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Avaliação Psicológica
versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431
Aval. psicol. v.5 n.2 Porto Alegre dez. 2006
RESUMOS-XI SIMPÓSIO DA ANPEPP
Validade de critério da versão em português da Toronto Alexithymia Scale-TAS para população clínica
Elisa Medici Pizão Yoshida
Pontifícia Universidade Católica de Campinas
Introdução
A pesquisa teve por finalidade contribuir para o processo de validação da versão em português da Toronto Alexithymia Scale -TAS (Yoshida, 2000), estimando suas propriedades psicométricas em população clínica. Os resultados da consistência interna, análise fatorial e precisão de teste e reteste foram apresentados em outro trabalho (Yoshida, no prelo). Aqui, são resumidos os estudos da validade de critério por grupos comparados (pacientes vs. acompanhantes) e a validade por testes existentes, empregando-se, neste último caso, duas medidas de critério: avaliação de sintomas psicopatológicos e neuroticismo.
Para a avaliação de sintomas psicopatológicos optou-se pela Escala de Avaliação de Sintomas-40 / EAS-40 (Laloni, 2001), uma adaptação, para a mesma população, da Escala de Avaliação de Sintomas-90-R / SCL-90-R, de Derogatis (1994). E como medida de neuroticismo, a Escala Fatorial de Ajustamento Emocional / Neuroticismo/ EFN, desenvolvida por Hutz e Nunes (2001). A escolha da EAS-40 deveu-se ao fato de já terem sido observadas associações positivas e significantes entre as medidas da TAS e a EAS-40 (por ex., Pregnolatto, 2005 e Yoshida & Silva, 2006). E quanto à EFN, já demonstrou boas qualidades psicométricas (precisão e validade) com amostras de universitários, mas não havia, até o início desta pesquisa (2003), dados com população clínica. Como ela é o único instrumento validado no Brasil que mede neuroticismo, e, como há evidências na literatura de associação entre alexitimia e neuroticismo decidiu-se por sua inclusão neste estudo, esperando-se, inclusive, fornecer novas evidências sobre seus parâmetros psicométricos.
Método
Participantes
Um grupo caso constituído por 294 pacientes atendidos pelo SUS, de hospital geral de cidade de médio porte do estado de São Paulo, internados para tratamentos diversos. Houve predomínio de mulheres (61,5%), idade média 38,56 (DP=15,01), casadas, com escolaridade média. Tempo de médio de internação 3,13 dias (DP=1,73). Um grupo comparativo composto por 28 acompanhantes com características sócio-demográficas semelhantes às do grupo caso.
Instrumentos
Versão em Português da Escala de Alexitimia de Toronto - TAS de Taylor e cols. (1985) (Yoshida, 2000) - Instrumento de auto-avaliação, de 26 itens, idealizado para medir o grau de alexitimia. Respostas em escala de tipo Likert de cinco pontos variando entre, 1 (discordo inteiramente) e 5 (concordo plenamente). Os escores totais variam entre 26 e 130, sendo que nas pesquisas internacionais, para escores acima de 74 (inclusive) o sujeito é considerado alexitímico e menores de 62 (inclusive), não alexitímico (Taylor e cols., 1988). E para valores entre 63 e 73, nada se pode afirmar. Não existem ainda pontos de corte estabelecidos para a população brasileira.
Na pesquisa com universitários (Yoshida, 2000) foram identificadas as seguintes propriedades: escore médio feminino 63,69 (DP=10,01); masculino 62,08 (DP= 10,19) e amostra total, 63,13 (DP= 10,12); coeficientes Alfa 0,72 (F),0,70 (M) e 0,71(T), precisão teste, reteste de uma semana 0,72. A análise fatorial exploratória indicou quatro fatores, que explicam 39,67% da variância. Quanto às variáveis psicológicas que eles representam, foram as mesmas oferecidas para a escala original (Taylor & cols., 1988). Isto é, o Fator 1 refletiria a habilidade de identificar e descrever sentimentos e distinguir sentimentos de sensações corporais; o Fator 2, o sonhar acordado (daydreaming); o Fator 3, a preferência por focalizar eventos externos em vez de experiências internas e o Fator 4, a habilidade para comunicar os sentimentos a outras pessoas.
Escala de Avaliação de Sintomas - 40 - EAS-40 (Laloni, 2001) - auto-relato de 40 itens que medem sintomas psicopatológicos segundo quatro dimensões: psicotismo (F1), obsessividade-compulsividade (F2), somatização (F3) e ansiedade (F4). A avaliação da intensidade do sintoma é feita segundo três níveis: 0=nenhum, 1= pouco e 2=muito. A EAS-40 revelou ainda boa consistência interna e validade de constructo.
Escala Fatorial de Ajustamento Emocional/Neuroticismo - EFN (Hutz & Nunes, 2001) - Auto-relato, com 82 itens e respostas em Likert de sete pontos, onde 7 corresponde a frase que descreve muito bem as opiniões e sentimentos ou atitudes do sujeito e 1, absolutamente não descreve bem. A EFN corresponde a uma medida de Neuroticismo/ Estabilidade Emocional segundo quatro facetas: vulnerabilidade, desajustamento psicossocial, instabilidade/ansiedade e depressão. Foi desenvolvida com base no modelo de personalidade dos Cinco Grandes Fatores, dos quais o Neuroticismo é uma das dimensões que "identifica indivíduos propensos a sofrimento psicológico, altos níveis de ansiedade, depressão, hostilidade, vulnerabilidade, autocrítica, impulsividade, baixa-auto-estima, idéias irreais, baixa tolerância a frustração e resposta de coping adaptativas" (Costa & Widiger, citado por Nunes, 2000, p.18).
Procedimento
A coleta de dados foi de forma individual e cada participante respondeu à TAS e a apenas mais um dos outros dois instrumentos para evitar queda da motivação e/ou cansaço. Reteste entre 7 e 10 dias com parte da amostra. Para o estudo da validade de grupos comparados foram convidadas pessoas que acompanhavam os pacientes, que tinham no mínimo 18 anos e disponibilidade para colaborar. A pesquisa foi aprovada pelo Comitês de Ética para Pesquisas com Seres Humanos da instituição e a participação, em ambos os grupos, foi voluntária e precedida da assinatura de termo de compromisso livre e esclarecido.
Resultados
A Tabela 1 apresenta as medidas resumo dos escores da TAS, da EAS-40 e da EFN, para a amostra geral e segundo o sexo. Na Tabela 2 encontram-se os resultados da validade de grupos comparados. A Tabela 3 apresenta os resultados da validade de critério por testes existentes.
Discussão
O escore médio da TAS para a amostra geral (72,81,dp=9,15) (Tabela 1), corresponde a um valor ligeiramente abaixo do internacionalmente aceito como ponto de corte para definir a presença de alexitimia, 74. Comparando-se as amostras feminina e masculina, não foram observadas diferenças significantes em relação aos escores totais médios [t(292) = 1,46, p > 0,005], e nem entre os escores médios das dimensões F2, F3 e F4. Apenas em F1 o escore médio foi superior para as mulheres [t (292) = 2,38, p <0,02]. Por se tratarem de pacientes hospitalizados, é possível que os altos escores estejam refletindo uma expressão secundária da alexitimia à situação estressora, que corresponderia a uma reação estado para os efeitos de doenças físicas.
Quanto à EAS-40, a amostra geral (n=167) apresenta escores médios muito próximos aos da amostra feminina, provavelmente devido ao número superior de mulheres (n=116), se comparado ao de homens (n=51). Apesar dos escores masculinos serem consistentemente inferiores, as diferenças não são estatisticamente significantes, tanto no que respeita aos escores totais [t (165)=0,75, p>0,05], quanto parciais (ts entre 0,44 e 1,55). Em outras pesquisas com população do mesmo hospital geral (Laloni, 2001 e Pregnolatto, 2005) este padrão também foi encontrado. Isto é, do ponto de vista dos sintomas psicopatológicos não há diferenças entre homens e mulheres.
Quanto à EFN, os escores médios da amostra geral (n=127) também foram afetados pelo desequilíbrio da amostra em relação ao sexo, ficando nos quatro domínios mais próximos dos da amostra feminina (n=84). Quando se compara os escores médios de homens e mulheres, para N1 (vulnerabilidade) e N3 (ansiedade) as diferenças foram significantes (p<0,01). E nos domínios N2 (desajustamento psicossocial) [t (125) = 1,71] e N4 (depressão)[t(125) = 0,59], as diferenças não foram significantes. Considerando que a dimensão vulnerabilidade (N1) avalia "medo de críticas, insegurança, dependência às pessoas mais próximas, baixa autoestima, dificuldade em tomar decisões, etc (Hutz & Nunes, 2001, p. 21), e que, a dimensão ansiedade (N3) "agrupa itens que descrevem sintomas somáticos de transtornos relacionados com ansiedade, irritabilidade, transtornos do sono, impulsividade, sintomas de pânico e mudanças de humor, etc." (p.21), cogita-se haver maior sensibilidade da mulher à condição de doente e à situação de hospitalização. Quanto aos domínios N2 (desajustamento psicossocial) e N4 (depressão) teriam sido, igualmente, afetados pela condição de hospitalização, independentemente do sexo do paciente.
Obteve-se coeficientes estatisticamente significantes entre os escores Totais da TAS com os quatro domínios da EFN (Tabela 2). Da mesma forma, entre o F1 da TAS e os quatro domínios da EFN. Quanto ao F2 da TAS, correlacionou-se de forma moderada mas significante com N2 (-0,18), o F3 com N3 (0,20) e N4 (0,34) e o F4 com o N2 da EFN (0,20). Apesar da amostra ter em média nível de escolaridade inferior ao da utilizada para a construção do instrumento, formada por universitários (Hutz & Nunes,2001), os resultados indicam que as escalas guardam entre si margem significante de covariância. Uma versão reduzida da EFN deveria de toda forma ser buscada para facilitar o uso em contextos como o hospitalar, em que a disponibilidade de tempo dos profissionais costuma ser exígua.
Quanto às correlações entre a TAS e a EAS-40 (Tabela 2), foram mais modestas dos que as com a EFN, porém significantes no que concerne aos escores totais das duas escalas e o escore total e F1 da TAS e as dimensões, psicoticismo (F1), obsessividade-compulsividade (F2) e somatização (F3) da EAS-40. Apenas com o F4 (ansiedade) da EAS-40 , as associações da TAS total e F1 não foram significantes. Em relação às dimensões F2 , F3 e F4 da TAS, os coeficientes não foram significantes em nenhum dos casos. Pode-se dizer portanto que a TAS e a EAS-40 medem, no geral, constructos que mantêm entre si bom nível de associação, mas se tomadas isoladamente, apenas a F1 da TAS pode ser prevista pela severidade dos sintomas psicopatológicos.
Em relação à validade de grupos comparados, não foram verificadas diferenças entre os dois grupos. E isto, provavelmente, devido ao fato do processamento cognitivo e expressão das emoções serem habilidades fortemente influenciadas por valores culturais, que no caso de familiares são amplamente compartilhados.
Referências
Derogatis, L. R. (1994). Symptom Checklist-90-R (SCL-90-R) Administration, Scoring, and Procedures Manual (3ª ed.). Mineapolis: National Computer Systems. USA.
Hutz, C. S., & Nunes, C. H. S. S. (2001). Escala Fatorial de Ajustamento Emocional/Neuroticismo. São Paulo: Casa do Psicólogo.
Laloni, D. T. (2001). Escala de Avaliação de Sintomas-90-R SCL-90-R: adaptação, precisão e validade.Tese de Doutorado não publicada, Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Campinas, SP.
Nunes, C. H. S. S. (2000). A construção de um instrumento de medida para o fator neuroticismo/estabilidade emocional dentro do Modelo de Personalidade dos Cinco Grandes Fatores. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul., Porto Alegre, RS ( disponível para downloading no site www.psicologia.ufrgs.br/laboratório/).
Pregnolatto, A. P. F. (2005). Alexitimia e sintomas psicopatológicos em pacientes submetidos a hemodiálise. Dissertação de Mestrado não publicada, Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Campinas, SP.
Taylor,G. J., Bagby, R. M., Ryan, D. P., Parker, J. D., Doody, K. F., & Keefe, P. (1988). Criterion validity of the Toronto Alexithymia Scale. Psychosomatic Medicine, 50, 500-509.
Taylor, G. J., Ryan, D., & Bagby, R. M. (1985). Toward the development of a new self-report alexithymia scale. Psychotherapy and Psychosomatics, 44, 191-199.
Yoshida, E.M.P. (2000). Toronto Alexthymia Scale -TAS: precisão e validade da versão em português. Psicologia:Teoria e Prática, 2 (1), 59-74.
Yoshida, E.M.P., & Silva, F.R.C. S. (2006). Escala de Avaliação de Sintomas-40 (EAS-40): validade e precisão em amostra não clínica.(manuscrito submetido).
Endereço para correspondência
Av. Francisco de Assis Dinis, 227. Parque dos Príncipes
06030-380, Osasco, SP
Tel.: (11) 3684-1497
E-mail: eyoshida.tln@terra.com.br
A pesquisadora agradece às bolsistas de Iniciação Científica, Aline Mara Ferreira Rosa (FAPESP), Fabrícia Medeiros Sanches (CNPq) e Fernanda Robert de Carvalho Santos Silva (CNPq), pela inestimável colaboração na coleta e tabulação dos dados. Agradece ainda às agências FAPESP e CNPq pela concessão das bolsas.