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Revista da Abordagem Gestáltica
versão impressa ISSN 1809-6867
Rev. abordagem gestalt. v.15 n.2 Goiânia dez. 2009
EDITORIAL
Há uma clássica epígrafe de Husserl, publicada em A Idéia da Fenomenologia, onde se lê: Se por um lado o Autor teve que rebaixar praticamente o ideal das suas aspirações filosóficas ao de um simples principiante, por outro lado chegou com a idade à plena certeza de se poder intitular um efectivo principiante. Quase poderia ter a esperança, se lhe fosse concedida a velhice de Matusalém, de poder chegar a ser um filósofo. Esta colocação de Husserl aponta para o inacabamento da fenomenologia, e é com esse espírito de inacabamento que apresentamos esse novo número da Revista da Abordagem Gestáltica, totalmente dedicado à Fenomenologia e suas relações com a Psicologia.
Entre os dias 04 e 07 de junho desse ano, tivemos a oportunidade de abrir espaço para um grande diálogo entre a Psicologia e a Fenomenologia, com a realização do I Congresso Sul-Brasileiro de Fenomenologia e I Congresso de Estudos Fenomenológicos do Paraná . Por iniciativa do Núcleo de Estudos do Desenvolvimento Humano (Nedhu), vinculado ao Departamento de Psicologia da Universidade Federal do Paraná (UFPR), e coordenado pelos professores Adriano Holanda, Carlos Serbena e Joanneliese de Lucas Freitas, este Congresso pôde reunir um excelente mosaico de idéias, proposições, pontos de vista e mesmo de abordagens teóricas e filosóficas.
Esta diversidade pode ser observada na grade da programação do evento (reproduzida na última seção desse número). Tivemos a grata satisfação de contar com mais de quatrocentos participantes dos mais variados estados do país, construindo um Congresso que ultrapassou as fronteiras do sul do país e se constituiu num evento de âmbito nacional. Ao contar com a colaboração de profissionais e pensadores de todo o país, o Congresso pôde ser um excelente exemplo da qualidade das produções atuais na área e da diversidade de leituras e pensamentos.
Neste novo número, apresentamos algumas das produções oriundas desse evento. Boa parte das apresentações dos convidados encontra-se aqui reproduzida em formato de artigo, além de alguns dos trabalhos apresentados como proposições.
Começamos este número com o artigo intitulado Psicologia e Fenomenologia: Diálogos e Interlocuções, de autoria de Adriano Holanda (Universidade Federal do Paraná). Trata-se da fala de encerramento do Congresso, onde o autor tem a possibilidade de fazer um diálogo entre ciência e filosofia, apontando caminhos para a apropriação da fenomenologia pela psicologia. Em seguida, temos a apresentação do texto A Consciência e o Mundo: O Projeto da Fenomenologia Transcendental de Edmund Husserl, de Carlos Diógenes Côrtes Tourinho (Universidade Federal Fluminense) no qual o autor procura esclarecer a especificidade da atitude fenomenológica e a estratégia metodológica adotada pela fenomenologia para fazer da filosofia uma ciência rigorosa.
O texto que se segue, intitulado O Esquema da Coisa (Das Ding) de Husserl e a Esquizofrenia, é de autoria de Francisco Martins (Universidade de Brasília) e procura qualificar as análises de Husserl sobre a realidade com vistas a esclarecer o estatuto da realidade na clínica. As relações entre Clínica e Fenomenologia são ainda objeto de análise de outros artigos como em Reflexões sobre a Relação Psicoterapêutica: Diálogos com Merleau-Ponty, de Joanneliese de Lucas Freitas (Universidade Federal do Paraná), onde a análise se pauta pela compreensão do outro em Merleau-Ponty e suas possíveis correlações com a clínica gestaltista.
Dois outros artigos apontam para o diálogo entre a clínica psicológica e a fenomenologia, que são: Reconstruindo Sentidos na Interface de Histórias: Uma Discussão Fenomenológico-Existencial da Constituição do Sujeito Borderline, de Anna Karynne da Silva Melo, Georges Daniel Janja Bloc Boris e Violeta Stoltenborg (da Universidade de Fortaleza Unifor); e Entre a Fenomenologia e a Hermenêutica: Uma Perspectiva em Psicoterapia, de Luciana da Silva Mendes Ferreira (Universidade Católica de Brasília).
O artigo intitulado Um Rastro a Desaparecer na Praia do Pensamento: Foucault e a Fenomenologia, de Marcos Nalli (Universidade Estadual de Londrina) procura analisar a fase arqueológica do pensamento de Michel Foucault a partir de sua interação com a fenomenologia husserliana.
A presença do pensamento de Jean-Paul Sartre pode ser encontrada em dois textos: Bases Epistemológicas da Antipsiquiatria: A Influência do Existencialismo de Sartre, de Bianca Spohr & Daniela Ribeiro Schneider (Universidade Federal de Santa Catarina); e em A Inter-relação Filosófico-Literária do Pensamento de Sartre: Bases para uma Psicologia Fenomenológica do Eu, de Carolina Mendes Campos (Instituto de Psicologia Fenomenológico-Existencial do Rio de Janeiro); Fernanda Alt (Universidade Federal do Rio de Janeiro) & Ariane P. Ewald (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
Durante o Congresso, tivemos ainda a oportunidade de estabelecer novas relações da fenomenologia com outros campos de aplicação na psicologia, que podem ser exemplificadas pelos textos: Psicologia e Esporte: Um Olhar Fenomenológico para esse Encontro Marcado pela Modernidade de Cristianne Almeida Carvalho (Universidade Federal do Maranhão); O Psicólogo do Trabalho no Mundo das Práxis Capitalistas: Reflexões Fenomenológico-Existenciais de Sylvia Mara Pires de Freitas (Universidade Estadual de Maringá & Universidade Paranaense Unipar) e Oficina de Criatividade com Pais de Crianças Deficientes Adriana Cristina Pereira, Micheli Manzin Cesarini & Giuliana Bilbao (Universidade Paulista Campinas).
Encerramos este número com a tradução de um texto clássico da literatura fenomenológica. Em 1933, Gerardus Van der Leeuw publica a mais importante obra de fenomenologia da religião Phenomenologie der Religion, no original em holandês. Em seu epílogo, temos um excelente resumo do método fenomenológico. Apresentamos aqui a tradução desse epílogo, a partir da versão francesa dessa obra, cujo título expandido é La Religion dans son Essence et ses Manifestations. Phénoménologie de la Religion.
Esperamos que os leitores desfrutem desse novo número.
Adriano Furtado Holanda
- Editor -