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Arquivos Brasileiros de Psicologia
versão On-line ISSN 1809-5267
Arq. bras. psicol. vol.69 no.2 Rio de Janeiro 2017
ARTIGOS
Gravidez decorrente de violência sexual: revisão sistemática da literatura
Pregnancy resulting from sexual violence: systematic review of the literature
El embarazo resultante de la violencia sexual: revisión sistemática de la literatura
Mykaella Cristina Antunes NunesI; Normanda Araujo de MoraisII
IDoutoranda. Universidade de Fortaleza (Unifor). Fortaleza. Estado do Ceará. Brasil
IIDocente. Programa de Pós-graduação em Psicologia. Universidade de Fortaleza (Unifor). Fortaleza. Estado do Ceará. Brasil
RESUMO
Este estudo teve como objetivo geral mapear os estudos existentes sobre o desfecho da gestação de mulheres que engravidaram como resultado de violência sexual e descrever quais aspectos são ressaltados nos artigos em relação a essas experiências de desfecho. Foi realizada uma Revisão Sistemática de Literatura nas bases de dados IndexPsi, PePSIC, SciELO e Lilacs, a partir da combinação de 11 descritores e processo rigoroso de análise, selecionando-se 30 artigos ao final. A análise destes mostrou que as experiências de gravidez decorrente de estupro revelam uma diversidade de vivências, que, embora não possíveis de serem generalizadas, apontam para aspectos comuns tanto no que se refere à interrupção (vínculo com a violência, repúdio à gravidez e temor de dano social ou psicológico à criança) quanto à continuidade (relação de apego e vínculo com o bebê, crenças religiosas).
Palavras-chave: Estupro; Violência contra a mulher; Continuidade da gestação; Aborto.
ABSTRACT
This study consists of a Systematic Literature Review (SLR). Aimed to map the existing studies on the outcome of pregnancy in women who become pregnant as a result of sexual violence, and describe which aspects are highlighted in articles regarding these experiences outcome. Research was conducted on the basis of IndexPsi, PePSIC, SciELO and Lilacs from the combination of eleven descriptors and rigorous analysis, selecting 30 items that comprised the corpus of work. Analysis of these articles showed that pregnancy resulting from rape experiments reveal a variety of experiences, which although it is not possible to generalize, point to commonalities regarding both the interruption (bond with violence, rejection of pregnancy and fear of social or psychological damage to the child) and continuity (attachment and bonding with the baby, religious beliefs).
Keywords: Rape; Violence against women; Continuity of gestation; Abortion.
RESUMEN
Este estudio tuvo como objetivo general mapear los estudios existentes sobre el resultado del embarazo en las mujeres que quedaron embarazadas como consecuencia de la violencia sexual y describir cuales aspectos se destaca en los artículos sobre estas experiencias de resultado. Se llevó a cabo una Revisión Sistemática de Literatura (RSL) en las bases de datos IndexPsi, PePSIC, SciELO y Lilacs, a partir de la combinación de once descriptores y riguroso proceso de análisis, con la selección de 30 artículos al final. El análisis de los mismos mostró que las experiencias de embarazo decurrentes de violación revelan una diversidad de vivencias, que aunque no es posible generalizar a punto en común, tanto en lo relativo a la interrupción (vínculo con la violencia, el rechazo del embarazo y el temor de daño social o psicológico al niño) cuanto a la continuidad (relación de apego y el vínculo con el bebé, creencias religiosas).
Palabras clave: Violación; Violencia contra la mujer; Continuidad del embarazo; Aborto.
Introdução
No Brasil, assim como em diversos países, a Violência Sexual (VS) constitui um sério problema de saúde pública. Estima-se que a violência sexual atinja 12 milhões de pessoas a cada ano no mundo. Embora estatísticas ainda sejam parcas no tocante à extensão da VS, sabe-se que são frequentes os abusos sexuais intrafamiliares - como o incesto e o estupro, em especial - e o sexo forçado perpetrado por parceiros íntimos (Krug et al., 2002; Schraiber et al., 2007). O estupro, a partir de reformulação da Lei nº 12.015 (Brasil, 2009), passa a ser compreendido como "constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso", o que pode ser cometido contra mulheres e homens.
Estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), em 2014, acerca do estupro no Brasil, constatou que, em relação ao total das notificações ocorridas em 2011, foram notificados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) 12.087 casos de estupro, sendo 88,5% das vítimas do sexo feminino. Sobre as consequências sofridas pelas vítimas do estupro, as mais prevalentes foram estresse pós-traumático (23,3%), transtorno de comportamento (11,4%) e gravidez (7,1%). Entretanto, a proporção de vítimas que ficaram grávidas com consequência do estupro apontava para 15,0% quando se considerava apenas os casos em que houve penetração vaginal e a faixa etária entre 14 e 17 anos (Cerqueira, & Coelho, 2014).
Segundo a Norma Técnica do Ministério da Saúde - MS (Brasil, 2012) que versa sobre Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes, o risco de gravidez decorrente do estupro varia entre 0,5 e 5%, depende de alguns fatores, como: idade da vítima, coincidência com o período fértil, se a violência foi um caso isolado ou se é uma violência continuada, e se a vítima estava utilizando métodos anticoncepcionais. Considera-se que os casos de gravidez entre as adolescentes são mais numerosos em face da alta recorrência de estupro entre crianças e adolescentes, o que faz com que a probabilidade de gravidez aumente substancialmente.
Outro dado importante observado na norma técnica do MS (2012) é que, entre as vítimas adultas que ficaram grávidas como consequência do estupro, 19,3% realizaram aborto previsto em lei, enquanto nas adolescentes e crianças 10,6% dos casos. Essa proporção se reduz quando a grávida é adolescente ou criança. Como a norma técnica prescreve que o aborto para menores de 18 anos só deve ser feito quando o menor e o seu responsável concordam, e tendo em vista a alta prevalência de casos de estupro envolvendo crianças e adolescentes, em que os próprios familiares são os autores, é possível que a diferença na taxa de aborto entre menores de idade e adultos reflita esses fatos.
Com base nesses achados, o presente estudo teve como objetivo geral mapear os estudos existentes sobre o desfecho (interrupção ou continuidade) da gestação de mulheres que engravidaram como resultado de violência sexual e descrever quais aspectos são ressaltados nos artigos em relação a essas experiências. Em termos de objetivos específicos, buscou-se: 1) caracterizar quantitativamente os estudos quanto à base de dados, ano de publicação, nacionalidade, idioma, área de publicação, tipo de estudo, método (quantitativo ou qualitativo), temática principal e objetivo do estudo; e 2) descrever (qualitativamente) as principais categorias temáticas em torno das quais os estudos poderiam se agrupar, sintetizando-se o conteúdo dos artigos analisados para cada categoria.
Tal estudo justificou-se pela necessidade de investigar o atual panorama de estudos acerca desta temática (desfecho da gestação resultado de estupro), visto que a literatura científica tende a trazer mais uma dimensão epidemiológica da VS, enfatizando menos a gravidez (nos casos em que esta ocorre) e menos ainda a experiência das mulheres que engravidaram. Também pela necessidade de melhoria das políticas públicas de saúde voltadas especialmente para as mulheres que engravidam decorrente de violência sexual, que podem ser fomentadas a partir de estudos desse tipo.
Método
O presente estudo consiste numa Revisão Sistemática de Literatura (RSL). Em um estudo dessa natureza são feitas avaliações críticas de materiais que já foram publicados, considerando o progresso das pesquisas na temática abordada. Inicialmente se estabelece um determinado problema e sumarizam-se estudos prévios para, assim, delimitar o estado da arte da problemática investigada (Hohendorff, 2014).
Foi realizada pesquisa nas bases de dados IndexPsi, PePSIC, SciELO e Lilacs, utilizando-se a combinação de descritores em idioma português segundo consulta aos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS). Na realização das buscas foram feitas onze combinações dos termos, sendo: Violência Sexual and Gestação, Abuso Sexual and Gestação, Estupro and Gestação, Violência Sexual and Gravidez, Abuso Sexual and Gravidez, Estupro and Gravidez, Violência Sexual and Aborto Legal, Abuso Sexual and Aborto Legal, Estupro and Aborto Legal, Gestação and Aborto Legal e Gravidez and Aborto Legal. As bases acima foram delimitadas a partir da facilidade de acesso aos trabalhos que, em sua maioria estão disponíveis em sua forma completa. Optou-se por não trabalhar com os descritores em outros idiomas, pois isso exigiria mais tempo para a coleta e análise dos artigos não disponível por tratar-se de uma pesquisa de mestrado da primeira autora que englobava outros estudos.
A busca dos artigos deu-se a partir de alguns critérios de inclusão: a) artigos escritos nos idiomas português, inglês e espanhol; e b) artigos que abordassem a problemática da violência sexual, gestação e aborto legal. Os trabalhos que não disponibilizavam sua forma completa, os artigos repetidos e publicações denominadas de Gray Literature (teses, dissertações, monografias, relatórios, documentos oficiais não publicados comercialmente, entre outros) não foram incluídos na pesquisa. Optou-se por não delimitar o período de publicação, já que se pretendia alcançar o maior número de trabalhos sobre a temática em épocas diferentes de publicação. A pesquisa nas bases de dados ocorreu em janeiro de 2014.
Para a seleção dos estudos, inicialmente os artigos foram analisados de forma independente pelas autoras, com base em seus resumos e na leitura completa destes quando a técnica primeira era insuficiente para determinar sua seleção. As exclusões foram justificadas e as discrepâncias resolvidas em consenso. Determinada a seleção dos artigos, eles foram lidos em sua completude e submetidos a duas etapas de análise (quantitativa e qualitativa). Num primeiro momento foi feita uma análise quantitativa, considerando: a) a quantidade de publicações por ano; b) a origem da publicação; c) o método utilizado; d) o idioma empregado; e e) a área temática da publicação. Realizando-se essa etapa, seguiu-se com a análise qualitativa dos artigos e definição das categorias de análise.
Resultados e discussão
Esta revisão sistemática obedeceu 11 combinações diferentes de descritores em bases de dados específicas, gerando um total de 809 estudos, que passaram por processo rigoroso de análise até findar em 30 artigos que consistem no corpus de análise deste trabalho. O processo de seleção dos artigos está ilustrado na Figura.
Durante o percurso de seleção e análise dos artigos, alguns trabalhos foram excluídos, sendo antes da classificação eliminados (n = 697) estudos e posteriormente (n = 82), conforme demonstrado na Figura. Depois de feita essa primeira análise dos artigos, segundo os critérios de inclusão, chegou-se ao total de 30 estudos, que foram inicialmente classificados quantitativamente quanto à origem, ao idioma, tipo de estudo, método utilizado, ano e área de publicação.
A análise da Tabela 1 evidencia que os artigos são em sua maioria de origem nacional, de idioma português, de natureza empírica e qualitativa. É importante destacar que os artigos se referem predominantemente ao contexto brasileiro (n = 28), tratando os outros de experiências no Uruguai e Chile (n = 2).
Acerca do ano de publicação, o período de identificação dos artigos foi de 1994-2013, tendo sido constatada maior produção no ano de 2007 (n = 5). Sugere-se que a maioria expressiva de publicação neste ano deva-se à recente publicação da Norma Técnica de Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes do Ministério da Saúde, em 2005, visto que a primeira edição se deu em 1999 e com esta já houve grande aumento de serviços de atendimento às mulheres vítimas de violência (Villela, & Lago, 2007).
Outro aspecto observado diz respeito à concentração de trabalhos por área e por autor que merecem atenção. Acerca do primeiro, observou-se que os estudos se concentram em sua maioria na área médica (n = 10), de saúde pública (n = 9) e de enfermagem (n = 6), tratando principalmente de questões relacionadas à assistência e ao atendimento às vítimas de violência sexual e às condutas dos profissionais de saúde no atendimento a essas. Em seguida aparecem as publicações na área da Psicologia (n = 4) e do Direito (n = 1). Apenas quatro artigos tiveram como área a Psicologia, tratando sobre a reorganização familiar de uma adolescente após experiência de gravidez decorrente de estupro; as discussões que se sucederam junto à rede que atendeu a família e criança que engravidou devido uma violência sexual; discussão acerca da violência sexual e saúde sexual e reprodutiva da mulher; e reflexão sobre aspectos sociais, éticos, religiosos e de saúde pública no atendimento a caso de abuso sexual.
Sobre as publicações por autor, observou-se existir estudos de um mesmo autor, apesar dos colaboradores poderem ser diferentes, que apontam para centros de estudos (grupos de pesquisa ou departamentos acadêmicos) e regiões onde estão se destacando produções nessa área temática de publicação. A exemplo disso verificou-se (n = 4) publicações do Centro de Pesquisas em Saúde Reprodutiva de Campinas - Cemicamp, Campinas (SP), Brasil (Bedone, & Faúndes, 2007; Faúndes et al., 2004; Faúndes, Rosas, Bedone, & Orozco, 2006; Faúndes, Simoneti, Duarte, & Andalaft-Neto, 2007); (n = 2) publicações do Departamento de Obstetrícia da Universidade Federal de São Paulo - Unifesp, São Paulo (SP), Brasil (Colas, Andalaft Neto, Rosas, Kater, & Pereira, 1994; Colas, Aquino, & Mattar, 2007); (n = 2) publicações do Departamento de Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Campinas (SP), Brasil (Higa, Mondaca, Reis, & Lopes, 2008; Higa, Reis, Lopes, 2007); e (n = 2) publicações do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, FM-UFMG, Belo Horizonte (MG), Brasil (Pires et al., 2009a;b).
Com base nos dados acima constatou-se uma predominância de produção nas áreas biomédicas e na região Sudeste do Brasil, o que evidencia a importância de ampliar os estudos para outras áreas e localidades. Também avançar nas subtemáticas que ainda são escassas, por exemplo, acerca das experiências das vítimas grávidas como consequência da VS. Observou-se que, num período de quase duas décadas (1994 a 2013), apenas foram localizados seis estudos que reportavam à questão referida, o que justifica a ampliação de pesquisas que também contemplem outros atores envolvidos na dinâmica da violência sexual, que não somente os serviços e os profissionais de saúde.
Por fim, os artigos foram submetidos a uma análise qualitativa, a qual gerou a definição de três categorias de análise conforme semelhanças temáticas trabalhadas pelos autores, a saber: 1) Serviços e protocolos de atendimento às vítimas de violência sexual (n = 12); 2) Conhecimentos, percepções e práticas dos profissionais de saúde diante de situações de violência sexual, aborto legal e aborto induzido (n = 12); e 3) Experiências de gravidez decorrente de estupro (n = 6). Os artigos foram classificados pelas temáticas principais que abordavam (objetivos principais), embora em muitos casos tenha se verificado que os artigos tocavam em mais de uma das categorias de análise que foram criadas.
Serviços e protocolos de atendimento às vítimas de violência sexual
A respeito desta categoria, verificou-se que os estudos se debruçaram em apresentar serviços e protocolos de atendimento às vítimas de VS existentes no território brasileiro, atentando-se em descrever rotinas, tratamento, funcionamento e outras questões que se reportam às dificuldades nesse processo. Esses programas e serviços possuem protocolos e fluxogramas específicos para as situações de VS e são norteados pela Norma Técnica para Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes, que teve sua primeira edição em 1999, pelo Ministério da Saúde (Barbosa, Dantas, Silva, & Silva, 2010; Bedone, & Faúndes, 2007; Colas et al., 1994; Drezett, 2003; Faria, Araújo, & Baptista, 2008; Faúndes et al., 2006; Higa et al. 2007;2008; Oliveira et al., 2005; Pires et al., 2009a;b; Villela, & Lago, 2007).
Um aspecto importante destacado nos estudos (Faria et al., 2008; Faúndes et al., 2006; Higa et al., 2007; Oliveira et al., 2005; Pires et al., 2009b) diz sobre a importância do acolhimento na chegada da vítima ao serviço de saúde, devendo esse acontecer com respeito, sensibilidade e solidariedade, além de que no ato do atendimento deve ser utilizada uma ficha única por todos os profissionais que atenderam a mulher, a fim de evitar a repetição das mesmas perguntas sobre a violência sofrida (Faúndes et al., 2006).
Acerca do tratamento de saúde, enfatizado em muitos estudos (Bedone & Faúndes, 2007; Faúndes et al., 2006; Higa et al., 2007; Oliveira et al., 2005; Pires et al., 2009a/2009b), pontuou-se que, na maioria das vezes, a porta de entrada das mulheres aos serviços de saúde se dá pelos prontos-socorros nos hospitais, de onde são encaminhadas para os serviços especializados que procederão com a assistência específica à mulher. No que se refere ao tratamento da vítima, destacou-se: os cuidados quanto à profilaxia de doenças sexualmente transmissíveis (DSTs) e gravidez indesejada; a realização de exames, como o exame físico que compõe provas para o sistema judicial e identifica lesões que requerem tratamento, além de outros exames complementares; as situações de gravidez, tendo a mulher o direito assegurado ao aborto; a assistência multiprofissional do serviço (medicina, enfermagem, psicologia e serviço social) e a interface com outros que necessitar, como das áreas policiais e judiciais (Faria et al., 2008; Higa et al., 2008; Pires et al., 2009b).
Outros estudos destacaram a diferença de fluxograma de atendimento às vítimas de VS, sendo um específico para os casos de ocorrência imediata ou remota sem gravidez e outro para os casos com gravidez decorrente da violência (Bedone, & Faúndes, 2007; Higa, et al., 2007; Pires et al., 2009b). A principal diferença entre estas duas situações diz respeito à ocorrência da gravidez. Na segunda situação, é um fato que requer um acompanhamento especial à vítima por ser de maior complexidade, visto as reações psicológicas e sociais que determina, se houver a interrupção ou a continuidade da gestação. Entende-se que a diferença nos fluxogramas deve existir visto as especificidades dos casos e necessidades mais emergentes, que suscitam outras demandas de atendimento, como quando há gravidez. Mas ambas as situações requerem acompanhamento especializado pela particularidade como cada mulher vivencia essa experiência e demanda assistência de diversas ordens.
Outro aspecto apresentado, desta vez nos estudos de Bedone e Faúndes (2007), Faria et al. (2008) e Higa et al. (2007), diz respeito à avaliação da equipe de saúde e outros responsáveis acerca das condições de cada caso que levará à realização ou não do aborto legal quando requerido pela mulher. Tais estudos pontuam que, apesar de a escolha ser da mulher, não é toda situação que evolui para um aborto, pois há a necessidade de ser avaliada anteriormente a consistência das informações fornecidas pela mulher aos diferentes profissionais que a atenderam. No entanto, é importante destacar se tal protocolo tem efetividade na prática, visto a dinâmica do atendimento às vítimas de VS e as próprias características do trabalho profissional.
Também o estudo de Colas et al. (1994), ao apresentar o primeiro serviço de atendimento às vítimas de VS no Brasil, destacou que o procedimento de aborto legal apenas era concedido às vítimas com idade gestacional até a 12ª semana. Quanto a isso, ressalta-se que por lei o aborto legal nos casos de violência sexual constitui em direito assegurado às vítimas até a 20ª ou 22ª semana de gestação e com o concepto pesando menos que 500 g. Tais achados apontam para a necessidade de mais articulação das leis referentes ao assunto à prática profissional.
Acerca das dificuldades no que se refere ao atendimento às vítimas, segundo alguns estudos elas dizem respeito à: carência de recursos humanos necessários e suficientes para atender a todo o conjunto de necessidades postas pelas vítimas; insuficiência dos serviços e a pouca divulgação dos mesmos; subnotificação do crime, visto que muitas mulheres não chegam aos serviços de saúde (Bedone, & Faúndes, 2007; Oliveira et al., 2005; Villela, & Lago, 2007).
Outro problema deve-se ao fato da temática violência sexual na rede de assistência à saúde ainda ser vista de forma atravessada pela equipe de profissionais, pois articula um tema (a violência), cuja interface com a saúde é de reconhecimento recente, "distante" da formação e prática profissional, além das questões de ordem moral, ética e religiosa envolvidas entorno da violação do corpo e da prática do aborto em se tratando de VS contra a mulher (Barbosa et al., 2010; Faúndes et al., 2006; Higa et al, 2007; Oliveira et al., 2005; Villela, & Lago, 2007).
Conhecimentos, percepções e práticas dos profissionais de saúde diante de situações de violência sexual, aborto legal e aborto induzido
A questão principal desta categoria é discutir os entraves pessoais/profissionais que aparecem no atendimento às vítimas de VS, os quais se constituem como um problema para intervenções continuadas e de qualidade principalmente quando o assunto se refere ao aborto legal. Tais entraves dizem respeito às condições dos profissionais de saúde nos seguintes âmbitos: do envolvimento pessoal, das crenças religiosas, da formação e conhecimento sobre o tema, da não violação ao Código de Ética profissional, do temor ao julgamento, e das situações de clandestinidade, agindo por vezes como impeditivos para a assistência adequada à vítima (Adriasola, 2013; Colas et al., 2007; De Zordo, 2012; Duarte, & Almeida, 2010; Farias, & Cavalcanti, 2012; Faúndes et al., 2004; 2007; Lunardi, & Simões, 2004; Selli, 2004; Soares, 2003; Vieira, 2012; Vieira, Padoin, & Landerdahl, 2009).
Acerca do aspecto Envolvimento Pessoal, alguns estudos destacaram que o profissional de saúde se sensibiliza com a situação de sofrimento da vítima, manifestando diversas reações, como indignação, revolta, raiva, pena, dentre outras (Lunardi, & Simões, 2004; Soares, 2003; Vieira et al., 2009). Contudo, alguns preferem preservar-se desse envolvimento por receio de misturar-se afetivamente com a situação e/ou com a mulher em situação de violência (Selli, 2004; Vieira et al., 2009). Tem a expectativa de que a mulher seja capaz de superar o sofrimento, ter o filho e o encaminhar para a adoção (Soares, 2003). Quando envolvidos em situação de aborto legal, sentem-se do mesmo modo comovidos pela situação da mulher, apresentando sensações que variam desde dor e pena até constrangimento e culpa, visto os conflitos, dilemas morais e éticos por parte de cada profissional (Lunardi, & Simões, 2004).
Sobre o item Religião, alguns estudos pontuaram que as questões morais/religiosas têm sido mais marcantes em situações em que se coloque em evidência a possibilidade ou a realização do abortamento por mulheres que engravidaram decorrente de estupro ou entre aquelas que o realizaram de forma ilegal (Farias, & Cavalcanti, 2012; Soares, 2003). Segundo esses autores para muitos dos profissionais que são contra o aborto nessas situações a razão principal é a concepção de que o abortamento é um crime, um pecado que produz culpa na mulher e no profissional que se comprometeu com o procedimento.
Também de acordo com os estudos de Adriasola (2013) e Farias e Cavalcanti (2012), há casos em que alguns profissionais fazem uso da objeção de consciência, permitida pelo código de ética, para justificar os motivos religiosos que repudiam o aborto legal. De acordo com Adriasola (2013), um profissional médico pode fazer uso da objeção de consciência, mas não deve se abster do cuidado médico antes e depois do procedimento à paciente. Além disso, é responsabilidade da instituição ter em seu quadro profissionais médicos que não façam objeção de consciência nesses casos de interrupção da gravidez e nas situações em que não contar com esses profissionais encaminhar a paciente para outra instituição. Segundo Colas et al. (2007) e Soares (2003), as conotações culturais e religiosas muitas vezes funcionam como fator de resistência, sobretudo, por causa da interrupção da gravidez e dificultam, muitas vezes, o posicionamento da equipe de saúde frente à prestação de uma assistência justa e humana a essas mulheres.
Acerca do aspecto Formação e Conhecimento, alguns estudos apresentaram em comum a falta de conhecimento por parte dos profissionais, principalmente de saúde, que atendem as vítimas de VS, acerca do tema da violência, do Aborto Legal e da Norma Técnica do MS que versa sobre Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes. Entre as fragilidades profissionais nessa área, há quem acredite erradamente ser preciso alvará judicial para praticar aborto previsto na Lei (Faúndes et al., 2004) e quem pense ser necessária a exigência da apresentação do boletim de ocorrência (BO) para a realização do aborto legal (Farias, & Cavalcanti, 2012). Também segundo De Zordo (2012), só uma minoria dos ginecologistas entrevistados sabia que, de acordo com as Normas Técnicas e com o Código de Ética médica, os médicos podem se recusar a realizar um aborto previsto em Lei só se tiverem um colega disponível a fazer o procedimento.
Tais dados comprovam que os profissionais desconhecem a Norma Técnica, bem como a legislação acerca do aborto legal, fato que é igualmente observado em outros estudos (Colas et al., 2007; Duarte, & Almeida, 2010; Vieira, 2012; Vieira et al., 2009). O despreparo para lidar com estas questões está relacionado, muitas vezes, à falta de capacitação e do consequente domínio de instrumental teórico e prático para tratar dos agravos resultantes da violência sexual, carências que vem antes mesmo da prática profissional, ainda na graduação (Farias, & Cavalcanti, 2012; Soares, 2003; Vieira et al., 2009).
Sobre o aspecto A não violação do Código de Ética Profissional, De Zordo (2012) e Farias e Cavalcanti (2012) apontaram para o receio principalmente dos(as) médicos(as) obstetras de descumprir o seu código de ética profissional ao participar da realização de um aborto legal. A incompatibilidade com a formação profissional retrata o dilema vivido pelos profissionais de saúde acerca da prática do aborto legal, pois, embora concordem que seus colegas de profissão realizem o aborto legal e reconheçam o direito das mulheres de acesso ao aborto legal, não se sentem confortáveis em realizá-lo devido à cultura da formação profissional. Além da natureza de sua formação profissional, outros fatores podem contribuir para o permanente dilema sofrido por parte significativa dos profissionais de saúde, com relação à prática do aborto, como o valor da vida e sua relação com os avanços tecnológicos, que permitem aos profissionais visualizar o embrião-feto em formação. A partir da 12ª semana, se formam os ossos e o feto começa a ter a aparência de uma criança, apontaram vários médicos.
Acerca do item O temor ao julgamento, estudos tais como os de Selli (2004) e Soares (2003) destacaram que quando se trata da realização do aborto, alguns profissionais temem ser julgados pela sociedade, serem tachados de "aborteiros" e incriminados, caso aceitem o pedido de praticar o aborto requerido pela mulher. O temor do médico é duplo: ele teme ser acusado, investigado e processado pela Justiça e, ainda, estar interrompendo uma gestação que, na realidade, não foi resultado de estupro. Ao contrário do aborto induzido, o aborto por estupro foi apontado como moralmente justificável na opinião da maioria dos profissionais de saúde entrevistados. Porém, muitos médicos se perguntavam: "e se elas mentirem?", o que expressa o descrédito à palavra da mulher e a desconfiança quanto à sua responsabilidade no estupro. Embora a maioria deles, segundo os estudos, não se definissem como praticantes de alguma religião e não considerassem o aborto um crime ou um pecado, essa incerteza e o medo de transgredir a Lei levava muitos médicos a se recusarem a realizar abortos legais (De Zordo, 2012; Soares, 2003).
Por último, sobre o fator Clandestinidade, alguns estudos pontuaram que durante muito tempo apenas a interrupção da gravidez por risco de morte da gestante era praticada nos hospitais, enquanto as mulheres vítimas de violência sexual recorriam ao aborto clandestino. Assim, muitas das mulheres que acabavam se sujeitando aos riscos dos abortos clandestinos poderiam cumprir as condições prévias para a prática do aborto previsto em lei (Faúndes et al., 2004;2007; Vieira, 2012). Também em outros estudos, destacou-se que alguns profissionais (quando entrevistados) apontaram em sua prática que as mulheres que o fazem ocupavam os leitos que deveriam ser reservados às mulheres grávidas, que elas ferem com a missão da obstetrícia que é salvar a vida ou cuidar dos fetos vivos, tendo esses uma atitude negativa em relação a essas mulheres, de esquecimento e demora no atendimento a elas (De Zordo, 2012; Duarte, & Almeida, 2010; Vieira, 2012).
Experiências de gravidez decorrente de estupro
Os artigos que abordam a discussão da experiência de engravidar decorrente de uma VS retratam questões muito importantes e pertinentes à situação de vida das vítimas nessa dimensão, tais como o silêncio da família e da própria mulher agredida em relação à violência, os aspectos positivos e negativos da vivência da maternidade e as experiências de atendimento a esses casos por parte dos profissionais de saúde. Entre os seis trabalhos analisados, verificou-se que três estudos se reportavam a vivências de VS e gestação em adolescentes (Cantelmo, Cavalcante & Costa, 2011; Drezett et al., 2011; González, Luengo, Caba, & Molina, 1999; Moura, Silveira, & Nogueira, 2001), dois em mulheres adultas (Vertamatti et al, 2009;) e um em criança (Santos, 2012).
Cantelmo et al. (2011), em seu estudo, retratam a experiência de abuso sexual sofrida por uma adolescente com consequente gravidez, destacando nessa vivência o silêncio diante da ocorrência da VS pela vítima e por sua família, que está relacionado a diversos fatores, como o de manter a ordem familiar e o de não abalar a relação e o amor pela filha. Também destaca o surgimento de uma maternidade vivenciada de forma positiva pela jovem, que ameniza os danos causados pela VS. A dedicação à maternidade, a ótima relação de apego e a forte ligação afetivo emocional possibilitaram novas sensações que destoam das advindas do abuso sexual.
Na experiência de outra adolescente, o desfecho foi diferente em relação à aceitação da criança e vivência satisfatória da maternidade, bem como seus familiares não tomaram conhecimento da violência nem da gestação até o momento da pesquisa. Moura et al. (2001) destacaram a experiência de uma adolescente que decidiu continuar a gravidez decorrente de estupro devido razões de cunho religioso da família, mas que, durante o período em que foi acompanhada, não apresentou sentimento de aceitação para com a criança. A não revelação da violência à família e consequentemente da gravidez fruto dela esteve associada ao temor da vítima frente às ameaças do agressor caso a violência fosse revelada.
Observa-se que essa experiência mostra outro modo de lidar com a gestação e a chegada de um bebê quando decorrente de VS, se diferenciando do observado no estudo realizado por Cantelmo et al. (2011) e aproximando-se mais dos aspectos observados por González et al. (1999) no que se refere à rejeição ao filho pela mãe adolescente.
González et al. (1999) realizaram um estudo com 203 adolescentes vítimas de VS que engravidaram, para comparar as variáveis pessoais e familiares que se associam à rejeição do filho nestas adolescentes em relação a outras que não sofreram a violência e viviam com seus parceiros. Sobre esse aspecto, ou seja, a atitude pelo filho ao nascer, 68,5% das adolescentes vítimas de VS rejeitaram versus 8,7% nos casos controle. Também os pais das primeiras rejeitaram mais a criança que os das segundas. Outro aspecto observado foi que os filhos têm maior probabilidade de serem rejeitados pelas mães e grupo familiar quando a violência sofrida foi do tipo intrafamiliar do que quando aconteceu fora desse contexto. Também eram entregues para a adoção com maior frequência do que quando a violência tinha sido extrafamiliar. Mesmo com a rejeição manifestada pelas mães adolescentes e por suas famílias, apenas 19% delas optaram por encaminhar o filho para a adoção (González et al., 1999).
Já outro estudo realizado com mulheres adultas (19-44 anos) apontou os motivos pelos quais para elas era preferível interromper a gestação resultante de VS, do que continuar e criar ou mesmo encaminhar para adoção (Drezett et al., 2011). Desta forma, ao se investigar entre essas mulheres os principais motivos para interromper uma gestação legalmente, elas referiram: o repúdio pela gravidez em 88,4% dos casos; o vínculo com a violência em 86,0%; a violação do direito da maternidade em 76,7%; e o temor de dano social - 44,2%; ou psicológico - 18,6% para a futura criança. Drezett et al. (2011) verificaram que, entre as mulheres que decidiram pelo aborto, não houve arrependimento e que a maioria delas referiu forte sentimento de alívio ao término do procedimento. Além disso, mais da metade das entrevistadas afirmou que não experimentou mudança ou interferência negativa nas relações pessoais com a família, parceiro sexual, religião, trabalho ou escola após o abortamento, exceto transtornos para a sexualidade em 65,8% dos casos.
Outro estudo retrata a experiência de uma mulher de 32 anos, grávida decorrente de VS (37ª semana gestacional) e a indicação do parto cesárea nesses casos, já que em geral a vítima não apresenta para o parto vaginal as condições emocionais e sociais tão importantes (desejo de ter o filho nos braços e a presença do cônjuge ou outra pessoa querida ao seu lado quando precisar, por exemplo) que amenizam a dor e o estresse do trabalho de parto vaginal, tornando, assim, o processo mais doloroso para essas mulheres (Vertamatti et al., 2009).
O último estudo apresenta a história de abuso sexual e gravidez de uma criança de 11 anos de idade (Santos, 2012). O caso mobilizou toda rede de assistência e sociedade, tendo-se criado dois grupos, um que apoiava a interrupção da gravidez, alegando os seguintes aspectos: a idade da vítima, a gestação que poderia ser de risco, a gravidez como advinda de uma violência, a situação de pobreza em que vivia a criança, seu despreparo para cuidar do filho, a falta de apoio da família de origem e o tempo médico limite para se realizar o aborto legal. E outro que se fortalecia em defesa da manutenção da gestação e vida do bebê (Santos, 2012). Ao final, a gestação não foi interrompida, mas se destacaram no estudo os discursos profissionais/institucionais imbuídos de verdades pessoais, disputando o saber que deveria prevalecer na condução do desfecho desse caso.
Os estudos apresentam vivências tanto de continuidade da gestação como de interrupção desta, retratando experiências diferentes que dizem sobre formas tidas pelas vítimas de lidar e enfrentar uma situação de gravidez decorrente de VS, possibilitando uma compreensão deste fenômeno mais ampla, livre de conceitos prévios, tão importante no manejo do atendimento a essas mulheres (Cantelmo et al., 2011; Drezett et al., 2011; González et al., 1999; Moura et al., 2001; Santos, 2012; Vertamatti et al., 2009).
Considerações finais
Este estudo teve como objetivo mapear os estudos existentes sobre o desfecho da gestação de mulheres que engravidaram como resultado de violência sexual e descrever quais aspectos são ressaltados nos artigos em relação a essas experiências de desfecho. Com esse propósito, realizou-se tanto uma análise quantitativa quanto qualitativa dos artigos, evidenciando-se que, em sua maioria, são de característica nacional, idioma português, natureza empírica e qualitativa. Além disso, foram encontrados eminentemente artigos da área médica e de saúde pública, em que são referidas questões acerca do atendimento e do funcionamento dos serviços, carecendo de mais ênfase nos aspectos psicológicos que estão presentes nas vivências das mulheres, sugerindo-se mais publicações na área da Psicologia.
A análise qualitativa dos estudos possibilitou a identificação de três categorias: 1) Serviços e protocolos de atendimento às vítimas de violência sexual; 2) Conhecimento, percepções e práticas dos profissionais de saúde diante de situações de violência sexual, aborto legal e aborto induzido; e 3) Experiências de gravidez decorrente de estupro.
Acerca dos serviços de atendimento às vítimas, estes aumentaram desde que o MS criou a Norma Técnica de Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes, em 1999, mas ainda se faz necessária a criação de mais serviços, visto que não atende toda demanda advinda da VS. Sobre os profissionais, estes precisam avançar em termos do conhecimento acerca da Norma Técnica e da legislação acerca do aborto legal. Também é importante refletirem a respeito de seus credos, crenças e valores pessoais a fim de não comprometerem com suas opiniões o desenrolar do atendimento às vítimas de VS, principalmente nos casos de interrupção da gestação.
As experiências de gravidez decorrente de estupro revelam uma diversidade de vivências, envolvendo diversos atores, a vítima, o agressor, a família, a rede de atendimento, entre outros. A vivência da violência por si só já acarreta diversos comprometimentos a níveis de saúde mental e física, relacionamentos sociais e prejuízos dos projetos de vida, ainda mais quando a vítima descobre estar grávida. No entanto, não se tratam de experiências generalistas; ao contrário, os estudos mostraram também que a história pode caminhar para desfechos surpreendentes, de ressignificações positivas por parte das mulheres.
Ainda são muitos os entraves para que a política de atenção às vítimas se concretize segundo as orientações da Norma Técnica, apesar do conhecimento desta verificado pelos serviços nos artigos. A violência Sexual parece ser um tema ainda de pouca familiaridade por parte dos profissionais de saúde, aparentemente não aparecendo como um problema de saúde púbica. Soma-se a isso as questões pessoais contrárias à VS, gestação ou aborto legal que agem negativamente no atendimento às vítimas.
Ao contrário disso, a assistência a esses casos deve começar em nível de atenção primária, atentando-se para atividades preventivas de conhecimento dessa temática à população a fim de que essas mulheres também possam ser assistidas desde o começo, evitando problemas futuros ou quando já dada à situação de gravidez possam ter a autonomia de decidir o desfecho. É fundamental que o acompanhamento seja continuado e não pontual nos serviços de saúde.
Considera-se importante em outros estudos ampliar a análise de artigos internacionais, visto que neste optou-se por usar somente o idioma português para os descritores e bases de dados que estão mais próximas de produções nacionais, tendo com isso alcançado um número tímido de publicações em outros idiomas. Apesar dessa limitação do estudo, ressalta-se a riqueza de conteúdos encontradas na leitura e análise dos artigos sobre as experiências de interrupção ou de continuidade da gestação reforçadas neste trabalho dada a extrema necessidade de se abordar essa temática. Também a ênfase voltada aos profissionais acerca da natureza complexa/polêmica do tema em questão que puderam ser contemplados nesta pesquisa. Ademais reitera-se a importância do desenvolvimento de mais pesquisas acerca das experiências das vítimas de VS que engravidaram a fim de que sejam avaliados outros aspectos (situação de vida, relação mãe/filho nos casos de continuidade, saúde mental da vítima, repercussões sociais e familiares, entre outros), por exemplo, a partir de um estudo de seguimento longitudinal das vítimas após a decisão. Também são importantes estudos de avaliação do atendimento por elas recebido ou pesquisas com as mulheres que abandonaram os serviços, a fim de proporcionar maior compreensão sobre suas experiências e, consequentemente, promover melhorias nas políticas de saúde, sobretudo aquelas direcionadas à gravidez advinda de estupro.
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Endereço para correspondência:
Mykaella Cristina Antunes Nunes
mykaellanunes@hotmail.com
Normanda Araujo de Morais
normandaaraujo@gmail.com
Submetido em: 29/06/2015
Revisto em: 14/03/2017
Aceito em: 03/04/2017