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Revista Psicologia Organizações e Trabalho
versão On-line ISSN 1984-6657
Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.17 no.3 Brasília jul/set. 2017
https://doi.org/10.17652/rpot/2017.3.13269
Desenvolvimento de carreira de estudantes durante a graduação: análise de fundamentos epistemológicos em estudos nacionais
Career development for undergraduate students: analysis of epistemological principles in studies in Brazil
Desarrollo de la carrera de estudiante durante la enseñanza superior: análisis de fundamentos epistemológicos en estudios nacionales
Fernanda Zatti; Iúri Novaes Luna; Narbal Silva; Gabriel Lopes Rosa Feigel
Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
RESUMO
As transformações no contexto contemporâneo do trabalho têm significativo impacto sobre a construção de trajetórias profissionais, configurando novos modelos de carreira. Esta investigação teve como objetivo analisar os fundamentos teóricos e epistemológicos que sustentam as produções científicas nacionais em estudos empíricos sobre desenvolvimento de carreira de estudantes de graduação. Realizou-se uma revisão sistemática da literatura, composta por 19 trabalhos obtidos mediante consulta eletrônica nas fontes Portal de Periódicos CAPES, BVS Psicologia Brasil, Banco de Teses e Dissertações CAPES e Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações. Os estudos analisados utilizaram-se predominantemente de abordagens de natureza construtivista e de perspectivas ligadas aos quadrantes subjetivos, relacionados à sociologia da regulação. No tocante aos eixos temáticos em Psicologia Organizacional e do Trabalho, houve predomínio de estudos relacionados ao eixo do comportamento. Recomenda-se o avanço na exploração da temática em outros estudos nacionais no âmbito da formação superior.
Palavras-chave: desenvolvimento profissional; ensino superior; epistemologia.
ABSTRACT
The transformations that characterize the contemporary context of the labor market have significant impact on the construction of professional trajectories, constituting new career models. This study aimed to analyze the theoretical and epistemological principles that support the Brazilian scientific production in empirical studies about career development of undergraduate students. Therefore, a systematic literature review was performed; it was composed of 19 articles obtained from online searches of the following sources: Portal de Periódicos CAPES, BVS Psicologia Brasil, Banco de Teses e Dissertações CAPES, and Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações. The studies analyzed were predominantly based on constructivist approaches and perspectives linked to the subjective quadrants, related to the sociology of regulation. Regarding the thematic axes in Work and Organizational Psychology, there was a predominance of studies related to the behavioral axis. Further research on the subject in studies on Brazil in the undergraduate context is recommended.
Keywords: professional development; higher education; epistemology.
RESUMEN
Las transformaciones en el contexto contemporáneo del mundo laboral influyen en la construcción de trayectorias profesionales, configurando nuevos modelos de carrera. El presente estudio tuvo como objetivo analizar los fundamentos teóricos y epistemológicos que apoyan las producciones científicas nacionales en estudios empíricos sobre el desarrollo de carrera de los estudiantes de la enseñanza superior. Para eso, se realizó una revisión integradora de la literatura, compuesta por 19 trabajos obtenidos del Portal de Periódicos CAPES, BVS Psicologia Brasil, Banco de Teses e Dissertações CAPES y Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações. Los trabajos analizados utilizaron predominantemente enfoques con naturaleza constructivista y perspectivas vinculadas a los cuadrantes subjetivos, relacionados con la sociología de la regulación. En cuanto a los ejes temáticos en Psicología del Trabajo y de las Organizaciones, hubo predominancia de investigaciones relacionadas con el eje comportamental. Se recomienda el avance en la exploración de la temática en otros estudios nacionales en el ámbito de la formación superior.
Palabras-clave: desarrollo profesional; enseñanza superior; epistemología.
O mundo do trabalho contemporâneo constituiu-se a partir de significativas mudanças sociais, políticas, culturais e econômicas, resultantes das alterações nas relações entre capital e força de trabalho, decorrentes das transformações dos processos produtivos, sobretudo no que se refere à diminuição da importância da produção industrial em massa e à valorização da acumulação flexível (Harvey, 2006). Na conjuntura atual, a intensificação de mudanças no conteúdo e no contexto do trabalho impõe novas demandas aos trabalhadores, que precisam desenvolver novos repertórios comportamentais (Magalhães, 2011). Ademais, crises econômicas, reestruturações e demissões, características da sociedade pós-industrial, demandam habilidades para enfrentar transições frequentes de trabalho (Nota, Ginevra, & Soresi, 2012). Essas transformações, que revestem o contexto contemporâneo do trabalho, bem como outros espaços de vida, impactam e alteram a construção das trajetórias profissionais, configurando novas formas e modelos de carreira.
Em sua origem, a concepção de carreira surgiu no interior das fábricas e tradicionalmente foi definida por um processo psicossocial associado às organizações (Ribeiro, 2009, 2011a). No entanto, conforme Ribeiro (2011a), o processo de elaboração da concepção e da ferramenta denominada carreira somente pode ser compreendido se situado social e historicamente na constituição do mundo do trabalho, que vem se transformando significativamente nas últimas décadas. Desse modo, a carreira é um construto teórico e prático, instituído nos primórdios do século XX, para designar a progressão das pessoas no interior das empresas (dimensão objetiva dos planos organizacionais de carreira), que resultou, também, na configuração de sua dimensão subjetiva (desenvolvimento e trajetória psicossocial das pessoas no trabalho) (Ribeiro, 2015).
Importa considerar que, no bojo das transformações contemporâneas, a formação superior constitui uma etapa significativa no desenvolvimento da carreira de um número cada vez maior de pessoas. No sistema educacional brasileiro, a passagem pelo ensino superior é quase uma unanimidade nas expectativas dos adolescentes e adultos jovens das classes média e alta, para os quais parece não existir outra forma de profissionalização ou inserção no mercado de trabalho (Soares, 2002). Ademais, a segunda metade do século XX foi marcada por uma expansão sem precedentes da demanda e da oferta da educação superior no Brasil (Ministério da Educação e Cultura [MEC], 2012), cenário em que o número total de matrículas no ensino superior brasileiro cresceu 81% entre os anos de 2003 e 2012 (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira [Inep], 2014). Entretanto, é preciso considerar que no Brasil, no ano de 2013, entre as pessoas ocupadas, apenas 14,9% tinham concluído o nível superior (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE], 2013), o que indica que, apesar da expansão verificada, o acesso a esse grau de instrução ainda é restrito a uma parcela muito pequena da população.
O período de formação superior é um momento privilegiado para a construção da identidade profissional e a consolidação da identidade pessoal. Nesse sentido, o estabelecimento de objetivos de carreira está relacionado com a clareza sobre a própria identidade, a percepção de capacidade pessoal, o comportamento exploratório, a percepção de barreiras e de apoio e a percepção pessoal sobre o mercado de trabalho (Teixeira & Gomes, 2005). Ademais, o desenvolvimento de objetivos profissionais claros e planos para implementá-los, bem como os compromissos assumidos neste sentido, são indicadores de maturidade e desenvolvimento psicossocial (Almeida & Soares, 2003). Logo, percebe-se a importância que questões relativas à carreira apresentam no contexto das experiências vivenciadas no curso superior, constituindo um aspecto relevante na compreensão de condições relacionadas à permanência, à evasão, ao desempenho, à satisfação e ao desenvolvimento psicossocial.
A carreira é, assim, um processo contínuo, ao longo do ciclo vital, constantemente em desenvolvimento (Super, 1980). Neste trabalho, a carreira é entendida como a continuidade da vida do indivíduo no trabalho, a partir de um passado vivenciado e um futuro planejado que traz um significado para direcionar as ações do presente (Lisboa & Soares, 2000).
O desenvolvimento de carreira, por sua vez, é um processo que influencia as mudanças sistemáticas que podem ser observadas no comportamento vocacional1 ao longo do tempo (Crites, 1974), constituindo-se pelas contínuas escolhas ocupacionais realizadas ao longo da vida (Brown & Brooks, 1990). Diz respeito, portanto, à pessoa em constante mudança nos contextos de sua vida, de modo que converge com o desenvolvimento pessoal. Dessa maneira, o indivíduo e as circunstâncias de sua vida, em interação mútua, constituem o foco e a trama do desenvolvimento de carreira (Wolfe & Kolb, 1980). O desenvolvimento de carreira durante a graduação compreende, portanto, as experiências vivenciadas durante a formação profissional e que constituem a relação entre autoconceito e trabalho por meio da atualização da identidade profissional.
Ao considerar os argumentos até aqui apresentados, entende-se que estudos teóricos e empíricos que busquem conhecer as vivências no ensino superior podem auxiliar na identificação de fatores associados à evasão e a outros aspectos do desenvolvimento psicossocial dos acadêmicos (Teixeira, Castro, & Piccolo, 2007). No que diz respeito aos estudos nacionais no campo do desenvolvimento de carreira, Bardagi, Lassance e Paradiso (2003) ressaltam que a maioria deles se concentrava em amostras de adolescentes ou abordava questões relativas à entrada no mercado de trabalho ou, ainda, à problemática dos profissionais já inseridos na esfera produtiva. Diante dessa constatação, as autoras apontaram para a necessidade da realização de mais estudos para a compreensão dos vários fatores que afetam o desenvolvimento de carreira de universitários. Aliado a isso, entende-se que identificar como a literatura tem se constituído neste campo e como os estudos já realizados vêm sendo concebidos no âmbito da psicologia pode contribuir com o avanço científico na área, pois a identificação de padrões de produção de conhecimentos, bem como o mapeamento de perspectivas metodológicas e temáticas abordadas ajudam a definir lacunas e promover o desenvolvimento em determinados campos de pesquisa (Santos & Kobashi, 2009). Tendo em vista o que até aqui foi exposto, no presente trabalho o propósito central será o de revisar, de forma sistemática, estudos empíricos referentes ao desenvolvimento de carreira de estudantes durante a graduação. Pretende-se, assim, realizar o mapeamento e a caracterização das pesquisas realizadas neste âmbito, bem como analisar os fundamentos teóricos e epistemológicos que as sustentam.
Na discussão dos aspectos epistemológicos, partiu-se da identificação das abordagens teóricas que embasam a produção científica no campo do desenvolvimento de carreira de estudantes durante a graduação, localizando-as nas perspectivas epistemológicas em psicologia vocacional (objetivismo, construtivismo e construcionismo social) (Melo-Silva & Ribeiro, 2015; Metz & Guichard, 2009; Patton & McMahon, 2014; Ribeiro, 2011b; Ribeiro, 2013). A partir disso, serão propostas possíveis articulações com os paradigmas sociológicos (funcionalismo, interpretativismo, humanismo radical e estruturalismo radical), sugeridos por Burrell e Morgan (1979). Tais articulações visam a um aprofundamento da análise a ser empreendida, haja vista que os quadrantes epistemológicos, propostos por Burrel e Morgan (1979), contribuem para a localização das divergências e das aproximações existentes entre os pressupostos teóricos e epistemológicos que circunscrevem os fenômenos de pesquisa, em especial os de natureza psicossocial.
Ademais, buscou-se apresentar aproximações entre os estudos científicos localizados e os três eixos temáticos da psicologia organizacional e do trabalho2: o do comportamento, o da subjetividade e o clínico, propostos por Bendassolli, Borges-Andrade e Malvezzi (2010). A sistematização proposta permite classificar as diversas perspectivas de análise predominantes no campo da psicologia organizacional e do trabalho, elencando critérios claros e epistêmicos que facilitam a diferenciação dos pesquisadores e dos profissionais do campo (Borges, 2010).
Com o intuito de subsidiar as discussões aqui propostas, apresenta-se inicialmente uma breve descrição das perspectivas epistemológicas em psicologia vocacional, das proposições de Burrel e Morgan (1979) e de Bendassolli et al. (2010). Em seguida, são descritos o método utilizado, bem como os dados obtidos a partir da busca sistemática na literatura. Por fim, são apresentadas análise, descrição e interpretação, que constituem o foco central deste trabalho.
Perspectivas epistemológicas em psicologia vocacional, paradigmas sociológicos e eixos da psicologia organizacional e do trabalho
As diferentes perspectivas evidenciadas nas teorias de carreira podem ser explicadas pelas posições filosóficas ou visões de mundo que as sustentam. Nesse campo, conforme indicam diferentes autores da área (Melo-Silva & Ribeiro, 2015; Metz & Guichard, 2009; Patton & McMahon, 2014; Ribeiro, 2011b; Ribeiro, 2013), identificase o predomínio de três perspectivas: a objetivista, a construtivista e a construcionista social.
Ao longo da história, as compreensões de carreira foram muito influenciadas por uma visão positivista, que enfatiza a racionalidade baseada no valor objetivo do conhecimento e na preponderância da objetividade sobre a subjetividade, o que significa a supremacia dos fatos sobre os sentimentos. A lógica do positivismo é sustentada pelas premissas de que o comportamento é observável, mensurável e linear, de que os seres humanos podem ser estudados separadamente do seu ambiente e de que os contextos nos quais vivem e trabalham têm menor importância do que as suas ações (Patton & McMahon, 2014).
A visão de mundo construtivista, por sua vez, teve um impacto significativo nos discursos sobre carreira (McIlveen & Schultheiss, 2012). Os construtivistas argumentam contra a possibilidade da verdade absoluta, afirmando que a construção da realidade do ser humano ocorre de dentro para fora, baseada em cognições individuais que interagem com perspectivas formadas a partir das relações entre pessoa e ambiente. Além disso, para os construtivistas, os seres humanos constroem ativamente a própria realidade e, dessa forma, também são capazes de construir ativamente uma posição significativa dentro do contexto de trabalho. Assim, o construtivismo vê a pessoa como um sistema aberto, interagindo constantemente com o meio ambiente (Patton & McMahon, 2014).
O construcionismo social, por fim, tem gerado uma série de perspectivas que ampliaram o entendimento sobre carreira (Patton & McMahon, 2014). Na perspectiva do construcionismo social, os significados pessoais são criados por meio de processos de interação social (Young & Collin, 2004). Na visão construcionista, é sustentada a ideia de que a realidade não é um dado natural e predeterminado, mas uma construção que se dá a partir de relações psicossociais, por meio de práticas e de discursos sociais. Portanto, não é uma verdade objetiva, mas discursos produzidos e compartilhados. Nessa perspectiva, a atenção incide sobre o processo e as dinâmicas de interação social, e não na estrutura de conhecimento individual ou em uma verdade objetiva (Ribeiro, 2013).
Ao conceberem um quadro paradigmático referencial, Burrell e Morgan (1979) defendem que todos os cientistas partem de pressupostos explícitos ou implícitos a respeito da natureza do mundo social e da forma como ele pode ser investigado. Nessa concepção, existem pressupostos de natureza ontológica, que se relacionam à essência do fenômeno a ser pesquisado, e são classificados como nominalistas ou realistas. No nominalismo, reside a crença de que a realidade é criada pela consciência do sujeito e representada por conceitos que tentam objetivá-la. Já no realismo predomina a ideia de que o mundo real existe independentemente da consciência.
As premissas de natureza epistemológica, por sua vez, refletem a base de entendimento e a transmissão de conhecimento sobre o mundo social. Burrel e Morgan (1979) também propõem uma decomposição da epistemologia nos extremos positivista e antipositivista. O positivismo caracteriza-se pela busca de regularidades e relações causais para predizer a realidade social. Para o antipositivismo, o mundo social só pode ser compreendido sob a perspectiva do sujeito, que é participante do ambiente.
Os pressupostos relativos à concepção de natureza humana, por fim, representam a relação entre os seres humanos e seu ambiente. As visões sobre a natureza humana são classificadas como deterministas ou voluntaristas. Por meio da concepção determinista, considera-se que o sujeito é condicionado pelo seu ambiente. A partir do voluntarismo, o entendimento preponderante é de que o sujeito é autônomo e exerce papel ativo no ambiente (Burrel & Morgan, 1979).
As demarcações referentes à ontologia, epistemologia e natureza humana impactam nas definições metodológicas. Assim, é possível verificar a opção por uma abordagem nomotética, que enfatiza a sistematização e a formulação de hipóteses, ou uma abordagem ideográfica, que compreende a ciência social como essencialmente subjetiva (Burrel & Morgan, 1979).
No campo dos fenômenos de pesquisa, em especial os de natureza psicossocial, Burrel e Morgan (1979) contribuem com a localização de divergências e das aproximações existentes entre os pressupostos teóricos e epistemológicos que os circunscrevem. Isso ocorre por meio da proposição de quatro paradigmas, também chamados de quadrantes epistemológicos, a partir dos quais os autores relacionam teorias organizacionais com contextos sociolómas funcionalista e estruturalista radical; e a subjetiva, na qual se encontram os paradigmas interpretativista e humanista radical.
O paradigma funcionalista sustenta-se na sociologia da regulação e, assim, diz respeito às abordagens que se preocupam em manter a ordem, a estabilidade, a integração e a funcionalidade, com foco em entender por que a sociedade é mantida como entidade. Aborda, portanto, o ser humano de um ponto de vista realista, positivista e determinista, utilizando-se de abordagens nomotéticas. O funcionalismo é essencialmente pragmático, orientado para a solução de problemas, partindo da crença da existência concreta da realidade e da ordenação social, independente dos sujeitos que a observam. O paradigma interpretativista também se ajusta à sociologia da regulação, porém com foco na compreensão da natureza social por meio da experiência subjetiva. Apesar disso, ao contrário do funcionalismo, é nominalista, antipositivista e voluntarista. Para o interpretativismo, a realidade social só adquire existência a partir da visão do sujeito, sendo o mundo social compartilhado intersubjetivamente por meio de significados (Burrell & Morgan, 1979).
O humanismo radical, por sua vez, define-se pelo interesse na sociologia da mudança radical a partir de críticas ao status quo e de uma perspectiva subjetivista. Baseia-se nas premissas nominalistas, antipositivistas, voluntaristas e ideográficas. Nessa perspectiva, a consciência do homem é dominada por superestruturas ideológicas que geram a alienação, sendo que a preocupação dessa corrente é libertar o sujeito das restrições impostas pelos arranjos sociais. Por outro lado, o estruturalismo radical baseia-se em uma visão realista, positivista, determinista e nomotética. Diferencia-se do paradigma funcionalista ao conceber que a emancipação do homem é possibilitada por meio de conflitos, mudanças estruturais e crises políticas e econômicas (Burrell & Morgan, 1979).
Outro modo de compreender as diferentes perspectivas epistemológicas utilizadas na produção científica, especialmente em se tratando da psicologia organizacional e do trabalho é o proposto por Bendassolli et al. (2010). São propostos, portanto, três eixos temáticos em psicologia organizacional e do trabalho, denominados de eixo do comportamento, eixo da subjetividade e eixo clínico.
No primeiro, o processo de investigação tem origem na observação dos fenômenos de natureza psicossocial, cujo propósito é o de descobrir causas e consequências, além de possíveis estimativas de probabilidade de ocorrência de fenômenos ou eventos, visando a predizer ou antecipar a ocorrência de possíveis comportamentos. Nesse eixo ou perspectiva epistemológica, enquadram-se as pesquisas correlacionais de campo, por meio da operacionalização de construtos, mensuração e controle de variáveis (Bendassolli et al., 2010).
Já no eixo denominado de subjetividade, o foco está no sujeito. Nessa concepção, a subjetividade se caracteriza como um processo social e histórico, por meio do qual o ser humano constrói determinadas formas de relação, ao mesmo tempo em que é construído por elas. Os pesquisadores alinhados com essa perspectiva utilizam, em geral, métodos e técnicas que possibilitem analisar amplos conjuntos de significados atribuídos pelos pesquisados, respectivos contextos de inserção, bem como os processos de participação e de alienação, referentes aos processos de construção da subjetivação, nas organizações e no trabalho. Por conseguinte, os procedimentos metodológicos utilizados se endereçam para o uso intensivo de entrevistas, análise de discursos, de documentos, histórias de vida, entre outros métodos relacionados com as questões fundamentais que se busca responder (Bendassolli et al., 2010).
Por fim, a terceira possibilidade de investigação dos fatores humanos no mundo do trabalho denomina-se método clínico. Por essa via, busca-se compreender as dimensões psíquicas e respectivas subjetividades, que são mobilizadas a partir das interações humanas nas organizações (Heloani & Lancman, 2004). Os procedimentos metodológicos utilizados fundamentalmente se caracterizam por meio da conexão entre pesquisa e intervenção (Bendassolli et al., 2010).
Na seção a seguir, serão apresentados os procedimentos metodológicos adotados (critérios de inclusão, de exclusão e respectivas etapas), com o intuito de identificar, nas bases de dados nacionais, estudos sobre o desenvolvimento de carreira de estudantes de graduação brasileiros.
Método
Com o propósito de identificar estudos empíricos sobre desenvolvimento de carreira de estudantes graduandos brasileiros, realizou-se, por meio do procedimento denominado de revisão sistemática de literatura, consulta eletrônica nas seguintes fontes (bases de dados): Portal de Periódicos CAPES, BVS Psicologia Brasil, Banco de Teses e Dissertações CAPES e Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações. O método de revisão sistemática foi eleito por utilizar, como fonte de dados, a literatura científica sobre a área de conhecimento, além de rastrear o conhecimento disponível a partir de procedimentos sistematizados de coleta e de análise de dados (Sampaio & Mancini, 2007).
Na operacionalização da busca, foram utilizadas combinações duas a duas. Essas combinações se dividiam entre, de um lado, o descritor "desenvolvimento de carreira" e, de outro, os descritores "ensino superior", "graduação", "graduando", "graduandos", "universitário" e "universitários". A busca foi realizada em junho de 2016 e, em relação à delimitação temporal, consideraram-se todos os estudos localizados até o ano de 2015.
Os seguintes critérios foram adotados para exclusão e inclusão de produções científicas, a respeito do assunto, ao se considerar os objetivos propostos: (a) trabalhos não disponíveis na íntegra; (b) trabalhos de revisões teóricas ou análise documental; (c) trabalhos que não abordassem o desenvolvimento de carreira na graduação, sob a perspectiva da psicologia; e (d) trabalhos que não foram realizados por meio de amostras de graduandos brasileiros. A opção por priorizar os estudos com discentes brasileiros deu-se pela importância da realização de um mapeamento dos estudos sobre desenvolvimento de carreira na formação superior em âmbito nacional, com vistas a conhecer o estado da arte e as respectivas bases epistemológicas que têm sido utilizadas.
Considerando isso, inicialmente foram encontrados 85 estudos a respeito do assunto. Destes, foram excluídas 53 produções que se repetiam na busca. Os 32 textos restantes foram submetidos aos critérios de exclusão para delimitar a amostra de trabalhos a serem analisados. Desconsideraram-se, então, 13 produções que não abordavam o desenvolvimento de carreira no campo dos fenômenos psicológicos. Dessa forma, a amostra final foi constituída por 19 trabalhos.
Após esse procedimento, realizou-se a análise dos estudos com base nos seguintes critérios: tipo de publicação, instituição de origem ou periódico de publicação, ano de publicação, autoria, tipo de estudo, instrumentos utilizados para a coleta de dados e tema central do estudo. Feito isso, buscou-se identificar as abordagens teóricas adotadas pelos autores dos estudos, localizando-as, em seguida, nas perspectivas epistemológicas identificadas em psicologia vocacional: objetivismo, construtivismo e construcionismo social (Melo-Silva & Ribeiro, 2015; Metz & Guichard, 2009; Patton & McMahon, 2014; Ribeiro, 2011b; Ribeiro, 2013). Posteriormente, procedeu-se a análise das possíveis articulações e aproximações com os paradigmas sociológicos/epistemológicos de Burrel e Morgan (1979).
Por fim, os estudos foram analisados com vistas a identificar possíveis aproximações com os eixos temáticos em psicologia organizacional e do trabalho: eixo do comportamento, eixo da subjetividade e eixo clínico, propostos por Bendassolli et al. (2010). Na seção que segue, serão apresentadas as principais descobertas feitas a partir dos procedimentos de pesquisa adotados e até aqui descritos.
Resultados
Caracterização dos estudos empíricos nacionais no campo do desenvolvimento de carreira durante a graduação
Conforme critérios mencionados na seção anterior, a amostra final deste trabalho foi composta por três teses, nove dissertações e sete artigos. Na análise das características gerais dos trabalhos, chamou a atenção o fato de que os estudos recuperados datam de a partir de 2007, ou seja, nenhuma publicação foi localizada em período anterior a esse. Ademais, a grande maioria das pesquisas provém de universidades do Sul ou Sudeste do país. Cabe esclarecer que houve três ocorrências de trabalhos de pós-graduação (teses e dissertações) que deram origem à publicação de artigos, os quais também apareceram na busca. São os casos de Bardagi (2007) e Bardagi e Hutz (2009,2012); Ourique (2010) e Ourique e Teixeira (2012); e Oliveira (2007) e Oliveira e Dela Coleta (2008).
Observa-se que a maioria dos estudos sobre o tema é de natureza quantitativa (Carlotto, 2013; Freitas, 2015; Magalhães & Teixeira, 2013; Mognon, 2013; Oliveira, 2014; Ourique, 2010; Ourique & Teixeira, 2012; Pelissoni, 2007; Silva, Coelho, & Teixeira, 2013).
Também foram localizados estudos com uso de métodos quantitativos e qualitativos (Bardagi, 2007; Oliveira, 2014; Silva, 2010). Foram identificadas, ainda, duas publicações que descreveram estudos qualitativos (Bardagi & Hutz, 2009, 2012).
Nas pesquisas em que foram utilizados métodos qualitativos, os fenômenos de pesquisa foram os seguintes: evasão do curso superior, transformações da identidade durante a formação superior e transição universidade-trabalho. Os instrumentos de coleta de dados foram, em sua maioria, entrevistas, sendo que foi identificado apenas um estudo que utilizou a técnica de grupo focal.
Em relação aos estudos quantitativos, foram pesquisados temas como satisfação com a escolha profissional, situações estressoras, estratégias de coping, comportamento exploratório, comprometimento com a carreira, autoeficácia profissional, desenvolvimento de carreira em relação à transformação da identidade durante a formação, experiências de estágio e vivências acadêmicas e, ainda, preocupação e envolvimento com a carreira.
Na maioria dos estudos foram utilizados questionários sociodemográficos e de características vocacionais, elaborados pelos autores, além de instrumentos psicométricos validados. Assim, nas pesquisas analisadas, foram identificados 17 instrumentos de medida, além de quatro estudos de validação de cinco instrumentos e dois estudos de construção e validação de dois instrumentos.
É possível observar que, nos estudos analisados, foram abordadas quatro temáticas principais, entre elas experiências universitárias, comportamento vocacional, crenças de autoeficácia e transição para o trabalho. Essa divisão tem apenas a finalidade de mapear, de forma geral, os construtos identificados, já que não é possível estabelecer uma nítida fronteira entre os temas que, na maioria das vezes, são estudados de modo concomitante. A Tabela 1 apresenta uma síntese das informações sobre os trabalhos analisados.
Produção científica sobre desenvolvimento de carreira durante a graduação: Perspectivas epistemológicas em psicologia vocacional, paradigmas sociológicos e eixos da psicologia organizacional e do trabalho
Com o objetivo de analisar os fundamentos epistemológicos que sustentam as produções científicas nacionais no campo do desenvolvimento de carreira durante a graduação, serão apresentadas articulações entre as perspectivas epistemológicas contemporâneas na psicologia vocacional (objetivismo, construtivismo e construcionismo social), os paradigmas sociológicos (funcionalismo, interpretativismo, humanismo radical e estruturalismo radical), propostos por Burrell e Morgan (1979), e os eixos temáticos em psicologia organizacional e do trabalho (comportamental, subjetivo e clínico), descritos por Bendassolli et al. (2010).
A perspectiva objetivista em psicologia vocacional, ao ser analisada à luz dos pressupostos epistemológicos de Burrel e Morgan (1979), pode ser considerada ontologicamente realista, epistemologicamente positivista, e assume uma concepção de natureza humana determinista. Isso acaba por culminar na opção por métodos nomotéticos. Por isso, pode ser aproximada ao quadrante da sociologia da regulação e ao quadrante funcionalista. Se considerarmos os eixos temáticos em psicologia organizacional e do trabalho (Bendassolli et al., 2010), é possível analisar que as pesquisas que se baseiam nessa perspectiva guiam-se predominantemente pelo eixo do comportamento. Como exemplos da perspectiva objetivista, pode-se citar o enfoque Traço e Fator, de Frank Parsons, e o tipológico, de John Holland. Contudo, cabe destacar que em nenhum dos estudos aqui analisados tal perspectiva foi adotada.
A vertente teórica construtivista, por sua vez, pode ser aproximada aos pressupostos epistemológicos de Burrel e Morgan (1979), aliando-se a uma ontologia nominalista, epistemologia antipositivista, concepção de natureza humana voluntarista, resultando no predomínio do uso de métodos ideográficos, que se aproximam ao eixo temático da subjetividade (Bendassolli et al., 2010). No entanto, tendo em vista especificamente as definições metodológicas adotadas na maior parte dos trabalhos localizados na perspectiva construtivista, também é possível verificar aproximações ao eixo do comportamento.
Importa considerar que essa perspectiva epistemológica em psicologia vocacional foi a predominante nos estudos analisados. Entre os enfoques teóricos que embasaram os estudos, houve a prevalência das abordagens de Donald Super, Mark Savickas e, ainda, de pressupostos do enfoque sociocognitivo, de Robert Lent e Steven Brown, e da teoria da aprendizagem social da tomada de decisão na carreira, de Krumboltz.
No que diz respeito à análise dos paradigmas sociológicos de Burrel e Morgan (1979), depreende-se que o construtivismo se alinha ao paradigma interpretativo. Nos trabalhos que se utilizam dessa abordagem, o objetivo é reconhecer e/ou interpretar o meio em que um fenômeno ocorre, com categorias e abordagens a priori e sem propor mudanças no contexto, aproximando-se dos quadrantes relacionados à sociologia da regulação de Burrell e Morgan (1979).
A perspectiva construcionista social foi identificada em apenas um dos estudos que compuseram a amostra deste trabalho. É possível analisar que essa compreensão parte de uma ontologia nominalista, uma epistemologia antipositivista, e parte de uma visão voluntarista da natureza humana, culminando na utilização de métodos ideográficos.
Também é possível relacionar a perspectiva construcionista social ao paradigma interpretativo de Burrell e Morgan (1979), no qual são feitas tentativas de interpretação do contexto em que o fenômeno ocorre. Porém, vinculações mais efetivas foram estabelecidas com o paradigma humanista radical, ao se considerar que neste reside uma base de compreensão de sociedade que enfatiza a importância de transcender as limitações dos arranjos sociais existentes. Esses estudos utilizam uma lógica subjetiva e, quando considerados do ponto de vista dos paradigmas de Burrell e Morgan (1979), possibilitam um entendimento acerca do mundo social, o qual permite reconhecer as mudanças, que se fazem necessárias mediante uma realidade social já existente. Em alguns momentos, os estudos podem propor mudanças à realidade vigente, mas, em geral, essas mudanças são de natureza incremental, sem uma cisão radical aos modelos estruturais e institucionais vigentes. Considerando isso, analisa-se que em termos dos eixos temáticos em psicologia organizacional e do trabalho, há maiores aproximações com o eixo da subjetividade.
Com base nas aproximações realizadas entre as abordagens utilizadas em estudos sobre o desenvolvimento de carreira durante a graduação e os paradigmas de Burrell e Morgan (1979), percebese a prevalência de perspectivas ligadas aos quadrantes mais subjetivos dos paradigmas sociológicos, notadamente por meio da abordagem construtivista, esta mais relacionada à sociologia da regulação e da abordagem construcionista social, que se insere no quadrante da sociologia da mudança radical.
Discussão
O campo de estudo das carreiras, no âmbito da psicologia vocacional, surgiu a partir de uma visão objetivista, estando atrelado à seleção de pessoal e centralizado na modalidade estatística (Melo-Silva, Lassance, & Soares, 2004). Junto a essa concepção está implícita uma postura diretiva por parte do profissional, que possuía as ferramentas e a expertise para conduzir o processo de orientação, enquanto o orientando exercia um papel mais passivo diante do processo.
As ideias desenvolvimentistas, surgidas na década de 1950, apresentaram um novo paradigma para a orientação, com a proposta de um processo menos diretivo e da ampliação do escopo de atuação, quando então o orientador passou a atuar no auxílio ao desenvolvimento da vida profissional dos sujeitos, e não mais simplesmente no momento de escolha de um caminho profissional (Ribeiro, 2011b). O percurso histórico das teorias vocacionais evidencia, portanto, uma ampliação na compreensão das carreiras, especialmente quando Donald Super aborda o comportamento vocacional ao longo do ciclo vital, entendendo as escolhas ocupacionais e a formação da identidade profissional não como um comportamento focal, mas como um processo que ocorre ao longo da vida (Savickas, 1995).
As teorias construtivistas possibilitaram, assim, uma visão mais integradora do ser humano, com foco tanto em processos cognitivos como nas influências sociais. Diante do mundo contemporâneo do trabalho, percebe-se a inadequação de uma visão individualizante e estática de carreira, urgindo a demanda por enfoques teóricos que considerem a aprendizagem e o desenvolvimento ao longo da vida em constante interlocução com o contexto. Nesse sentido, passa a existir um consenso de que não há um padrão linear para o desenvolvimento da carreira, o que exige dos indivíduos a capacidade de adaptação às transições e a construção de novos sentidos para suas experiências de vida e trabalho (Oliveira, Melo-Silva, & Dela Coleta, 2012). Assim, instaura-se o desafio de assumir modelos coerentes com a realidade contemporânea, capazes de subsidiar intervenções adequadas e efetivas aos seus propósitos. A partir dos materiais analisados neste trabalho, evidenciou-se que os estudos no campo do desenvolvimento de carreira de estudantes de graduação são relativamente recentes, sendo que somente foram localizados com datas a partir do ano de 2007. Assim, é possível analisar que tais estudos acompanham a expansão verificada no âmbito do ensino superior brasileiro, no contexto das atuais demandas do mundo do trabalho. No entanto, ainda é válido ponderar a necessidade da realização de mais estudos para a compreensão dos vários fatores que afetam o desenvolvimento de carreira dos universitários, conforme foi apontado por Bardagi et al. (2003).
Em relação aos paradigmas sociológicos de Burrel e Morgan (1979), constatou-se a prevalência de perspectivas ligadas aos quadrantes mais subjetivos, com a abordagem construtivista mais relacionada à sociologia da regulação e a abordagem construcionista social com a sociologia da mudança radical. Ao mesmo tempo, constatou-se a utilização de uma grande variedade de instrumentos de medida e a predominância de métodos quantitativos, o que poderia parecer incompatível metodologicamente. No entanto, rompendo com uma visão separatista, é relevante considerar que diferentes formas de acessar o fenômeno em estudo revelam perspectivas distintas, mas que podem se complementar, o que, por sua vez, poderá favorecer uma compreensão ampliada sobre o fenômeno estudado.
A significativa expansão dos programas governamentais de apoio para acesso dos estudantes ao ensino superior tem facilitado a inserção de muitos sujeitos nesse espaço de formação profissional, antes muito mais restrito e hoje mais relevante ainda nas trajetórias de carreira. Ainda assim, constata-se a necessidade de ampliar a atenção às vivências do estudante, desde seu ingresso até a transição para o mundo do trabalho, o que poderá contribuir com os propósitos de expansão e de democratização do ensino superior e, principalmente, com a promoção da saúde mental e da satisfação profissional dos sujeitos que se encontram em momentos de formação profissional. Nesse ponto, é preciso considerar também que a permanência no ensino superior requer a consideração de diferentes fatores, os quais abrangem questões precedentes ao ingresso, que dizem respeito à trajetória socioeconômica e cultural do estudante; relativos ao percurso acadêmico, que aludem aos estímulos ou barreiras vivenciados; e em relação a expectativas futuras, que dizem respeito ao que o acadêmico vislumbra como profissão, diante das condições inscritas socialmente (Silva & Nogueira, 2015).
De acordo com Ribeiro (2013), a maneira clássica de conceber a orientação profissional baseia-se na abordagem teórica objetivista, edificada nos Estados Unidos e na Europa, que, na maior parte do século XX, foi determinada pela estabilidade social e econômica, possibilitando uma vida profissional marcada pela continuidade, previsibilidade e normalidade. O contexto da América Latina nunca foi semelhante. No entanto, teorias e práticas têm sido utilizadas, tornando esse processo muitas vezes descontextualizado. Assim, o autor alerta para a necessidade de considerar que cada contexto apresenta fatores sociais e econômicos que afetam as elaborações teóricas e visões de mundo, utilizadas para compreender e intervir em espaços sociais específicos.
Destarte, instaura-se o desafio de que os modelos e as práticas adotados em orientação profissional sejam coerentes com a realidade contextual vivenciada pelos sujeitos e, principalmente, permeáveis às transformações que marcam o mundo contemporâneo do trabalho. Ademais, o atual momento histórico demanda maior atenção ao desenvolvimento de carreira na graduação, tanto no campo da produção de conhecimento quanto no das práticas profissionais.
Desse modo, amplia-se, cada vez mais, um campo importante para intervenções no âmbito do desenvolvimento de carreira, o qual, diante das atuais configurações do mundo do trabalho, exige contínuo desenvolvimento, aprimoramento e atualização. Apesar do aumento da produção científica, evidenciado especialmente na última década, pode-se dizer que, quanto a estudos que abordem o desenvolvimento de carreira de estudantes na graduação, ainda há necessidade de ampliação das investigações na área. Diante das mudanças que marcam a vida contemporânea no mundo do trabalho, é essencial que a temática seja mais explorada em publicações nacionais, para que se avance também em termos de contribuições teóricas e subsídios na área do aconselhamento psicológico e da orientação de carreira no contexto da formação superior.
Assim, este estudo mostra sua relevância por discutir um tema ainda pouco debatido no âmbito da psicologia organizacional e do trabalho e da orientação profissional, apontando para a necessidade de que os enfoques teórico-metodológicos no campo do desenvolvimento de carreira contemplem as novas demandas sociolaborais. Além disso, o estudo aponta para a importância de se conhecer os pressupostos epistemológicos que embasam as investigações e as práticas no campo.
No presente trabalho foi possível realizar um mapeamento abrangente e conhecer como a literatura tem se constituído neste campo de estudo. No entanto, identifica-se como limitação deste estudo o uso de descritores amplos que podem não ter localizado trabalhos que se concentram em construtos específicos, mas que, mesmo assim, compõem este campo de estudo. Assim, aponta-se para a importância da realização de mais estudos, referentes à produção científica no âmbito do desenvolvimento de carreira na graduação, para que se amplie o escopo da análise.
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Endereço para correspondência:
Fernanda Zatti
Universidade Federal de Santa Catarina, Campus Universitário, Centro de Filosofia e Ciências Humanas da UFSC, Departamento de Psicologia, Trindade
Florianópolis, SC, Brasil 88040-970
E-mail: fernanda.zatti@outlook.com
Recebido em: 29/12/2016
Primeira decisão editorial em: 07/04/2017
Versão final em: 18/04/2017
Aceito em: 22/04/2017
Trabalho realizado com o apoio do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul.
1 Psicologia vocacional e orientação profissional inserem-se no mesmo campo de estudo, sendo a psicologia vocacional a base teórica e a orientação profissional a sua aplicação prática (Ribeiro, 2011a). A orientação profissional pode ser definida como estratégia de compreensão e intervenção para o auxílio de pessoas em seus processos de escolhas, elaboração de projetos e desenvolvimento de carreira (Melo-Silva & Ribeiro, 2015). Como aponta Melo-Silva (2001) o termo vocation, em inglês, pode ser traduzido tanto como tendência a uma determinada atitude, inclinação, quanto como a tarefa, atividade ou profissão à qual alguém se dedica; dessa forma, o termo originalmente engloba o profissional e o de carreira; em português, no entanto, o vocacional costuma referir-se somente à primeira acepção. Ao utilizar os termos "vocacional", "ocupacional", "profissional" e "de carreira" neste trabalho, serão respeitadas as escolhas dos autores pelos termos e, quando da escrita original para este manuscrito, optou-se pelo termo "carreira" ou "de carreira".
2 O termo utilizado originalmente por Bendassolli, Borges-Andrade e Malvezzi (2010) é "psicologia do trabalho e das organizações". Contudo neste trabalho utiliza-se "psicologia organizacional e do trabalho" com intuito de padronizar o termo, facilitar a compreensão do leitor, e, ainda, por se compreender que essa decisão não compromete a análise realizada.