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Revista Psicologia Política

versão impressa ISSN 1519-549X

Rev. psicol. polít. vol.14 no.29 São Paulo abr. 2014

 

Experiências religiosas da juventude contemporânea: indagações sobre fé, secularização, ética e política

 

Religious experiences of the contemporary youth: questions about faith, secularism, ethics and political

 

Experiencias religiosas de la juventud contemporánea: preguntas acerca de fe, laicismo, ética y política

 

Expériences réligieuses de la jeunesse contemporaine : questionnements sur la foi, la sécularisation, l'éthique et la politique

 

 

Danilo Marques da Silva GodinhoI; Cíntia de Sousa CarvalhoII; Solange Jobim e SouzaIII

IPsicólogo, doutorando em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Técnico do Núcleo de Álcool e Drogas do Hospital Dia Casa Verde. Colaborador da Comissão de Ética do Conselho Regional de Psicologia, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. danilomgodinho@gmail.com
IIPsicóloga, doutoranda em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Professora Substituta do Departamento de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Psicóloga do Centro Educacional Anísio Teixeira, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. cintiapsicologia_51@hotmail.com
IIIProfessora Doutora do Departamento de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. soljobim@uol.com.br

 

 


RESUMO

A relação do homem com a religião é um dos aspectos da experiência humana que participa da produção da subjetividade, atravessando épocas, culturas e espaços sociais. Deste modo, torna-se relevante conhecer a maneira como os jovens são capazes de expressar sua compreensão desta experiência. A intenção foi criar oportunidades, através de "oficinas de debates", para que os jovens se confrontassem com as suas crenças religiosas, além de compartilhar por meio de uma escuta atenta do outro, as infinitas possibilidades de se construir um modo de ser a partir da experiência religiosa. O texto se desenvolve articulando o discurso dos jovens entrevistados com as reflexões teóricas sobre fé, religiosidade, secularização, ética e política.

Palavras-chave: Religião, Fé, Ética, Juventude, Subjetividade.


ABSTRACT

The relationship created by man with religion is one of the aspects of human experience which participates on the production of subjectivity, throughout times, cultures and social spaces. In this way, it is important to know if the young is capable to reveal his comprehension of such experience, converting it in life attitudes. The intention was to create opportunities, through "talking workshops", in order to make them to be challenged by their religious faith, sharing with the others, by talking and listening, the infinite possibilities of being themselves by taking into account their religious experience. This article intends to put together the speech of the young people and the theories about faith, religiosity and ethics.

Keywords: Religion, Faith, Ethics, Youth, Subjectivity.


RESUMEN

La relación entre el hombre y la religión es un aspecto de la experiencia humana que participa en el proceso de producción de la subjetividad, a través de las épocas, culturas y espacios sociales. Por lo tanto, es importante saber cómo los jóvenes son capaces de expresar su comprensión de esta experiencia. Así, se han creado oportunidades, a través de "talleres de debates", para que los jóvenes se enfrentasen con sus creencias religiosas y compartiesen, a través de la escucha atenta del otro, las infinitas posibilidades para la construcción de un modo de ser desde la experiencia religiosa. El texto se desarrolla articulando el discurso de los entrevistados jóvenes con reflexiones teóricas sobre la fe, la religión, el secularismo, la ética y la política.

Palabras clave: Religión, Fe, Ética, Juventud, Subjetividad.


RÉSUMÉ

La relation de l'homme avec la religion est l'un des aspects de l'expérience humaine qui participe de la production de la subjectivité, franchissant des époques, des cultures et des espaces sociaux. De cette façon, il est important de connaître la manière dont les jeunes sont capables d'en exprimer leur compréhension. L'intention a été de créer des opportunités à travers « les ateliers de débats », pour que les jeunes confrontent leurs croyances religieuses, outre partager par le moyen d'une écoute attentive de l'autre, les infinies possibilités de se construire une manière d'être à partir de l'expérience religieuse. Le texte se développe en articulant le discours des jeunes interviewés avec des réflexions théoriques sur la foi, la religiosité, la sécularisation, l'éthique et la politique.

Mots clés: Religion, Foi, Ethique, Jeunesse, Subjectivité.


 

 

Introdução

Este trabalho teve como objetivo analisar as diversas formas de elaboração e expressão da fé entre os jovens contemporâneos. Consideramos que o atual momento histórico, notadamente marcado por uma fragmentação, expansão, divulgação e profusão do religioso pelo mundo, compreende também um sincretismo religioso que nos interessa investigar. A partir daí surgiram algumas questões para a construção deste texto: qual o significado das manifestações religiosas diversas entre os jovens contemporâneos? Como os jovens justificam suas crenças? Em que contexto as práticas religiosas podem ser compreendidas como modos de organização social com intenções políticas definidas em função de uma coletividade?

Tendo como ponto de partida estas questões, o texto articula abordagens teóricas sobre fé e religiosidade com os discursos apresentados por um grupo de jovens cariocas, buscando, através deste diálogo entre teoria e prática, ampliar a compreensão da relação da juventude contemporânea com a experiência religiosa.

 

Religião e Vida Social: um percurso teórico

Ao analisarmos excertos das obras de Jean-Pierre Vernant (1983), Peter Berger (1985), Walter Benjamin (2002) e Leonardo Boff (2001), constatamos que a relação do homem com o sagrado, ecoa de muito longe, nos remetendo às nossas origens e levando-nos a crer ainda mais na necessidade de contemplar este assunto sem perder de vista todo o seu inestimável valor na constituição da experiência humana. Vernant afirma que a religião é o cimento que une e dinamiza as relações dos homens, funcionando desse modo como um laço social. Por essa razão, defende que o sagrado e o social devem ser estudados juntos, retomando como exemplo a Grécia antiga, onde o sagrado fazia parte de todos os aspectos da vida comum, sendo a religião "[...] a maneira pela qual uma sociedade chega a pensar a si mesma. Para eles, social e sagrado deviam ser pensados conjuntamente." (Vernant, 1983:66). Vernant nos fala sobre a Grécia arcaica com a intenção de mostrar a intrínseca relação do sagrado infiltrado no corpo social: "Há também sociedade - a da Grécia arcaica, por exemplo - onde a descrença é inconcebível. São, em geral, sociedades onde o sagrado não tem definição estrita, já que irriga todo o corpo social, e pode ser encontrado tanto numa cerimônia religiosa quanto num rito culinário [...]" (Vernant, 1983:65). Ao trazer o exemplo grego, Vernant defende o pensamento de que o sagrado pode ser verificado ao longo de toda a história, sendo inclusive capaz de revelar-se com maior intensidade quando se acredita equivocadamente que havia de todo desaparecido.

De fato, creio que o sentimento religioso jamais esteve ausente da vida social e intelectual; mas sua presença assume também a máscara da irreligião, ou, se preferirem, da 'religião de contrabando'. Existe aí toda uma série de articulações e de complexidades que podem, por si sós, dar conta dos falsos ressurgimentos e das verdadeiras permanências. (Vernant, 1983:65)

Segundo o autor, a religião é um sistema simbólico próprio ao pensamento humano na sua necessidade de produzir um mundo em que seja possível viver.

Em outras palavras, os homens edificaram toda uma série de sistemas que lhes permitem ultrapassar os dados do real, atravessá-los por visarem, por seu intermédio, a universos de significações, de valores, de regras, que servem de cimento para uma comunidade. Assim o homem se distingue do animal, que não fabrica ferramentas nem conhece propriamente a linguagem, nem a socialização, nem a história. Ora, para mim, a religião é um desses sistemas simbólicos. (Vernant, 1983:70)

Trabalhando a partir de uma perspectiva semelhante a esta apresentada por Vernant, Berger analisa a dimensão simbólica presente na religião referindo-se a ela como um "nomos". Tal noção diz respeito ao modo como os indivíduos atribuem sentido às suas experiências no mundo. O "nomos", enquanto ordenação das coisas do mundo recebe da religião uma aura divinificadora, um cosmos que o justifica com base num poder superior e por isso mesmo incontestável. Pode-se dizer, portanto, que a religião é a cosmificação do "nomos", ou seja, o discurso por excelência capaz de atribuir sentido à vida face à morte. Para o autor, construir o mundo é construir um sistema que faça sentido e o cosmos religioso surge como província de ordem em meio ao caos que nos espreita.

Boff (2001) nos orienta no debate sobre os diferentes usos que podem ser feitos da religião enquanto sistema simbólico, alertando para o fato de que uma vez institucionalizadas, as religiões correm o risco de se afastar da espiritualidade que lhes deram origem, se corrompendo na busca pela detenção de uma verdade absoluta e pelo poder: "Ao substantivarse e institucionalizar-se em forma de poder, seja sagrado, social, cultural e milenar (como nos estados pontifícios de outrora), as religiões perdem a fonte que as mantém vivas - a espiritualidade." (Boff, 2001:28).

O que Leonardo Boff chama de espiritualidade, diz respeito à experiência singular de cada sujeito, a uma capacidade de autotranscedência do ser humano que independe de rituais, celebrações ou dogmas de determinada estrutura de pensamento religioso. Para o autor, as religiões são água canalizada, não devendo, portanto, serem confundidas com a fonte que lhes dão vida, que é a própria espiritualidade. Segundo o autor, a dimensão espiritual é a fonte de onde emerge a fé, experiência sensível que por ser íntima e profunda faz com que a dimensão espiritual se manifeste em cada indivíduo de um modo singular, sem que necessariamente tenha que apontar na direção de qualquer crença religiosa.

Benjamin (2002) também discute a questão da religiosidade, mas o faz a partir de uma reflexão acerca da dimensão ética, ao questionar a possibilidade de uma lei ética absoluta e definitiva, algo pronto para ser praticado pelos indivíduos. O autor reconhece a dimensão do sagrado como lugar de excelência da ética numa sociedade. Segundo Benjamin, o valor ético se manifesta através da "contemplação religiosa", já que é nela que a vontade mais profunda de cada indivíduo encontra expressão na vida em comunidade. Na contramão de uma moral que limita o poder de escolha e enfraquece a responsabilidade do sujeito frente aos seus atos, Benjamin nos convoca a recuperar a experiência do sagrado a fim de que o ético seja plasmado na sociedade a partir das ações dos indivíduos no cotidiano, no âmbito da comunidade da qual participam.

É na religião que a ética encontra a sua expressão mais genuína, despertando a todos para a responsabilidade comum na edificação de uma sociedade justa e humana. Religião, política e ética são aspectos inteiramente relacionados entre si na obra de Benjamin. Em Benjamin, a ética é um modo de viver uma experiência de fé. Ainda que subjetiva, nas suas mais diversas formas de apropriação e expressão, esta experiência é responsável por reunir a todos em torno de um propósito maior na luta pelo bem comum. Essa experiência de fé que não precisa necessariamente de um objeto religioso definido é referente a algo que reverbera sentido no mais profundo da singularidade de cada sujeito.

 

Estratégias Metodológicas para a Investigação da Experiência Religiosa dos Jovens

A metodologia aqui utilizada integra a análise teórica com a produção de um conhecimento gerado a partir do diálogo com jovens na faixa etária entre 18 e 29 anos. Para alcançar este objetivo realizamos entrevistas coletivas, denominadas "oficinas de debate", com dois grupos de jovens universitários, em duas universidades distintas na cidade do Rio de Janeiro. A estratégia coletiva buscou criar também oportunidades dos jovens se confrontarem com as suas próprias experiências religiosas, além de compartilhar através do debate e de uma escuta atenta do outro, as infinitas possibilidades de produção de subjetividade a partir da experiência religiosa. As "oficinas de debate" tiveram a duração média de 1 hora e 30 minutos, com 8 jovens em cada grupo. Os depoimentos foram gravados, transcritos e os discursos dos jovens foram analisados com o objetivo de se colocar em destaque os principais temas que foram surgindo a partir das falas dos jovens.

Importante esclarecer que esta pesquisa teve como objetivo entrelaçar os depoimentos dos jovens com as reflexões teóricas dos autores citados, buscando uma compreensão da experiência religiosa a partir do cenário cultural e dos atravessamentos históricos particulares que a sedimentam em cada época. Com base nesta abordagem metodológica, este estudo colocou em destaque aspectos ainda pouco discutidos sobre a produção de subjetividade da juventude contemporânea, especialmente no que diz respeito ao sentido que os jovens atribuem à sua religiosidade, entendida aqui como uma das dimensões da fé e da ética. Importante dizer que este texto não tem a pretensão de esgotar este debate, mas apontar e formular perguntas instigantes que podem se desdobrar em novos estudos.

 

Discutindo as Narrativas: os jovens e suas crenças

Religião e Poder: liberdade ou submissão?

Ao longo dos debates destacamos duas concepções de religião bastante distintas: uma que contempla a filiação a uma instituição religiosa como uma possibilidade de ser livre, e outra, que diferentemente da visão anterior, aponta para uma perspectiva que reflete e refrata, em contrapartida, o caráter institucional da religião como cerceamento da liberdade do sujeito.

A fala da jovem Mariana expressa de modo bastante nítido a convicção de que fazer parte de uma determinada crença religiosa, não representa uma alienação, mas antes uma possibilidade de compartilhar esta experiência de contato com o sagrado no bojo de uma comunidade na qual questões podem ser discutidas, refletidas e elaboradas, tendo como referência a própria existência humana:

Mariana: A religião no meu caso não me limita, pelo contrário, eu me sinto liberta, eu sou livre. Eu sou metodista e nas minhas reuniões, nos meus grupos de jovens, há sim uma discussão, há sim uma reflexão, baseada não só no que é pregado, mas no que a gente está vivendo... Então a gente está sempre debatendo, porque temos os nossos questionamentos. Então eu não acho que limita, pelo contrário, eu acho que eu nunca me senti tão livre depois que eu me converti.

Nesta fala, percebemos a consideração de que fazer parte de uma instituição religiosa torna-se importante como forma de estar num ambiente acolhedor em que diferentes experiências podem ser trocadas. Esse excerto se comunica com as reflexões de Berger (1985) e Vernant (1983), que viram no ato de pertencimento a uma dada estrutura de pensamento religioso uma expressão das mais importantes de uma perspectiva de laço social para os seus participantes. De acordo com esta perspectiva, o comprometimento com determinada estrutura religiosa não desvaloriza aquilo que se experimenta na vida, representando justamente o oposto, ou seja, a possibilidade de dar contorno e forma através da experiência religiosa para o que está sendo nela experimentado.

No depoimento de Cidiane, exposto abaixo, a religião é contemplada no seu caráter ontológico de aproximar os humanos em torno de um propósito comum, sendo considerada como forma de conexão dos homens entre si, o que valorizaria, ainda mais, o caráter libertador das instituições religiosas:

Cidiane: Acredito em Jesus Cristo e vejo assim que não limita. E, ao contrário, sinto, e não é só sensação, mais existencialmente eu me percebo cada vez mais livre como ser humano, como mulher também, na medida em que eu, não vou usar a palavra 'adequar', como alguns podem usar: 'aquilo se adequa, aquilo se limita, aquilo segue ou normatiza'; mas, na medida em que trago para minha vida isso, me sinto mais livre sim, até porque quando a gente segue uma crença, resolve ou opta por alguma religião é porque a gente acredita e aquilo vem ao encontro de necessidades profundas do ser.

Em contrapartida a esta perspectiva, Gabriel expôs sua aversão ao caráter institucional da religião, compreendendo-a como um mecanismo de manipulação que cerceia a liberdade dos sujeitos. Em outras palavras, a religião institucionalizada, para este jovem, está sempre organizada em termos de poder e subordinação, ficando deste modo sujeita ou exposta às mais variadas apropriações. As instituições religiosas aparecem como produtoras de normatividades pela via da prescrição moral. Isso aparece articulado na sua fala do seguinte modo:

Gabriel: Eu acho, na verdade, que a religião, qualquer que seja ela, ela reflete a sociedade como um todo, reflete as leis, e digamos assim, são na verdade estruturas feitas para tentar colocar a gente numa determinada linha, digamos assim, normatizar a gente para tentar de alguma forma docilizar os corpos; o que é importante para que a gente consiga se constituir como seres sociáveis, mas acho que é uma forma de suprir, colocar as pessoas dentro de certos limites. Qualquer tipo de sistema de crenças que tenta me dar linha e queira dar uma diretriz para minha própria vida, eu acho isso limitador... É lógico que existe uma dimensão na religião que é algo de ensinamento, de interiorização e de reflexão... O problema é como nós, enquanto seres humanos, nos apropriamos da religião, de como a utilizamos... É uma questão que eu identifico em praticamente todas as religiões, que é um "q" de manipulação, de manipulação de trazer "a verdade" as leis ou as leis divinas, o que é certo, o que é errado, e de dizer como a gente deve agir...

Então eu diria que religião, o termo religião, o caráter institucional da religião é poder... Todas elas caminham juntas no poder, tem uma estrutura coercitiva.

Acompanhando o pensamento exposto por Gabriel, outros jovens também expressaram uma percepção das instituições religiosas como cerceadoras da liberdade de escolha, pois quando excessivamente dogmáticas esvaziam o potencial reflexivo que fundamenta o próprio discurso religioso. Neste caso, o caráter institucional da religião é tido como estrutura coercitiva e o fato de alguns jovens não se filiarem a estas estruturas representa a possibilidade de escolher livremente e refletir sobre as questões existenciais a partir de uma diversidade maior de discursos e de crenças:

Patrícia: Eu não acredito no sentido de você ter uma religião como um dogma. Eu vejo muitas pessoas que vão à Igreja Católica, por exemplo, e está o padre falando e elas estão rezando aquilo automaticamente e quando saem dali esquecem tudo o que foi falado ali dentro e fazem o oposto. Então eu acho que além de uma religião, de ter uma religião em si, você tem que ter fé em alguma coisa, acreditar, mesmo que seja: 'eu acredito no meu modelo interior, em ser bom, em fazer o bem, ser uma pessoa digna e honesta'. Não estou dizendo que não acredito na Igreja Católica, só que não preciso estar lá diariamente, como outras pessoas, para ter minha fé.

[...]

Gabriel: É lógico que ser livre, ou seja, ser livre de crenças ou crenças compartilhadas, de alguma forma tem os seus contras. A gente acaba ficando mais angustiado, no meu caso acaba ficando sem chão às vezes, mas de alguma forma permite que eu, ou outra pessoa que também não queira se enquadrar nesses mecanismos, se envolva nas suas próprias crenças, se interne, se interiorize muito mais do que tentar aceitar uma estrutura pronta, dada... Acho que abre para mais possibilidades, para que a gente consiga se fazer ser...

As críticas e demandas apresentadas por Gabriel parecem se aproximar das questões apresentadas por jovens brasileiros participantes da pesquisa de Regina Novaes (2004). A autora apresenta dados que afirmam o aumento do número de brasileiros "sem religião", em especial, de jovens entre 15 e 24 anos. Entretanto, constata que tal fato não representa apenas uma negação da experiência religiosa, mas antes, é a tentativa de criar novas possibilidades de lidar com a transcendência. Para a autora, tanto a secularização - que trouxe a possibilidade de negação das instituições religiosas - quanto os novos sincretismos - favorecidos pela globalização do campo religioso e a desestabilização da hegemonia católica -, são fatores que engendram outros modos de lidar com a religião. Em síntese, a autora considera que a negação da religião não pressupõe a negação da fé. Em outras palavras, tais jovens afirmam prescindir das mediações institucionais para o exercício da conexão com o transcendente.

O que parece estar em jogo neste caso são as diferentes formas de apropriação da religião. O que se conclui disso, é que a fé está constantemente sujeita a existência de mecanismos de controle que podem pasteurizar e direcionar formas específicas de se conectar com o sagrado, corrompendo e distorcendo alguns princípios em leituras fechadas e intransigentes que dificultam reflexões e ressignificações dotadas de um potencial transformador. Em contrapartida, alguns jovens argumentam que é possível estar dentro de uma instituição religiosa compartilhando a experiência do contato com a dimensão do sagrado, sem que com isso se perca o sentido profundo que tal experiência pode proporcionar para o sujeito. Os argumentos destes jovens, a exemplo também da fala de Mariana reproduzida abaixo, apontam para a possibilidade de desenvolvimento da fé como experiência viva que transcende as contradições presentes nas instituições religiosas, tal qual aquelas verificadas na história do cristianismo.

Mariana: Mesmo sabendo disso tudo, que há paradoxos e há contradições, o que eu vivo é algo que vai além... Porque isso é estudado dentro da Igreja, é dado, não é? Eu faço Teologia. Essas coisas são muito interessantes, como a história, como tudo que é passado, mas o que eu vivo vai muito além, é uma experiência viva.

Para finalizar este tópico, podemos constatar que independente de se filiar ou não a uma linha ou estrutura de pensamento religioso, o que mais fica claro na fala de nossos jovens interlocutores, frequentadores ou não de uma determinada instituição religiosa, é que a fé, qualquer que seja ela, significa em primeiro plano estar conectado com uma dimensão de experimentação da vida que lhe empresta mais sentido. Ter fé, segundo os depoimentos, proporciona uma maior chance de êxito pessoal.

Após observarmos junto aos nossos interlocutores como estes significam a religião em suas vidas, vejamos a seguir como os jovens entrevistados articulam a instituição família com a instituição religião, destacando os processos de subjetivação que estes vetores de sociabilidade desencadeiam.

Religiosidade: entre herança e individuação

Jean Perreault (2005) faz uma análise sobre o modo como as relações entre juventude e religião favorecem um entendimento maior do contexto atual, apontando para um olhar que contempla as juventudes de hoje como as primeiras gerações herdeiras do processo de secularização religiosa1, iniciado a partir dos anos sessenta e intensificado nos anos oitenta. Esse processo representa uma gradual abertura religiosa para o surgimento de novas maneiras de desenvolvimento da fé, marcando principalmente um enfraquecimento dos poderes tradicionais e uma mudança de paradigma no que diz respeito às relações entre as instituições e os indivíduos: "Neste sentido, "ser secularizado" supõe uma reconfiguração do religioso, já que a religião está ao mesmo tempo presente, substituída por outros sistemas de sentidos e em concorrência no mercado dos bens de salvação." (Perreault, 2005:166).

Segundo Perreault (2005), os processos de globalização e secularização trouxeram consigo uma tendência à individuação do crer, em que a fé ficou mais livre e acessível para ser elaborada de um modo mais particular. Observa-se a partir de então, um processo de reconfiguração do religioso, em que se criam novos modos de se relacionar com a dimensão religiosa, modos não mais diretamente atrelados à autoridade das religiões tradicionais e às formas antigas de transmissão do sagrado: "As religiões são assim compreendidas não mais como sistemas que detêm e defendem verdades, mas como diferentes expressões culturais de uma mesma busca do absoluto. A partir de então, os empréstimos e as trocas se tornam possíveis, permitidos e encorajados." (Perreault, 2005:167).

As duas principais consequências destes processos foram de um lado os fundamentalismos, e de outro os sincretismos, surgidos como respostas antagônicas (a primeira representando uma postura de fechamento e a segunda ensejando uma abertura ao intercâmbio cultural e ao diálogo inter-religioso). Um importante desdobramento da secularização religiosa foi a ruptura com uma transmissão linear dos valores religiosos, outrora realizada dentro da família.

Sobre este aspecto, é interessante notar que numa época em que eclodem centelhas de fé de toda espécie, divulgadas e proliferadas por toda parte, não se pode mesmo esperar outra coisa senão uma perda do monopólio das famílias na transmissão de um legado religioso. Portanto, o fato de a religiosidade ter sofrido uma abertura, um processo de secularização, fez com que a fé deixasse de pertencer exclusivamente ao clã familiar e passasse a circular pelo domínio público com maior liberdade. Esse processo de libertação de uma transmissão linear dos valores religiosos, até então quase que obrigatoriamente herdados do seio familiar, aparece claramente nos seguintes depoimentos:

Karina: A minha mãe é moderna, sabe que cada um tem o seu caminho, então a gente procura não intervir uma no caminho da outra. Eu vou ao culto dela e ela vai à Igreja católica, mas só que eu não me adequo ao que ela segue, não acredito em certas coisas que ela acredita, e há uma compreensão mútua.

[...]

Rodrigo: Eu sou o único da minha família que sou católico praticante, que vai à missa, e participa ativamente. O resto da minha família ou não tem uma religião fixa ou é protestante, tem a religião deles. Tem que respeitar ponto e acabou. Eles têm a religião deles e eu tenho a minha. Desde pequeno passei por várias religiões e eu vi aquela que eu me adequei, vi a que eu me sentia melhor.

A liberdade maior gozada pelos jovens no momento de fazer escolhas religiosas aponta para um voluntarismo que restringe o papel da família, ficando esta responsável apenas por orientar, dar uma direção, mesmo que o jovem se decida por outra. Os trechos seguintes representam bem esta noção:

Késsia: Achei legal que uma das entrevistadas falou que a família não tem que escolher religião dos seus filhos. Concordo, ok. Mas assim, do mesmo modo que, como pais, a gente tenta meio que orientar para uma escola melhor, um meio social melhor, na verdade os pais inserem os filhos no meio religioso mais adequado que eles acham no momento, e a gente amadurece para isso, para questionar, para ver se tá de acordo, fazer uma opção nossa. A gente tem a opção de ficar passivo na história ou reeditar. Eu tive a minha época de parar e pensar, vamos lá é isso o que eu quero? Tá, quero, mas não quero tão dentro da Igreja assim, tá dentro demais... Fui quase mandada pro convento sem querer (risos); é sério, faltava só dizer o "sim", já tava tudo arrumado, foi um susto bem grande, aí eu disse "não, péra aí!".

[...]

Luisa: Eu nasci na Igreja Católica, sempre segui, fiz catecismo, primeira comunhão, só que quando eu fiz a crisma eu tinha quinze anos, aí eu comecei a ver muita coisa errada dentro da Igreja. Pessoas que davam palestra para mim e depois eu via fazendo coisa errada na rua. Aí eu pensava assim "poxa, não está certo". É isso o que desanima, entendeu? Essa contradição. Por conta disso eu já visitei várias religiões.

Observa-se nestes casos, que o primeiro contato com a religião ocorreu dentro da família, mas com o passar do tempo, estas jovens encontraram no mundo um espaço para conhecer outras crenças, ter contato com outros valores, para então formar suas próprias convicções. Conforme foram crescendo, puderam questionar de alguma forma as suas religiões de origem, buscando com isso aliar aos ensinamentos de berço as experiências particulares e subjetivas que foram vivendo, elegendo aquelas que reverberaram algum sentido maior. Estes depoimentos engendram a tendência contemporânea entre os jovens de buscar um equilíbrio entre aquilo que recebem enquanto herança do seio das tradições familiares, com aquilo que sentem como sendo verdadeiro para as suas vidas, tal como argumenta Patrícia:

Patrícia: No meu caso foi assim: nasci, fui batizada, e na época da primeira comunhão, meu pai, minha mãe, eles me abriram várias opções "olha tem isso, aquilo", me explicaram tudo, "tem outras religiões". Eles me deram uma opção que muitos pais não dão: "Você quer fazer a primeira comunhão, é isso que você quer seguir?" e eu respondi "não, não quero", aí eles "tudo bem então você não vai fazer". Meus pais me ensinaram muito, na medida em que eles me guiaram até certo ponto para que eu tivesse fé, minha crença acima de qualquer religião. Então eu não preciso estar num templo, em algum local para eu acreditar naquilo. Eu tenho minha fé, minhas convicções para seguir, ter valores.

Percebemos aqui um entendimento do papel da família enquanto instituição que deve orientar o jovem, mas também promover o espaço de liberdade que é necessário para permitir fundar a sua fé própria e subjetiva. Este tipo de comportamento desloca o foco de um indispensável pertencimento a determinadas instituições religiosas, para uma outra experiência de fé que prescinde deste espaço institucional. A mistura de aspectos variados, pertencentes às mais diversas crenças, em experiências de fé plurais, livres de um controle maior das instituições e das tradições religiosas familiares, oferece a possibilidade de se fundar uma conduta ética própria e singular. Portanto, vejamos no tópico a seguir, como tal conduta ética idiossincrática se conecta, nos discursos dos jovens, com a dimensão política que, em último caso, se traduz num modo de estar no mundo frente ao outro.

Religião e Política

Reginaldo Prandi (1997), ao teorizar sobre a globalização, perscruta a possibilidade de se fazer política a partir da diversidade religiosa. A partir daí, levanta a questão do que pode serfeito de toda a fragmentação, expansão, divulgação e profusão do religioso pelo mundo. É neste ponto, que aproxima a religião da política, vislumbrando nela todo um potencial democrático: "Mas no tempo da diversidade multicultural planetária, como antes, há religiões e religiões. Na relação de aceitação e rejeição do mundo firmada por cada uma pode-se encontrar a chave de articulação religião-mundo-política. Aí, pluralidade religiosa pode ser também pluralidade de concepções políticas ensinadas por diferentes religiões." (Prandi, 1997:67).

A religião pode, a partir da sua função histórica de costurar um sentido para a vida do indivíduo, ser agora melhor explorada no seu potencial de agregar valores em torno de uma democracia global. As religiões, circulando hoje mais livremente, descontando-se o caso dos fundamentalismos, podem ser capazes de operar um saber viver com o Outro diferente, no bojo de uma verdadeira comunidade. Daí o autor dizer: "Religiões que valorizam os ideais de coletividade e os direitos coletivos acima da individualidade e da subjetividade, acreditando que há um senso de justiça universal que precisa ser levado ao mundo para sua transformação, abrem certamente uma porta favorável à participação política democrática dos devotos." (Prandi, 1997:68)

Esta perspectiva apontada por Prandi, de que o contexto atual representa o momento histórico propício para uma aproximação da religião com a política, operando com isso a promoção e difusão de valores que visam uma ética comunitária, pode ser encontrada nos seguintes trechos extraídos do debate:

Cidiane: Com relação à multipluralidade, eu acho que é muito interessante isso. Eu vivi, sempre fui católica, mas passei por vários estágios. No primeiro estágio eu vivi uma Igreja, assim uma teologia da libertação. Vivi a doutrina social da Igreja, essa coisa fortíssima, politizada... ; acho a teologia da libertação muito interessante, eu acho que ela veio num momento crucial da Igreja, que a Igreja se fechava muito.

[...]

Marina: A religião em muitos aspectos é política. Se aquilo é uma forma de levar a vida, a religião acaba tratando de todos os assuntos. Cada pessoa que vai ali percebe coisas que podiam ser de outra forma, outras maneiras de agir.

A fala de Mariana se conecta com as considerações apresentadas por Sílvia Fernandes (2007), que buscou analisar as relações entre religião e política. Em seu artigo, afirma que recentes estudos apresentam certo esvaziamento e indiferença dos jovens frente às propostas de ação empreendidas pelos partidos políticos. Por outro lado, observa-se certo investimento dos jovens para mobilizações voluntárias defendidas pelos movimentos religiosos. Por meio de revisão teórica, a autora considera que os modos de se fazer política no contemporâneo podem estar se modificando, sendo reinventados pelos jovens, e, as instituições religiosas parecem ser um endereço escolhido por muitos dos jovens que buscam formas de intervir na realidade.

Ainda que essas formas de mobilização engendradas pelas instituições religiosas não tenham sido diretamente levantadas por nossos interlocutores, Rogério, no depoimento abaixo, nos fornece outra definição para a dimensão ético-política de que falamos. Para o jovem, a reflexão política propiciada pela religião se afirma na produção de sujeitos que se compreendem como parte do mundo que habitam e sentem-se por ele responsáveis. Rogério afirma ainda a dimensão de uma ética engajada, que faz dialogar verdades interiores com ações práticas pela via da fé:

Rogério: Eu acho que existe uma verdade racional no mundo e nas coisas. Toda essa verdade também está dentro da gente, nós não estamos separados do mundo, existe uma relação do nosso interior com o nosso exterior, com a própria realidade, e quanto mais a gente cria essas relações mais compreende o mundo e reafirma a nossa fé nas coisas.

Neste ponto os depoimentos reforçam aquilo que o estudo do tema da religião em Walter Benjamin (2002) nos confere, que é em última análise a constatação de que no limite entre política e religião, nos seus pontos de encontro, está a eminência de uma ética, necessária e possível. Disto resulta que aquilo que separa a religião da política perde a sua razão de ser toda vez que se confronta a questão religiosa deslocando-a para um fundo ético, que é onde se encontra o que de melhor ela pode oferecer, e se desvenda a sua aura política.

Pudemos observar que, a religião é compreendida como importante vetor de individuação para muitos jovens e também percebida enquanto possibilidade de engajamento ético-político-subjetivo no mundo. Num cenário de globalização e autonomização do fenômeno religioso, as instituições passam a ser apenas parte de um arsenal de possibilidades de modos de se relacionar com a dimensão da fé.

 

Conclusão

Este texto teve como foco ampliar o debate sobre a experiência religiosa da juventude contemporânea e sua diversidade de possibilidades de manifestação. Deste modo, pretendeuse desencadear uma reflexão, a partir do diálogo com jovens de diferentes segmentos sociais, propiciados pelas "oficinas de debates". Os discursos dos jovens caminharam no sentido de explorar as distinções entre religião e espiritualidade, entre a fé e os caminhos para a compreensão da ética. A partir das falas, constatamos a emergência de uma liberdade maior dos jovens em fundar a sua fé nas suas próprias experiências, individuando-se frente à transmissão familiar religiosa. Por outro lado, os jovens nos mostraram o modo como a dimensão religiosa engendra uma política de estar no mundo engajada e que pressupõe a responsabilidade com o outro.

Conforme visto, religião diz respeito cada vez mais a experiências de fé singulares, liberando-se gradativamente da égide das instituições religiosas de outrora. Nada mais legítimo, portanto, do que considerar a juventude como um importante foco desta transformação religiosa, e os depoimentos dos jovens aqui apresentados reiteram o lugar de destaque que eles podem ocupar nesta transformação. Walter Benjamin nos incita a dar continuidade a este debate, propondo, com base em indagações filosóficas que precisam ser revisitadas, o lugar a ser ocupado pelo poder da crítica e o papel que os jovens podem desempenhar para a produção de uma ética em permanente devir, plasmada em uma religião que ainda está por ser inventada: "É no âmbito da juventude que a religião atinge a comunidade de maneira a mais intensa, e em nenhum outro lugar a ânsia por religião pode ser mais concreta, íntima e penetrante do que na juventude." (Benjamin, 2002:27).

O panorama atual parece corroborar esta noção, já que o jovem de hoje goza de uma liberdade muito maior para fundar o contato com a dimensão religiosa nas suas próprias experiências, a partir da sua própria caminhada, o que preenche o seu existir de um sentido particular, que nem por isso deixa de estar inscrito numa ética comunitária. Esta noção aparece bem descrita na reflexão de Perreault e no depoimento de uma das jovens entrevistadas:

O "peregrino" moderno torna-se o ator principal da construção do sentido, na medida em que só ele pode traçar seu itinerário, viver a experiência da estrada, com o risco da itinerância. "Os traçados espirituais pré-fabricados" não só não têm mais credibilidade, mas toda palavra deve submeter-se a um processo no qual os juízes são o indivíduo e a experiência pessoal. (Perreault, 2005:168)

[...]

Suzane: Os jovens estão procurando uma religião que se adeque às suas necessidades, não estão querendo se adequar à religião, mas adequar a religião à sua fé. A juventude sem a minha fé e não sem a minha religião estaria perdida. Então o que me guia não é a minha religião, mas a minha fé.

Frente às questões apresentadas, desdobram-se tantas outras ainda a serem respondidas, tais como:

i) a necessidade de se ampliar a discussão religiosa junto aos jovens, abrindo espaço para a expressão da subjetividade em transformação, fazendo da experiência religiosa um destino com sentido;

ii) abordar a dimensão religiosa nas escolas, afirmando-se a pluralidade desta experiência como formas de manifestação da fé;

iii) analisar o discurso da laicidade e suas consequências, problematizando as interpretações que esvaziam o sentido da experiência religiosa enquanto aspecto intrínseco e irrevogável da condição humana.

Para finalizar, colocamos em aberto a seguinte questão, de cunho teológico, mas também epistemológica: quais as consequências para o exercício da experiência da fé entre os jovens contemporâneos, desencadeada pela tensão entre a tímida presença da discussão sobre a religiosidade e o ideário racionalista que habita nossos discursos e práticas contemporâneas?

 

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Recebido em 12/08/2013
Revisado em 12/012/2014
Aceito em 21/03/2014

 

 

1 Por secularização religiosa o autor compreende "a instauração de sociedades pluralistas e oficialmente liberadas da autoridade das instituições e símbolos religiosos".

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