes possuem interesse econômico, uma vez que são utilizados como praguicidas, medicamentos e drogas lícitas e ilícitas, além das toxinas e contaminantes ambientais. A presente revisão enfatizou a importância do modelo animal que emprega os roedores para o estudo da neurotoxicidade e, assim, contribuiu para o entendimento do mecanismo de ação das diferentes substâncias químicas e o uso/ exposição seguros destas durante o período perinatal, período crucial para o desenvolvimento pleno de um animal.

 

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Recebido em: 10/06/2020
Aprovado em: 13/08/2020

 

 

Agradecemos a Chairim Arrais pela elaboração das figuras ilustrativas.

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