EDITORIAL

Há alguns anos, em 2009, comemoramos os 60 anos da Arquivos Brasileiros de Psicologia, acontecimento raro entre as publicações seriadas no Brasil. Em 2014 foram alcançados 65 anos de atividades e retomamos aqui a celebração dessa longa trajetória, que abarca muitas instituições, momentos históricos, editores, autores e colaboradores. Neste número, que encerra o volume 66, publicamos colaborações com o intuito de homenagear o primeiro editor deste periódico, Emilio Mira y López, 50 anos após seu falecimento.

Dois textos dedicados a ele constam desta edição. "Emilio Mira y López: uma ciência para além da academia", de autoria de Jacó-Vilela e Rodrigues, compõe a Seção Aberta. Nele, são apresentados dados sobre a extensa e variada trajetória de Mira y Lopez, que constitui parte da história da psicologia, por seu interessante percurso e protagonismo de ações. E, se toda biografia corre sempre o risco de idealização, como advertiu Freud, para ser escrita, registrada, ela depende do interesse que o biografado desperta no biógrafo. Nesse quesito o percurso do personagem que colaborou com a fundação deste periódico está repleto de acontecimentos de interesse para a história da psicologia no Brasil. O segundo texto, de Martins, abre a Seção de Artigos, com dez artigos inéditos. "Uma história da psicologia em revista: retomando Mira y López" se vale das conexões envolvendo Mira y López para situar a institucionalização dos saberes psi em meio às transformações por que passava o país em meados do século XX. Nesse momento, em que a psicologia se encontra fortemente institucionalizada em imagens endurecidas - acompanhadas de pregnante cientificismo e tecnicismo -, tal reflexão imprime movimento a algumas das estátuas da prática acadêmica. Esperamos que esses textos, que celebram o percurso de Mira y López, contribuam para matizar ainda mais a história da psicologia, trazendo elementos para a reflexão sobre nossa atuação como profissionais.

Afirmando seu acolhimento à diversidade das produções em nossa área, a ABP publica nesta edição artigos que contemplam temas de interesse teórico e metodológico. Em "Validation of the 'Anxious Thoughts Inventory' for use in Brazil", pesquisadores brasileiros expõem resultados de estudo na área da avaliação psicológica, especificamente no que concerne à preocupação entendida como processo cognitivo; no artigo "Manejo da crise: encaminhamento e internação psiquiátrica em questão", as autoras destacam as dificuldades da Rede de Atenção Psicossocial em construir uma resposta à crise, o que problematiza o funcionamento do modelo psicossocial; em "Território e nomadismo: a saúde em questão", a proposta é usar o nomadismo como ferramenta de problematização das políticas públicas de saúde, construídas a partir de uma perspectiva territorial; no artigo "Sustentando a diferença: teatro, conexões e invenção de mundos", resultados de estudo indicam a pertinência da atividade teatral como dispositivo privilegiado para a produção de subjetivação; em "A marca do desejo parental", pesquisadores franceses se interrogam sobre os modos de transmissão do desejo dos pais à criança, em termos de marca inconsciente; no artigo "Liberdade e desejo de constituir família: percepções de jovens adultos", a partir dos resultados de pesquisa sobre as repercussões do individualismo na família contemporânea, as autoras apontam mudanças no lugar ocupado pelos filhos nos projetos de constituir família; em "O singular do caso clínico: uma proposta metodológica em psicanálise", interessa apresentar um tipo de construção de caso cujo foco não está na descrição do tratamento, mas na leitura clínica de dados, de modo a extrair o que se considera a marca do caso; o artigo "Compreendendo textos narrativo e argumentativo: há diferenças?" expõe resultados de estudo sobre as relações entre compreensão de textos e tipos de textos, mostrando que as características estruturais dos textos influenciam sua compreensão; "Efeitos da similaridade ortográfica das pseudopalavras no acesso lexical" traz resultados de estudo que verificou o efeito que a similaridade ortográfica de um estímulo tem no tempo de reação e na precisão dos participantes em uma tarefa de decisão lexical.

Nesta edição, contamos também com a resenha "A psicologia e as questões singulares de nosso tempo", sobre livro recentemente editado. E, igualmente, com a Nominata, lista dos pareceristas que, com suas avaliações no ano de 2014, contribuíram para a qualidade do que publicamos. Registramos a eles mais uma vez, nossos agradecimentos. Agradecimentos, por fim, à equipe que conosco faz este periódico e às agências que o apoiam.

Francisco Teixeira Portugal
Vera Lopes Besset