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Ciências & Cognição

versão On-line ISSN 1806-5821

Ciênc. cogn. vol.9  Rio de Janeiro nov. 2006

 

Artigo Científico

 

Resposta de alunos de ciências biológicas à apresentação de uma ilusão visual

 

The response of biological sciences undergraduate students to the presentation of a visual illusion

 

 

Alline Mayumi Tokumoto; Alfredo Pereira Jr.

Instituto de Biociências, Universidade do Estado de São Paulo (UNESP), São Paulo, São Paulo, Brasil

 

 


Resumo

Inicialmente realizamos uma revisão bibliográfica de resultados recentes, na Neurociência Cognitiva, a respeito dos correlatos neurais das ilusões visuais. A partir desta revisão, realizamos uma pesquisa a respeito de processos cognitivos relacionados à percepção de uma ilusão visual. Apresentamos a ilusão visual Two-Stroke Flash (Mather, 2006) para alunos de duas turmas de graduação em Ciências Biológicas da UNESP/Campus de Botucatu (modalidades Licenciatura e Biomédica), e solicitamos uma descrição por escrito de suas experiências visuais, tendo em vista: a) detectar se os alunos perceberam o movimento ilusório, o que se correlacionaria com uma atividade cerebral nas áreas visuais posteriores; b) detectar se os alunos perceberam que o mesmo se tratava de uma ilusão, o que se correlacionaria com uma atividade cerebral nas áreas frontais; e c) comparar as respostas das duas turmas, tendo em vista as diferentes orientações curriculares. Os resultados obtidos indicam que a maioria dos alunos das duas turmas percebeu o movimento, havendo maior tendência à explicação do mesmo como ilusório por parte dos alunos da modalidade médica. © Ciências & Cognição 2006; Vol. 09: xxx-xxx.

Palavras-Chave: ilusão visual; neurociência cognitiva; correlatos neurais; córtex visual; sistema executivo; ciências biológicas.


Abstract

Initially we make a bibliographic review of recent results in Cognitive Neuroscience regarding the neural correlates of visual illusions. Based on this review, we made a research on cognitive processes related to the perception of a visual illusion. We presented the visual illusion Two-Stroke Flash (Mather, 2006) for two groups of undergraduate students in Biological Sciences of the UNESP/Campus of Botucatu city (Licenciature and Biomedicine modalities), and requested a written description of their visual experiences, having the objectives: a) to detect if they perceived the illusory movement (this perception would be correlated with a cerebral activity in the posterior visual areas); b) to detect if they perceived that the same was an illusion (this cognitive process would correlate with cerebral activity in frontal areas); and c) to compare the answers of the two groups, in view of the different curricular orientations. The results obtained in this research indicate that the majority of the students in the two groups perceived the illusory movement, having a tendency for the explanation of the percept as illusory by the students of the medical modality. © Ciências & Cognição 2006; Vol. 09: xxx-xxx.

Keywords: visual illusion; cognitive neuroscience; neural correlates; visual cortex; executive system; biological sciences.


 

 

Introdução

A percepção é uma construção ativa de um estado cerebral relacionado a elementos relevantes do ambiente. No caso de estímulos visuais complexos, ambigüidades perceptivas podem surgir, dando origem às chamadas ilusões visuais. Tais ilusões são ferramentas úteis para se entender o funcionamento do cérebro, uma vez que a característica ilusória é uma construção do cérebro. Esta é induzida pelo estímulo, porém o cérebro acrescenta aspectos não presentes no mesmo. Importantes estudos tem sido realizados para se descobrir os tipos de atividade cortical que dão suporte à percepção consciente de características não presentes nos estímulos, como ilustrado na revisão bibliográfica que fazemos na próxima seção.

Ao lado das ilusões clássicas estudadas pelos psicólogos Gestaltistas, novas ilusões têm sido propostas recentemente, utilizando modernos recursos de computação gráfica com animação. A qualidade de tais ilusões, para sua utilização em estudos de neurociência cognitiva, depende principalmente da facilidade com que a característica ilusória é espontaneamente percebida. Animações que requerem treinamento ou instruções explícitas para que sejam percebidas podem ser inadequadas para estudos cognitivos, uma vez que tais preparações podem viciar os resultados.

Uma característica adicional desejável, para determinados tipos de estudos cognitivos, é que, além de propiciar a experiência ilusória, as animações ainda possibilitem que os sujeitos possam por si mesmos descobrir que tal percepção é ilusória. Por meio deste procedimento, podemos estudar processos cognitivos relacionados à interpretação das percepções por parte do sujeito.

Nesse sentido, investigamos a resposta de alunos de graduação em Ciências Biológicas a uma ilusão visual, com o intuito de saber em que medida os alunos, espontaneamente, descobrem que se trata de uma ilusão. Para isso, utilizamos a ilusão Two-Stroke Flash, de autoria de George Mather (Sussex University, Inglaterra), que obteve o segundo lugar no concurso "Melhor Ilusão Visual de 2005" (http://illusioncontest.neuralcorrelate.com/index).

A pesquisa contou com a participação de alunos dos cursos de Ciências Biológicas do Instituto de Biociências da UNESP, Campus de Botucatu, Distrito de Rubião Júnior. Os cursos são oferecidos em três modalidades: Licenciatura, Bacharelado e a Modalidade Médica (Biomedicina), sendo que nesta pesquisa houve a participação de alunos das modalidades Licenciatura e Biomedicina.

 

Revisão bibliográfica

As Figuras de Kanizsa (Figura 1) têm sido largamente utilizadas em estudos sobre a percepção de contorno ilusório. Brighina e colaboradores (2003) empregaram essas figuras para investigar o papel do córtex occipital na percepção do contorno ilusório, e a existência de lateralização para essa atividade visual. Desse modo, a estimulação magnética transcranial (rTMS) foi aplicada para induzir uma inibição transitória na atividade do córtex e, assim, estabelecer as regiões necessárias para formação do contorno ilusório. Neste estudo, os sujeitos realizaram os testes de percepção, devendo escolher entre as figuras com contornos reais e ilusórios, pressionando os botões correspondentes, em duas condições: sem aplicação de rTMS e após aplicação de rTMS. Observou-se que a estimulação (rTMS) no córtex extra-estriado direito aumentou significativamente o tempo de resposta para a percepção de contorno ilusório, mas não para o contorno real, corroborando o importante papel dessa área na percepção de contorno ilusório.

 

Figura 1

Figura 1 - Contornos ilusórios de Kanizsa

 

Variações das figuras de Kanizsa foram também utilizadas na avaliação de tecnologias empregadas para se medir a atividade cerebral. Kruggel e colaboradores (2001), a fim de demonstrar a viabilidade da condução combinada de Eletroencefalograma (EEG) e Imageamento por Ressonância Magnética Funcional (fRMI) empregaram um teste cognitivo, cujas respostas às tecnologias mencionadas utilizando essas figuras eram bem conhecidas. Quatro variações de figuras de Kanizsa foram apresentadas aos sujeitos, mas apenas uma era o estímulo-alvo, e ao detectá-lo, o sujeito deveria pressionar um botão específico. Os resultados mostraram estar de acordo com estudos anteriores de EEG e fMRI, realizados separadamente, revelando uma ativação seqüencial do córtex occipital estriado e extra-estriado ao longo da via ventral de processamento do objeto. Além disso, as figuras ativaram a área Temporal Média (MT) enquanto o estímulo-alvo ativou as áreas frontal e parietal.

Nas ilusões de mascaramento visual, conteúdos perceptivos se tornam "invisíveis" pela modificação do contexto em que são apresentados. Macknik e Haglund (1999), utilizaram esse tipo de ilusão em que uma barra que piscava (alvo) se tornava invisível pela presença de outras duas barras que piscavam na fase contrária (chamadas de "máscaras"), nos dois lados do alvo. O objetivo do trabalho foi investigar se a atividade no sistema visual primário está mais relacionada ao estímulo físico ou à geração do percepto (isto é, do conteúdo consciente). Por meio de imagens de anatomia funcional de regiões de V1, observou-se que o alvo e as máscaras, quando apresentadas separadamente, produziram atividades correspondentes no córtex. Porém, durante a condução da ilusão, os sinais ópticos gerados pelo alvo desapareceram, permanecendo, apenas, os das máscaras, o que indicaria que neurônios de V1 participam da construção do próprio percepto.

Tse e colaboradores (2005), utilizaram uma ilusão de mascaramento conhecido como Standing Wave (Figura 2) para investigar o papel de áreas específicas dentro do lobo occipital humano na manutenção da consciência. Assim, regiões retinotópicas do lobo occipital de cada sujeito foram mapeadas usando-se fMRI e em seguida, as ilusões foram apresentadas e as respostas em cada área retinotópica mapeada foram medidas. Os resultados mostraram que nessa hierarquia visual o limite inferior encontra-se após a área V2 e o limite superior está restrito ao lobo occipital. Ou seja, o estudo indicou que áreas visuais posteriores a V2, mas dentro do lobo occipital, são suficientes para manter a consciência de alvos simples.

 

Figura 2 - Mascaramento visual conhecido como Standing Wave: o segundo fotograma, da esquerda para a direita (que é o negativo das "máscaras" - o primeiro e o terceiro fotogramas), é visível quando apresentado isoladamente, mas fica invisível ao ser apresentado em seqüência com seus vizinhos.

 

Ao contrário da ilusão de mascaramento, em que um percepto se torna invisível, há um tipo de ilusão (Concentric Rings) de movimento aparente cuja característica é que o observador percebe o estímulo atravessando um espaço visual vazio entre os dois estímulos apresentados. Isso significa que, de alguma forma, a trajetória do movimento aparente é completada ("filling-in") subjetivamente. Liu e colaboradores (2004), empregaram essa ilusão para testar (via fMRI) modelos neurais que explicariam esse fenômeno, sendo que um deles propõe um correlato cortical nas áreas sensoriais primárias e o outro, nas áreas associativas (em particular, na área MT+).

Imagens de anéis concêntricos que provocavam percepção de movimento aparente, "flicker" (os mesmos anéis apresentados simultaneamente) ou movimento real, foram apresentadas aos participantes. Os resultados demonstraram que MT+ é a primeira área na hierarquia cortical visual em que ocorre o filling-in visual para a via do movimento aparente, sustentando o modelo do lócus cortical posterior. Além disso, observou-se também uma sobreposição de regiões corticais de MT+ e complexo occipital lateral, fornecendo uma evidência para interação entre vias de processamento de forma e de movimento, o que resultaria na sustentação do objeto percebido continuamente durante o movimento aparente.

Um recente estudo conduzido por Muckli e colaboradores (2005), usando estímulos que sugerem movimento aparente, encontrou resultados complementares. Utilizando fMRI, eles investigaram atividades relacionadas ao movimento aparente em regiões de V1. Confirmou-se que a atividade estava relacionada à percepção consciente do movimento e sugeriu-se que a ativação de V1 poderia ser explicada por interações em seu interior ou por mecanismos de retroalimentação de áreas visuais superiores, o que indicaria o envolvimento do córtex visual primário nas representações da trajetória de movimento aparente.

O movimento aparente acima mencionado pode ser percebido quando dois estímulos visuais separados espacialmente são apresentados sucessivamente. Porém, imagens estáticas também podem induzir percepção de movimento, pela relação de contraste de luminosidade entre elementos estáticos, como no caso da figura ilusória conhecida como Rotating Snakes (Conway et al., 2005; vide Figura 3). Essa figura é composta por uma série repetida de elementos que produzem uma percepção transitória de movimento quando se move o olho ou com o piscar. A direção percebida na versão em escala de cinza é preto - cinza escuro - branco - cinza claro.

 

Figura 3 - Rotating Snakes: indução de uma ilusão de movimento.

 

A explicação proposta em estudos anteriores está relacionada aos pares branco/cinza claro ou preto/cinza escuro, os quais geram sinais de movimento do elemento de maior contraste em direção ao de menor contraste. Conway e colaboradores (2005), sugeriram que os pares cinza escuro/branco e cinza claro/preto também poderiam gerar sinais que contribuiriam com a ilusão. Os dados foram coletados por meio de monitoramento da posição dos olhos e gravação das respostas de unidade celulares (single cell) em macacos, durante a apresentação dos estímulos. Os quatro pares de elementos adjacentes, quando apresentados sozinhos, produziram movimento ilusório de acordo com a figura original. Os resultados indicaram que as diferenças de tempo entre as respostas para diferentes elementos de contraste podem explicar o movimento ilusório percebido e fornecem evidências de que esses sinais de direção surgem em neurônios seletivos à direção em V1.

Outras imagens estáticas podem gerar mudanças na percepção sem indicar movimento. Estímulos visuais biestáveis são aqueles que podem ser percebidos de duas formas diferentes, transitando de uma para a outra sem que ocorram mudanças na figura. Ou seja, a consciência visual muda enquanto o estímulo sensorial continua o mesmo. O cubo de Necker (Figura 4) é uma figura ilusória biestável. Nakatani e Leeuwen (2006), estudaram a sincronização de fase do EEG em relação à mudança perceptual no cubo de Necker. Foram gravadas EEG das áreas frontal e parietal, enfocando a sincronização da fase de banda gama entre elas. Anterior à resposta de mudança, períodos transitórios característicos de sincronização apareceram na banda gama entre as áreas parietal e frontal. Os participantes foram instruídos a pressionarem um botão correspondente à direção da mudança percebida. Os resultados indicam que os processos de mudanças perceptivas envolvem as áreas frontal e parietal. De acordo com autor, os eventos neurais que levam à mudança na percepção são compostos por vários processos que poderiam se identificados como sincronização transitória da banda gama, que são pares que ocorrem num padrão espaço-temporal, antes da resposta de mudança.

 

Figura 4 - O Cubo de Necker, uma ilusão ótica publicada em 1832, por Louis Albert Necker.

 

Um outro tipo de estímulo visual biestável é o chamado Spinning Wheel, que gera uma percepção de movimento aparente percebido apenas como mudança na direção (Figura 5). Sterzer e colaboradores (2002), utilizaram esta ilusão para investigar se as mudanças perceptivas ativariam áreas conhecidas como complexo do movimento humano (hMT+/V5) e observaram respostas relacionadas à mudança num sistema frontoparietal. Os indivíduos foram instruídos a indicar mudança direcional pressionando um botão. Usando fMRI, as ativações que ocorreram durante a reversão espontânea da direção percebida de movimento foram analisadas. Os resultados mostraram ativações em várias áreas parietais e frontais, hMT/V5 e sulco occipital lateral, mas não em áreas da via ventral do processamento visual cortical.

 

Figura 5 - A apresentação dos quatro fotogramas à esquerda conduz à percepção ilusório de movimento apresentado à direita (Spinning Wheel).

 

Metodologia

Participaram da pesquisa alunos do 4o ano de Licenciatura em Ciências Biológicas, e alunos do 2o ano de Ciências Biológicas Modalidade Médica, sendo coletadas 25 respostas dos primeiros e 22 respostas dos segundos. Os testes foram aplicados no Instituto de Biociências, durante o horário de aula das turmas. A participação dos alunos foi voluntária e as respostas foram anônimas. Antes da apresentação da ilusão visual, foi esclarecido aos alunos que se tratava de uma pesquisa sobre percepção, sem menção de que o tema da pesquisa seria a ilusão visual, sendo solicitado aos alunos que descrevessem com detalhes a sua experiência perceptiva frente ao estímulo a ser apresentado.

A ilusão utilizada no estudo foi Two-Stroke Flash, de autoria de George Mather da Universidade de Sussex (Inglaterra), obtida online no site http://illusioncontest.neuralcorrelate.com/index. A apresentação durou cerca de 5 minutos, sendo utilizado um projetor multimídia e redução da iluminação do recinto, possibilitando aos alunos redigir a resposta enquanto visualizavam a animação. Os dois pesquisadores percorreram o recinto para verificar se a animação apresentada propiciava uma visualização adequada à distância, e em variados ângulos.

A animação apresentada é construída a partir da imagem mostrada na figura 6. Há, na mesma, dois círculos formados de pequenos retângulos, com um ponto de fixação ao centro. A animação é construída a partir desta figura, pela formação de seqüências de imagens estáticas (que chamaremos, por conveniência, de "fotogramas"), da seguinte maneira (para uma explicação mais detalhada, vide Mather, 2006). O primeiro fotograma corresponde à imagem acima apresentada na Fig. 6. No segundo fotograma, os retângulos que compõem o círculo maior são ligeiramente deslocados no sentido anti-horário, enquanto os retângulos que compõem o círculo menor são deslocados no sentido horário. O terceiro fotograma é uma imagem em branco, de alta luminosidade (o flash referido no nome da animação).

A intercalação do terceiro fotograma é essencial para se gerar a ilusão de movimento rotatório dos círculos, o que ocorre quando o olhar é fixado no ponto central, ou mesmo quando se enfoca a figura como um todo, sem a fixação naquele ponto.

 

Figura 6 - Ilustração da ilusão visual Two-Stroke Flash.

 

É importante ressaltar que esta animação ainda possibilita ao observador a descoberta de que o movimento giratório percebido se trata de uma ilusão. Esta descoberta é possível por meio da fixação do olhar em um único retângulo (que pode ser tanto do círculo maior como do menor), quando se percebe que o mesmo está simplesmente oscilando lateralmente e retornando à posição anterior.

Após todos os alunos terminarem a redação das respostas, as mesmas foram recolhidas e analisadas conforme as categorias: a) alunos que descreveram o movimento mas não o identificam como sendo ilusório; b) alunos que descreveram o movimento e o identificaram como sendo ilusório; c) alunos que descreveram imagens estáticas (pontos, retângulos, círculos); e d) alunos que fizeram analogias com objetos relacionados a movimentos circulares (moinho, espremedor de laranja)

 

Resultados

Agrupamos os resultados obtidos em quatro categorias:

A) Alunos que descreveram o movimento, mas não o identificaram como ilusório.
B) Alunos que descreveram o movimento e o identificaram como ilusório.
C) Alunos que descreveram imagens estáticas (pontos, retângulos, círculos).
D) Alunos que fizeram analogias com objetos relacionados a movimentos circulares (moinho, espremedor de laranja).

Os resultados obtidos encontram-se na tabela 1.

 

Curso

Categoria

Biologia

(Total de 25 respostas)

Biomedicina

(Total de 22 respostas)

A)

12

9

B)

9

13

C)

2

0

D)

2

0

Tabela 1 - Número de Respostas por Categoria

 

Os resultados acima foram analisados em termos da freqüência de cada categoria por curso (Figuras 7 e 8), o que possibilitou a comparação entre as respostas dos alunos dos dois cursos, o que fazemos na próxima seção..

 

Figura 7 - Distribuição das respostas dos alunos de biologia.

 

Figura 8 - Distribuição das respostas dos alunos de biomedicina.

 

Discussão

Os resultados obtidos indicam que a ilusão Two-Stroke Flash possibilita uma fácil visualização do movimento ilusório, ao mesmo tempo em que possibilita ao observador identificar tal movimento como sendo ilusório.

Com base na revisão bibliográfica realizada, podemos conjeturar que a ilusão é produzida pela atividade do córtex visual, modulado por mecanismos atencionais, enquanto a interpretação desta percepção como sendo ilusória envolve processos cognitivos suportados pelo sistema executivo (composto pelo cortex frontal e suas ligações com o sistema límbico; vide Liu et al., 2004; Sterzer et al., 2002).

Nesta segunda operação cognitiva, os hábitos dos diferentes grupos sociais se manifestam, como se pode observar nas diferenças encontradas nas respostas dos alunos na categoria "b" (alunos que descreveram o movimento e o identificaram como sendo ilusório). Nesta categoria, há uma diferença significativa entre os dois grupos de alunos, com a presença de 59% dos alunos da Modalidade Médica e 36% de alunos da Licenciatura.

Esta diferença sugere que os alunos da Licenciatura, seguindo uma tradição da Biologia, estão mais habituados à descrição dos fenômenos percebidos, sem vincular necessariamente tal descrição a uma explicação destes fenômenos, ao passo que os alunos da Modalidade Médica, possivelmente pela interação com os hábitos cognitivos dos profissionais da área médica, já mostram uma maior preocupação com a explicação dos fatores geradores do fenômeno.

Esta diferença cognitiva, se verdadeira, corresponde à própria evolução histórica das ciências biológicas, que se desenvolveram, a partir do Renascimento, como ciências descritivas, tomando-se aqui como exemplo os "Historiadores da Natureza" que percorriam o planeta na busca de novas espécies a serem descritas e classificadas. A partir da teoria evolucionista e da teoria genética as ciências biológicas se tornaram, desde o início do Século XX, também ciências explicativas, vindo a se tornar também ciências aplicadas, a partir do desenvolvimento da biotecnologia nas últimas décadas.

Os resultados obtidos nos permitem concluir que, a partir do uso de animações com características semelhantes àquela por nós utilizada, podemos estudar não só o funcionamento dos sistemas perceptuais, como também processos cognitivos que seriam, em parte, moldados pelos hábitos culturais dos grupos humanos.

 

Agradecimentos

Ao CNPq (Alfredo P. Jr.)

 

Referências Bibliográficas

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Notas

A.M. Tokumoto
Endereço para correspondência: Instituto de Biociências, UNESP, CEP 18618-000, Botucatu, SP.
E-mail para correspondência: allinetoko@hotmail.com

A. Pereira Jr.
E-mail para correspondência: apj@ibb.unesp.br