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Psicologia em Pesquisa
versão On-line ISSN 1982-1247
Psicol. pesq. vol.4 no.2 Juiz de Fora dez. 2010
ARTIGOS
A Pesquisa em Neuropsicologia: Desenvolvimento Histórico, Questões Teóricas e Metodológicas
Research in Neuropsychology: Historical Development, Theoretical and Methodological Issues
Simone Cagnin
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
RESUMO
O presente artigo tem como objetivo enfocar a pesquisa na Neuropsicologia, a partir de uma revisão histórica da literatura da área, destacando os principais métodos e questões teóricas que surgiram no percurso dos estudos científicos da relação cérebromente. Inicialmente, pretende-se apresentar os antecedentes históricos da pesquisa em Neuropsicologia, privilegiando-se a emergência do método anátomo-clínico, no século XIX, e as escolas psicométrica e cognitivista do século XX. Neste contexto, algumas pesquisas clínicas e experimentais com estudos de caso único e estudos de grupo são privilegiadas. Uma discussão sobre as contribuições e os limites das técnicas de neuroimagem é também esboçada. Por último, uma conclusão é proposta com o intuito de integrar as reflexões tecidas ao longo do trabalho.
Palavras-chaves: Neuropsicologia; história; pesquisa; método.
ABSTRACT
This article aims to focus on research in neuropsychology from a historical review of the literature highlighting the key methods and theoretical issues that have arisen in the course of scientific studies of the brain-mind relationship. Initially, we intend to present the historical background of research in neuropsychology, privileging the emergence of anatomical-clinical method in the nineteenth century, and psychometric and cognitive schools of the twentieth century. In this context, some clinical and experimental studies of a single case and group studies are emphasized. A discussion of the contributions and limitations of neuroimaging techniques is also outlined. Finally, a conclusion is proposed in order to integrate the reflections made throughout the paper.
Keywords: Neuropsychology; history; research; method.
Este trabalho pretende descrever, a partir de uma revisão histórica, as principais questões teóricas e metodológicas no âmbito da Neuropsicologia. O avanço das pesquisas nas Neurociências na década de 1990, a chamada âdécada do cérebro', e as pesquisas posteriores do novo século, tanto as mais voltadas para o estudo do hardware cerebral subjacente a determinadas funções cognitivas quanto as mais direcionadas para a relação cérebro-mente, ou mesmo aquelas que privilegiam o estudo da mente, devem parte de seu sucesso atual aos estudos pioneiros de neuroanatomistas, clínicos, teóricos e pesquisadores dos séculos XIX e das décadas anteriores às décadas de 90 do século XX. Mostra-se, assim, relevante traçar o percurso histórico das abordagens teóricas e metodológicas que serviram de base para o nítido desenvolvimento que a Neuropsicologia encontra na contemporaneidade.
Autores como Shallice (1988), Kristensen, Almeida e Gomes (2001), Caramazza e Coltheart (2006), dentre outros, apresentaram, em seus trabalhos, revisões teóricas que destacaram aspectos teóricos e metodológicos relevantes ao longo da história da Neuropsicologia, incluindo-se aqui a Neuropsicologia Cognitiva. Porém, acreditamos que nosso ensaio teórico pode vir a contribuir para aprimorar o debate iniciado por estes e outros autores, na medida em que busca refletir sobre questões teóricas e metodológicas importantes que, a nosso ver, apresentam algumas lacunas e ainda não encontram consenso na área.
Sendo assim, objetivamos apresentar uma revisão integrativa e crítica da literatura da área, destacando os principais métodos e técnicas encontrados ao longo da história da Neuropsicologia. A diversidade de objetivos e de abordagens teóricas que guiam os pesquisadores da área parece trazer, por um lado, maior complexidade aos métodos e técnicas desenvolvidos, mas, por outro lado, parece dificultar o consenso e a integração teórica e metodológica.
Inicialmente, cabe observar que a Neuropsicologia só surge como uma disciplina cientifica mais diferenciada nas primeiras décadas do século XX, sendo o termo "Neuropsicologia" inicialmente utilizado por Hebb (1949), com o intuito de marcar, como observaram Kolb e Wishaw (1980), um estudo científico que combinava o interesse comum pelo funcionamento cerebral compartilhado pelos neurologistas e pelos psicólogos da Psicofisiologia da época. Não obstante, investigações científicas da relação cérebro-mente começaram a ocorrer nas últimas décadas do século XIX, investigações estas que merecem ser aqui destacadas, pois forneceram as bases para as abordagens metodológicas que surgiram posteriormente.
Estes estudos pioneiros, desenvolvidos por anatomistas e clínicos do século XIX, em uma época em que as técnicas de avaliação das lesões cerebrais dependiam especialmente de uma análise neuroanatômica post mortem, merecem ser destacados não só por seu caráter científico inaugural, mas também pela ousadia de tal empreitada com tão poucos instrumentos e pressupostos teóricos consistentes que os guiassem.
Por outro lado, como já referido, no âmbito da própria Neuropsicologia, encontramos uma diversidade de enfoques, desde aqueles mais voltados para os substratos cerebrais envolvidos em determinados processamentos da informação, passando por estudos com ênfase na coleta de dados quantitativos com enfoque psicométrico, até aqueles mais voltados para o estudo da mente per se, ou seja, estudos com ênfase cognitivista e menos preocupados com o hardware cerebral. Nesta direção, apesar de muitos pesquisadores se situarem na mesma interface, os mesmos podem ter interesses muito divergentes, o que suscita, de certo modo, a nosso ver, certa fragmentação de saberes e de métodos produzidos na área.
Sendo assim, frente a tal diversidade de enfoques, priorizaremos aqui estudos e métodos que consideramos mais afeitos a nosso objetivo de esboçar uma reflexão sobre as principais questões teóricas e metodológicas envolvidas na pesquisa em Neuropsicologia.
Antecedentes Históricos da Pesquisa Sobre a Relação Cérebro-Mente nos Primórdios da Neuropsicologia
No curso da história da Neuropsicologia, podemos identificar três grandes abordagens metodológicas mais amplas, como aponta Shallice (1988). A primeira dessas abordagens ou escolas, denominada clássica, baseia-se em estudos de casos clínicos isolados, com construção teórica baseada em diagramas, ênfase na correlação anátomo-clínica e na testagem ad hoc. A segunda escola, por sua vez, possui um enfoque psicométrico, com ênfase na coleta de dados quantitativos e no uso de testes estandardizados, priorizando, neste contexto, o estudo de grupos de pacientes selecionados a partir da semelhança dos sintomas clínicos e/ ou do locus da lesão. A terceira escola, considerada uma escola experimental com ênfase cognitiva, prioriza, por sua vez, o estudo de caso único e tarefas experimentais baseadas em modelos de processamento da informação. Enfocaremos, aqui, inicialmente, estas abordagens metodológicas, pois, a nosso ver, trazem questões até hoje significativas para a área.
A primeira abordagem metodológica foi introduzida por Broca, no século XIX, abordagem esta que se expressou através do método anátomo-clínico, sendo este método um marco na emergência de um método verdadeiramente científico nos estudos da relação cérebro-mente. Os estudos anteriores aos de Broca, nas primeiras décadas do século XIX, especialmente os de Gall e seus seguidores, estudos estes conhecidos como representantes da frenologia, apresentaram um método pouco rigoroso e duvidoso para o estudo da relação cérebro-mente. A análise das conformações cranianas para a postulação de uma correlação entre áreas cerebrais distintas e faculdades mentais específicas, mais ou menos desenvolvidas em função de seu "volume" cerebral, proposta por estes estudos, é hoje considerada pseudocientífica.
Como o próprio nome indica, o método anátomo-clínico visa a estabelecer correlações entre os sintomas apresentados na clínica neuropsicológica com o locus da lesão cerebral subjacente. Através da análise do tecido cerebral post-mortem, pioneiros da investigação científica da relação cérebro-mente como Broca, Wernicke, dentre outros, propuseram algumas correlações iniciais entre áreas cerebrais restritas e déficits funcionais específicos relacionados a síndromes diferenciadas no contexto do estudo das afasias.
Entretanto, como observa Kertesz (1983), as correlações propostas através do método anátomo-clínico, embora provendo uma informação anatômica relativamente detalhada, encontraram alguns problemas do ponto de vista metodológico. Um desses problemas refere-se ao intervalo entre as épocas da avaliação clínica e da avaliação anatômica, pois podem ocorrer outros comprometimentos cerebrais neste período de tempo, por exemplo, causados por seguidos AVCs (acidentes vasculares cerebrais), mascarando assim as correlações inicialmente propostas. Nesta direção, cabe observar que os AVCs, apesar de costumarem levar a quadros clínicos mais estáveis, costumam ocorrer de modo seqüenciado, o que pode levar a uma dificuldade de interpretação dos achados anatômicos. Outra fonte de "interferência metodológica" que pode levar a dificuldade na interpretação dos resultados poderia ser ocasionada, por exemplo, no caso da existência de tumores, pela compressão, causada por estes, em outras áreas cerebrais, o que poderia levar a alterações endócrinas e vasculares mais amplas e, conseqüentemente, a uma imprecisão na avaliação da área cerebral comprometida. E no caso de doenças degenerativas ou de um processo de atrofia cerebral devido ao envelhecimento, estes quadros também podem dificultar uma correlação baseada em necropsias do tecido cerebral.
Outra fonte de dificuldade trazida pelo método anátomo-clínico refere-se ao fato de que, muitas vezes, os casos bem estudados na clínica neuropsicológica não têm a chance de serem necropsiados ou, então, inversamente, casos pouco avaliados clinicamente são, por sua vez, necropsiados, mas não permitem correlações mais significativas devido à falta de um detalhamento funcional mais preciso de seus déficits cognitivos.
A emergência do método anátomo-clínico e seu uso pelos chamados "construtores de diagrama do século XIX", como Lichtheim (1885), iniciou uma era de pesquisas na "Neuropsicologia" da época, respaldada por um método fundamentado cientificamente. Através de estudos de casos, qualitativamente descritos, estes "construtores de diagrama" ousaram propor modelos ou "diagramas" hipotéticos que visaram uma explicação teórica dos seus achados clínicos.
Do ponto de vista metodológico, Lichtheim (1885), discípulo de Wernicke e, conjuntamente com este autor, considerado um pioneiro na construção teórica, especialmente no que se refere ao processamento da linguagem, contrapôs, por um lado, o caso "puro", que apresentava um único tipo de déficit e, por outro, o caso "misto, que apresentava múltiplos déficits funcionais. Porém, em sua opinião, só o caso "puro" tinha interesse teórico, na medida em que contribuía para a construção de modelos teóricos baseados nas perdas seletivas apresentadas por estes pacientes. Inclusive, hoje em dia, o modelo teórico de Lichtheim é considerado, por autores como Ellis e Young (1988), como "precursor" de alguns modelos construídos sob a égide do paradigma do processamento da informação. Neste sentido, então, os diagramas de Lichtheim e, anteriormente, os de Wernicke, podem ser considerados como pioneiros de uma construção teórica com ênfase no detalhamento seqüencial do processamento da informação , em especial no que diz respeito ao processamento da linguagem.
Não obstante, como observa Shallice (1988) e como já destacamos em trabalho anterior (Cagnin, 2009), os construtores de diagrama, apesar de terem encontrado certo sucesso na tentativa da construção de uma taxonomia neurológica para a época, com a caracterização de síndromes afásicas diferenciadas, partiram de uma avaliação clínica pouco sistemática e insuficiente dos déficits e preservações cognitivas dos pacientes por eles avaliados. As pesquisas desenvolvidas nos primórdios da investigação científica da relação cérebro-mente enfatizaram o estudo de caso único, priorizando assim uma avaliação mais qualitativa e pouco quantitativa dos achados clínicos, o que de certo modo impossibilitou uma estandardização dos resultados encontrados e, conseqüentemente, uma comparação entre os pacientes avaliados.
Algumas dificuldades metodológicas emergiram neste contexto. A primeira refere-se à inferência da localização da lesão cerebral tendo como base a avaliação clínica de pacientes com comprometimentos cerebrais. A segunda, por sua vez, diz respeito à inferência do funcionamento da cognição normal a partir do estudo da cognição deficitária exibida por estes pacientes. Inclusive, como observa Shallice (1988), a dificuldade de dissociar estes dois tipos de inferência, que apontam para implicações metodológicas distintas, tornou-se um desafio para os pioneiros do estudo científico da relação cérebro-mente que utilizaram o método anátomo-clínico em suas pesquisas. O chamado "localizacionismo estreito", foi o termo atribuído à perspectiva que enfatizou uma correspondência mais termo a termo da localização das funções mentais no cérebro, perspectiva essa que não dissociou adequadamente o problema da localização cerebral das funções mentais do problema de inferir o processamento cognitivo normal a partir das disfunções apresentadas pelos pacientes.
Não obstante, cabe observar que, para autores como Gage e Hickok (2005), Wernicke propôs uma teoria bastante inovadora para a época, pois esboçou uma base teórica de como os conceitos eram adquiridos e representados no córtex de maneira distribuída, o que, inclusive, vai em direção a uma visão mais contemporânea da representação conceitual no cérebro. Neste sentido, Wernicke, com sua proposta de uma visão distribuída das representações conceituais no córtex cerebral, já previa uma espécie de localizacionismo distribuído, bem como considerava os efeitos da plasticidade neuronal e da adaptação contextual, o que vai de encontro às tentativas de enquadrá-lo como um representante do "localizacionismo estreito".
Kertesz (1983) também destaca a dificuldade da inferência do funcionamento cognitivo normal a partir do estudo da cognição deficitária apresentada pelos pacientes com comprometimentos cerebrais. Para este autor, a análise funcional de sistemas cognitivos normais poderia não fornecer base suficiente para que sejam testadas as funções danificadas e/ou "reorganizadas" desses pacientes. Em outras palavras, nem sempre podemos tirar conclusões diretas sobre o funcionamento cognitivo normal tendo como base apenas a observação das patologias encontradas na clínica neuropsicológica. Estudos clínicos e experimentais com sujeitos normais, não lesionados, também devem ser considerados, pois os mesmos podem ou não ratificar as interpretações e conclusões obtidas pelos estudos anteriormente mencionados.
Há que se observar ainda, como ressalta Caplan (1981), que a própria definição de "função mental" é arbitrária, pois clínicos, neurofisiologistas e psicólogos, dentre outros, poderiam ter concepções diferentes a respeito de um mesmo comportamento observado. Neste sentido, diferentes concepções teóricas poderiam levar a diferentes interpretações daquilo que denominados "função mental". Por exemplo, para Luria (1981), esta função demandaria a atividade de um sistema funcional complexo que envolve um conjunto de estruturas cerebrais em interação em contraposição a outras abordagens que estabelecem correlações mais estreitas entre estruturas cerebrais e funções mentais específicas.
Já no que se refere à localização cerebral de funções, como destaca Kertesz (1983), uma das principais questões teóricas no que a isso diz respeito é aquela que indaga se o desempenho cognitivo observado em um dado paciente com lesão cerebral pode ser atribuído apenas à perda de determinados componentes cognitivos ou ao surgimento de outras estruturas funcionalmente relacionadas ou mesmo não diretamente relacionadas que são recrutadas após a injúria. Um exemplo disso poderia ser a dificuldade observada na execução de tarefas que envolvem aspectos construtivos após comprometimentos do hemisfério direito. Porém, segundo esse autor, não se tem muita certeza se essa dificuldade é devida ao mau desempenho do hemisfério lesionado ou ao desempenho "normal" do hemisfério esquerdo sem a "ajuda" do hemisfério direito. Em outros termos, após uma dada lesão cerebral, às vezes, podem ser observados não só sintomas negativos e déficits, mas também sintomas positivos e o surgimento de novos comportamentos.
Sendo assim, um dos argumentos contra a perspectiva localizacionista estreita baseia-se na idéia de que o desempenho observado após a lesão cerebral teria pouca relação com a perda da função da área cerebral comprometida, tendo, em contrapartida, mais relação com a combinação e a reorganização das estruturas remanescentes intactas.
A segunda escola que surge no percurso da história da Neuropsicologia, a perspectiva denominada anti-localizacionista, contrapôs-se ao chamado "localizacionismo estreito" e foi, por sua vez, influenciada pelas idéias do gestaltismo, tendo seu auge nas décadas de 20 a 40 do século XX.
O conceito de equipotencialidade de K. Lashley (1929, 1938), proposto a partir de seus estudos sobre a aprendizagem animal, foi um dos argumentos teóricos utilizados pela escola antilocalizacionista, na medida em que supõe a possibilidade de compensação da perda de uma função cortical por outra área cortical preservada. Jackson (1874) e Luria (1981) também abordaram a possibilidade de reorganização funcional das áreas cerebrais preservadas e a emergência de operações e estratégias compensatórias em pacientes com lesões cerebrais.
Do ponto de vista clínico, a escola antilocalizacionista contribuiu para o entendimento do quadro clínico mais amplo apresentado pelos pacientes, ou seja, a compreensão dos déficits e de preservações cognitivas em vários domínios do conhecimento ajudou a entender os fatos clínicos mais complexos e menos diferenciados (Hécaen & Albert, 1978). Porém, do ponto de vista teórico e metodológico, autores como Ellis e Young (1988), expoentes de uma perspectiva neuropsicológica cognitivista e modular, sinalizaram para o fato de que a perspectiva antilocalizacionista representou certo "retrocesso" no curso da história da Neuropsicologia, na medida em que enfatizava uma abordagem integral e menos "modularista" e diferenciada do cérebro.
Cabe observar que outros problemas e variáveis podem também contribuir para dificultar uma localização mais termo a termo de funções mentais no cérebro como, por exemplo, a variabilidade da etiologia e a evolução da lesão cerebral, a idade e o sexo do paciente que sofreu a injúria cerebral, o fato de o mesmo ser destro ou canhoto, as diferenças anatômicas individuais, dentre outros fatores importantes que poderiam ser destacados. Entretanto, não enfocaremos tais fatores, devido aos objetivos mais amplos já mencionados do presente trabalho.
De modo complementar aos estudos desenvolvidos nos primórdios da clínica neuropsicológica, os estudos desenvolvidos em laboratório com sujeitos animais também merecem ser brevemente destacados, na medida em que contribuíram para o aprimoramento de técnicas de registro e de intervenção cerebral, bem como para algumas correlações entre áreas cerebrais específicas e determinados distúrbios comportamentais. Trabalhos como os de Flourens (1853), Lashley (1929, 1938), Klüver e Bucy (1939), dentre inúmeros outros, poderiam ser aqui destacados.
Como observam Hart e Semple (1990), os estudos propostos pela Neuropsicologia experimental animal buscaram determinar os princípios fundamentais das funções cerebrais usando espécies não humanas. Estes estudos contribuíram de modo significativo para o desenvolvimento da metodologia experimental e tiveram a vantagem de poder controlar variáveis como o tamanho da lesão cerebral, sua localização, bem como o registro e/ ou a estimulação elétrica de áreas cerebrais específicas. De modo complementar, a vantagem de poder se exercer um controle rigoroso do meio ambiente e a obtenção de dados mais precisos sobre a história de vida dos animais submetidos aos experimentos também merecem destaque.
A questão do grau de generalização dos achados experimentais desses estudos animais para a espécie humana parece ser alvo de controvérsias, pois, por um lado, autores como Davison (1974) apontam para a complexidade do comportamento humano em contraposição ao comportamento animal e, por outro lado, autores como Kolb e Wishaw (1980) apontam para a fundamental importância desses estudos para a Neuropsicologia humana. O principal argumento desses últimos autores reside no fato de que o meio ambiente apresentaria problemas básicos para todos os mamíferos, problemas estes que demandariam a mediação de mecanismos neurais similares na sua solução, o que, por sua vez, permitiria um bom grau de generalização dos estudos animais para a espécie humana.
Cabe observar que estes estudos, apesar de não serem "típicos" da Neuropsicologia, pois utilizavam, preferencialmente, sujeitos experimentais animais e possuíam um enfoque mais psicofisiológico, também contribuíram para o estudo da relação cérebro-mente, especialmente para a investigação dos processos motivacionais e emocionais e de seus substratos neurais, processos estes que parecem permitir um maior grau de generalização para a espécie humana do que os processos associados às chamadas "funções cognitivas superiores", como o pensamento e a linguagem.
Neste contexto, o desenvolvimento do método experimental com diferentes técnicas de intervenção e de registro cerebral, como as de estimulação e de registro por eletrodos, passando por técnicas de lesão cerebral seletiva, dentre outras técnicas de intervenção, possibilitou o estudo do papel de determinadas áreas cerebrais em processos emocionais e motivacionais específicos, bem como em processos como atenção, memória, aprendizagem e ciclo sono-vigília.
Estes trabalhos, desenvolvidos em uma época desprovida dos recursos atuais das técnicas de neuroimagem e do auxílio computacional, foram de fundamental importância não só para o desenvolvimento de uma metodologia experimental consistente no estudo da relação cérebro-mente, como também para o entendimento das bases neurais subjacentes a determinados comportamentos.
Em suma, as pesquisas clínicas e experimentais que inauguraram a investigação científica da relação cérebro-mente, seja com o método anátomo-clínico ou com as diversas técnicas de intervenção e de registro cerebral in vitro, forneceram as bases para os subseqüentes estudos desenvolvidos ao longo da história da Neuropsicologia. A interface com diferentes disciplinas básicas e aplicadas, muitas delas hoje situadas no contexto das chamadas Neurociências, caracterizou a emergência desta disciplina híbrida que denominamos Neuropsicologia.
A Neuropsicologia do Pós-Guerra: Contribuição de A. R. Luria e da Psicologia Experimental
A grande mudança metodológica que ocorreu novamente na Neuropsicologia surge após a Segunda Guerra Mundial. Por um lado, a Neuropsicologia se alia à Psicologia Experimental e à Psicometria da década de 50, nos países ocidentais, e por outro lado, no contexto da extinta União Soviética, Luria aproxima os seus inúmeros trabalhos clínicos e teóricos da perspectiva sócio-histórica de Vygotsky.
Inicialmente, cabe destacar brevemente a importância dos trabalhos de Luria (1981, 1992), em especial, seus inúmeros estudos clínicos e seus estudos com pacientes com lesões frontais. A par de sua vasta contribuição teórica e clínica mais ampla, os estudos com os chamados pacientes pré-frontais e a postulação de que as regiões frontais estariam envolvidas com a programação, verificação e regulação das funções cognitivas como um todo merecem destaque. A sua ênfase na complexidade dos sistemas funcionais cerebrais e sua contribuição para a avaliação e a reabilitação neuropsicológicas foram de fundamental importância para o desenvolvimento da área. Inclusive, o grande número de avaliações clínicas feitas por Luria e seus colaboradores originou a Bateria de Testes Luria-Nebraska, bateria esta que ainda é uma referência no contexto da avaliação neuropsicológica.
Ainda no que se refere à contribuição de Luria, concordamos com Kristensen, Almeida e Gomes (2001) que uma de suas principais contribuições diz respeito às inovações metodológicas propostas por ele na avaliação clínica de seus pacientes. A partir do uso de técnicas aparentemente não muito sofisticadas, porém guiadas por referenciais teóricos consistentes, como sua idéia de uma organização sistêmica das funções corticais superiores, Luria parece ter conseguido compatibilizar o pressuposto da complexidade das funções corticais superiores da escola anti-localizacionista com a possibilidade de uma localização dinâmica dessas mesmas funções.
Podemos ainda destacar os trabalhos realizados nas décadas de 50 e 60 com ênfase na lateralização cerebral de funções, pois estes trouxeram contribuições teóricas e metodológicas importantes para o entendimento da especificidade dos hemisférios cerebrais no desempenho de determinadas funções cognitivas. Pesquisas experimentais e clínicas, como as de Myers e Sperry (1953), Gazzaniga, Bogen e Sperry (1962), dentre outros, com animais com secção do corpo caloso e com sujeitos com comprometimentos no corpo caloso, bem como pesquisas experimentais com sujeitos normais com o uso, por exemplo, da escuta dicótica e da apresentação visual taquitoscópica, forneceram inúmeros achados que corroboraram o pressuposto de que os hemisférios cerebrais processariam as informações com certa independência e especificidade. De modo geral, a idéia vigente seria de que haveria a dominância no processamento da linguagem pelo hemisfério esquerdo versus a dominância do processamento visuoespacial pelo hemisfério direito, na maioria dos indivíduos.
Observamos ainda que muitas das pesquisas experimentais com sujeitos animais, inclusive, serviram de inspiração e apoio para pesquisas realizadas com pacientes humanos como, por exemplo, as realizadas por Sperry (1984) com pacientes comissurotomizados (com secção do corpo caloso).
Não obstante, estudos interessados em estudar não só a lateralização cerebral de funções e a assimetria funcional hemisférica, como também a comunicação inter-hemisférica, vêm apontando para uma maior complexidade na organização cerebral de funções e para uma maior colaboração inter-hemisférica na realização de tarefas complexas que envolvem maior carga cognitiva. Autores como Gazzaniga e LeDoux (1981), Cooney e Gazzaniga (2003), dentre outros, observaram que os sistemas relacionados aos dois hemisférios cerebrais, apesar de funcionalmente assimétricos, conformariam uma rede funcional articulada e, neste sentido, não teria sentido a proposição de uma visão dualista que propõe um isolamento mais radical na comunicação inter-hemisférica.
Já no que diz respeito à nova abordagem metodológica originada da aliança entre a Neuropsicologia e a Psicologia Experimental, a chamada escola psicométrica, esta teve seu auge nas décadas de 1940 e 1950 do século XX, mas alguns estudos em décadas anteriores poderiam ser considerados precursores deste tipo de abordagem, como os estudos de Weisenburg e Mac Bryde (1935), com ênfase na construção de um teste normatizado sobre as afasias, dentre outros.
Para esta nova escola, as observações clínicas, somente, não constituem uma base de dados suficiente para uma especulação teórica consistente e nem para a padronização de testes. Neste contexto, os estudos de grupo adquiriram uma ênfase especial e a quantificação dos dados apresentados pelos pacientes foi a tônica, em contraposição à ênfase em estudos de caso único dos primórdios da Neuropsicologia. Nesta direção, inúmeros testes foram padronizados e grandes baterias de testes foram propostas, como as baterias Luria-Nebraska e Halstead-Reitan, bem como houve a sofisticação dos procedimentos experimentais e um maior controle das variáveis envolvidas.
No que se refere ao estudo de caso único, Lichtheim (1885), nos primórdios dos estudos científicos da relação cérebro-mente, fez, inicialmente, a distinção metodológica entre o chamado "caso puro" que apresenta um único tipo de déficit e o "caso misto" que, por sua vez, apresenta déficits múltiplos. Para ele, apenas o caso puro teria importância teórica e metodológica, pois ajudaria na construção de modelos teóricos a respeito do funcionamento cognitivo humano. Apesar de possuir maior incidência clínica, o caso misto não ajudaria tanto na construção teórica, na medida em que não apresentaria déficits seletivos, o que dificultaria a formulação de hipóteses a respeito dos subcomponentes cognitivos envolvidos em determinadas tarefas.
De acordo com Shallice (1988), quando uma teoria está sendo testada, a descrição de qualquer paciente, puro ou misto, ajudaria na avaliação da capacidade explicativa destas teorias. Porém no que se refere à construção de modelos teóricos, os casos puros apresentariam um quadro mais nítido de um determinado déficit cognitivo. A perda seletiva de um determinado processamento da informação atrelado aos chamados casos puros ajudaria no melhor entendimento do funcionamento cognitivo do que as múltiplas perdas simultâneas apresentadas pelos casos mistos.
Se, por um lado, autores como Sokol, McCloskey, Cohen e Aliminosa (1991), Ellis e Young (1988), dentre outros, concordam com Lichtheim quanto à maior relevância do estudo de caso único para a construção teórica, por outro lado, autores como Robertson, Knight, Rafal e Shimamura (1993) enfatizam o estudo de grupos de pacientes por acharem os mesmos mais elucidativos para a construção teórica. Na opinião desses últimos autores, a comparação entre grupos de pacientes poderia fornecer mais dados para o estudo da modularidade do sistema cognitivo do que o estudo das singularidades apresentadas por um determinado indivíduo.
Outro problema que podemos destacar, neste contexto, é que a inserção ou não de um paciente em uma categoria mais pura ou mais mista é direcionada pelo enfoque teórico do qual se parte. Sendo assim, diferentes teorias podem produzir diferentes "casos puros", aquelas que para elas são mais relevantes e estejam mais em consonância com seus modelos. Neste sentido também já apontara Kuhn (1962), ao abordar a concepção de paradigma e as implicações teórico-metodológicas na chamada ciência normal.
Entretanto, cabe assinalar que algumas síndromes consideradas mais "puras" nas últimas décadas, como, por exemplo, a dislexia profunda, o "agramatismo" na afasia de Broca, dentre outras, já não são vistas como "puras" ou unitárias, pois há, na clínica e na pesquisa neuropsicológicas, relatos variados de pacientes com dissociações funcionais dentro de uma mesma síndrome.
Seria interessante ressaltar, no que se refere aos estudos de grupos de pacientes, alguns problemas que podem surgir na validação interna de uma pesquisa experimental, e no caso, de uma pesquisa neuropsicológica com ênfase experimental.
Tendo como base os problemas apontados por Campbell e Stanley (1968) em relação à pesquisa experimental, Crockett, Clark e Klonoff (1981) redimensionam os mesmos para a pesquisa no âmbito da Neuropsicologia.
O primeiro desses problemas, destacado pelos autores acima, refere-se às próprias mudanças que normalmente ocorrem no percurso de uma doença neurológica. Desordens de origem traumática ou por AVC, com início preciso e agudo ou desordens de origem degenerativa, com gradual deterioração cerebral, têm percursos distintos, sendo que as primeiras podem levar a uma recuperação posterior total ou parcial, e as segundas, a um declínio mental variável em seu percurso.
O segundo problema refere-se à seleção dos pacientes para a composição dos grupos experimental e de controle. Há, normalmente, dois métodos mais tradicionais de seleção de pacientes: no primeiro, os sujeitos são selecionados de acordo com o diagnóstico médico ou local da lesão, e, no segundo, os sujeitos são selecionados a partir de um modelo de comportamento pré-estabelecido, ou seja, a partir de um critério funcional dos sintomas mais significativos.
Este primeiro método de seleção, "o local da lesão", é problemático como "variável independente", pois as lesões, obviamente, são acidentais e consequentemente afetam áreas distintas cerebrais. Além disso, esta seleção parte da hipótese de que as relações entre o cérebro e o comportamento são invariantes, o que é questionado por inúmeros estudos de casos relatados na literatura.
Também Caramazza (1984), ao abordar os critérios anatômicos e funcionais utilizados na seleção dos grupos, aponta uma diferenciação entre alguns critérios anatômicos de seleção. Para este autor, os critérios anatômicos para composição de grupos podiam ser divididos em dois tipos mais amplos: o primeiro relacionado à unilateralidade da lesão, e o segundo relacionado a áreas anatômicas mais restritas, tais como um determinado lobo em um hemisfério.
Há que se observar que, apesar de problemas na seleção inerentes aos estudos de grupos, muitos estudos de grupo têm contribuído de modo substantivo para a pesquisa neuropsicológica. Neste contexto, o agrupamento de pacientes, a partir de critérios anatômicos tendo como base o locus cerebral da lesão, em termos de áreas cerebrais mais restritas, trouxe inúmeras contribuições teóricas para a investigação de déficits cognitivos mais específicos.
No que se refere ao critério funcional utilizado para a seleção experimental de pacientes com lesão cerebral, este toma como base os sintomas apresentados por estes pacientes no percurso da avaliação neuropsicológica. Uma abordagem sindrômica baseada na co-ocorrência de sintomas possui, entretanto, suas limitações, pois parte da assunção da homogeneidade dos pacientes selecionados, o que de fato não acontece quando se analisa com maior profundidade os déficits apresentados por estes.
Problemas teóricos e práticos podem surgir neste contexto, pois não só a complexidade e variabilidade dos déficits são comuns, como também a própria definição de síndrome, às vezes, é vaga e não tão consensual entre os pesquisadores. Não obstante, na clínica neuropsicológica, a taxionomia sindrômica, como, por exemplo, a das afasias, pode oferecer um referencial mais amplo em uma primeira avaliação mais geral do paciente. Em contraste, na pesquisa neuropsicológica, a pressuposição da existência de um sistema de processamento comum, danificado nos pacientes, pode levar à interpretação errônea dos achados clínicos. Mesmo porque, em realidade, como já visto, são muito raras as chamadas síndromes "puras" com apenas um componente (ou módulo) comprometido. Normalmente, as "síndromes" costumam apresentar mais de um componente comprometido, e são assim muito mais "mistas" do que parecem à primeira vista.
A partir de uma avaliação clínica e/ou de aplicação de testes estandardizados com o uso, por exemplo, de grandes baterias de testes como a Hastead-Reitan e a Luria-Nebraska, os sujeitos-pacientes eram selecionados para compor os grupos experimentais participantes da pesquisa neuropsicológica. Porém, dois problemas poderiam surgir nesse contexto: primeiro, não havia uma bateria de testes que fosse consensual entre os pesquisadores e, segundo, havia a dificuldade de generalização entre os estudos realizados. A variabilidade entre os sujeitos, como já foi mencionado, também era um dado complicador que complementava as dificuldades encontradas por esta abordagem.
Como aponta Caramazza (1984), considerar a variância intra-grupo como um erro randômico da variância pode mascarar as diferenças individuais significativas, ou seja, a heterogeneidade dos sintomas apresentados pelos pacientes.
Ainda podemos destacar outros problemas que podem afetar a validade interna de modelos neuropsicológicos puramente experimentais tais como a testagem em si e os instrumentos utilizados na avaliação.
No que se refere à testagem em si, os pacientes com lesão cerebral tendem a apresentar fadiga facilmente, e/ou podem demonstrar ansiedade pela dificuldade na resolução de certos testes. Baterias de testes mais longas podem, por um lado, ser mais abrangentes na avaliação dos déficits, mas, por outro, são exaustivas e sujeitas a interferências como a fadiga e a ansiedade dos pacientes.
Segundo Lezak (1995), as abordagens de avaliação neuropsicológica podem ser pensadas como situando-se em um continuum que vai desde um pólo mais quantitativo de análise a um pólo mais qualitativo. Abordagens que priorizam exclusivamente a avaliação de escores baseados no número de respostas corretas ou incorretas ou no tempo da resposta e derivam de uma aplicação universal de um formato único de procedimentos podem ser vistas como quantitativas. Como vimos, a ênfase na estandardização e na quantificação de dados e na comparação dos mesmos destaca-se neste contexto, e a chamada escola americana de Neuropsicologia dos anos 50 e 60 com sua tradição psicométrica situa-se nesse extremo. Em outro extremo, as abordagens de avaliação que se baseiam em uma detalhada análise das respostas, com particular atenção na singularidade das respostas, podem ser vistas como qualitativas.
Os instrumentos utilizados na avaliação neuropsicológica também podem apresentar problemas. A utilização de testes mais estandardizados, tais como o WAIS (Escala de Inteligência Wechsler para Adultos), em conjunção com testes mais específicos, tem se tornado mais corrente na pesquisa e na clínica neuropsicológica. Entretanto, como observa Crockett, Clark e Klonoff (1981), alguns testes como o BVRT (Benton Visual Retention Test), utilizado na clínica para avaliar a memória visual com bons resultados, apresentam problemas na pesquisa neuropsicológica em termos de escala, distribuição e variabilidade estatística.
Também podemos destacar o problema da interpretação dos dados clínicos apresentados pelos pacientes. Por exemplo, baixos escores em testes como o WAIS poderiam estar relacionados a diferentes fatores, tais como baixa fluência verbal, problemas de memória, diferenças culturais ou baixa inteligência. Cabe assinalar, entretanto, que a aplicação de testes mais específicos, posteriormente, orientados por uma hipótese mais focal, pode ajudar na discriminação da natureza dos déficits e na interpretação dos achados clínicos. Inclusive, o problema da validade ecológica de testes como o WAIS, dentre outros, tem sido destaque em trabalhos como os de Duncan, Burgess e Emslie (1995), Van der Elst, Van Boxtel, Van Breukelen e Jolles (2008), dentre outros autores.
Outro problema experimental que pode também surgir na pesquisa neuropsicológica é a chamada regressão estatística em direção à média. Dada a natureza da população preferencialmente estudada pela Neuropsicologia, podemos inferir que, em determinadas tarefas, tais sujeitos terão um desempenho abaixo da média. Mas, por definição, estes escores são, normalmente, extremos e assim mais suscetíveis de regressão em direção à média. Este problema é mais nítido especialmente quando somado aos problemas experimentais já citados anteriormente.
Campbell e Stanley (1968) também destacam outro problema que poderia afetar a validade interna de um dado experimento: a existência de "vieses" na seleção ou artefatos da seleção, como na acepção de Shallice (1988), dos sujeitos da pesquisa. Na Neuropsicologia, este problema pode ocorrer e, provavelmente, ocorre freqüentemente, pois a dificuldade na seleção de sujeitos que formem um grupo relativamente homogêneo é comum na pesquisa neuropsicológica. A variabilidade entre sujeitos normalmente é grande e não pode ser meramente resolvida a partir de critérios de diagnóstico. Esta variabilidade pode estar diretamente relacionada às variações do locus da lesão nos pacientes. As características pré-mórbidas dos pacientes também podem afetar o processo de seleção, levando a uma dificuldade de avaliação se um determinado desempenho após a lesão é realmente originado de um comprometimento cognitivo propriamente dito ou se tem também influência de dificuldades pré-mórbidas do paciente.
Um último problema apontado por Crockett, Clark e Klonoff (1981) refere-se à dificuldade de um acompanhamento experimental longitudinal em muitos pacientes, pois, muitas vezes, estes não retornam para novas avaliações ou há mortalidade nos grupos experimental e de controle.
Em suma, cabe assinalar que a interação entre os problemas já mencionados é mais comum do que a existência de um problema único, o que pode afetar ainda mais os estudos experimentais ou quase-experimentais na pesquisa e na clínica neuropsicológicas. Além disso, a etiologia do dano cerebral, a magnitude da lesão, a história da doença e outros fatores podem variar, e neste sentido são variáveis "incontroláveis" em um modelo experimental.
Uma mudança metodológica tem surgido, entretanto, nas últimas décadas, com o ressurgimento do status dos estudos de caso único, especialmente no âmbito da Neuropsicologia Cognitiva. De modo complementar, as modernas técnicas de neuroimagem in vivo também têm contribuído para a pesquisa na área, possibilitando em muitos casos uma localização mais precisa de algumas lesões. A seguir, abordaremos mais diretamente alguns aspectos teóricos e metodológicos envolvidos na pesquisa neuropsicológica na contemporaneidade.
A Contribuição Atual da Neuropsicologia Cognitiva e das Técnicas de Neuroimagem para a Pesquisa em Neuropsicologia
De modo diferenciado dos estudos pouco fundamentados dos construtores de diagrama do século XIX, os novos estudos de caso investigados pela Neuropsicologia Cognitiva contemporânea são vistos hoje em dia como um procedimento empírico bastante significativo para a construção de inferências sobre a cognição normal, pois, nestes estudos, há uma grande preocupação com a produção de dados quantitativos que possam permitir uma análise estatística consistente.
Alguns estudos de caso único, como, por exemplo, o estudo do paciente K. F. feito por Shallice e Warrington (1974), estudos anteriores de Scoville e Milner com o paciente HM. (2000), dentre inúmeros outros estudos, têm contribuído, inclusive, para a reformulação de teorias sobre a memória e para a revisão de modelos teóricos que não se coadunam com os seus achados clínicos. Os trabalhos de Baddeley (1986, 1990, 2000), com ênfase na construção de modelos sobre a memória de trabalho, exemplificam esse tipo de construção teórica de inspiração computacional.
Uma das vantagens do estudo de caso único é que este método parece permitir resolver o problema da heterogeneidade encontrada em estudos de grupos. Através de uma análise intensiva e quantitativa dos déficits e preservações dos pacientes, o estudo de caso único demonstra ser um método promissor para prover informações da organização funcional de subsistemas cognitivos.
A modularidade da mente, pressuposto teórico dominante na Neuropsicologia Cognitiva, por sua vez inspirado por Marr (1982) e Fodor (1983), parece encontrar no estudo de caso um importante aliado metodológico para respaldar a idéia de comprometimentos diferenciados em módulos específicos dos sistemas cognitivos. As dissociações funcionais, especialmente as duplas dissociações funcionais que surgem entre pacientes e intra-paciente complementam essa idéia de uma organização modular ou parcialmente modular de alguns subsistemas cognitivos. Aliás, como destacamos em trabalho anterior (Cagnin, 2009), uma grande contribuição metodológica para a Neuropsicologia foi o princípio de dupla dissociação funcional, proposto por Teuber (1955), princípio este cuja lógica Shallice (1988) considerava análoga à das interações cruzadas na análise de variância.
Uma dissociação funcional dupla poderia ser vista quando, por exemplo, um dado paciente tem um desempenho muito pobre em um processamento da informação, (p. e. capacidade de reconhecer faces), mas mantém a capacidade de processar a informação envolvida em outra tarefa (p. e. reconhecer símbolos). Em contraste com este primeiro paciente, é encontrado outro paciente que apresenta o desempenho oposto, ou seja, o reconhecimento de símbolos é preservado, mas não o de faces, o que demonstra certa independência entre esses dois tipos de processamentos. Já a dissociação funcional simples ou clássica seria observada quando há a perda de um dado processamento em um paciente sem que haja um contraste mais direto com a preservação simultânea desse mesmo processamento em outro paciente. Uma das desvantagens da dissociação funcional simples como método seria a de que não haveria o controle da complexidade da tarefa. Em outros termos, quando um dado paciente executa bem uma primeira tarefa e mal uma segunda tarefa, sem que possamos compará-lo com outro paciente que apresenta o quadro oposto em termos de déficits e de preservações cognitivas, isso pode ter sido devido à dificuldade da tarefa proposta. Porém, quando encontramos pacientes duplamente dissociados funcionalmente, a questão da dificuldade da tarefa deixa de existir.
Coltheart (2008) destaca o fato de que as inferências que partem das duplas dissociações funcionais teriam a vantagem de não apresentarem nenhum problema metodológico intrínseco, em contraste com as inferências baseadas nas associações funcionais ou mesmo nas dissociações funcionais simples. Neste sentido, então, parece haver certo consenso na área a respeito da importância das duplas dissociações funcionais, especialmente, para o entendimento dos subsistemas cognitivos envolvidos em determinados processamentos da informação.
Inicialmente, as duplas dissociações funcionais estavam correlacionadas com loci anatômicos cerebrais específicos, sendo que as dissociações eram assim consideradas como evidências de uma topografia cerebral diferenciada correlacionada com uma dada função cognitiva. Entretanto, há uma série de problemas com esta correspondência mais estreita entre função mental e área cerebral, em termos inferenciais, pois diferentes arquiteturas mais ou menos distribuídas podem produzir distintas dissociações funcionais. Neste sentido, na modernidade, a concepção de dupla dissociação funcional prescinde, muitas vezes, da variável anatômica inicialmente proposta por Teuber.
Em contraste com a associação de sintomas, base da classificação por síndromes, as duplas dissociações funcionais, especialmente as duplas dissociações "fortes", são importante método de comparação entre pacientes e mesmo intra-paciente, comparando seus déficits e preservações para a elaboração de inferências a respeito não só de natureza do quadro apresentado pelo paciente, mas também apontando para a organização normal do sistema cognitivo.
No que se refere às associações funcionais entre déficits, frequentemente, pode se tornar difícil discernir se trata-se de uma associação anátomo-funcional ou de uma mera proximidade anatômica da lesão, sem o envolvimento de uma relação funcional significativa entre os déficits. Em outras palavras, a lesão pode danificar áreas anatômicas próximas, áreas estas que podem ou não ser a base neural de componentes cognitivos distintos. Porém, como na clínica neuropsicológica os sintomas associados a estes componentes costumam co-ocorrer, parecem ser originados de um mesmo "módulo" ou subsistema cognitivo. Através de uma dupla dissociação funcional entre pacientes que apresentam, de modo diferenciado, comprometimentos diferentes, muitas vezes opostos, em tarefas distintas, podemos discriminar melhor, hipoteticamente falando, os subsistemas cognitivos subjacentes aos déficits apresentados.
Como também assinalam Ellis e Young (1988), os pacientes podem ser semelhantes em alguns sintomas, mas são diferentes em outros, e mesmo naqueles que apresentam sintomas semelhantes, isso não significa necessariamente que estes sintomas comuns sejam necessariamente causados pelo mesmo motivo.
Caramazza (1986), ao abordar os componentes necessários para a explicação dos achados neuropsicológicos, realça a necessidade da construção de uma hipótese inicial sobre o funcionamento normal de um dado subsistema cognitivo. A seguir, ele aponta a necessidade da elaboração de uma hipótese a respeito de "como" este subsistema foi danificado por certa lesão. Também a assunção de que o comportamento apresentado pelo paciente reflete as operações do sistema cognitivo subtraído de alguns de seus componentes (a assunção de transparência ou subtração) complementa estes requisitos. Por último, a assunção de que todos os sistemas cognitivos funcionam do mesmo modo, quando intactos, a chamada universalidade, é também um princípio básico que guia as análises explicativas na Neuropsicologia.
A partir desses princípios diretores mais amplos, Caramazza sugere algumas conclusões, realçando a importância dos estudos de caso único para a pesquisa neuropsicológica. Para ele, cada caso poderia ser visto como uma espécie de "teste independente" para a uma dada teoria e a generalização não poderia ser feita de modo pré-teórico entre pacientes. Também, em sua opinião, não é possível replicar um determinado achado clínico na Neuropsicologia. E, por último, os estudos de grupo são por ele vistos como não possibilitando uma base significativa de dados para a generalização para a função normal.
Podemos inferir que Caramazza (1986) e Caramazza e Coltheart (2006), dentre outros, defendem o estudo de caso único como o método mais adequado a ser utilizado na investigação neuropsicológica que tem como objetivo a entendimento da função normal. Ellis e Young (1988) também apóiam a legitimidade do estudo de caso em detrimento dos estudos de grupos, concordando com Caramazza e Caramazza e colaborador, no que a isso diz respeito.
Os chamados neuropsicológicos "ultra-cognitivistas", na acepção de Shallice (1988), também parecem não se preocupar com a correlação entre o locus cerebral da lesão e os déficits funcionais apresentados pelo paciente. Para eles, a questão da localização cerebral de funções deixa de ser prioritária no contexto de pesquisa na Neuropsicologia Cognitiva. Em contrapartida, Shallice (1988), defende a compatibilização dos estudos de grupo com os estudos de caso, pois, em sua opinião, ambos podem contribuir para a formulação e a testagem de hipóteses na pesquisa neuropsicológica. Concordamos com Shallice e com sua perspectiva mais moderada, que visa a compatibilizar os dois tipos de metodologias, estudo de caso e de grupo, pois, acreditamos na possibilidade do intercâmbio de informações para a construção teórica que possa advir do uso desses dois métodos.
Apesar de demandarem mais tempo e esforços na seleção dos pacientes apropriados, os estudos de grupo não devem ser rejeitados como metodologia, pois trazem a vantagem de resultados mais fidedignos e a possibilidade de maior generalização, estandardização e comparação entre os pacientes. Também os estudos de casos encontram alguns problemas tais como os padrões de recuperação apresentados pelos pacientes após o comprometimento cerebral.
Estudos longitudinais centrados na avaliação de padrões de recuperação podem ser também úteis na pesquisa neuropsicológica, na medida em que acompanham a evolução dessa variação e podem ajudar na interpretação dos déficits. Estratégias utilizadas pelos pacientes após a lesão, como já mencionamos inicialmente, também podem complementar as dificuldades de avaliação do desempenho destes pacientes no sentido da discriminação dos déficits e preservações em seu quadro clínico.
Não obstante, o método das duplas dissociações funcionais pode ajudar na identificação desses déficits e preservações e, assim, minorar os efeitos tanto da recuperação quanto da utilização de novas estratégias cognitivas após a lesão cerebral. As duplas dissociações funcionais são, neste sentido, mais importantes do que as dissociações simples, no que se refere às dificuldades interpretativas dos déficits. Como vimos, eliminar a hipótese de uma interferência de dificuldade de tarefa, no sentido de uma maior complexidade da mesma afetando o desempenho de um paciente, é um dos papéis da dupla dissociação funcional.
Cabe observar que, mesmo no estudo de caso único, normalmente, há a aplicação de uma abordagem experimental onde o próprio paciente é o seu "controle". Aspectos quantitativos são enfatizados e parecem se conjugar para uma avaliação mais detalhada dos déficits e preservações apresentadas pelo paciente. Nesta direção, como também assinala Lezak (1995), a avaliação neuropsicológica pode ser vista como uma série de "experimentos" guiados por uma hipótese explicativa, como ocorre em situações tradicionais de pesquisa. Sendo assim, então, não só o neuropsicólogo mais diretamente voltado para a pesquisa neuropsicológica, como o neuropsicológo com uma ênfase mais clínica e nos processos de reabilitação, poderiam ser considerados "pesquisadores" em sua prática.
Como destacam Semenza, Bisiacchi e Rosenthal (1988), há uma tendência, na Neuropsicologia Cognitiva, em contraste com a Neuropsicologia das décadas de 50 e 60, para a conformação de grupos menores e mais homogêneos de pacientes e também para estudos de casos dentro de um grupo, ou seja, uma espécie de método misto que permite a análise das diferenças individuais dentro do estudo de grupo.
Observamos assim na contemporaneidade, como também aponta Ralph (2004), o aumento do número de pesquisas que incluem uma série de casos que envolvem pacientes similares, estudados tanto individualmente quanto de modo comparativo. Este tipo de metodologia "mista" parece compatibilizar as vantagens do estudo de caso único com as vantagens do estudo de grupos de pacientes, como sugerem Ralph, Moriarty e Sage (2002). Esse tipo de metodologia "híbrida" parece permitir, como observam esses últimos autores, uma melhor explicitação da relação entre a severidade do déficit e o desempenho na tarefa, algo que seria impossível apenas com estudos de casos únicos.
A utilização de testes padronizados, retirados de um pool de testes, a partir de uma hipótese explicativa, e a posterior escolha de testes ou tarefas complementares mais específicas para avaliar os aspectos mais comprometidos de cognição, pode ser um bom referencial tanto para os estudos de caso quanto para os estudos de grupo. Esta abordagem mais focal, na clínica e na pesquisa neuropsicológicas, parece ter inúmeras vantagens, não só em termos de sua aplicabilidade, como também para a testagem de hipóteses mais definidas e mais teoricamente direcionadas.
Não obstante, como observam Newcombe e Ratcliff (1979), podemos observar algumas dificuldades interpretativas quando se parte dos resultados obtidos em um dado teste para a postulação de hipóteses e de inferências sobre a âfunção' cognitiva que está sendo avaliada. Aliás, a inferência feita a respeito do funcionamento cognitivo a partir dos resultados da avaliação comportamental obtidos em testes ou em tarefas experimentais, tanto em pacientes com déficits cognitivos quanto em indivíduos normais, pode sofrer efeitos interpretativos variáveis. Em outros termos, para os autores, as funções cognitivas não seriam avaliadas per se, mas sim o comportamento que, por sua vez, demanda processos inferenciais para ser interpretado. E, como vimos, o próprio conceito de função mental pode variar de acordo com a abordagem teórica utilizada na área.
Cabe abrir um parênteses para a menção aos trabalhos desenvolvidos no contexto brasileiro, como os de Capovilla (2007), Ferracini, Trevisan, Capovilla e Dias (2007), Capovilla e colaboradores (2009), com ênfase no uso da avaliação psicológica e na construção e validação de testes. Com o desenvolvimento de um grande número de testes e com uma abrangência de populações estudadas, esses pesquisadores têm contribuído para o aprimoramento metodológico e para a amplificação de questões teóricas na área.
Concluímos que a emergência do novo paradigma do processamento da informação, que muito influenciou a Neuropsicologia Cognitiva, teve implicações não só do ponto de vista metodológico, ou seja, afetando o tipo de método e os procedimentos experimentais adotados, mas também afetando o tipo de inferência possível a ser delineada a partir dos achados dos pacientes com lesão cerebral.
Já no que se refere à questão da localização cerebral da lesão, esta pode ser mais ou menos importante, dependendo dos objetivos da pesquisa neuropsicológica. Na clínica neuropsicológica, por exemplo, esta questão ainda tem bastante relevância, talvez mais do que nas pesquisas cognitivamente orientadas da Neuropsicologia Cognitiva. Pesquisadores como Shallice (2003), em estudos mais recentes, destacam a importância dos estudos feitos com técnicas de neuroimagem, pois acreditam que os mesmos podem ajudar não só no entendimento da organização cerebral de funções, mas também da compreensão do funcionamento cognitivo humano. Inclusive, acreditamos que as inúmeras pesquisas que utilizam as atuais técnicas de neuroimagem nas Neurociências têm contribuído para redimensionar a questão da localização cerebral de funções na contemporaneidade, possibilitando, por um lado, uma localização mais precisa de algumas lesões em pacientes neurológicos e, por outro lado, o estudo do cérebro in vivo em pacientes lesionados e em indivíduos normais.
Em contraposição ao método anátomo-clínico, utilizado, muitas vezes, para inferir o locus da lesão em pacientes neurológicos com a posterior localização post mortem da área cerebral afetada, estas técnicas não invasivas podem prescindir desse tipo de inferência, isto é, a localização das áreas cerebrais e de sua ativação seletiva se dá diretamente pelas imagens obtidas. No caso de lesões cerebrais, ajudam na precisão do local e tamanho da lesão, trazem informações sobre processos de atrofia cerebral e podem indicar assimetrias hemisféricas em indivíduos com ou sem comprometimentos cerebrais.
Técnicas como a Tomografia Computadorizada (CT), a Imagem por Ressonância Magnética Funcional (fMRI) e a Tomografia por Emissão de Pósitrons (PET), dentre outras técnicas de neuroimagem, têm também ajudado no teste de modelos teóricos, muitos deles de inspiração computacional, além de revelaram os substratos neurais de processamentos cognitivos mais implícitos, inclusive podendo demonstrar a recuperação funcional cerebral, como sugerem Humphreys e Price (2001). Nesta direção, o desenvolvimento de programas computadorizados que modelam o funcionamento cerebral tem ajudado na testagem de hipóteses sobre este funcionamento, bem como tem ajudado na observação dos efeitos de lesões seletivas em partes desse sistema (Santos, 2008).
Também na concepção de Henson (2005), as técnicas de neuroimagem, especialmente a PET e a fMRI ajudariam na construção da hipótese de um mapeamento "sistemático" entre estrutura e função no cérebro, e poderiam auxiliar na testagem de modelos teóricos, mas isso não significa estabelecer uma correspondência termo a termo de variáveis comportamentos com estruturas cerebrais. Neste caso, segundo este autor, os dados trazidos por estas técnicas poderiam ser considerados uma variável dependente, como a própria variável comportamental, e poderiam ajudar não só no diagnóstico clínico de pacientes, mas também nas pesquisas experimentais da Psicologia Cognitiva.
Santos (2008) destaca que as inovações tecnológicas expressas pelas diferentes técnicas de neuroimagem estrutural e funcional, aliadas às técnicas neurofisiológicas, podem auxiliar no diagnóstico precoce dos distúrbios cognitivos e comportamentais. E para Marcucci e Vandresen (2006), a análise da atividade cerebral in vivo ajudaria na identificação das áreas do cérebro que estão mais ativadas e subjacentes a determinados comportamentos, bem como ajudaria na definição de áreas cerebrais comprometidas. De modo complementar, possibilitaria entender o processo de recuperação neuronal, ou seja, a plasticidade cerebral, quando há algum tipo de injúria ou lesão.
No que diz respeito à plasticidade cerebral, podemos observar que, como sinalizam Bates e Elman (1994), Stiles (2000) e Stiles e colaboradores (Stiles & Thal, 1994; Stiles, Reilly, Paul & Moses, 2005), e no passado já havia sinalizado Lenneberg (1967), dentre outros, a razoável recuperação de funções linguísticas e espaciais, após injúria cerebral no início do processo do desenvolvimento ontogenético, sugere a ativação de mecanismos de plasticidade em sistemas cerebrais imaturos em contraposição à menor plasticidade observada após comprometimentos cerebrais em adultos. Segundo Stiles (2000), com o desenvolvimento, os sistemas neurais estabilizariam padrões de funcionamento otimizados, mas isto não elimina a capacidade de adaptação destes sistemas, ainda que em menor grau.
Os estudos destes e de outros autores sugerem que quando se compara as lesões cerebrais precoces com as lesões adquiridas em adultos, os padrões de associação entre o comportamento e o substrato neural afetado pode ser mais variável, ou seja, como observa a autora supracitada (Stiles, 2000), padrões particulares de mudança podem variar em função da idade e do domínio do conhecimento avaliado. Ainda que estes mecanismos não sejam bem conhecidos em suas bases, supõe-se que os mesmos envolvam mudanças tanto no substrato neural quanto nas estratégias cognitivas utilizadas pelas crianças para atingir determinados comportamentos.
No se refere a algumas das implicações dos mecanismos de plasticidade para a pesquisa na área, podemos observar assim certo dinamismo na própria organização funcional ao longo do desenvolvimento, especialmente na criança, mas também em adultos, ainda que em menor grau, o que parece trazer alguns problemas para o pressuposto de uma estabilização funcional invariável. Inclusive, podemos aqui argumentar se as técnicas de neuroimagem funcional seriam sensíveis para captar esse tipo de variabilidade, especialmente quando a mesma é sutil.
Um outro problema que observamos no uso das técnicas de neuroimagem refere-se ao fato de que também pode haver variabilidade nos indivíduos em termos de idade, sexo, preferência manipulatória, dentre outras variações inter-individuais que podem ter implicações na organização funcional cerebral, o que pode levar a uma maior dificuldade de interpretação das imagens e do cotejamento das mesmas. Nesta perspectiva, as variáveis individuais devem ser consideradas quando se utiliza este tipo de técnica, o que poderia limitar, a nosso ver, o grau de generalização das correlações anátomo-funcionais encontradas.
De modo complementar, podemos argumentar quais seriam as implicações das técnicas de neuroimagem para a Neuropsicologia, em especial para a Neuropsicologia Cognitiva. Muitos pesquisadores, especialmente aqueles com ênfase âultra-cognitivista', como Ellis e Young (1988), como o próprio adjetivo insinua, costumam negligenciar as variáveis cerebrais e a localização cerebral de funções, enfatizando a construção de modelos de processamento da informação tendo como inspiração o pressuposto da modularidade da mente. Através da priorização de estudos de casos únicos, consideram, inclusive, que a Neuropsicologia Cognitiva é uma espécie de âmétodo' da Psicologia Cognitiva, na medida em que pode trazer contra-exemplos', ou seja, exemplos que possam refutar, a partir de uma lógica de falseabilidade, modelos estabelecidos de cognição normal. Neste contexto, podemos argumentar que as técnicas de neuroimagem não adquirem a importância que possuem para outras abordagens neuropsicológicas mais preocupadas com a relação cérebro-mente per se.
Como mencionamos anteriormente, a pressuposição de modularidade aplicada ao contexto da Neuropsicologia Cognitiva é mais afeita à perspectiva de Marr (1982) do que a de Fodor (1983), ou seja, a idéia de um encapsulamento informacional dos módulos cognitivos, preconizada por Fodor, bem como o caráter inato dos mesmos, não encontra total respaldo na área. Inclusive, na contramão da perspectiva inicial de Fodor, alguns autores (i.e. Norman & Shallice, 1980; Shallice, 1988) propõem uma organização semi-modular em sistemas de domínio geral, como os sistemas centrais, e não apenas em sistemas de domínio específico. Observamos ainda autores que parecem compatibilizar uma abordagem modularista com o uso de técnicas de neuroimagem, como alguns expoentes da chamada Neurociência Cognitiva (i.e. Swick, Ashley & Turken, 2008, dente outros), pois, mesmo que não utilizem explicitamente o termo "modularidade" em seus argumentos teóricos, a nosso ver, propõem correspondências mais estritas entre estruturas cerebrais e determinados funcionamentos mentais.
Não obstante, algumas limitações das técnicas de neuroimagem poderiam ser apontadas, dentre elas está o fato de não se mostrarem totalmente sensíveis a determinados tipos de lesões mais difusas ou originadas por problemas neuroquímicos cerebrais. De modo complementar, a dificuldade de ajustamento temporal entre as variáveis comportamentais, muitas delas de grande complexidade, e as variáveis cerebrais subjacentes podem influenciar na interpretação das imagens obtidas e, consequentemente, podem levar a correlações equivocadas e/ou parciais entre essas variáveis. Em alguns casos, a nosso ver, poderia ocorrer também a interpretação de uma relação de causa-efeito entre estas variáveis onde apenas são encontradas correlações mais amplas, o que poderia levar a conclusões apressadas e errôneas a respeito da relação entre as bases cerebrais de determinados comportamentos.
Por fim, acreditamos que as modernas técnicas de neuroimagem, apesar de suas limitações, nem todas elas aqui elencadas, podem trazer significativas contribuições não só para a compreensão da organização cerebral das funções cognitivas humanas, mas também para o entendimento do funcionamento cognitivo per se. Neste sentido, dependendo dos objetivos da pesquisa clínica, experimental e/ou teórica e da formação dos pesquisadores que compartilham do interesse pelo estudo da relação cérebro-mente, as técnicas de neuroimagem podem adquirir maior ou menor importância. Porém, cabe observar que o alto custo desses recursos tecnológicos faz com que os mesmos nem sempre estejam disponíveis para a pesquisa neuropsicológica.
Considerações Finais
A significativa evolução teórica e metodológica que tem ocorrido nas Neurociências de modo geral, em especial na Neuropsicologia contemporânea, tanto em sua vertente mais cognitivista, com menor ênfase no estudo do hardware cerebral, quanto em sua vertente mais moderada, com igual ênfase no funcionamento cognitivo e na localização cerebral de funções, tem muito contribuído para o entendimento da cognição deficitária exibida pelos pacientes neurológicos, bem como para o entendimento das funções cognitivas normais.
Acreditamos, conjuntamente com Vallar (1999), que os estudos de caso único e os estudos de grupos de pacientes desenvolvidos na área, a par de suas vantagens e limitações metodológicas, podem contribuir, ambos, para o desenvolvimento do conhecimento a respeito da arquitetura neural e funcional envolvida nas funções mentais, e não haveria razão para a exclusão de uma destas fontes de pesquisa clínica e teórica. Mas, dependendo dos objetivos da pesquisa e das circunstâncias, pode haver a priorização de um destes tipos de estudos.
Os estudos de caso único ainda se mostram relevantes na contemporaneidade, a nosso ver, pela dificuldade de se encontrar, na clínica neuropsicológica, muitas vezes, homogeneidade nos sintomas exibidos pelos pacientes. Neste contexto, as técnicas de neuroimagem poderiam ajudar na identificação do locus da lesão, bem como, em alguns casos, de sua particularidade anatômica, corroborando assim os achados clínicos peculiares encontrados na avaliação clínica. Podemos ainda realçar o valor epistemológico dos estudos de casos na falsificação de hipóteses e de modelos teóricos, na tradição de estudos clássicos na área, como os de Baddeley (1990, 2000).
Os estudos de grupos, por sua vez, também parecem se beneficiar do uso de técnicas de neuroimagem funcional, pois as mesmas permitem a seleção de indivíduos a partir de critérios anatômos-funcionais. Nesta perspectiva, tanto os estudos com pacientes com síndromes neurológicas adquiridas, congênitas e/ou genéticas, transtornos psiquiátricos ou do desenvolvimento, dentre outros, quanto os estudos com indivíduos normais poderiam se beneficiar do uso desse tipo de técnica.
Os achados obtidos em pesquisas experimentais com sujeitos animais e, em alguns casos, com o uso de neuroimagem (como as de Shadlen e Newsome, 2001) com macacos rhesus, dentre outras) e com sujeitos humanos sem comprometimentos cerebrais também podem contribuir para corroborar os achados sugeridos pelas pesquisas desenvolvidas na clínica neuropsicológica, sendo esse intercâmbio de informações bastante profícuo para o desenvolvimento da área.
Nesta perspectiva, acreditamos que uma abordagem integrativa e inclusiva dos estudos de caso único e de grupo de pacientes, conjuntamente com os estudos experimentais com sujeitos animais e com indivíduos normais, possibilitaria não só o cotejamento de informações obtidas a partir de diferentes técnicas e métodos, mas também a articulação de saberes que, apesar de diferenciados, a nosso ver, não se mostram excludentes.
Desde os primórdios dos estudos da relação cérebro-mente, com a emergência do método anátomo-clínico e sua contribuição pioneira para uma análise verdadeiramente científica dessa relação, passando pelos avanços metodológicos originados pela construção e estandardização de inúmeros testes, até o panorama científico atual com as técnicas de neuroimagem funcional em um contexto teórico com diversificados modelos de processamento da informação, o percurso da pesquisa em Neuropsicologia parece ter se dado por etapas, ou escolas, como prefere Shallice (1988), etapas estas que utilizaram, preferencialmente, alguns métodos e técnicas de pesquisa.
Cabe observar que quando um novo método surge no panorama científico costuma haver certa adesão imediata ao mesmo e certa priorização de suas vantagens em detrimento de suas limitações. Porém, acreditamos que o aumento de pesquisas que utilizam estas abordagens metodológicas, muitas delas relatando dificuldades e/ou a insuficiência do método e/ou das técnicas a este relacionadas para o alcance de determinados objetivos, possa suscitar uma reflexão crítica a respeito das vantagens e limitações do método ou técnica em questão.
No que se refere às técnicas de neuroimagem, a par de suas possibilidades e limites metodológicos e inferenciais, acreditamos que as mesmas possam contribuir de modo significativo para a pesquisa na Neuropsicologia, apesar de observarmos, em alguns casos, certo exagero no tipo de inferência feito a respeito da relação cérebro-mente tendo como base a avaliação da atividade cerebral.
De modo complementar, acreditamos que a construção de modelos de funcionamento cognitivo humano e o teste de sua aplicabilidade na clínica e na pesquisa neuropsicológicas também podem trazer contribuições importantes para o desenvolvimento teórico e metodológico no âmbito das Ciências Cognitivas, incluindo aqui a Psicologia Cognitiva, e das Neurociências de modo geral.
A natureza investigativa da Neuropsicologia merece aqui destaque, pois são as hipóteses teoricamente guiadas que fornecem a linha base norteadora na pesquisa, avaliação e reabilitação neuropsicológicas. Como vimos, as abordagens de avaliação neuropsicológica desde aquelas situadas em um pólo mais quantitativo de análise até aquelas situadas em um pólo mais qualitativo devem levar em conta o caráter investigativo de todo trabalho neuropsicológico, seja nos processos de avaliação, diagnóstico e reabilitação, seja na pesquisa empírica e na construção teórica.
Por fim, apesar do grande desenvolvimento teórico e metodológico que as Neurociências e a Neuropsicologia vêm vivenciando nas últimas décadas, acreditamos que ainda existam muitos problemas teóricos e metodológicos relacionados ao estudo da relação cérebro-mente que demandam melhor explicitação e que, a nosso ver, trazem inúmeros desafios para a realização de pesquisas na área.
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Endereço para correspondência
Rua Barata Ribeiro, 70/1603 - Copacabana
CEP 22011-002 - Rio de Janeiro/RJ
E-mail: scagnin@oi.com.br
Recebido em Abril de 2010
Revisto em Setembro de 2010
Aceito em Setembro de 2010