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Psic: revista da Vetor Editora

versão impressa ISSN 1676-7314

Psic v.7 n.2 São Paulo dez. 2006

 

ARTIGOS

 

Aspectos psicológicos em dermatologia: avaliação de índices de ansiedade, depressão, estresse e qualidade de vida

 

Psychological aspects in dermatology: anxiety, depression, stress and specific quality of life evaluation

 

Aspectos psicológicos en dermatología: evaluación de índices de ansiedad, depresión, stress y calidad de vida

 

 

Martha Wallig Brusius Ludwig 1; Luciana Balestrin Redivo 2; Hericka Zogbi 3; Luciana Hauber 4; Tatiana Helena Facchin 5; Marisa Campio Müller 6

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo teve como objetivo verificar índices de depressão, ansiedade, estresse e qualidade de vida específica em pacientes com dermatoses. Participaram da pesquisa 151 sujeitos, homens e mulheres, entre 20 e 89 anos de idade. O delineamento do estudo foi transversal, descritivo e correlacional. Os instrumentos utilizados foram BAI, BDI, DLQI-BRA e ISSL. Os resultados demonstraram que os índices de ansiedade e depressão têm média considerada leve, de acordo com as características do instrumento (BAI: 10,76±9,21; BDI: 13,49±11,45). Sobre estresse, 60,3% da amostra obteve resultado positivo para estresse, sendo a área psicológica a mais afetada. Os resultados de qualidade de vida específica em dermatologia ficaram um pouco abaixo da média de estudos brasileiros (3,69±3,72). Verificou-se correlações moderadas e altamente significativas ( 0,01) para os índices de ansiedade, depressão, estresse e qualidade de vida específica, nos quais podemos evidenciar as relações entre adoecimento físico e psíquico, colocadas pela literatura.

Palavras-chave: Psicodermatologia, Ansiedade, Depressão, Estresse, Qualidade de vida.


ABSTRACT

This article aims to analyze anxiety, depression, stress and specific quality of life levels in skin disease patients. The participants were 151 persons, men and women, between 20 to 89 years old. The study used a descriptive, transversal and correlational methodology. The data were collected through BAI, BDI, DLQI-BRA and ISSL. The results indicates anxiety and depression levels showing by a light mean in a compliance with the instrument characteristics (BAI: 10,76±9,21; BDI: 13,49±11,45). As regards of stress, 60,3% of the sample got positive results for stress, presenting the psychological area as more affected. The specific dermatology quality of life results shows a low levels mean when compared with another Brazilian studies (3,69±3,72), as well as another countries. However, this survey shows moderate and high significant correlations ( 0,01), for anxiety, depression, stress, specific quality of life levels, therefore we can attest the illness as evidence of relation between psyche and physics, as showed by the literature.

Keywords: Psychodermatology, Anxiety, Depression, Stress, Quality of life.


RESUMEN

Este estudio ha tenido como objetivo verificar índices de depresión, ansiedad, stress y calidad de vida específica en pacientes con dermatosis. Han participado de la investigación 151 sujetos, hombres y mujeres, entre 20 y 89 años de edad. El delineamiento del estudio ha sido transversal, descriptivo y correlacional. Los instrumentos utilizados han sido el BAI, BDI, DLQI-BRA y ISSL. Los resultados han mostrado que los índices de ansiedad y depresión tienen promedio considerado leve, de acuerdo con las características del instrumento (BAI: 10,76±9,21; BDI: 13,49±11,45). Sobre el stress, 60,3% de la muestra ha obtenido un resultado positivo, siendo el área psicológica el más afectado. Los resultados de calidad de vida específica en dermatología han aparecido un poco abajo del promedio de estudios brasileños (3,69±3,72). Se han verificado correlaciones moderadas y altamente significativas ( 0,01) para los índices de ansiedad, depresión, stress y calidad de vida específica, donde hemos podido verificar las relaciones entre enfermedad física y psíquica presentadas por la literatura.

Palabras clave: Psicodermatología, Ansiedad, Depresión, Estrés, Calidad de vida.


 

 

Introdução

Muitos são os autores que discorrem sobre a estreita relação entre pele e psiquismo (Anzieu, 1989; Montagu, 1988; Winnicott, 1983) desde sua importância para a constituição do ego até o entendimento da pele como uma via de comunicação com o mundo externo. Através da pele, o indivíduo tem suas emoções expostas ao outro, quando ruboriza, arrepia ou adoece.

Quanto ao adoecimento da pele, Tiedra et al. (1998) referem que as afecções dermatológicas produzem um efeito negativo na vida dos pacientes. Além disso, sublinham que aspectos psicológicos têm papel importante no desencadeamento e nas conseqüências de diversas dermatoses.

É evidente a importância de estudos sobre a pele, avaliando questões psicológicas no surgimento das dermatoses, com o objetivo de prevenir doenças, bem como intervir mais especificamente. Atualmente, inúmeras são as variáveis psicológicas estudadas para uma melhor compreensão do adoecimento da pele. Alguns estudos também procuram investigar intervenções que possam ser complementos dos tratamentos médicos. Müller (2001, 2004), comparou dois grupos de pacientes com vitiligo: um recebendo tratamento médico por seis meses e o outro, sujeito a tratamento médico e psicológico durante o mesmo período. Os resultados demonstram que o grupo que obteve os dois tratamentos teve aumento significativo da repigmentação da pele (80%) em comparação ao grupo com apenas tratamento médico, que repigmentou 20%.

Os estudos de qualidade de vida em pacientes com dermatoses são diversos e apontam essa variável co-mo fortemente prejudicada na vida das pessoas com afecções de pele. Os temas de ansiedade e depressão também estão sendo estudados na sua relação com as doenças de pele em diversos países, nos quais aparecem correlações entre esses índices, sem que necessariamente se estabeleçam relações de causa e efeito (Amorim-Gaudêncio Roustan & Agustina, 2004; Devrimci-Ozuven, Kudakci & Boyvat, 2000; Kent & Keohane, 2001; Kose, Sayar & Ebrinc, 2001; Singareddy, Moin, Spurlock, Merrit & Udhe, 2003; Stangier & Ehlers, 2000; Yazici e cols., 2004).

Quanto ao estresse sabe-se que é um fator relacionado com o surgimento e desenvolvimento de doenças, desde os estudos de Selye (1936). Muitos pesquisadores têm buscado aprofundar os conhecimentos sobre a relação entre o estresse e as doenças de pele. Rodríguez, Celis e Soza-Sarritiello (2002) referem que extensos estudos indicam que o estresse emocional pode exacerbar alguns eventos na psoríase, por exemplo.

Um estudo sobre estresse e doenças psicossomáticas, realizado na Iugoslávia afirma que os resultados das pesquisas contemporâneas e experiências clínicas indicam a necessidade de um cuidado compreensivo e multidimensional para entender, prevenir e tratar pacientes psicossomáticos (Lecic-Tosevski, Draganic-Gajic, Vukovic & Stepanovic, 2001). Além desses estudos, outros têm sido feitos, trabalhando questões de estresse e doenças dermatológicas (Niemeier, Klein, Gieler, Schill & Kupfer, 2005; Picardi & Abeni, 2001; Stangier & Ehlers, 2000; Yang, Sun, Wu & Wang, 2005).

A presente pesquisa avaliou qualidade de vida específica e os aspectos emocionais: ansiedade, depressão e estresse em pacientes com dermatoses. Fica evidenciada a importância de novos estudos, principalmente no Brasil, que busquem avaliar a influência dos aspectos emocionais presentes em pacientes dermatológicos.

 

Método

O presente trabalho apresenta um estudo de delineamento transversal, descritivo e correlacional, caracterizando-se num recorte da realidade dos pacientes portadores de dermatoses, sem acompanhamento longitudinal. Os dados foram submetidos à análise estatística por meio de testes descritivos, do qui-quadrado de Mann-Whitney e de Kruskall-Wallis e da Análise de Correlação (Coeficiente de Pearson), por meio do programa SPSS 11,5. Os objetivos do trabalho foram respondidos exclusivamente com o teste de correlação, porém alguns resultados interessantes puderam ser encontrados por meio dos testes de qui-quadrado propostos. Nas conclusões dos testes estatísticos utilizou-se o nível de significância de 5%, ou seja, sempre que p 0,05 houve evidência de significância estatística.

Participantes

Foram entrevistados 151 sujeitos, portadores de dermatoses, sem especificação, em atendimento nos Ambulátorios de Dermatologia do Hospital São Lucas da PUC-RS (HSL) e de Dermatologia Sanitária (ADS) de Porto Alegre. Os locais de coleta foram selecionados por conveniência e os sujeitos foram selecionados consecutivamente, por ordem de chegada nos serviços de saúde, sendo critério de inclusão estar pelo menos na terceira consulta, para maior número de casos com diagnóstico estabelecido e menor número de casos em investigação, no intuito de evitar o enviesamento dos resultados, no que tange aos sentimentos em relação à doença. A idade mínima dos sujeitos foi estabelecida em 20 anos, considerando a necessidade de compreensão e resposta aos instrumentos propostos e algum nível de maturidade para a entrevista, em se tratando de um estudo transversal.

Procedimento para Coleta de Dados

Os pacientes foram encaminhados pelos dermatologistas para participar da pesquisa, no próprio ambulatório, e depois de informados e consentindo a participação, respondiam aos questionários, sendo 40 minutos a média de tempo total de aplicação.

Instrumentos

Inventários de Beck. O BAI, Beck Anxiety Inventory (1993), é composto por 21 itens, numa escala de 4 pontos com graus de gravidade crescente de sintomas de ansiedade. A pontuação é a seguinte: 0 - 10 pontos, grau mínimo de ansiedade; 11 - 19, grau leve; 20 - 30, grau moderado; 31 - 63, grau grave). O BDI, Beck Depression Inventory (1993b), é uma escala de auto-relato, composta por 21 itens, cada um com quatro alternativas, subentendendo graus crescentes de gravidade de depressão, sendo a pontuação de 0 - 11, grau mínimo de depressão; de 12 - 19, grau leve; de 20 - 35, grau moderado e de 36 - 63 grau grave.

Dermatology Life Quality Index (DLQI-BRA). Adaptado e validado para o português para uso na região sul (Zogbi, 2004, Zogbi, Müller, Protas, Kieling & Driemier, 2005) tendo apresentado um índice de consistência interna dado pelo Alpha Cronbach, de 0,73. É composto por dez itens, relacionados à qualidade de vida específica para problemas de pele, divididos em seis domínios: trabalho, lazer, relações pessoais, tratamento, sintomas e sentimentos. A pontuação geral do instrumento vai de 0 a 30 pontos, sendo melhor o índice de qualidade de vida quanto mais próximo de zero. Não há ponto de corte estabelecido para esse instrumento.

Inventário de Sintomas de Stress para Adultos-ISSL (Lipp, 2000). Visa a identificar a presença de sintomas de estresse, os tipos de sintomas existentes, se físicos e/ou psicológicos, e a fase de estresse (alerta, resistência, quase exaustão e exaustão) em que se apresentam. Para o levantamento desses três resultados, é necessário consultar as tabelas de avaliação propostas no manual, não sendo possível fazer o diagnóstico utilizando apenas o número total de sintomas assinalados. Faz-se o levantamento a partir de três tabelas de correção referentes a: fases do estresse, tipo de sintomatologia (sintomas físicos) e tipo de sintomatologia (sintomas psicológicos).

A fase de alerta caracteriza-se por ser positiva do estresse tornando a pessoa mais atenta, forte e motivada. Na fase de resistência, a produtividade diminui e acentua-se a vulnerabilidade para vírus e bactérias. Já na fase de quase-exaustão, as resistências física e emocional estão fragilizadas exigindo esforço maior para as atividades do cotidiano. Por último, a mais negativa e patológica fase do estresse é a de exaustão quando a pessoa entra em desequilíbrio interior, podendo causar doenças graves como psoríase e vitiligo, por exemplo.

Procedimentos éticos

O projeto obteve aprovação do Comitê de Ética da PUC-RS sem restrições, sendo resguardadas as questões éticas de sigilo e identificação dos sujeitos. Os participantes receberam leitura e explicação sobre o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

Resultados

A população é composta em sua maioria por mulheres (67,5%) comum em estudos dermatológicos; por pessoas de baixa escolaridade (68,2% com até primeiro grau completo), sendo este um achado comum em pesquisas realizadas nos serviços públicos de saúde. As idades foram categorizadas em 7 faixas, que variam entre 20 e 89 anos. A maior parte da amostra localizou-se na faixa 5 (de 60 a 69 anos), apresentando uma média de idade de 55,06 anos (dp=14,75). Essa média de idade é superior aos demais estudos pesquisados, cuja média é em torno de 40 a 43 anos. Um dado importante já que a maioria das doenças estudadas tem seu início em torno da segunda década de vida. A faixa de idade 3 (entre 40 e 49 anos) mostrou resultados estatisticamente mais significativos que as demais faixas para a depressão (p= 0,03), ansiedade (p= 0,01) e qualidade de vida específica em dermatologia (p=0,4) por meio do teste de qui-quadrado de Kruskal-Wallis.

Em relação aos diagnósticos da amostra, percebe-se que são bastante variados. Entre eles, 15% estão dentre as psicodermatoses (Fitzpatrick, 1997), sendo acne, dermatite atópica, psoríase, vitiligo e herpes. Embora neste artigo não abordemos as características de cada dermatose separadamente, é interessante salientar aquelas diretamente relacionadas com aspectos emocionais, dadas as características do estudo.

Uma característica peculiar desta pesquisa foi ter estudado aspectos emocionais em diferentes dermatoses, diferenciando-se de muitos trabalhos, nos quais são avaliadas dermatoses específicas, como psoríase e acne, por exemplo (Bloom, 2004; Sampogna, Será & Abeni, 2004).

Grande parte dos sujeitos entrevistados, 43% apresentou diagnóstico em investigação, seja pelo estágio da doença ou pela complexidade do caso, mesmo com a tentativa de eliminar tal variável pela seleção dos sujeitos. Quanto à percepção ou não da influência dos fatores emocionais na doença de pele, os resultados ficaram equilibrados: 49,7% percebem a influência de fatores emocionais no desencadeamento de sua dermatose, e 50,3% não percebem.

 

 

Sobre a ansiedade

Os resultados referentes ao Inventário Ansiedade de Beck (BAI) demonstraram que o nível médio de ansiedade na amostra foi de 10,76 (9,21) pontos, caracterizando nível mínimo de ansiedade. A figura abaixo apresenta os resultados de freqüência dos níveis de ansiedade fornecidos pelo instrumento. Pode-se verificar que a ansiedade nesta amostra é um elemento presente, com 40,39% das pessoas com algum nível, embora 59,61% (n=89) apresentem níveis mínimos.

Sobre a depressão

Com base nos resultados da Escala de Depressão de Beck (BDI), a amostra apresenta nível mínimo de depressão na sua maior parte (56,3%; n=85) e 43,7% apresenta algum nível de depressão. O índice médio de depressão da amostra foi de 13.49 (dp= 11.45), caracterizando nível leve de depressão. A figura 2 apresenta os níveis de depressão da amostra e evidencia uma pequena freqüência de sujeitos com nível grave de depressão. Tanto os índices de ansiedade quanto os de depressão se distribuem entre os quatro níveis diferentes, estando mais concentrados no mínimo.

Sobre a Qualidade de Vida Específica em dermatologia

Os resultados do DLQI-BRA demonstram que a média desta amostra foi de 3,69 (3,72) pontos, estando abaixo da média de outros estudos realizados: no estudo brasileiro de validação para o Sul do Brasil realizado por Zogbi (2004) a média encontrada foi de 7,12; nos Estados Unidos foi 6,5 (Hahn e cols., 2001); na Dinamarca de 7,9 (Zachariae, Zachariae, Ibsen, Mortensen & Wulf, 2004) e, no estudo de validação do instrumento no Reino Unido, de Finlay e Khan (1994) foi de 7,3. Esse dado evidencia que nesta amostra o aspecto qualidade de vida específica parece estar pouco prejudicado.

Sobre o estresse

Os resultados apresentados pelo Inventário de Sintomas de Stress para Adultos-ISSL (Lipp, 2000) mostram que a maior parte da amostra, 60,3%, apresentou diagnóstico positivo para estresse, sendo 46,4% localizados na fase de resistência (considerando as fases da autora: alerta, resistência, quase exaustão, exaustão). Essa fase é caracterizada pela busca do equilíbrio perdido na fase de alerta, quando aumenta a produção de cortisol e a vulnerabilidade a doenças é acentuada.

A área de concentração do estresse na amostra total foi de 31,1% de pessoas com estresse na área psicológica, 15,9% na área física e 13,2% concentrado em ambas as áreas. O percentual sem diagnóstico de estresse foi de 39,7%.

Correlações entre aspectos emocionais

Neste estudo, foi realizada a análise de correlação de Pearson, encontrando-se correlações altamente significativas (p<0,001) entre todos os aspectos emocionais avaliados entre as pessoas com doenças de pele, como se vê a seguir.

Em se tratando de um estudo correlacional, todas as variáveis propostas foram estudadas. A correlação entre depressão e ansiedade mostra-se mais forte em relação às demais, o que é esperado em função das características de construção dos dois instrumentos. Foi encontrada uma correlação significativa para estresse e ansiedade, o que pode ser entendido pela proximidade dos sintomas, visto que no diagnóstico de estresse, muitas vezes, estão presentes características de ansiedade. A correlação entre depressão e qualidade de vida específica mostra-se moderada e altamente significativa.

 

 

Das correlações entre sexo e os aspectos emocionais, fica evidenciado o estresse, por ser o único significativo, mesmo que esta seja correlação fraca (p= 0,16). Este é um dado mais significativo para o grupo das mulheres.

Os demais aspectos emocionais não mostraram significância em relação a variável sexo na presente amostra. Esse é um dado corroborado pela literatura internacional, nos quais mesmo com a maioria de mulheres na busca pelos serviços de dermatologia, os prejuízos aparecem com a mesma intensidade em ambos os sexos, uma informação relevante quanto aos inconvenientes causados pelas dermatoses.

Análise Inferencial

Embora não seja o objetivo de um estudo correlacional, a estatística inferencial foi utilizada em favor da riqueza dos dados encontrados, alguns deles corroborando os dados de correlação e outros complementando-os. Por meio do teste de qui-quadrado de Mann-Whitney, houve associação entre sexo feminino e níveis mais altos de ansiedade (p= 0,05), embora o estudo de correlação não tenha demonstrado a correlação entre o prejuízo causado pela dermatose e o sexo. Aspectos de ansiedade em mulheres não podem ser afirmados aqui como uma decorrência da doença de pele.

As mulheres tiveram resultados mais significativos para estresse (p=0,05), corroborando o estudo de correlação. Por meio do teste de qui-quadrado de Mann-Whitney (U), a qualidade de vida específica em dermatologia apresentou resultados significativos (p=0,001) para o grupo que não possui estresse (39,7% da amostra), talvez daí a predominância de pouco prejuízo na qualidade de vida específica.

Verificou-se também que a ansiedade é um dado significativo para a amostra total, sem diferenciar o sexo (p= 0,04) diferente das outras variáveis emocionais. A ansiedade aparece de forma mais díspare do que a depressão, quando se trata de gênero. Além disso, as mulheres representam 7,8% da amostra com nível grave de ansiedade, enquanto os homens não apresentam nível grave (0% da amostra). Os resultados do DLQI-BRA não mostram diferenças significativas para prejuízos na qualidade de vida específica em dermatologia entre homens e mulheres.

 

Discussão

Numa revisão bibliométrica breve, vê-se que índices de ansiedade são em geral mais pesquisados em pacientes com dermatoses que índices de depressão. A base de dados Proquest, por exemplo, apresenta dez artigos com os termos depressão e doenças de pele (depression and skin diseases) e 26 artigos com os termos ansiedade e doenças de pele (anxiety and skin disease). No entanto, os dois índices contêm importantes informações para o adoecimento, conforme Picardi, Porcelli, Pasquini e Fassone (2006); Picardi, Pasquini, Abeni e Fassone (2005); Urpe, Pallanti e Lotti (2005).

Neste estudo, obtivemos níveis de depressão de leve a grave, estando a média de pontuação no nível leve. Esse índice pode ser explicado por meio de algumas das teorias que embasam o entendimento das doenças numa perspectiva psicossomática (Mello Filho, 2002), nas quais o adoecimento é uma concretização no corpo de algo que não foi simbolizado e elaborado no plano psíquico. Quando não se consegue elaborar mentalmente algum conflito, o psiquismo tenta fazê-lo por meio do corpo.

A amostra desta pesquisa apresentou uma média maior de depressão em comparação à média de ansiedade. De acordo com a literatura (Fleck e cols., 2002), a depressão enquanto transtorno, é mais prevalente nas mulheres. No entanto, no presente estudo, assim como numa pesquisa realizada na Turquia em pessoas com dermatoses, não foram encontradas diferenças significativas para depressão entre homens e mulheres. Como a depressão se caracteriza por sofrimento eminentemente psicológico, espera-se uma elaboração no plano psíquico. A manifestação orgânica surge quando da impossibilidade dessa organização.

Outros estudos avaliam prevalência de diagnósticos de transtornos de ansiedade e depressão em pacientes dermatológicos, diferente do objetivo da presente pesquisa, que avaliou níveis de ansiedade e depressão em relação à doença. Uma pesquisa realizada no Brasil (Marot, 1993) abordou a freqüência de transtornos de ansiedade e depressão da população dermatológica. Nosso estudo buscou correlações entre aspectos emocionais e doenças de pele, não objetivando diagnosticar os sujeitos para transtornos de ansiedade, depressão e/ou estresse. Em função disso, o estudo foi construído e analisado visando a proporcionar inferências sobre a relação das dermatoses com aspectos emocionais, visto que os sintomas físicos estão relacionados aos psicológicos.

Um estudo argentino com pacientes dermatológicos, de validação de uma escala para depressão, comparando-a com a Escala de Depressão de Beck (BDI), encontrou sintomas de depressão em 50% da população estudada (Fernández, Bronstein, Bernardou & Woscoff, 2001). A presente pesquisa encontrou sintomas de depressão em 43,7 % da amostra, estando um pouco abaixo do referido estudo.

Uma pesquisa feita na Turquia com pacientes com acne, encontrou níveis mais elevados de ansiedade e depressão nesses pacientes do que no grupo sem doença de pele (Yazici e cols, 2004). Na presente pesquisa, não foi realizada comparação com pacientes sem dermatoses, mas a literatura existente contribui para o entendimento.

Quanto aos resultados de qualidade de vida específica em dermatologia, chama atenção o escore baixo nesta amostra em comparação a outros estudos, já citados, o que demonstraria uma percepção de pouco prejuízo nessas pessoas, já que, com o do DLQI-BRA, quanto menor o índice, melhor a qualidade de vida específica. Dessa forma, o que fica evidenciado é que o fato de estarem acometidas por um problema de pele aparece como algo que não incomoda. Uma inferência das pesquisadoras, tanto pela prática clínica quanto pelas discussões com dermatologistas, é que isso se dê possivelmente em função de muito tempo de convivência com a doença. No entanto, este é um dado não obtido estatisticamente no presente estudo.

Em relação às médias de idade, obtivemos uma média alta (na faixa de 60 a 69 anos). Pode-se inferir que os efeitos da doença de pele podem ficar minimizados perante os outros problemas decorrentes do envelhecimento.

O nível de estresse mostrou correlação com os níveis de ansiedade, depressão e qualidade de vida, conforme a tabela 1. Além disso, a maior parte da amostra apresentou diagnóstico positivo para estresse. Fica evidente, como abordado por outras pesquisas, a já conhecida influência do estresse no aparecimento ou exacerbação de doenças. De acordo com Koblenzer (1993) e Gupta (1998), na psoríase, alopecia areata, dermatite atópica e acne, o estresse aparece como um disparador da doença. Outros estudos (Paldaof, Leroux & Bussy, 2001; Rodríguez, Celis & Sosa-Sarritello, 2002; Picardi e cols, 2003) referem o estresse como coadjuvante no desenvolvimento das dermatoses. Grande parte dessa amostra (43%) apresentou o diagnóstico dermatológico ainda em investigação, podendo ser por quatro fatores: falta de conhecimento da doença por parte do paciente; dificuldade do serviço em diagnosticar uma doença presente; dificuldade de diagnóstico de algumas doenças ou ainda por, de fato, os sujeitos apresentarem sintomas que não se configurem como um diagnóstico fechado.

 

Conclusões

Podemos considerar, como em outros estudos (Picardi e cols, 2005; Jesitus, 2005), a importância de um atendimento integrado aos pacientes dermatológicos, oferecendo psicoterapia, atendimentos em grupo, técnicas de relaxamento e estratégias de redução de estresse, que contemplem um suporte psicossomático do sujeito em sua integralidade. Realçamos a necessidade de que outros estudos sejam feitos para um maior entendimento das pessoas com problemas dermatológicos, principalmente utilizando grupos controles sem dermatoses. Na presente amostra, muitos sujeitos apresentaram diagnóstico em investigação, conforme apresentado nos resultados, e seria relevante conhecer os motivos pelos quais isso acontece por meio de novos estudos. Assim, seria possível propor programas de intervenção, informando pacientes e instrumentalizando profissionais para um trabalho conjunto e integrado, já que o fim último das pesquisas é beneficiar os pacientes, aqueles que sofrem com o problema estudado. Isso é ainda mais importante quando se pensa que as doenças de pele, diferentemente de outras doenças, estão expostas ao externo e, talvez por isso, as pessoas com estes problemas necessitem de adaptação tanto à sua doença quanto à exposição ao outro.

A qualidade de vida específica apresentou poucos prejuízos nessa amostra e poderia ser mais estudada em outras investigações. Isso porque chama a atenção o fato de que estar acometido por uma doença de pele não gera, nessas pessoas, um incômodo importante. Interessante que fossem realizados mais estudos brasileiros, em que as pesquisas em psicodermatologia são ainda incipientes. A partir disso, as equipes de saúde poderiam oferecer atendimento mais completo e qualificado, ampliando o entendimento das relações entre o adoecimento orgânico e os aspectos emocionais.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Rua Professor Xavier Simões, 330 - Bairro Vila Conceição
CEP 91920790 Porto Alegre-RS
E-mail: marthaludwig@hotmail.com

Recebido em: agosto 2006
Revisado em: setembro 2006
Aprovado em: dezembro 2006

 

 

Sobre os autores:

1 Martha Wallig Brusius Ludwig é psicóloga, psicoterapeuta, voluntária na ONG Psorisul, mestranda em Psicologia Clínica PUC-RS e bolsista pelo CNPq.
2 Luciana Balestrin Redivo é psicóloga, psicoterapeuta, voluntária na ONG Psorisul, mestranda em Psicologia Clínica PUC-RS e bolsista pelo CNPq.
3 Hericka Zogbi é psicóloga, psicoterapeuta, voluntária na ONG Psorisul, doutoranda em psicologia PUC-RS e bolsista pelo CNPq.
4 Luciana Hauber é bolsista de Iniciação Científica BIC/FAPERGS, graduanda em psicologia PUC-RS.
5 Tatiana Helena Facchin é bolsista de Iniciação Científica BIC/FAPERGS, graduanda em psicologia PUC-RS.
6 Marisa Campio Müller é psicóloga, psicoterapeuta, doutora em Psicologia Clínica PUC-SP, professora titular Faculdade de Psicologia e Enfermagem PUC-RS, líder Grupo de Pesquisa Psicologia da Saúde, PUC-RS.