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Arquivos Brasileiros de Psicologia
versão On-line ISSN 1809-5267
Arq. bras. psicol. vol.70 no.spe Rio de Janeiro 2018
ARTIGOS
Educação infantil, controle social e resiliência... infância como produção subjetiva
Child education, social control and resilience... the childhood as subjective production
Educación infantil, control social y resiliencia... infancia como producción subjetiva
Késia Pereira de Matos D'Almeida
Docente. Creche. Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ). Prefeitura Municipal de São Gonçalo. Niterói. Estado do Rio de Janeiro. Brasil
RESUMO
Este artigo objetiva colocar em análise o direito à Educação Infantil como um dos direitos incorporados às políticas públicas brasileiras para a Infância. A complexidade evidencia-se nas práticas cotidianas de muitas instituições, nas quais se ratifica que promulgações das leis por si só não garantem o direito nem modificam práticas afirmadas, promovendo processos de subjetivação e formando condutas resilientes. Imergirmos nas práticas de institucionalização de crianças, estabelecendo relações entre os campos de saber, tipos de normatividade e formas de subjetividade. Entendemos como desafio a criação de espaços de discussão que possam perceber como potência o que é visto como ausência no outro. Ressignificar as práticas educativas, propiciando situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada, fugindo dos ditames da organização social, redimensionando-a enquanto fluxo de resistências na sociedade de controle.
Palavras-chave: Educação; Infância; Controle e Resiliência.
ABSTRACT
This article aims to analyze the right to early childhood education as one of the rights incorporated into Brazilian public policies for children. Complexity is evident in the day-to-day practices of many institutions, in which it is confirmed that promulgations of laws alone do not guarantee the right nor modify established practices, promoting processes of subjectivation and forming resilient behaviors. We immerse ourselves in the practices of institutionalizing children, establishing relationships between the fields of knowledge, types of normativity and forms of subjectivity. We understand as a challenge the creation of spaces of discussion that can perceive as potency what is seen as absence in the other. It is important to re-signify educational practices, providing care situations, games and guided learning in an integrated way, avoiding the dictates of social organization, resizing it as a flow of resistance in the control society.
Keywords: Education; Childhood; Control and Resilience.
RESUMEN
Este artículo objetiva poner en análisis el derecho a la Educación Infantil como uno de los derechos incorporado a las políticas públicas brasileñas para la Infancia. La complejidad se evidencia en las prácticas cotidianas de muchas instituciones, en las cuales se ratifica que las promulgaciones de las leyes por sí solas no garantizan el derecho ni modifican prácticas afirmadas, promoviendo procesos de subjetivación y formando conductas resilientes. En las prácticas de institucionalización de los niños, establecemos relaciones entre los campos de saber, tipos de normatividad y formas de subjetividad. Entendemos como desafío la creación de espacios de discusión que puedan percibir como potencia lo que es visto como ausencia en el otro. Resignificar las prácticas educativas, propiciando situaciones de cuidados, juegos y aprendizajes orientados de forma integrada, huyendo de los dictámenes de la organización social, redimensionándola como flujo de resistencias en la sociedad de control.
Palabras clave: Educación; Infancia; Control y Resiliencia.
O caminho inicial da análise
No contexto da Educação Infantil, consideramos como desafio imergir nas ações que caminham pela vertente de institucionalização de crianças cada vez mais jovens, colocando em discussão as normatizações e normalizações imbricadas no processo de escolarização da infância. Questionamos: todo mundo tem que estar na escola em nome do direito, mas como se dá o direito na prática para além da legislação? O que produz a escola? Em que contexto se produz a escola? Que criança é produzida com um processo de escolarização/institucionalização sustentado na norma jurídica? Que racionalidade fundamenta a garantia do direito à Educação Infantil? E ainda: para que estamos escolarizando crianças desde a tenra idade? Interrogações consideradas fundantes para a discussão que se pretende à medida que a Educação Infantil não é tida como possibilidade, mas como ordem, regulamentando por meio da lei certa subjetividade.
O objetivo, porém, não é estabelecer uma avaliação entre certo e errado, entre o melhor e pior, pois acreditamos que diferentes elementos são constitutivos das realidades em suas múltiplas apresentações. Entretanto, foi preciso desviar das armadilhas determinadas pelo imediatismo atual, pela flexibilização, pelas exigências da globalização, colocando em análise os saberes, as concepções, as verdades, os juízos de valor, as teorias, o especialismo, o próprio lugar de saber-poder.
É necessário "estranhar" as questões que se apresentam como verdades instituídas, à medida que, segundo Scheinvar (2009, p. 168):
[...] a "infantilização" da criança [...] e a localização da escola como espaço de aquisição de conhecimentos e de formação cidadã, são entendidas como produções articuladas através do conceito de proteção que, em um processo de desnaturalização, revelam-se como dispositivos de controle cujos efeitos estão incorporados nas estratégias de governo.
O direito que institucionaliza acaba aprisionando as resistências, acomoda e modela, tentando inibi-las. Segundo Passetti (2003), as normas instituem-se com objetivo específico: estabelecer um equilíbrio, um convívio manso, no qual os indivíduos respondem com docilidade a uma posição de controle e às práticas ditas normais. É um cuidado para controlar condutas, por meio de uma vigilância discursiva que promove informações e concepções, administrando e contendo as resistências. Governa-se acreditando no sujeito capaz de participar de forma controlada e controladora, vigilante e vigiado.
O direito à Educação Infantil - primeira etapa da Educação Básica -, garantido na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB (Lei n° 9.394/1996), é estabelecido como uma demanda popular, à medida que as mulheres se inseriram significativamente no mercado de trabalho, prevalecendo o sentido de guardar as crianças.
A atual Constituição Federal de 1988 (Brasil, 1988) e as emendas constitucionais institucionalizaram a Educação Infantil como forma de escolarização. Esta é a tensão própria do debate que se coloca para a área, visto a maior defesa para assumir a Educação Infantil como etapa de educação estabelece-se sobre dois referenciais. O primeiro é a ideia do estabelecimento normativo de espaços voltados ao atendimento e acolhimento da primeira infância a partir de referenciais educacionais e legais e o segundo, compreende a garantia a esta etapa de educação como direito da criança, sendo ambos entendidos como avanço.
Colocamos em análise tal compreensão, visto que estas deliberações permitem como contraproposta a transformação do direito em obrigação, voltando-se à escolarização e ensino, assim como à institucionalização crescente de crianças cada vez mais jovens. Do mesmo modo, a criança acaba entendida como indivíduo público tornando-se propriedade compartilhada por todos, dispondo de seus corpos, saberes, desejos, virtualidades, devires.
Educação Infantil: direito e obrigação como referenciais de ação
A infância é uma construção discursiva da Era Moderna e sua visibilidade se dá pela propagação dos discursos. Intensificam-se os enunciados sobre a infância e as verdades sobre o que é próprio a esta etapa de desenvolvimento nos campos do comportamento, da ação e da linguagem. Decorrem do universo infantil categorizações, normatizações e classificações, por ser este um objeto de exercício de poder, cuja prática é pautada em olhares particulares, dando ênfase aos cuidados diferenciados nesta etapa da vida, apesar de inespecífica em relação aos períodos que compreende. Faixas etárias são definidas e reagrupadas de forma constante, tendo por base modelos comportamentais, aos que correspondem espaços normalizadores, nos mais diversos formatos, tais como o escolar, o recreativo, o religioso, entre outros. Estabelecem-se normas em torno do crescimento e do desenvolvimento infantil "salutar", bem como das ações voltadas à formação de cidadãos do mundo moderno.
A infância como objeto de controle, como prática discursiva, assim como ocorre com as práticas pedagógicas, em particular escolares, adota formas e concepções diversas. Rastreá-las é uma maneira de fazer emergir os fundamentos de sua forma contemporânea que, no Brasil, se inscreve em códigos legais sustentados na noção de direitos sociais.
No Brasil, a partir da década de 1980, após 21 anos de ditadura civil militar, com a ação de movimentos sociais o caráter educacional das instituições de Educação Infantil é discutido e questões como a ação compensatória das pré-escolas e a precária situação de atendimento à infância entram em pauta visando redefinir a função e os objetivos da educação da infância.
Assim sendo, de acordo com Kuhlmann Junior (1998), nessa década iniciam-se, a partir da mobilização da sociedade através de diferentes movimentos sociais dos mais variados segmentos (feminista, fabril, entre outros), as reflexões acerca de uma política voltada para infância. O ideal de acesso igualitário à Educação Infantil prevalece, deixando o conteúdo dessa forma de educação como um aspecto singular e não inerente ao próprio acesso. Acesso e direito passam a vigorar como palavras de ordem, deixando em segundo plano os conteúdos pedagógicos de tal demanda.
A Constituição Federal de 1988 estabelece a Educação Infantil como direito da criança, dever do Estado e uma opção da família, ampliando "a maneira pela qual se tentou, desde o século XVIII, racionalizar os problemas propostos à prática governamental, pelos fenômenos próprios a um conjunto de seres vivos constituídos em população: saúde, higiene, natalidade, raças..., a biopolítica" (Foucault, 2008, p. 89).
Desde então, a Educação Infantil tem sido alvo de muitas normatizações e subsequentemente discussões e debates em torno das consequências que as decisões encaminhadas pelas deliberações legais vêm trazendo para a área.
A Educação Infantil encontra-se "abarcada" e reconhecida como primeira etapa da Educação Básica, incluída no mundo dos direitos. Entretanto, é preciso questionar: que direito é esse? Quais as condições necessárias para o exercício do direito? Ou ainda, como coloca Foucault (1997, p. 89), "num sistema preocupado com o respeito aos sujeitos de direito e à liberdade de iniciativa dos indivíduos, como será que o fenômeno 'população', com seus efeitos e seus problemas específicos, pode ser levado em conta?".
Ficamos, então, com a questão: para onde caminhou a Educação Infantil nesse contexto? Ao estabelecermos a relação entre abrangência do discurso legal sobre as práticas pedagógicas e a difusão quantitativa de atendimento das crianças de zero a cinco anos, constatamos que este último se mostrou insuficiente para atender a demanda. As formas de funcionamento, em grande parte, são duvidosas tanto no âmbito estrutural, com lugares próprios e voltados a esse atendimento, quanto no âmbito de garantia dos direitos a igualdade, proteção, ao fazer infantil, dentre outros. Formam-se novos enunciados, mas não há uma ruptura dos conceitos historicamente produzidos e afirmados.
Os discursos voltaram seu foco para a garantia dos direitos sociais e individuais, mas o que se verifica é a prática de um cenário abarrotado de incoerências: se por um lado deparamo-nos com a propagação do discurso acerca da conquista de direitos a partir da Constituição Federal de 1988, por outro comprovamos no exercício diário um conjunto de determinações que se firmam apenas no aspecto legal e não na garantia efetiva do direito propriamente dito.
A escolarização cada vez mais precoce das crianças vem balizada em discursos referentes ao respeito às diferenças, ao processo de desenvolvimento e suas etapas específicas, aos princípios éticos, estéticos e políticos. Contudo, nas ações cotidianas observamos que tais pressupostos vão dissipando-se em práticas e determinações - normativas ou não - homogêneas. Outro aspecto relevante é a propagação do discurso sobre o respeito aos princípios: éticos da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum; políticos, dos direitos e deveres de cidadania, do exercício da criticidade e do respeito à ordem democrática e estéticos, da sensibilidade, da criatividade, da ludicidade e da diversidade de manifestações artísticas e culturais. Os mesmos também acabam gerando uma adequação das práticas às regras sociais neoliberais, ao situar a educação como mecanismo para que as crianças sejam moldadas e enquadradas, acolhendo as demandas de eficiência. Igualmente propaga o conceito de educação etapista e disciplinadora. Os textos legais e sua propagação também não garantem que práticas efetivamente profícuas sejam implantadas para que toda população de infantis, entre zero e cinco anos, tenha o exercício de seu direito à educação garantido, a partir de uma nova racionalidade.
A problematização de escola como controle e mecanismo de exclusão nas instâncias que se propõe a atuar está ligada, entre muitos atravessamentos, às práticas modeladoras e de enquadramento disciplinar. Rótulos, moldes, determinação, paradigma, entre outros, devem ser perseguidos e agrupados, enquadrando protótipos pré-determinados. Abrir portas, apagar as luzes, abrir caixas, respeitar o limite, seguir regras e lógicas, adaptar-se... Permanentemente: repetir comportamentos e falas, reproduzir e produzir julgamentos, sofrer e aplicar punições, identificar as adversidades e enfrentá-las, adaptando-se para superá-las.
A pedagogia escolar, muitas vezes, devassa condutas e estabelece estratégias de e para vigilância constante e também para adequação. Espaço, desejo, tempo, corpo são controlados através de mecanismos de submissão, manutenção e adaptação do que é tido como bom, correto, ideal e aceitável.
O discurso sobre a garantia dos direitos sociais e individuais das crianças racionalizou, justificou e estabeleceu regimes de verdade sobre a necessidade premente de leis e normas no campo da educação da infância. Como base da pirâmide que se constrói propaga-se a necessidade de assegurar e garantir o desenvolvimento integral da criança, governando corpos e capturando suas resistências, além de protegê-la das adversidades que podem ser propiciadas por suas famílias.
O panorama da Educação Infantil aponta para um cenário que - nas ações políticas e sociais direcionadas à infância o que também significa à sua educação - desconsidera, em muitos sentidos, as múltiplas infâncias que povoam a realidade brasileira, a produção de outras lógicas e os movimentos de resistência que também são produzidos nestes espaços, promovendo em muitos casos ajustes comportamentais e desenvolvimentistas, formando comportamentos resilientes, adaptados às exigências e lógicas existentes.
Exige-se de crianças e famílias - sob preceitos de liberdade, direito, proteção, prevenção e participação - a adequação, adaptação, comportamentos, etapas, desenvolvimento, dentre outros, configurados pelo controle e capturados pelas normas.
Resiliência e Educação Infantil
A lógica que estrutura a política da Educação Infantil pode ser colocada em análise pelo conceito de resiliência, com o qual adaptação, adequação, conformidade e flexibilidade tornam-se fundantes para o processo de escolarização desde a primeira etapa da Educação Básica.
As práticas em Educação Infantil no Brasil estão imersas em inúmeras tensões intrínsecas ao processo de reconhecimento e legalização desta etapa de educação como vimos anteriormente. Práticas de cuidar e educar; ação complementar, normalizações, padrões, obrigatoriedade, dentre outras normatizações fazem parte deste contexto e sobrecarregam o cenário que se configurou no cotidiano da educação da criança de zero a cinco anos de idade. A ampliação do acesso à Educação Infantil como etapa escolar e os paradoxos trazidos pelos dispositivos de controle da sociedade liberal amplamente propagado pela nova diretriz da obrigatoriedade deste segmento ilustram com precisão os atravessamentos que compõem o panorama brasileiro.
Ao nos envolvermos com as temáticas sobre a Educação Infantil e as ações que caminham pela vertente da institucionalização de crianças desde a tenra idade nos deparamos com produções de espaços temporais que enquadram e tendem a padronizações seguindo modelos industriais de décadas passadas, configurando a discussão sobre as normatizações e normalizações imbricadas no processo de escolarização. Propaga-se nacionalmente um discurso voltado à constituição de escola adequada e dos padrões de normalidade desenhados a priori. No entanto, o que seria uma escola adequada e dita normal? Segundo a concepção apresentada por Portocarrero (2004, p. 177-8) uma escola normal é uma escola na qual
[...] se ensina a ensinar, é onde se instituem experimentalmente métodos pedagógicos normalizados e normalizadores. A normalização dos meios técnicos da educação - como dos da saúde, do transporte de pessoas e de mercadorias - é a expressão de exigências coletivas.
Exigências estas vivenciadas frequentemente no cotidiano das instituições voltadas à educação da infância de forma cada vez mais astuciosa.
Tendo como base a adequação e adesão das crianças e suas famílias aos novos parâmetros e normas da Educação Infantil, conceitos e concepções vão somando-se aos preceitos existentes e vão se configurando ardilosamente nas práticas diárias, como ocorre com o conceito de resiliência.
Na educação este conceito vem ganhando força nas últimas décadas, reconfigurando as práticas educacionais da sociedade disciplinar:
[...] há um deslocamento atual que merece atenção diante do redimensionamento dos efeitos de técnicas de governamentalização em simultâneo acoplamento a uma tecnologia de poder articulada pela resiliência e que se inicia, em seus baixos começos, a partir da formação de crianças e jovens resilientes (Oliveira, 2012, p. 108).
Mas o que é ser resiliente? No que está balizado? Questionamentos importantes para a compreensão das atuais normativas da Educação Infantil. Segundo Oliveira (2012, p. 106-107):
A etimogia da palavra resiliência provém do latim (resilio), no qual situa-se como verbo (re+salio), designando voltar atrás, ou saltar para trás, recuar, retirar-se sobre si mesmo, desdizer-se, encolher-se, distender-se. [...] a palavra resílio é um dos termos atuais, também, recorrentes para intitular investimentos que valorizam a resiliência como conceito-chave para a gestão de pessoas voltada aos gerenciamentos de crise, superação de stress no ambiente de trabalho, contudo não restritos a ele. [...] investe-se, em variados espaços, no resílio otimizador de capacidades que buscam encontrar sua adequação adaptativa na resiliência, superando, contornando as denominadas vulnerabilidades. O resílio empreendedor "de gente", transmutando os ranços do desempenho, da competência em performance eficiente.
Originalmente resiliência compreendia uma terminologia utilizada pela Física e pelas áreas consideradas exatas a fim classificar e medir a capacidade de elasticidade, força e alteração inconstantes dos materiais estudados. Esta medição ocorre em virtude de os mesmos serem passíveis de adaptar, ajustar e resistir suas características iniciais às deformações que sofrem. Posteriormente, a partir da década de 1980, esta terminologia passou a ser utilizada pela Psicologia que, partindo do princípio empregado pelas áreas exatas instituiu o termo resiliência psicológica.
A Psicologia aproveitou o termo para medir a capacidade das pessoas superarem as frustrações cotidianas em qualquer nível, bem como sua possibilidade de recuperação emocional. Desta forma - assim como a Física avalia a capacidade de adaptação dos objetos às adversidades - a Psicologia também passa a classificar e avaliar a aptidão humana quanto ao seu preparo para suportar as desventuras da vida. Quanto mais resiliente mais capacidade adaptativa se tem. Resiliência humana segundo os preceitos da Psicologia compreende então a habilidade de contrapor os desafios e problemas que se apresentam cotidianamente, reagindo de maneira flexível, positiva, eficaz, eficiente, dinâmica e equilibrada. De tal modo, adaptar-se ao cotidiano prevê antes de tudo uma capacidade de superação ativa e efetiva, aceitando o novo, a mudança, ao outro e mantendo o foco de suas ações, interesses e objetivos. Com efeito, "disseminando a normalização da conduta monitorada, redimensionando o amor à obediência pela adesão à participação e esquecimento proposital das possibilidades de resistir" (Passetti, 2011, p. 47).
Contudo, segundo alguns estudos em diferentes áreas, embora a conjuntura brasileira esteja repleta de adversidades, algumas ações consideradas resilientes estão na realidade em outro nível. Este contraponto se dá à medida que, para a educação, a ação resiliente não é apenas aquela que afronta a qualquer custo as adversidades, mas a que acontece positivamente, de forma que mesmo diante de situações-problema a pessoa amplia sua forma de ver e avança autonomamente. Assim sendo, nem toda defesa psicológica ou cultural é efetivamente uma capacidade resiliente da pessoa.
Nesta perspectiva, os padrões classificatórios se aperfeiçoam e nem todo discurso de enfrentamento à adversidade, às resistências ou à inclusão em grupos é considerado ação resiliente. O conceito de resiliência não é mais difundido ou mesmo construído com base em um comportamento inerente ao indivíduo universalmente, pautando-se em conduta circunscrita à prática educacional travestida por políticas sociais com ênfase na ideia de proteção e segurança voltada à criança (Oliveira, 2012).
Sob estas bases, a resiliência na educação é entendida como a possibilidade de vivências relacionais ditas salutares e este comportamento é visto como possível desde a mais tenra idade. Segundo o boletim eletrônico n° 146 de julho de 2012 do Núcleo de Sociabilidade Libertária do Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP (Nu-Sol), o termo resiliência:
[...] também designa voltar atrás, em suas projeções e metas para a restauração do governo do vivo em suas variações contínuas, com o apoio político das verdades científicas e implantadas com a força da chamada "vontade política", dos Estados e da sociedade civil organizada (Boletim Hypomnemata, 2012, p. 01).
O que mantém a ideia necessária de flexibilidade e o ajuste permanente às demandas globais.
Entretanto, a resiliência não se faz presente em todos os momentos da vida, sendo necessário constituir mecanismos internos e externos sistematicamente que deem conta das antagônicas condições sociais existentes. Com esta configuração, a visão salvacionista da educação permanece ativa segundo esta lógica, sendo defendido que as crianças vivenciem situações desafiadoras desde a Educação Infantil para favorecer o desenvolvimento de sua resiliência e desta maneira passem a ser capaz de enfrentar as adversidades cotidianas, à medida que comportamentos resilientes não são inatos, mas desenvolvido de forma sequencial e gradativa como organismos de proteção. Entretanto é necessário questionar: Os comportamentos tidos como resilientes não seriam comportamentos assujeitados? Não seriam comportamentos prontos a aderir à lógica liberal que prega que somos o que queremos ser?
No contexto da norma e do que é dito normal, Portocarrero (2004, p. 1-2) nos ajuda a aprofundar nossas indagações ao trazer para o debate as considerações feitas por Foucault.
O pensamento de Foucault permite tomar as noções de norma e de normalização como conceitos operatórios para pensar e ver de outras maneiras, para pensar historicamente e circunscrever acontecimentos singulares - referentes à instituição escolar e relações de poder específicas - ao mesmo tempo que ajuda a tornar visíveis certas circunstâncias atuais e a pensar, também, o que estamos fazendo hoje em nossa sociedade.[...] Foucault estuda a constituição, a partir do século XVIII, de saberes e práticas que ordenam as multiplicidades humanas e objetivam o sujeito, individualizando-o e homogeneizando as diferenças através da disciplina e da normalização - práticas de divisão do sujeito em seu interior e em relação aos outros. Trata-se de saberes e práticas que atingem a realidade mais concreta do indivíduo, seu corpo, e que, devido à sua estratégia de expansão por toda a população, funcionam como procedimentos abrangentes de inclusão e exclusão social, que constituem um processo de dominação [...].
De tal modo, tais questionamentos são necessários, visto que na lógica resiliente a resistência não é por si só resistência. É necessário adaptar-se, ajustar-se, enquadrar-se, mantendo o equilíbrio, o padrão, a positividade permanentemente. É necessário resistir, mas um resistir modelar; um resistir moldado a comportamentos entendidos como bons, ideais, criativos; um resistir capturado. E na Educação Infantil esta expectativa é complementada pela ênfase na relevância de práticas pedagógicas que considerem diferentes linguagens como: música, escrita, corpo e movimento, matemática, ciências, dentre outras - incluindo crianças e adultos nesse cenário - desde que capturados pelos padrões de repostas, comportamentos e etapas corretas e próprias, deste ou daquele comportamento.
A proeminência de processos interativos na infância vem impregnada de discursos pautados na necessidade latente de resiliência, através da constituição de espaços considerados ideais e de qualidade. Igualmente investem-se na preparação e formação de crianças capazes de responder de modo disciplinado, autônomo, cordial e flexível as demandas impostas pela conjuntura social e ainda resiliente, talvez acima de tudo, pois serão capazes de se adaptar às adversidades que porventura tenham ao longo de seu desenvolvimento.
Na perspectiva da resiliência e de sua conformação nos ambientes escolares, por meio de práticas pedagógicas cada vez mais eficazes, comportamentos resilientes são desempenhados de forma adaptável às situações que se apresentam. Dobram-se frente às demandas considerando-as em sua positividade. De caráter autônomo, o resiliente é aquele que ultrapassa as rotinas adversas, contudo não questiona sua existência, as lógicas que as atravessa ou as microrrelações que se estabelecem. Assujeitados seguem resilientes seu caminho em busca de um "lugar ao sol", emanando a crença de que somos capazes de vencer as adversidades nos adaptando e respondendo com eficiência o que a sociedade e seu modo de produção capitalista nos pedem, sendo possível ser o que queremos ser. Desta forma, a escola investe cada vez mais no discurso de uma prática pedagógica que busque desenvolver as habilidades e as competências infantis através de testagens, de modo que suas potencialidades sejam trabalhadas em prol de um ajustamento consensual às modelações presentes e exigidas cotidianamente. Segundo Dias (2011, p. 40),
[...] o conceito de competência, na perspectiva dos estudos psicométricos, alude ao acúmulo qualitativo de habilidades que podem, ou não, levar o indivíduo à maestria. A noção de habilidade indica a facilidade que um indivíduo tem em lidar com o processo de aquisição de informação.
Obviamente podemos considerar que, nesta perspectiva, comportamentos de resistência aleatórios ao que está sendo demandado não são entendidos como processos resilientes, à medida que resiliente só é aquele que de jeito passivo e conformado associa suas ações às relações cotidianas pacificadas e assujeitadas.
A resiliência atende à demanda da sociedade flexível, que, segundo Sennett (2003), se encontra em oposição ao tempo rotineiro e exige do indivíduo a capacidade de dobrar-se à mudança, e ser capaz de não se apegar ao que constrói, trazendo à tona a ampliação da fragmentação, criando estruturas de poder e controle que se fundam nas micro e macropolíticas. O controle constante, a inclusão em padrões, a modelação, a propagação de discursos acaba produzindo verdades que não são questionadas. Oliveira (2012, p. 106) afirma que:
Está-se diante hoje da propalação política da resiliência e seus efeitos distendidos dos apaziguamentos de confrontos como conceito, como prática, como gestos muito ordinários, mínimos mesmo, neste nivelamento, neste revestimento de mil vestes que encontram seu nome justo e justificado na proliferação de direitos em camadas justapostas de uma concha protetora, conservadora. Não há pérola alguma surpreendente a sair desta ostra. Apenas ávidos negociadores que, dependendo da circunstância, explicitam seu desejo de dizimação, como proto-algozes de seu duplo inerente enquanto condição de assujeitados pelo conceito de vítima indissociável da própria resiliência. E o que se cultiva e se forma são plasticidades amorfas, repletas de formas e formas moldáveis e moduláveis, que se dilatam, encolhem e se recolhem, distendem-se, absorvem, distendem-se, acomodam, dissimulam e se conformam como bolhas elásticas que são. Resiliências e o que, e quem, elas produzem não suportam fissuras.
E a Educação Infantil está cada vez mais atravessada pelas exigências resilientes e condutas flexíveis, ajustadas, conformadas, modeladas. Contudo, as ponderações que nos propomos, propiciam algumas ideias, o levantamento de algumas hipóteses e o questionamento de verdades, por não serem fixas, estáveis e inquestionáveis, mas por reunirem a pluralidade de significados, a diversidade das experiências, a discussão de possibilidades, as perspectivas da educação, da pesquisa, da escola, do indivíduo, do coletivo, do Ser Humano e, em particular, da infância.
O caminho traçado para a Educação Infantil é longo e fértil em termos do processo de disciplinarização e controle, mas também em ações tidas como não resilientes. Práticas de resistência e potência. Deleuze, em um diálogo com Foucault (1993, p. 41), afirma que:
A prática é um conjunto de revezamentos de uma teoria a outra e a teoria um revezamento de uma prática a outra. Nenhuma teoria pode se desenvolver sem encontrar uma espécie de muro e é preciso a prática para atravessar o muro.
O que precisamos pensar e colocar em análise então no âmbito da Educação Infantil é o fazer que responda à questão posta por Foucault: O que estamos fazendo de nós mesmos? Inspirados nela podemos nos perguntar, no campo da análise deste artigo: Que outras práticas são possíveis para além da resiliência e práticas de sujeição?
Direito à Educação Infantil e controle social: (in) conclusões
A complexidade da Educação Infantil evidencia-se nas práticas cotidianas das instituições voltadas a esse serviço, que testemunham que promulgações de leis, por si só, não garantem o direito nem modificam práticas afirmadas. Embora compreendida atualmente no campo do direito, o que se experimenta na institucionalização da Educação Infantil são práticas paradoxais, como a garantia do direito a esta etapa da educação. Esta é a lógica da norma, sustentada no direito, que determina o dever que tem que ser cumprido. As crianças e sua educação também são atravessadas pelo direito no mundo modelar instituído pela sociedade de controle, à medida que se inclui os excluídos em modelos aceitáveis, consagrando a todos como participantes ativos do próprio controle, enquadrados na sociedade de plenos direitos (Passetti, 2003).
Constata-se nas práticas políticas e sociais, em relação à infância e a educação voltada a ela, a perpetuação da prática caritativa e filantrópica. É dado um estado, uma natureza e uma essência à infância, favorecendo uma concepção sobre a criança em que ela não é vista como alguém que é, mas como "algo" a que todos têm direito, como o direito a dispor dos corpos. A criança, como sujeito de direito, converte-se em seu objeto, mantendo-se uma visão romantizada e idealizada da infância por meio de práticas educacionais de homogeneização, com o intuito moralizar, normatizar e disciplinar. As normas de controle vão se "infiltrando" nas ações cotidianas e a sofisticação do controle é produzida pela sofisticação da norma.
O sistema de normalizações consolidadas está presente no ideário jurídico sustentado nas microrrelações. O saber-poder opera no indivíduo capturando-o em mecanismos de regulação por meio de dispositivos de controle como a escola, que atua no sentido de evitar o surgimento de manifestações de insubordinação. O Direito imprime segurança e corporifica a normatização. Foucault (1993) propõe a observação cuidadosa das relações de poder que se estabelecem não como poder de um, mas como ação de pessoas sobre pessoas; como uma prática, um fazer do homem sobre o homem, buscando a articulação entre saber e poder, considerando que estes funcionam como condição para que práticas específicas de poder sejam permanentemente atualizadas.
O discurso é uma produção de verdade e, como tal, afasta-se da condição de imparcialidade, assim como toda relação humana, é uma relação de poder. As verdades são naturalizadas, sem se pensar nos diversos sentidos de nossas práticas, bem como nos seus efeitos. O que se faz, para que e como, não é colocado em análise no cotidiano da Educação Infantil. A verdade produz controles sociais e políticos na formação da sociedade e esta valida certos poderes sustentados em saberes, pois segundo Foucault (1993, p. 10) "[...] a verdade não existe fora do poder ou sem poder [...] a verdade é deste mundo; ela é produzida nele graças a múltiplas coerções e nele produz efeitos regulamentados de poder".
Baseando-se em práticas de verdades, de "veridição", como nos aponta Foucault (2008), a sociedade se institui assim por relações efêmeras, passageiras e utilitárias, nas quais os indivíduos buscam o que há de imediato, o que é útil e como pode sê-lo, transformando o imediatismo em palavra de ordem e almejada por todos.
O direito, então, se apresenta como aparelho de governo, um mecanismo de poder. Estabelece-se uma relação análoga e recíproca entre os discursos e o exercício de poder, mas os mesmos exercícios implicam nos discursos produzidos sobre o direito e vice-versa. O poder produz e é produzido pelos discursos, com as formas de organização, com as leis e as legalidades, com as regras, com as normas. Tendo como norte o caminho genealógico de Foucault, na conclusão deste incide-se na questão que consideramos precedente: Quais as perspectivas do homem para produzir este ou aquele caminho?
Para Foucault (1993, p. 7), genealogia é:
[...] chegar a uma análise que possa dar conta da constituição do sujeito na trama histórica. É isto que eu chamaria de genealogia, isto é, uma forma de história que dê conta da constituição dos saberes, dos discursos, dos domínios de objeto, etc. sem ter que se referir a um sujeito, seja ele transcendente com relação ao campo de acontecimentos, seja perseguindo sua identidade vazia ao longo da história.
Mesmo tendo se tornado a Educação Infantil um espaço normatizado pelo direito e pela obrigação, suas práticas estão inscritas em movimentos históricos e como tais apontam para novos devires, contendo escapes das capturas próprias da sociedade de controle. Não só a normalização e disciplinarização são possíveis, à medida que as práticas sociais e políticas em nossas relações são produtoras de subjetividades múltiplas. Portanto, que outros mecanismos de ação podem ser instituídos para rompermos com as formas contemporâneas de controle? Que caminhos podem ser traçados para intervirmos no que está posto? E, anteriormente a essas questões, tornamos a interrogar: Que criança é produzida no processo de escolarização? O que é produzido com a institucionalização da criança na Educação Infantil? O que produzimos?
Um dos desafios da Educação Infantil é buscar responder a essas e tantas outras questões, refletindo sobre as relações de saber-poder, o que se passa e o que se firma como verdade, possibilitando, então, a organização de espaços de liberdade, resistência, convivência e discussão.
Deleuze (1992, p. 220) diz que "não cabe temer ou esperar, mas buscar novas armas". Consideramos necessário ponderar, na perspectiva foucaultiana, a possibilidade de se estabelecer na Educação Infantil um espaço de correlação entre campos de saber, tipos de normatividade e formas de subjetividade, dentro de uma determinada cultura (Foucault, 1984). Espaço este possível para trocas, interações e redimensionado como fluxo de resistências (Passetti, 2007), de insurreição e de movimento de aversão à sociedade de controle onde o rompimento ao modelo seja possível e não entendido como defeituoso e violento.
Deste modo, discutir as possibilidades de pensar a Educação Infantil como uma construção e não como uma adequação - uma modelação - é controverter as concepções acerca da educação, da pesquisa, da docência, da infância, da aprendizagem, da escola, do currículo, do indivíduo, do coletivo, do Ser Humano, sendo preciso, então, estarmos abertos às mudanças, às transformações, às insurreições. Tentando desviar das armadilhas determinadas pelo imediatismo atual, colocando em análise os saberes, as concepções, as verdades, os juízos de valor, as teorias, o especialismo, o nosso próprio lugar de saber-poder não para que o certo ou o errado fiquem determinados, mas para problematizar as práticas e liberá-las dos determinismos morais (Foucault, 1984).
Se a entrada da Educação Infantil no mundo do direito - reconhecendo a criança como sujeito de direito - está intimamente ligada às rupturas históricas, também sabemos que não bastam aprovações de textos legais e que não se trata de assegurar novas ou velhas concepções, mas de colocarmos em análise as afinidades que vão se firmando nas micro-relações com a produção de novos conceitos.
Uma abertura é pensar que não há modelos e padrões prévios. Desnaturalizar os saberes que ajuízam que todas as crianças são passíveis de ações iguais podem ser indicativos de outras possibilidades. Desmanchar o que está dado como certo, perfeito e inquestionável para novas ou outras produções possíveis, não enraizadas no que está posto. É fazer com que diferentes vozes falem por eles mesmos e não continuem delegando aos outros esta ação. Sair da verdade como garantia, como certeza e levar para o campo da experimentação, de um algo possível dentro de vários e diferentes possíveis. Como mais uma forma possível de saber e fazer vivente, dentre tantos outros possíveis. De tal modo, na Educação Infantil que os sujeitos não nascem, mas são produzidos por vários modos e não há um único e estático modo.
Ouvir as crianças nas respostas que dão cotidianamente, analisar as práticas, percebendo nossas implicações e atravessamentos. Buscar desnaturalizar a rotina e estabelecer um movimento de construção e desconstrução, rompendo as fronteiras dos territórios é uma outra indicação, à medida que ao se questionar a importância dos conceitos bem nomeados e definidos, estabelecendo certo rigor no questionamento interno, é possível interrogar também: O que queremos transformar? Esta é a pergunta. Querer transformar é uma relação de interesse-desejo-poder, entretanto o não querer transformar também traz em seu cerne uma concepção. Não cabe, porém, estabelecer um juízo de valor e colocar entre bom e ruim, bem ou mal, perfeito e imperfeito, mas entender que as práticas devem ser elementos analisadores do que constituímos diariamente junto às crianças.
Assim, constituiremos, possivelmente, "linhas de fuga" - como proposto por Deleuze e Guattari - em busca de "uma vida não fascista", como convida Foucault, para os fazeres e saberes de e na Educação Infantil. O "tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural nada deve parecer impossível de mudar", proposto por Brecht (1983), reafirma a discussão deste artigo sobre outros caminhos para a educação de crianças de zero a cinco anos que não sejam os da imobilização em papéis, da resiliência, do silenciamento, entre outros, por meio dos quais sujeitamos as crianças diariamente e necessitam ser questionados.
Que outro espaço queremos "da, na e para a" Educação Infantil? Que lógicas nos atravessam? São perguntas que devem ecoar e reverberar nas práticas cotidianas, desfocando da criança que se quer formar - sujeito de direitos, cujo exercício está marcado pela existência de tantas condicionalidades.
Questionar, como indica Passetti, as adesões e prevenções alardeadas na sociedade de controle e as institucionalizações produzidas - e que também produzimos - pode ser o caminho. O pensar sobre as relações de saber-poder, o que se passa e o que se firma como verdade, possibilita a organização de espaços de liberdade, resistência, convivência e discussão. Assim, e somente assim, podemos romper com os ditames sociais de controle, modelos, padrões e disciplina que nos são impostos cotidianamente e aos quais nos sujeitamos, quase sempre, com mansidão.
Referências
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Endereço para correspondência:
Késia Pereira de Matos D'Almeida
lkndalmeida@gmail.com
Submetido em: 27/04/2018
Revisto em: 17/09/2018
Aceito em: 18/09/2018