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Ciências & Cognição

versão On-line ISSN 1806-5821

Ciênc. cogn. vol.17 no.2 Rio de Janeiro set. 2012

 

Estudo de Caso

 

O uso da exposição "Ciência Massa" como atividade não formal para a formação de professores licenciandos em Ciências da Natureza

 

The use of the exhibition "Ciência Massa" as a non-formal activity for Natural Sciences undergraduate teacher training

 

 

Felipe Damasio; Olivier Allain; Geison João Euzébio

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina, Florianópolis, Santa Catarina, Brasil

 

 


Resumo

Neste trabalho está descrito o projeto realizado durante dois anos junto a uma turma ingressante em Licenciatura em Ciência da Natureza com habilitação em Física do Instituto Federal de Santa Catarina (IF-SC), campus Araranguá. O tema gerador adotado foi a Astronomia, em comemoração ao seu ano internacional ocorrido em 2009 e o projeto recebeu recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Todas as atividades foram planejadas para serem desenvolvidas em forma de atividades de extensão em ambientes não formais de ensino (comunidades, museus, ambientes abertos, pontos turísticos), elaboradas e realizadas pelos licenciandos durante quatro semestres. O projeto inicialmente contou com atividades de ensino para os alunos da Licenciatura que se seguiu ao planejamento e realização das atividades de extensão. A avaliação do projeto usou os dados alcançados pela realização das atividades e também se deu por meio da análise de um grupo focal realizado com os licenciandos participantes do projeto. © Cien. Cogn. 2012; Vol. 17 (2): 185-205.

Palavras-chave: formação de professores; ciências da natureza; ensino não formal; extensão.


Abstract

In this work we describe the project carried out for two years with a group of science teaching undergraduate students, at Federal Institute of Santa Catarina (IF-SC), Campus Araranguá. The theme chosen as a base to the project was astronomy, since 2009 was the International Year of Astronomy. The project received funds from Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). All activities were planned to be developed in the form of extension activities in non-formal education (communities, museums, outdoors, sights), developed and performed by undergraduates for four semesters. The project initially relied on teaching activities for the science teaching students. The further step was the planning and implementation of extension activities. The project assessment used data obtained by carrying out the activities and also occurred through the analysis of a focus group conducted with the undergraduates students that took part of the project. © Cien. Cogn. 2012; Vol. 17 (2): 185-205.

Keywords: astronomy; science teaching; teacher education; non formal education.


 

 

Introdução

No Projeto Pedagógico do Curso da Licenciatura em Ciências da Natureza com habilitação em Física do campus Araranguá do Instituto Federal de Educação, Ciência de Tecnologia de Santa Catarina (IF-SC) está definido que:

"O curso de Licenciatura em Ciências da Natureza com habilitação em Física tem a finalidade de formar profissionais com ampla e sólida base teórico-metodológica para a docência na área de Ciências da Natureza e de Física no Ensino Fundamental, no Ensino Médio e na Educação Profissional de nível médio, assim como em espaços não formais, visando atender às necessidades sócio-educacionais em consonância com os preceitos legais e profissionais em vigor, com participação ativa no desenvolvimento de processos pedagógicos, principalmente relacionados com o conhecimento das ciências da natureza e da física."

Estes espaços não formais constituem uma oportunidade de se estabelecer um meio de divulgação científica, ao mostrar aos alunos da Educação Básica e ao público em geral temas de Ciências da Natureza, abordando atividades e conteúdos as quais poderiam não ter acesso de outra forma.

Em especial, acreditamos que a Astronomia pode desempenhar este papel de divulgação, por se tratar de um tema que julgamos com grande potencial mobilizador e que promove encantamento e fascínio, não só em jovens como também para o público de todas as idades. Partimos da premissa que uma vez o público em geral mobilizado e já envolvido com temas científicos apresentados em Astronomia, o interesse por aprender outros temas das Ciências da Natureza é despertado.

Foi em conformidade com estes dois preceitos: o de formar professores capazes de lecionar em ambientes não-formais e professores divulgadores de ciência que o projeto relatado neste artigo foi planejado e realizado. Nele, a primeira turma que ingressou no curso, em 2009/1, teve contato com diversos cursos e oficinas para tratar de temas envolvendo Astronomia e ciências afins. Também tiveram contato com equipamentos que poderiam auxiliar em atividades de divulgação científica em ambientes não formais, tais como telescópios, equipamento multimídia e softwares de ensino. Estas atividades de ensino foram desenvolvidas durante um semestre no câmpus Araranguá do IF-SC.

Nos três semestres seguintes, estes alunos que participaram destas atividades de ensino, em número de doze, organizaram e realizaram uma exposição itinerante que foi montada em comunidades, museus, pontos turísticos e no pátio do câmpus do IF-SC. O objetivo desta atividade era formar professores com contato em ambientes não formais como divulgadores científicos e com a oportunidade de tratar de temas durante quatro semestres ligados à Astronomia, o que não ocorreria se o projeto não existisse.

A avaliação do projeto foi feita no semestre seguinte ao do término do projeto. Esta ocorreu com uma atividade de grupo focal mediada pelo professor orientador do projeto com onze alunos participantes.

O desenvolvimento de atividades de ensino de ciências em ambientes não formais tem sido relatado nos periódicos de ensino de ciências, bem como o ensino de Astronomia e a formação de professores, que são os três focos de interesse deste projeto. No entanto, em nenhum deles foi possível identificar estas três atividades interligadas, e é neste sentido que este projeto visa contribuir para outras iniciativas de formadores de professores.

 

Fundamentação teórica

De acordo com Moreira (1999) pode-se considerar que há três filosofias, ou sistemas de valores, subjacentes às teorias de aprendizagens: comportamentalismo, humanismo e cognitivismo. O comportamentalismo tem seu enfoque nos comportamentos observáveis e mensuráveis. Em outras palavras, na resposta do indivíduo ao receber determinados estímulos. Conforme essa visão, basta fornecer os estímulos adequados para obter a resposta desejada do indivíduo, não existindo preocupação com o processo mental entre o estímulo e a resposta (Oliveira, 1973). Entre as principais referências desta postura, pode-se citar B.F. Skinner.

No humanismo, o importante é a autorrealização da pessoa para atingir o crescimento pessoal. O aluno não é visto apenas a partir de seu intelecto, mas como um todo, a incluir sentimentos, pensamentos e ações. Nesta filosofia, a aprendizagem não é vista somente como o aumento de conhecimento, mas sim como algo capaz de influenciar nas escolhas e nas atitudes de quem aprende. Entre as maiores referências do humanismo estão Carl Rogers e Paulo Freire.

Por cognitivismo, entende-se a postura filosófica com enfoque no ato de conhecer, no processo intermediário entre o estímulo e a resposta, nas cognições. No cognitivismo, o interesse maior está nos processos mentais por meio dos quais se efetiva a distribuição de significados, a compreensão, transformação, armazenamento e uso das novas informações. O mais difundido autor cognitivista é Jean Piaget. A Figura 1 traz um mapa conceitual publicado por Pacheco e Damasio (2009) sobre as diferentes teorias de aprendizagem.

 

Figura 1

Figura 1 - Teorias de Aprendizagem (Pacheco e Damásio, 2009).

 

O projeto relatado neste artigo foi orientado pelo cognitivismo, principalmente o de Bruner e Vygotsky.

Toda atividade cognitiva humana envolve categorias (Lefrançois, 2008). Apesar de Bruner usar o termo categoria como sinônimo de conceito, hoje se sabe que o conceito é a representação mental de uma categoria, que nada mais é que um conjunto de elementos abarcados pelo conceito. A categorização está ligada à similaridade: objetos tendem a serem colocados na mesma categoria com base na semelhança entre eles. De acordo com Bruner, categorizar é tornar equivalentes coisas diferentes. Então um conceito consiste em representar mentalmente equivalências em coisas diferentes.

Um conceito é definido como uma espécie de regra (ou uma série delas) para classificar coisas como se fossem iguais. Um modo simples de definir conceitos é usar substantivo ou verbos. A abstração está envolvidaem todos os modelos de categorização.

Os objetos devem ter algumas características antes de serem classificados de determinada maneira, chamadas de atributos. São propriedades que não estão presentes em todos os outros objetos. Os atributos que definem um objeto são chamados de atributos criteriais; os que não o fazem são os irrelevantes. As categorias definem a natureza da similaridade necessária para entrar nelas. Toda informação é processada por meio de um ato de categorização.

A Figura 2 traz um mapa conceitual que mostra o cognitivismo de Jerome Seymour Bruner, segundo os autores deste artigo.

 

Figura 2

Figura 2 - Mapa conceitual sobre o cognitivismo de Bruner.

 

No nosso projeto, procurou-se usar estratégias que pudessem promover nos licenciandos a percepção dos atributos criteriais das categorias envolvidas no estudo da Astronomia. Pois é a partir delas que os conceitos são representados e, se tivessem claros os atributos criteriais de cada categoria, teriam condições de formar os conceitos com maior significado.

Piaget e Vygotsky sugerem que a escola deveria se esforçar para oferecer aos estudantes tarefas e desafios de dificuldades ótimas (Lefrançois, 2008). Não pode ser difícil a ponto de não ser compreendido nem tão fácil a ponto de que não resulte em nova aprendizagem. Os professores precisam conhecer as limitações dos alunos quanto ao potencial de pensamento.

A interação social tem um importante papel tanto para Piaget como para Vygotsky. Por meio dela as crianças se tornam conscientes dos sentimentos e pensamentos alheios, desenvolvem regras e seu próprio pensamento lógico. Uma diferença notória entre a teoria de Piaget e a de Vygotsky é que a primeira dá um papel principal para os fatores internos. Vygotsky, por sua vez, dá aos fatores externos (importância da cultura, papel da linguagem e a relação entre o quem ensina e quem aprende) este papel fundamental. A interação social não se dá por meio de qualquer discussão. Ela deve ser assimétrica, deve participar dela pelo menos um parceiro mais capaz que orienta o outro. Os licenciandos tiveram um semestre só de atividades de ensino para poderem desempenhar este papel de parceiro mais capaz.

O papel da cultura na teoria de Vygotsky pode ser resumida na interação social como sendo fundamental no desenvolvimento da cognição. Ele estabelece a distinção entre as funções mentais elementares e superiores. As elementares são nossas tendências e comportamentos naturais não aprendidos (sugar, chorar, por exemplo). Durante o desenvolvimento do indivíduo, e principalmente por meio da interação social (cultural), as funções mentais elementares se transformam nas superiores. Por funções mentais superiores, entende-se as atividades que caracterizam o que consideramos como pensamento (resolução de problemas e a imaginação).

O pensamento se torna possível pela linguagem. O desenvolvimento cognitivo está ligado à interação verbal que ocorre no processo. A relação professor-aluno envolve ensinar e aprender para ambas as partes: o professor aprende com o aluno e sobre ele da mesma forma que o aluno aprende pela ação do professor.

Para Vygotsky, o desenvolvimento cognitivo é a conversão das relações sociais em funções mentais e ocorre por meio da mediação. A interação social que provoca a aprendizagem deve estar dentro da região em que as funções ainda não amadureceram, mas estão no processo de maturação. Esta região entre o desenvolvimento real do indivíduo e o seu nível potencial é chamada de Zona de Desenvolvimento Proximal. O bom ensino é aquele que está à frente do desenvolvimento cognitivo e o dirige. A aprendizagem orientada para níveis de desenvolvimento já alcançados não é, portanto, efetiva (Moreira, 1999).

Não é preciso esperar que determinada estrutura mental se forme para que a aprendizagem ocorra, pelo contrário, é o ensino deste conceito que desencadeia a formação da estrutura mental necessária para aprender o conceito. Porém, não se pode ultrapassar a capacidade cerebral do indivíduo, o limite da Zona de Desenvolvimento Proximal. Mesmo que o novo conteúdo esteja dentro do limite da Zona de Desenvolvimento Proximal, o aprendizado não ocorre no momento em que ele é ensinado. É necessário tempo para que o cérebro desenvolva a estrutura mental capaz de processar o novo conceito (Gaspar, 2005).

Por este motivo, o primeiro semestre de nosso projeto foi dedicado exclusivamente a atividades de ensino aos licenciandos, antes que estes participassem do projeto de divulgação científica. Como a maioria dos conceitos que estavam sendo discutidos eram novos para eles, fazia-se necessário que houvesse um tempo para que eles os aprendessem e se formassem as estruturas mentais necessárias. Só depois deste período é que os estudantes começaram a desenvolver a exposição "Ciência Massa".

O modelo de Vygotsky indica que a aprendizagem ocorre por meio de aumentos graduais. Cada avanço deve estar na Zona Proximal do aprendiz, que deve ser alcançada por meio de desafios que o aprendiz possa realizar com a ajuda de um parceiro mais capaz.

O papel do educador, segundo Vygotsky, é o de criar atividades para que os alunos participem das mesmas dentro da sua Zona Proximal (vale relembrar: que não se apresentem tão fáceis a ponto de serem realizadas sem esforço, nem tão difíceis que não consigam ser realizadas). Foi neste sentido que os coordenadores do projeto relatado neste artigo trabalharam, criando atividades que se situassem na Zona Proximal dos licenciandos, para que estes pudessem desenvolver as atividades envolvidas no projeto de extensão "Ciência Massa".

Ainda, segundo Vygotsky, nos primeiros estágios da aprendizagem as orientações do professor são essenciais. No entanto, os aprendizes com mais experiência precisam de menos suporte, já que construíram uma base na aprendizagem prévia. É nesta expectativa que os coordenadores do projeto trabalharam. No estágio inicial, os professores orientaram todas as atividades envolvendo Astronomia e as Ciências afins. Com o transcorrer do projeto e das atividades, a intenção era dar cada vez menos orientações, de modo que os alunos se tornassem cada vez mais autônomos no tema da Astronomia e Ciências afins.

 

Revisão bibliográfica

Uma busca pelo grau de inserção de ambientes não-formais de ensino junto a moradores de regiões dos grandes centros urbanos foi o alvo do trabalho de Pereira, Chinelli e Coutinho-Silva (2008). Por meio de um relato de desenvolvimento do projeto "Ciência vai à escola", cujo objetivo era levar a atividade de divulgação científica a regiões carentes, os autores relatam o impacto positivo que os participantes tiveram ao interagir com o projeto.

A divulgação científica por meio de projetos foi relatada por Reis, Bastos, Salles e Rodrigues-Carvalho (2010). O projeto intitulado "Ciência até os ossos" foi desenvolvido durante três anos para um público variado, desde o infantil até adultos. O objetivo do projeto foi de sistematizar, produzir e elaborar materiais lúdico-didáticos para o público. A atuação no projeto foi dos membros do setor de Antropologia Biológica do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Inicialmente, o projeto contava somente com elementos expositivos. No entanto, ele foi posteriormente reconfigurado para contar com elementos interativos. Como resultado, os autores observaram um maior envolvimento do público com os temas apresentados, bem como maior facilidade de compreensão e aumento na curiosidade.

A busca de uma forma em que os museus de ciência e tecnologia possam contribuir para o ensino formal foi o alvo do trabalho de Chinelli, Pereira e Aguiar (2008). Estudantes de licenciatura buscaram nos ambientes não formais experimentos que pudessem ser reproduzidos em escolas. Um dado interessante trazido no estudo é que cerca de 80% dos experimentos destes ambientes são de Física. Como resultado foram identificados diversos equipamentos em museus que podem ser usados na educação formal através de sua reprodução nas escolas.

Uma análise do resultado das visitas de grupos de alunos do Ensino Fundamental ao Museu Nacional da UFRJ é feita por Vieira e Bianconi (2007). As autoras relatam a dificuldade dos alunos em entender os objetivos da visita e temem por cobranças que afetem sua nota no ensino formal. Estas preocupações atrapalham no aproveitamento que os alunos poderiam ter da visita e na aprendizagem da ciência de forma agradável.

Estes trabalhos contribuem no sentido de que nos mostram como tem sido trabalhado o processo ensino-aprendizagem em ambientes não formais, tanto em museus como em exposições itinerantes ou ainda em projetos de divulgação científica. Desta forma, os pontos positivos de cada trabalho contribuíram para a elaboração e realização das atividades do nosso projeto e os negativos de alerta para que estes equívocos não fossem repetidos.

Steffani (2007) acredita que o fascínio que as pessoas têm por Astronomia possa fazer com que os planetários sejam mecanismo de divulgação de ciências. A autora descreve o planetário José Baptista Pereira ligado à UFRGS e ainda relata que o planetário desenvolve atividades de articulação entre ensino, pesquisa e extensão, possibilitando sua interação com a sociedade.

Cursos dentro do próprio ambiente acadêmico para alunos da Educação Básica sobre Astronomia foram as atividades relatadas por Aroca e Silva (2011). O projeto consistia em levar alunos ao observatório da Universidade de São Paulo, no câmpus São Carlos, para que pudessem ser ensinados sobre o Sol. O projeto não se limitou em palestras, contou também com experimentos e observações.

Estes trabalhos mostram que, em ambientes não formais, as atividades não devem se limitar a palestras e apresentações expositivas. Quanto mais o público interagir, melhor. O nosso projeto foi desenvolvido neste sentido.

Como relatam Damasio e Steffani (2008), o início do ensino de Física formal se dá somente no final do Ensino Fundamental e quase sempre com o ensino de Cinemática. Quando professores têm contato com conteúdos e metodologias de ensino que agradem tanto a eles como aos seus alunos, todos se sentem melhor quando começam a discutir temas de Física, tanto em ambientes formais como em não formais.

Gobara e Garcia (2008) chamam a atenção para o fato de que grande parte dos estudantes de licenciatura são oriundos de escolas públicas, o que, segundo o autor, implica que eles não tenham uma ampla gama de conhecimentos. Esta dificuldade é um fator para a quantidade de egressos.

Nestes trabalhos, vemos que proporcionar conteúdos, além dos livros-texto, para os professores em formação deve facilitar a sua docência, junto com metodologias de ensino. Além disto, é preciso investir em uma cultura de ensino de ciência de qualidade nas escolas públicas, para superar esta deficiência. Consideramos que o melhor caminho é a qualificação dos professores que irão atuar nelas.

 

Contexto do projeto - IF-SC, câmpus Araranguá

O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina é uma instituição pública federal ligada ao Ministério de Ciência e Tecnologia, por meio da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica, tendo sede e foro na capital do estado, Florianópolis.

A instituição se tornou centenária no ano de 2009, tendo sua criação assinada pelo Presidente Nilo Peçanha, com o nome de Escola de Aprendizes Artífices de Santa Catarina. Em 1937, mudou o seu nome para Liceu Industrial de Florianópolis. Cinco anos mais tarde, nova mudança, para Escola Industrial de Florianópolis. Em 1965, tornou-se Escola Industrial Federal de Santa Catarina e três anos depois Escola Técnica Federal de Santa Catarina (ETF-SC).

Durante a década de 1980, a ETF-SC começou o processo de implantação de novas unidades. A primeira a ser inaugurada foi a de São José. Já na década de 1990, as unidades de Jaraguá do Sul e Joinville tiveram suas atividades iniciadas.

Em 2002, a ETF-SC passou a se chamar oficialmente CEFET/SC, tendo a possibilidade de oferecer cursos superiores, além de pós-graduação. Em 2006, as unidades de Chapecó e do Continente foram criadas. Em dezembro de 2007, foram iniciadas as atividades na primeira unidade no sul do estado, na cidade de Araranguá. A expansão continuou em 2009 e 2010, com a implantação dos câmpus de Itajaí, Gaspar, Lages, Criciúma, Canoinhas, Xanxerê e São Miguel do Oeste. Em 2009, o CEFET/SC, por meio de decreto passou a se chamar oficialmente Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (IF-SC).

Em relação ao câmpus Araranguá, no ano de 2008, foram oferecidos cursos técnicos de nível pós-ensino médio, em um total de três: Eletromecânica, Têxtil em Malharia e Confecção e Moda e Estilismo. No ano de 2009, iniciaram-se as atividades do curso de Licenciatura em Ciências da Natureza com habilitação em Física, além do curso de especialização em Educação de Jovens e Adultos. Em 2011, teve início o curso técnico integrado ao ensino médio.

 

Metodologia

As atividades do projeto se desenvolveram durante quatro semestres, sendo um deles somente para o ensino de temas que seriam abordados na exposição itinerantes e os três seguintes para a realização dela em ambientes não formais de ensino. A ação do projeto foi a de inserir objetos de ensino-aprendizagem nas comunidades no entorno do câmpus (mesmo que dentro das dependências do próprio câmpus), atingindo inclusive comunidades fora da cidade de Araranguá. O projeto foi intitulado Ciência Massa e se constituiu de uma exposição itinerante que contava com alguns objetos de aprendizagem, tais como: dois telescópios newtonianos para observação noturna (Figura 2); um planetário construído pelos próprios alunos que usa dois datashows para a projeção (Figura 3), os quais também eram usados para as palestras que os alunos ministravam (Figura 4); pôsteres produzidos pelos alunos que falavam de assuntos diversos como, por exemplo, buracos negros e a construção de um telescópio caseiro (Figura 5).

 

Figura 3

Figura 3 - Telescópios usados no projeto.

 

Figura 4

Figura 4 - Planetário construído pelos alunos.

 

Figura 5 - Palestras ministradas pelos licenciados.

 

Figura 6

Figura 6 - Exposição de pôsteres elaborados pelos alunos sobre diversos temas.

 

Atividades de ensino no câmpus do IF-SC

O primeiro semestre do projeto não teve exposição nas comunidades, pois era preciso que os alunos desenvolvessem os materiais que seriam apresentados e, ademais, eles próprios tomassem contato, a grande maioria pela primeira vez, com temas de Astronomia. Para tanto, foram oferecidos cursos de formação inicial e continuada com temas afins, três ao todo, com carga horária de 20 horas cada. Os temas geradores eram Relatividade Geral, Buracos Negros e medição do raio da Terra com precisão mais de trezentos anos antes de Cristo. Estes temas serviam para introduzir uma gama de assuntos variados, com quais os alunos poderiam ter mais ou menos afinidade de modo a produzirem o material para a exposição.

O curso de Relatividade foi puramente histórico-fenomenológico. Os assuntos abordados que mais tarde serviriam de alicerce para a produção das palestras foram: relatividade galileana, mecânica newtoniana, eletromagnetismo de Maxwell, o princípio da relatividade de Einstein, relatividade especial, relatividade geral. O texto escrito para o projeto foi publicado pelo Instituto de Física da UFRGS, em sua coleção Textos de Apoio ao Professor de Física (Damasio & Ricci, 2009).

O curso que teve como tema gerador Buracos Negros envolveu quase todos os conceitos de Astronomia. Os assuntos abordados foram: Por que 2009 foi o Ano Internacional da Astronomia?, luz e a dualidade onda-partícula, velocidade de escape, força gravitacional, Leis de Kepler, morte e vida das estrelas, relatividade de Einstein, radiação Hawking, resgate de um indivíduo com vida de dentro do Buraco Negro. O texto de apoio para o curso foi publicado pela revista A Física na Escola em forma de artigo (Damasio & Pacheco, 2009).

Por fim, o curso sobre como foi possível medir o raio da Terra com razoável precisão mais de 300 anos antes de Cristo gerou temas como: astronomia grega antiga, astronomia de posição, geocentrismo, heliocentrismo e trigonometria básica.

Elaboração da exposição itinerante

Após os cursos de ensino de temas de Astronomia, os alunos tiveram como incumbência preparar o material para exposição. As atividades que seriam realizadas consistiriam de palestras, realização de alguns experimentos e exposição de pôsteres com temas afins.

Para tanto, os alunos interagiram com os telescópios para que pudessem se tornar monitores das observações. Utilizaram, para isto, um software gratuito na internet que permite observar os astros do céu, na tela do computador e assim orientar as observações com o telescópio.

Além disto, eles prepararam palestras em que abordariam temas de seu interesse e que foram discutidos durantes os cursos de ensino. Foram preparadas quatro palestras, com temas tais como Buracos Negros, astronomia de posição, Astrologia e estrelas.

Também puderam pesquisar mais sobre temas de seu interesse com a orientação dos professores. Com esta atividade, conseguiram, então, produzir pôsteres para a exposição que ficaria no local durante a semana de atividades.

Realização da exposição em comunidades

No segundo semestre do projeto, uma vez a exposição formatada, foi possível começar as exposições nas comunidades. A escolha foi por fazer as mostras nas próprias escolas, de modo a envolver toda a comunidade ligada a ela: pais, alunos e responsáveis. As escolas a serem atendidas neste primeiro momento foram escolhidas de forma a contemplar as várias partes das comunidades do entorno do IF-SC, sendo uma escola de bairro, uma no centro e outra na cidade vizinha chamada Balneário Arroio do Silva. O projeto teve destaque no site do IF-SC como se pode observar na Figura 7.

A primeira escola visitada foi a EEB Neusa Ostetto Cardoso no bairro Polícia Rodoviária, comunidade considerada carente e sem opções de lazer. A exposição ficou na escola durante quatro dias, e as oficinas aconteciam nos períodos da tarde e noite. Elas ocorreram entre os dias 15 e 18 de setembro de 2009.

A segunda escola visitada foi a EEB Apolonio Ireno Cardoso, no centro do município vizinho de Balneário Arroio do Silva. A exposição ficou no colégio entre os dias 22 e 25 de setembro de 2009 e ocorreram nos períodos vespertino e noturno.

A última escola visitada neste semestre foi a EEB Araranguá, no centro da cidade de Araranguá. Ocorreu entre os dias 29 de setembro e 1 de outubro de 2009, nos períodos vespertinos e noturnos.

Em todo o período de 2009/2, os alunos que haviam ingressado no curso de Licenciatura neste semestre foram convidados a participar como assistentes dos que haviam construída a exposição e, durante este tempo, eles próprios produziram materiais para serem apresentados no semestre 2010/1, como o planetário móvel.

No primeiro semestre de 2010 novamente foram visitadas escolas da região de Araranguá, a EEB Maria Garcia Pessi no bairro Cidade Alta e o Centro de Educação de Jovens e Adultos no centro, ambos na cidade de Araranguá. A exposição foi realizada no período noturno entre os dias 9 e 19 de março de 2010.

 

Figura 7

Figura 7 - Destaque no portal estadual do IF-SC dado ao projeto.

 

Realização da exposição em atividades de extensão

No mês de outubro, a exposição ficou nas dependências do câmpus como parte das comemorações da Semana de Ciência e Tecnologia, recebendo visitantes de toda a região. O grande atrativo da exposição durante a Semana de Ciência e Tecnologia para os visitantes foram as observações noturnas com telescópios.

Como parte do dia da Ação Social da Escola Estadual Maria Garcia Pessi, os alunos levaram também a exposição a esta escola para que pudessem ser discutidos temas de Astronomia. Outra atividade prevista e que não foi realizada devido ao mau tempo foi a observação noturna num dos maiores pontos turísticos de Araranguá, o Morro dos Conventos. No dia do evento, que foi divulgado pela imprensa, o tempo estava chuvoso, o que não permitiu a realização das observações.

Realização da exposição em museu

Ainda no segundo semestre de 2010, o câmpus Araranguá voltou a fazer as atividades de exposição e observação com telescópios. Desta vez, não se optou por visitar escolas e sim por montar a exposição no centro da cidade, no espaço chamado "Centro Cultural". Neste espaço, ficavam expostos pôsteres nos períodos matutinos e vespertinos, e grupos agendavam uma visita monitorada pelos licenciandos. Além disto, havia sessões de observação noturna com telescópios nos períodos de lua cheia. A exposição ficou montada entre 5/10 e 5/11 de 2010. A repercussão local da exposição foi grande, tendo sido registrada em reportagens de jornal local (Figura 8) e os alunos tendo participado de entrevistas para a televisão de Araranguá (Figura 9).

 

Figura 8 - Repercussão na impressa local da exposição itinerante.

 

Avaliação

A avaliação do projeto ocorreu de duas formas:

Avaliação do orientador do projeto

Os avanços do projeto, fomentado em parte pelo CNPq, podem ser divididos em seu alcance em dois públicos, são eles: os alunos da licenciatura em Física (futuros professores e divulgadores de ciência) e o público em geral.

Os licenciandos tiveram contato com a divulgação científica, principalmente Astronomia, que é uma área normalmente negligenciada pelos currículos tradicionais das instituições de ensino superior. Acredita-se que após esta experiência de divulgação científica, esses futuros professores tenham uma maior intimidade, seja com a divulgação em si ou com temas de Astronomia. Não se pode deixar de lado o trabalho de pesquisa que eles desenvolveram para a elaboração as atividades, por meio de publicações de divulgação científica, em português e inglês, e periódicos científicos.

Para o público geral, o impacto é outro. Foram visitadas na região de Araranguá cinco escolas, que acolheram a exposição por quatro dias. Em cada dia destes, havia cerca de 40 pessoas, logo o número de pessoas que foram atingidas pela mostra na escola gira em torno de 800 pessoas. Na exposição na "Casa da Cultura", mais de 300 pessoas assinaram o livro de visitas, além das visitas guiadas que receberam 200 alunos. Logo, a estimativa de público geral atingido pela exposição foi de quase 1500 pessoas.

 

Figura 9 - Aluno dando entrevista para a televisão local sobre a exposição na 'Casa da Cultura'.

 

Avaliação pelos alunos

Grupo focal como técnica

Para que os licenciandos avaliassem o desenvolvimento do projeto, a opção foi que isto ocorresse de maneira coletiva em detrimento de entrevistas ou questionários individuais. A técnica usada com este fim foi o grupo focal.

De acordo com Gomes e Barbosa (1999), grupo focal é um grupo de discussão informal e de tamanho reduzido para obter informações de caráter qualitativo e em profundidade. Esta técnica fornece uma riqueza de informações qualitativas sobre o desempenho das atividades desenvolvidas. O objetivo principal dela é revelar a posição dos participantes do grupo sobre os tópicos de discussão. A recomendação dos autores é que o grupo deva ser de sete até doze pessoas, todas com alguma característica em comum. O moderador do grupo levanta assuntos previamente elencados e organizados em um roteiro construído por ele. O moderador incentiva a participação de todos, evitando que um ou outro tenha o domínio sobre as posições dos demais. O moderador não deve fazer julgamentos e sim encorajar os participantes fazendo as perguntas.

A realização do grupo focal

A técnica foi empregada com um grupo de onze alunos participantes do projeto no dia 20 de maio de 2011 e durou cerca de uma hora. As questões levantadas pelo mediador referiam-se aos seguintes aspectos:

Experiências: Quanto ao aprendizado e interesse despertado nas áreas de conhecimento envolvidos.

  • Como foi o processo ensino-aprendizagem nos FIC (Buracos Negros, Relatividade de Einstein e Medição do raio da Terra) de que participou?
  • Como foi o processo ensino-aprendizagem durante a elaboração das atividades nas escolas?
  • Como foi o processo ensino-aprendizagem durante a elaboração das atividades para o museu?

Sobre a expectativa docente: Pretende continuar explorando os espaços não formais quando for docente no Ensino Fundamental?

  • Como pretende fazer isto?
  • A experiência com o 'Ciência Massa' ajudou?

Sobre temas de Astronomia: Aprendeu e se motivou a aprender a Astronomia?

  • São temas que despertavam seu interesse?
  • O interesse se modificou com a atividade?
  • Pretende abordar o tema quando for docente?

Análise dos dados do grupo focal

A realização do grupo focal foi gravada em arquivo de áudio e transcrita, por um aluno que também participou da análise dos dados do grupo, ocupando por volta de 18 páginas. Para preservar a identidade dos alunos participantes do grupo focal, estes serão citados apenas como aluno xx, sendo que cada aluno possui um número entre 1 e 11.

Antes de discutir o aprendizado e o interesse, o debate iniciou com discussão dos alunos sobre o que é um ambiente não formal de aprendizagem. Este assunto rendeu várias opiniões, pois não havia um consenso nas ideias dos envolvidos. A maioria dos alunos ainda não possuía um conceito claro sobre o que é um ambiente de aprendizagem não formal. Surgiram questões como: um laboratório didático é um ambiente não formal? Alguns responderam que sim, justificando que ambiente formal é aquele tradicional com foco quadro/professor e que os laboratórios são pouco utilizados nas escolas que possuem algum, pois os professores não se dispõem a levar seus alunos nestes espaços. Outros, porém, acreditam que, por fazer parte da escola, o laboratório é um ambiente formal. A intenção do mediador neste momento era que os alunos construíssem em conjunto o conceito de ambiente não formal. Neste sentido foi lançado aos alunos o seguinte questionamento: se um professor de fora for convidado para ministrar uma palestra em nosso mini-auditório, este seria um espaço formal ou não formal? Novamente os alunos dividiram opiniões entre sim e não.

Em seguida, o mediador explicou a dinâmica que iria reger o grupo focal e questionou, para quem participou, como os alunos enxergaram o processo de ensino-aprendizagem nos FIC. Neste momento cada aluno expressou sua visão, sendo que algumas estavam consonantes. A maior parte dos alunos sinalizou que os cursos FIC trouxeram uma base e que instigaram a estudar mais sobre os temas, relacionados à astronomia, porém alguns alunos mostraram que o inverso também acontece e que é possível se identificar ou não com os temas. Frisaram ainda que consideram a astronomia como sendo interessante, porém não tiveram vontade de se aprofundar - nas palavras do aluno 2: "tu também pode perceber que não é a tua praia" (ipsis litteris). Todos concordaram que os temas dos cursos eram de extrema importância, que foram muito interessantes e que os cursos trouxeram conhecimentos que não seriam contemplados em sala nas aulas regulares.

Como os alunos que assistiram aos cursos FIC prepararam pôsteres e aulas com assuntos semelhantes aos vistos, o mediador questionou se os FIC ajudaram a formar os primeiros conceitos para que os alunos preparassem os pôsteres e aulas. Todos concordaram que auxiliaram muito na formação dos conceitos e na preparação das aulas. Os temas dos pôsteres eram abertos, ou seja, os alunos podiam escolher qualquer tema para confeccioná-los. Além disso, realizaram algumas atividades como a utilização de software para visualização do céu, de telescópios, entre outras. O mediador levantou a questão da meta-aprendizagem, aprender a aprender, e se a preparação dos materiais ajudaram a aprender a pesquisar em revistas com cunho científico ou de divulgação, a ter mais autonomia em relação ao professor. As opiniões foram categóricas ao afirmarem que contribuíram muito, sendo que para elaborar os pôsteres e as atividades todos os alunos precisaram pesquisar e estudar sobre os temas, direcionados, mas tendo que "se virar sozinhos". Um ponto levantado pelo aluno 5 foi que os alunos que receberam estas atividades muitas vezes faziam perguntas que os próprios palestrantes ainda não haviam pensado, tornando necessário estudar ainda mais para poder responder a eles.

A atividade abordada a seguir foi a do museu. O IF-SC adquiriu uma coleção de pôsteres relacionados a astronomia de 12 exemplares, os quais foram sorteados entre os alunos, de modo que estes não precisaram pesquisar sobre o tema relacionado ao seu pôster para poder explicar ao público geral que visitava a exposição localizada no museu. Neste momento, o mediador procurou descobrir se os alunos aprenderam mais sobre astronomia e ciência em geral com esta atividade. Todos os alunos concordaram que este tipo de atividade ajuda a aprender mais. Segundo o aluno 8, a autonomia proporcionada aos alunos para pesquisar e conseguir alcançar o objetivo, neste caso, o de ensinar de forma rápida e eficiente ao público geral sobre algum tema específico de astronomia, faz com que os alunos mergulhem no tema e consigam desenvolver maneiras de aprender e ensinar. O aluno 4 destacou que os temas dos pôsteres eram interligados, o que levou os alunos a desenvolverem uma noção geral sobre todos os temas e não ficassem bitolados apenas ao tema a que foram designados. Neste sentido, o moderador perguntou ao aluno 7, que é coordenado por ele como bolsista CAPES, se a atividade iria ajudá-lo na resposta de uma hipotética pergunta de um aluno de terceiro ano de ensino médio sobre o modelo de Sommerfeld de átomo. A resposta do aluno 7 continha um pouco de dúvida: ele acredita que a atividade no museu ajudou a aprender a pesquisar, mas não tem certeza se conseguiria fazer isto sozinho. Já os alunos 9 e 10 acreditam que conseguiriam aprender sozinhos sobre um determinado tema para posteriormente ensiná-lo. Destacaram que aprenderam os locais mais apropriados para pesquisar, onde é mais confiável ou não e que se deve pesquisar em mais de uma fonte para ter um melhor entendimento do tema. O mediador lembrou que, segundo Vygotsky, sempre precisamos ter um parceiro mais capaz para nos auxiliar a alcançar o entendimento. Para complementar a opinião dos alunos sobre aprender a aprender, o mediador questionou sobre os lugares em que os alunos podem ter informações confiáveis, quando forem professores e seus alunos perguntarem sobre temas que ainda não são de seu conhecimento. Por exemplo, se um aluno do ensino médio assistisse a um programa de televisão que abordasse o índice de refração negativa, assunto novo que possivelmente não estará no currículo da graduação, como fariam para pesquisar e responder a isso para o aluno? O aluno 3 se manifestou dizendo que primeiramente pesquisaria nos livros didáticos e se não encontrasse respostas neles, procuraria em artigos publicados em revistas científicas, tais como o Caderno Brasileiro de Ensino de Física, Ciência Hoje, Google Acadêmico. O aluno 4 citou Ciência e Educação para complementar a resposta. Para concluir, o mediador perguntou se os alunos se achavam mais capazes de pesquisarem sozinhos após terem participado desta atividade. Todos responderam ao mesmo tempo que sim, que se sentem mais preparados.

A pergunta que se seguiu mudou o rumo da conversa e enveredou para a contribuição do aprendizado dos alunos participantes para a futura experiência de docência dos mesmos. O mediador indagou se os alunos pretendiam utilizar os ambientes não formais de educação com seus futuros alunos, quando forem professores, ou se achavam esta prática desinteressante. O aluno 11 respondeu prontamente que pretende usar os ambientes não formais, pois acredita que contribuam para o aprendizado do aluno e até mesmo para os docentes. Complementando a resposta, o aluno 6 lembrou que, quando se faz algo de diferente e de novo, incentiva-se o aluno a se interessar mais e, assim, a estudar mais. Já o aluno 10 mostrou uma visão um tanto quanto pessimista, ao dizer que "Pretendo quando for possível, porque nem sempre é possível usar os ambientes não formais". Os alunos 4 e 7 alertaram que nem toda escola dá abertura para que se faça este tipo de atividades e que é preciso verificar se a escola o permite para só então fazer algo diferente, mas se o professor fizer uma "forcinha", é possível. Seguindo esta lógica, o mediador comentou que os alunos precisam ter bem claro que a escola é dos professores e não apenas dos diretores e aproveitou para perguntar se esta atividade que os alunos fizeram em ambientes não formais ajudá-los-ia a fazê-la novamente quando fossem professores, lembrando que na maioria das vezes estas atividades não são feitas durante a graduação. Todos os alunos concordaram que quando se tem este tipo de atividade durante a graduação, fica mais fácil de realizar eventos semelhantes quando vão para a carreira de docentes. O aluno 5 aproveitou para dar um exemplo que testemunhou em uma escola da região, em que havia um professor que se empenhava em fazer uma aula diferente, baseada em experimentos, e em instigar o aluno a querer aprender mais, porém este professor por algum motivo se afastou da escola e em seu lugar entrou um professor totalmente tradicional, que utilizava apenas quadro e giz em uma aula maçante. Os alunos, que já estavam acostumados com uma aula mais dinâmica, acabaram por não gostar do próprio professor novo e de suas aulas tradicionais que se tornaram, quase que na sua totalidade, chamadas de atenção para os alunos pararem com a bagunça. Isso mostra como os alunos gostam de fazer coisas diferentes e este tipo de atividades com ambientes não formais e experiências. O aluno 1 comentou que não é interessante apenas para que os alunos tenham uma aula diferente, mas os professores também são beneficiados, pois muitos já estão há vários anos trabalhando os mesmos conteúdos do mesmo jeito. Ao fazerem algo diferente, ganharão uma motivação a mais para trabalhar. O aluno 10 colocou que acredita que todas estas atividades são extremamente válidas e que vão ajudar muito na hora que ele for entrar em sala de aula como docente.

O último tema discutido tem relação especificamente com a astronomia, pois até este momento o tema principal de estudo dos alunos foi pouco comentado já que estas atividades poderiam ser construídas utilizando qualquer tema. O mediador lembrou que 2005 foi declarado o ano mundial da Física, focando em Einstein. Se as atividades tivessem sido elaboradas em 2005, teriam como tema a relatividade. Agora a pergunta lançada foi: "astronomia quase não é ensinada nas escolas, alguém aqui (neste caso os alunos) aprendeu astronomia na escola?". A maioria dos alunos respondeu que não aprenderam, os alunos 2 e 5 que aprenderam poucas coisas, como o movimento do sol e leis de Kepler. O aluno 6 disse que muitas vezes estes temas constam nos livros didáticos, porém geralmente nos últimos capítulos e os professores não costumam ensiná-los. Já o aluno 1 relatou que quando estava na oitava série do ensino básico fez um trabalho sobre astronomia no qual o professor teve que emprestar um livro pra ele, pois o livro didático não abordava este conteúdo. O mediador seguiu perguntando: "como a maioria de vocês nunca tinha aprendido astronomia, nas atividades aprenderam um pouco. Com esta experiência dos ambientes não formais, vocês ficaram com vontade de aprender mais sobre astronomia ou de nunca mais ver isto na vida?". Os alunos 5 e 6 responderam que tiveram vontade de aprender mais sobre o tema. Já os alunos 2 e 8 expressaram o contrário, mesmo achando o tema interessante e tendo estudado para poder fazer as atividades, não se identificaram e não têm vontade de ir mais a fundo. Depois disso, o mediador perguntou se eles pretendiam ensinar astronomia para seus futuros alunos, uma vez que é um tema pouco abordado nas escolas. O aluno 11 disse que sim, se a carga horária permitir, isto é, se depois que ensinar o que considera essencial sobrar algum tempo. Já o aluno 3 manifestou que tem interesse em ensinar astronomia para seus futuros alunos e que vai alocar a carga horária da sua maneira, considerando a astronomia como essencial para os alunos. O aluno 4 declarou que existem muitos professores que seguem o livro didático e que têm vontade de fazer diferente, que pretende analisar os PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais) e a PCSC (Proposta Curricular de Santa Catarina) para preparar suas aulas, tentando ajeitar os conteúdos ao longo do ano. Neste momento o mediador fez uma intervenção demonstrando sua preocupação em relação aos alunos se tornarem futuros professores seguidores de livros: "Vocês não podem ser seguidores de livro, vocês estão se formando pra isso. Professor seguidor de livro é professor mal formado...". E voltou a perguntar se os alunos queriam ensinar astronomia quando forem professores. Segundo o aluno 2, supondo que todos irão para a sala de aula, seria injusto não ensinar, visto que na graduação foi apresentado que é importante ser ensinado e a intenção é proliferar essa ideia. Uma preocupação foi demonstrada pelo aluno 11 no sentido da OBA (Olimpíada Brasileira de Astronomia) que acontece todos os anos e acredita ser injusto que um aluno do ensino médio não consiga participar satisfatoriamente porque não aprendeu sobre o tema. O aluno 8 afirmou também que é importante ensinar astronomia para que os alunos consigam entender uma notícia, que ultimamente são bem comuns, na TV ou jornal: "muitas vezes é colocado, é divulgado na TV: 'vai acontecer um eclipse', e o aluno: 'mas o que é isso? Por que acontece isso?'".

Por fim, o mediador pediu que cada um desse uma última contribuição, sobre o que quisesse para encerrar o grupo focal. As considerações iniciaram com o aluno 4, que declarou que estudar astronomia e pesquisar foi muito importante, bem como ir para a sala de aula e ter um primeiro contato com os alunos, o que foi muito interessante para ter uma ideia de como será quando for professor. "Porque a gente se pergunta: 'como vai ser o nosso dia-a-dia como professor com 30, 40 alunos?'. A gente já deu palestras pra 97...". Dando continuidade, o aluno 2 comentou que, como a intenção era trazer o tema astronomia para a gente aprender e querer estudar mais, foi totalmente válido. A única ressalva é que deveriam ter mais tempo para poder estudar mais. O aluno 5 pensa que o método de ensino no IF-SC dá oportunidade para que se conheça várias escolas, pois nenhuma é igual a outra, "A realidade na escola no centro é diferente da realidade em uma escola do interior, e o curso proporciona a gente a ir [sic] em todas essas duas, ter contato e a gente percebe que com uma aula experimental, às vezes até só com o Power Point mesmo, instiga mais os alunos e faz com que a gente cresça, pessoalmente e profissionalmente". O aluno 6 disse que o Ciência Massa foi uma das primeiras experiências que teve no IF-SC e em sala de aula, em que tentava aprender mais sobre astronomia e via a realidade das escolas. Um ponto negativo foi que os professores, e até mesmo os diretores, não davam tanta importância e não assistiam às palestras e oficinas: "Eu, quando for professor, se ir [sic] outro professor dar uma palestra eu vou lá pelo menos pra prestigiar o que o aluno vai explicar". O aluno 4 lembrou que algum professores até ficavam felizes quando as palestras eram ministradas, pois iam para a sala dos professores tomar café deixando os alunos com os palestrantes. O aluno 9 disse: "Espero que eu possa, se eu for professora, ensinar astronomia porque eu vi que os alunos gostam bastante". Também contou que um dia, quando estava na atividade do museu e nem toda a equipe estava presente, os alunos quando olhavam algum pôster que não tinha uma pessoa pra explicar, eles liam e ficavam curiosos ansiando por explicação pois percebiam que tinham assuntos da Física que são totalmente ligados ao seu cotidiano. O aluno 10 confessou que sempre teve dificuldade em falar em público e esta experiência que teve com as atividades foi muito importante para ajudar a superar esta barreira. Também constatou que com as visitas às escolas conseguiram ter uma ideia do que irão enfrentar, "eu acredito que é muito gratificante, tu aprender um conteúdo e repassar pros alunos". O aluno 1 primeiramente começou a falar sobre os FIC: "a gente descobriu um novo jeito de aprender". Por mais que os FIC tivessem aulas, disse ainda, estas eram baseadas em discussões, questionamentos e construção. Quando os alunos menos percebiam, mesmo não sabendo nada sobre o tema no início do FIC, estavam montando pôsteres. Sobre as atividades nas escolas, declarou: "eu por exemplo não pude ir porque trabalhava já naquela época, daí eles iam de tarde na sala de aula pra aprender um negócio novo, que era dar aula, dar uma palestra, estar de cara com os alunos". Por último este aluno falou sobre a atividade no museu, onde eram expostos os pôsteres, mesmo que não confeccionados por eles, tinham um tema e necessitavam pesquisar para ensinar às pessoas interessadas que visitavam a exposição: "se o cara foi lá é porque queria aprender alguma coisa". O último aluno a expressar suas considerações finais foi o aluno 3, que demonstrou uma preocupação em destacar que por mais que estas atividades tivessem sido, para muitos, a primeira experiência com alunos e que foi importante, "essa não é uma experiência de sala de aula ... A gente teve experiência de dar seminário, de ministrar palestra ... A gente não pode tomar isto como base, porque isso não é uma experiência de sala de aula. A partir do momento que tu tens uma turma de alunos e que tu tens que dar uma aula do início ao fim e que tu tens que seguir um conteúdo, é complicado, é bem diferente de tu chegar em um lugar e dar uma palestra". Exemplificou com sua experiência, pois possui uma turma em um projeto de inclusão digital: por mais que os alunos estejam presentes e querendo realmente aprender, não é tão simples assim. E isto nem se compara a encarar uma turma de ensino básico que está presente apenas porque os pais obrigam e muitas vezes não possuem interesse nenhum de aprender o conteúdo que está sendo ministrado, principalmente para as disciplinas da área das exatas.

 

Considerações finais

O projeto "Ciência Massa" teve contribuições relativas à formação docente, como mostram os dados do grupo focal, bem como na divulgação científica, tanto para o público local por meio das exposições, como para o público maior por meio dos trabalhos já publicados. Nem o orientador, tampouco os alunos tinham experiência no desenvolvimento deste tipo de atividade. A realização do projeto mostrou que não só é possível realizar este tipo de atividade, mas que esta contribui enormemente, tanto para o desenvolvimento do trabalho dos professores da Licenciatura, como na formação de seus alunos e de todo o público atingido pela divulgação científica realizada por meio deste tipo de projeto.

 

Agradecimentos

Ao CNPq pelo fomento ao projeto por meio do Edital .°63/2008. A colega Francieli Socoloski Rodrigues da UFFS pela leitura prévia e todas suas sugestões pertinentes.

 

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Notas

F. Damasio
Endereço para Correspondência: Av. XV de Novembro, 61, Araranguá, SC 88900-000, Brasil.
E-mail para correspondência: felipedamasio@ifsc.edu.br;

O. Allain
E-mail para correspondência: olivier@ifsc.edu.br;

G. J. Euzébio
E-mail para correspondência: geisoneuzebio@gmail.com.