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Estudos Interdisciplinares em Psicologia

versão On-line ISSN 2236-6407

Est. Inter. Psicol. vol.11 no.1 Londrina jan./abr. 2020

https://doi.org/10.5433/2236-6407.2020v11n1p162 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

Estresse ocupacional em professores moçambicanos da educação inclusiva

 

Occupational stress in mozambique teachers of inclusive education

 

Estrés ocupacional en profesores mozambicanos de educación inclusiva

 

 

Gildo AlianteI; Mussa AbacarII; Angelina Mualaquia PereiraIII

IUniversidade Federal do Rio do Grande do Sul
IIUniversidade Rovuma
IIIHospital Central de Nampula

 

 


RESUMO

Este estudo objetivou avaliar o estresse ocupacional e as estratégias de enfrentamento em professores da Educação Inclusiva. Participaram do estudo 15 professores moçambicanos que trabalham num Centro de Recursos de Educação Inclusiva na província de Nampula. Os dados foram coletados por meio de um questionário misto, no qual incluía dados sociodemográficos e profissionais, Inventário de Sintomas de Estresse para Adultos de Lipp e algumas questões abertas. A análise de conteúdo categorial das respostas mostrou que os professores perceberam o seu trabalho como estressante. A sintomatologia de estresse foi predominantemente de ordem física. As principais fontes de estresse dos professores foram de natureza situacional. Para fazer face às situações de estresse no trabalho, os professores recorrem essencialmente às estratégias focalizadas na emoção. Sugere-se a modificação do ambiente laboral causador de estresse e a educação e formação dos professores em estratégias de coping.

Palavras-chave: educação inclusiva; saúde mental; estresse ocupacional.


ABSTRACT

This study aimed to evaluate occupational stress and coping strategies in teachers of Inclusive Education. The participants were 15 Mozambican teachers, who work in an Inclusive Educational Resources Center in the province of Nampula. The data were collected through a mixed questionnaire, which included professional and sociodemographic data, the Lipp Inventary of Stress Symptoms for Adults and some open-ended questions. The categorical content analysis showed that teachers perceived their work as stressful. The stress symptomatology was mainly physical. The main source of stress for the teachers was of situational nature. To face the stressful situations at work, the teachers fundamentally resort to palliative strategies. It's suggested to change the stressful labor environment and teacher's education and training in coping strategies.

Keywords: inclusive education; mental health; occupational stress.


RESUMEN

Este estudio tuvo como objetivo evaluar el estrés laboral y las estrategias de afrontamiento en los docentes de Educación Inclusiva. Quince maestros mozambiquenos que trabajan en un Centro de Recursos de Educación Inclusiva en la provincia de Nampula participaron en el estudio. Los datos se recopilaron mediante un cuestionario mixto, que incluía datos sociodemográficos y ocupacionales, el Inventario de sintomas de estrés de adultos de Lipp y algunas preguntas abiertas. El análisis de contenido categórico de las respuestas mostró que los maestros percibían su trabajo como estresante. Los síntomas de estrés fueron predominantemente físicos. Las principales fuentes de estrés para los maestros son de naturaleza situacional. Para hacer frente a situaciones estresantes en el trabajo, los maestros utilizan esencialmente estrategias centradas en las emociones. Se sugiere la modificación del ambiente de trabajo estresante y la educación y capacitación de los maestros en estrategias de afrontamiento.

Palabras clave: educación inclusiva; salud mental; estrés ocupacional.


 

 

INTRODUÇÃO

Em Moçambique, à semelhança de outros países do mundo, a educação constitui um direito e dever do Estado, conforme instituído na Constituição da República de Moçambique (CRM) de 2004 e na Lei n° 18/2018 de 28 de dezembro - Lei do Sistema Nacional de Educação (Ministério da Educação de Moçambique, 2018). Assim, a cultura, a formação e o desenvolvimento humano equilibrado e inclusivo são, igualmente, direitos de todos os moçambicanos, conforme a alínea a) do artigo 3 da lei supracitada. O Estado organiza e promove o ensino como parte integrante da ação educativa nos termos definidos na CRM, visando o desenvolvimento sustentável, preparando integralmente as pessoas para intervirem ativamente na vida política, econômica e social, de acordo com os padrões morais e éticos aceites na sociedade, respeitando os direitos humanos, princípios democráticos, cultivando o espírito de tolerância, solidariedade e respeito ao próximo e às diferenças (alínea e) do artigo 3 da Lei n° 18/2018 de 28 de dezembro). A mesma lei refere que é tarefa do Estado promover a inclusão, a equidade e igualdade no acesso à educação.

Para atender os alunos com Necessidades Educativas Especiais (NEE), nomeadamente deficientes físicos, surdos, mudos e cegos, o governo moçambicano abriu espaço para a formação de turmas em escolas regulares. Essa estratégia assenta no princípio da inclusão, com vista a assegurar que as crianças, os jovens e os adultos com NEE possam frequentar escolas regulares, ao invés de serem segregados em escolas especiais (Ministério da Educação de Moçambique [MINED], 2013). Além da iniciativa de atender as crianças em escolas regulares, o governo construiu seis escolas para o ensino especial localizadas na cidade de Maputo e nas províncias de Sofala e Zambezia, bem como três Centros de Recursos de Educação Inclusiva ao nível do país, sendo um em cada região do país (norte, centro e sul) (MINED, 2013).

No entanto, o Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano [MINEDH], órgão que tutela a área da educação em Moçambique, reconhece que a implementação do conceito de escola inclusiva é complexa e exige competências e habilidades adicionais dos professores para lidar com diferentes habilidades físicas e cognitivas dos seus alunos, além de ser necessária uma atenção especial às características físicas da própria infraestrutura da escola (MINED, 2013). Para promover uma melhor participação dos alunos com NEE nas escolas regulares, é ainda necessário integrar melhor a abordagem da Educação Inclusiva para a diversidade nas políticas e regulamentos que orientam a gestão da escola e na formação de professores para todos os subsistemas e níveis de ensino (MINED, 2013).

Porém, observa-se uma fraca formação ou preparação dos professores moçambicanos para lidar com alunos portadores de NEE, tanto nas escolas regulares como nas escolas e nos centros específicos (MINED, 2013). A deficiente ou falta de preparo dos professores para o processo de inclusão é apontada como uma das principais fontes geradoras de estresse nesse grupo profissional (Naujorks, 2002; Naujorks & Barasuol, 2004). Além do mais, os professores moçambicanos, especialmente do ensino básico, confrontam-se com baixos salários, limitadas oportunidades de crescimento e desenvolvimento profissional, falta de recursos materiais para o trabalho, precárias condições físicas de trabalho (Abacar, 2011, 2015; Aliante & Abacar, 2019a; Aliante & Tittoni, 2017), o que pode originar problemas de saúde mental, como o estresse ocupacional (Abacar & Amade, 2018).

Existem diversas definições sobre o conceito de estresse. Em termos mais genéricos, Selye (1980) definiu-o como um conjunto de reações e processos fisiológicos criado por exigências do ambiente. Trata-se de uma reação natural e necessária de qualquer pessoa diante da necessidade de mudança (independentemente dessa mudança ser voluntária ou involuntária, ou ainda para situações positivas ou negativas), não podendo ser evitado. Em outras palavras, o estresse não é necessariamente desagradável, pois por um lado tem consequências positivas e gera resistência nos indivíduos (eustress) e de outro, gera vulnerabilidade e enfraquece o indivíduo (distress) ou estresse negativo (Marras & Veloso, 2012). No presente trabalho, o termo estresse é usado como sinônimo de distress, o estresse patológico.

A Síndrome Geral de Adaptação descrita por Selye (1980) compõe-se de três fases (alarme, resistência e exaustão), sendo que a ocorrência de uma fase precipita o desenvolvimento da outra. No entanto, Lipp (2016) apresenta a quarta fase a qual designa de quase-exaustão e situa-se entre a fase de resistência e exaustão. A fase de alarme corresponde à reação imediata do organismo quando exposto a estímulos aos quais não está adaptado. Caso o estressor desapareça a pessoa sai desta situação sem sequelas, porém se o estressor continua ou se algo mais acontece para desafiar entra na fase da resistência. Na fase de resistência ocorre uma adaptação total do organismo ao estímulo indutor de estresse e consequente aumento ou desaparecimento dos sintomas. É uma fase essencialmente marcada por dois sintomas: dificuldades com a memória e muito cansaço. Se o esforço da pessoa for suficiente para lidar com a situação, o estresse é eliminado. Se isto não ocorre, e se não consegue resistir ou se adaptar, o organismo começa a sofrer um colapso gradual e entra na fase de quase-exaustão (Lipp, 2016).

A fase quase-exaustão ocorre quando a tensão excede o limite de enfrentamento, a resistência física e emocional começa a reduzir, ainda há momentos em que a pessoa consegue pensar lucidamente, tomar decisões, rir de piadas e trabalhar. Porém, tudo isto é feito com esforço e, estes momentos de funcionamento normal, se intercalam com momentos de total desconforto. Trata-se de uma fase marcada por ansiedade, consequentemente, o cortisol é produzido em maior quantidade e começa a ter o efeito negativo de destruir as defesas imunológicas (Goulart Junior & Lipp, 2008). Devido ao enfraquecimento do organismo, doenças que permaneciam latentes são desencadeadas. Caso o estressor perdure e a pessoa esgote os seus recursos energéticos tem lugar à última fase de estresse, a de exaustão. É na fase de exaustão que se dá um colapso dos mecanismos de adaptação do indivíduo ao estressor, ao mesmo tempo em que entra num estado de exaustão, se o agente indutor de estresse for suficientemente grave e a exposição ao mesmo for demasiado prolongada (Lipp, 2016).

Na profissão docente, o estresse ocupacional do professor representa, segundo Kyriacou (2001), as experiências desagradáveis de um professor traduzidas em emoções negativas como a raiva, frustração, ansiedade, depressão e nervosismo, resultante de algum aspecto de seu trabalho e medidas pela percepção de que as exigências profissionais constituem uma ameaça à sua autoestima ou bem-estar. De modo geral, o estresse ocupacional ou profissional configura-se quando a origem dos agentes estressores (fatores de estresse) é eminentemente proveniente do espaço de trabalho ou decorrentes das atividades realizadas naquele ambiente (Marras & Veloso, 2012). Neste contexto, o estresse profissional pode ser desencadeado por um ou mais dos seis fatores propostos por Cooper, Sloan e Willians (1988), a saber: i) Fontes intrínsecas ao trabalho (condições de trabalho, longas horas de trabalho, viajar, novas tecnologias e sobrecarga de trabalho); ii) Papel na organização (ambiguidade do papéis, conflito de papéis e responsabilidades); iii) Relações interpessoais no local de trabalho (relação ruim com o superior, com "clientes", com os colegas);iv) Desenvolvimento na carreira (segurança no emprego, promoções, progressões e avaliação do desempenho profissional); v) Clima e estrutura organizacionais (grau de participação na tomada de decisões e sentido de pertença) e; vi) "Interface" trabalho-família (interferência do trabalho na família e interferência da família no trabalho).

Lipp (2016) propôs uma classificação de estressores ocupacionais do professor no meio escolar em: Questões institucionais, como a função generalista do professor e salários inadequados; Questões governamentais, como restrições orçamentárias para projetos especiais; Questões domésticas, como existência de barreiras entre vida pessoal e profissional ou ter que trabalhar a noite e em domingos e feriados em trabalhos que exijam mais atenção; Questões físicas, como turmas muito numerosas, salas pequenas, calor ou frio excessivo; Questões culturais, como a desvalorização da profissão docente e Drogas e violência nas escolas.

As consequências de estresse são diversas. Para o indivíduo estas se manifestam em termos de saúde mental e física. Al-Fudail e Mellar (2008) e Frango (1995) agrupam as consequências de estresse ao nível do individuo em: fisiológicas (cefaleias, alterações cardiovasculares e alterações gastrointestinais); psicológicas (irritação, tensão, tédio e depressão, disfunção cognitiva frequente, dificuldades na concentração, na memorização, em tomar decisões ou em avaliar situações de risco para a saúde e segurança de si próprio e de outros, ansiedade, fadiga, frustração e esgotamento) e comportamentais (consumo de álcool e drogas, tabagismo, comportamentos agressivos).

O estresse ocupacional não apenas pode ter impacto negativo na saúde física e mental dos trabalhadores, interferindo nos altos índices de afastamento laboral, com evidente diminuição da produtividade nas organizações de trabalho (Carlotto, Câmara, Diehl, Ely, Freitas, & Schneider, 2018); mas também pode afetar de forma negativa a eficiência e satisfação do trabalhador (Lipp, Costa, & Nunes, 2017); elevar o risco de acidentes de trabalho, aumento significativo dos custos da saúde pública (Hassard, Teoh, Visockaite, Dewe, & Cox, 2018) e o aparecimento da Síndrome de Burnout.

Ademais, quando os indivíduos vivenciam estresse ocupacional intenso, eles têm dificuldade em cumprir suas atividades laborais e extra-laborais e tendem a apresentar sintomas depressivos (Allemand, Schaffhuser, & Martin, 2015). Neste sentido, o estresse pode provocar uma alteração da dinâmica familiar e trazer prejuízos na saúde dos filhos e do cônjuge. Segundo a descrição de Frango (1995), a falta de disponibilidade psicológica, o isolamento, os comportamentos hostis e defensivos, a habilidade emocional e o desgaste físico podem enfraquecer e "desnutrir" as relações familiares, conduzindo a uma instabilidade e à deterioração da dinâmica familiar. Além disso, as consequências do estresse podem apresentar duas vertentes ao nível social: na vida social do indivíduo (o indivíduo tem tendência para o isolamento social, ausência de prazer no contato com os outros e falta de afinidade com as pessoas e solidão) e os encargos sociais das sequelas do estresse (Frango, 1995).

Nos estudos de estresse no trabalho há uma vertente que enfatiza a importância das variáveis individuais como atenuadoras dos efeitos do estresse, entendendo que são produtos do sujeito em função da valoração que esse atribui ao evento estressor (avaliação cognitiva), fazendo com que a avaliação que os indivíduos realizam sobre um mesmo acontecimento seja diferente (Melo, Carlotto, Rodriguez, & Diehl, 2016). Para o indivíduo considerar um evento como estressante, precisa percebê-lo como ameaçador para o seu bem-estar e não ter os recursos pessoais necessários para enfrentá-lo eficazmente. E, portanto, diante da mesma situação de estresse, cada indivíduo reage de maneira diferente, consoante aprecia uma exigência particular como negativa ou positiva para o seu bem-estar (Lazarus & Folkman, 1984).

Uma das variáveis individuais que tem recebido maior atenção dos estudiosos é a estratégia de enfrentamento ao estresse ou mecanismos de coping (Carlotto et al., 2018; Gonçalves Câmara, Carlotto, & Bedin, 2019). Existem diversos modelos teóricos sobre coping, dos quais se destaca o modelo cognitivista de Lazarus e Folkman (1984). O coping é constituído por esforços cognitivos e comportamentais desenvolvidos pela pessoa, para gerir (reduzir, minimizar, dominar ou tolerar) as exigências internas e externas das transações pessoais que são avaliadas como excedendo os recursos que pessoa dispõe (Lazarus & Folkman, 1984). O coping é assim entendido como a capacidade da pessoa lidar com o estresse, um fenômeno adaptativo que contribui para a sua sobrevivência e para um adequado desempenho das suas atividades em diversas vertentes da vida (Kyriacou, 2001).

Na ótica de Lazarus e Folkman (1984) as estratégias individuais de enfrentamento podem ser agrupadas em dois tipos: coping focalizado no problema e o focalizado na emoção. O coping focalizado no problema constitui-se no esforço despendido pelo indivíduo para atuar na situação que deu origem ao estresse, tentando mudá-la. A função dessa estratégia é alterar o problema existente na relação entre a pessoa e o ambiente que está causando a tensão.

O coping focalizado na emoção é compreendido como um esforço para regular o estado emocional que é associado ao estresse e reduzir a sensação física desagradável gerada. Trata-se de esforços para prevenir ou diminuir a ameaça, dano, perda, ou para reduzir o sofrimento associado ao estresse (Carver & Connor-Smith, 2010). Tais estratégias (baseadas na emoção) podem ser mentais ou físicas (Kyriacou, 2001). As mentais envolvem a tentativa de mudar a forma como a situação é avaliada e as físicas consistem em atividades que ajudam a pessoa a reter ou recuperar a sensação de estar relaxada, aliviando qualquer tensão e ansiedade que se acumularam.

Outra categoria de coping que tem sido considerada na literatura psicológica é a evitativa. O coping de evitação é caracterizado pelo uso de comportamentos que afastam completamente a pessoa da situação estressante. Nesse sentido, não há a necessidade de empreender esforços para lidar com a situação, uma vez que ela tende a não se configurar no panorama de problemas existentes (Carver & Connor-Smith, 2010). Finalmente, pode-se mencionar o apoio social. O apoio social consiste na demonstração de empatia, consideração e preocupação de uma pessoa em relação à outra, envolvendo tanto o apoio emocional propriamente dito como conselhos, outras formas de assistência ou ainda o sentimento de pertencer a um grupo (Rodrigues, Assmar, & Jablonski, 2008). Este recurso pode ser derivado de fontes informais (e.g., família, amigos e colegas de trabalho) ou de fontes formais, como os supervisores no local de trabalho.

Kyriacou (2001) apresenta algumas ações que os indivíduos optam para lidar com o estresse: i) tentar manter os problemas em perspectiva; ii) evitar confrontos; iii) tentar relaxar após o trabalho; iv) tomar medidas para lidar com problemas; v) manter os sentimentos sob controle; vi) dedicar mais tempo a tarefas específicas; vii) discutir problemas e expressar sentimentos com os outros; viii) ter uma vida saudável em casa; ix) planejar com antecedência e prioridade; e, x) reconhecer as próprias limitações. Tal como descrito por Lipp (2004), as estratégias de enfrentamento de estresse são alicerçadas em quatro pilares básicos: alimentação antiestresse, a fim de repor os nutrientes perdidos durante os períodos de estresse; relaxamento, a fim de reduzir a tensão mental e física que sempre acompanha o estressado; atividade física e reestruturação de aspectos emocionais, que se refere a conhecer a si mesmo e a mudar o modo estressante de pensar, sentir e agir. E uma vez que muitas pessoas negam estar a sofrer de estresse, até este chegar a resultados mais graves, McShane e Von Glinow (2014) asseguram que a estratégia evitativa cria um ciclo vicioso, pois o ato de não enfrentar o estresse torna-se um segundo estressor, acumulando-se com aquele que criou o estresse original. Para prevenir este ciclo vicioso, esses autores sugerem que empregadores e funcionários precisam aplicar uma ou mais das seguintes estratégias de enfrentamento do estresse: remover o estressor; afastar-se do estressor; mudar percepções de estresse; controlar as consequências do estresse e receber apoio social.

De uma forma geral, a literatura psicológica especializada mostra que o estresse ocupacional enquanto resultado da incapacidade do indivíduo em lidar com as fontes de pressão no trabalho, traz custos na saúde física e mental, afetando o indivíduo e as organizações (Cooper, 1998). Note-se que, embora a temática sobre estresse ocupacional em professores seja uma preocupação a nível internacional e amplamente pesquisada em outros países, em Moçambique as pesquisas desse fenômeno encontram-se numa fase incipiente, o que dificulta a compreensão da doença em termos da prevalência, sintomas, causas e seus efeitos na vida do professor e no funcionamento das organizações escolares. Daí que, além de preencherem a lacuna existente na literatura sobre o constructo no contexto moçambicano, os resultados deste estudo podem orientar os órgãos que tutelam o setor da educação a delinear programas preventivos e interventivos de modo a despertar nos professores a desenvolverem ações mais eficazes de promoção de saúde mental e bem-estar no trabalho.

Este estudo objetivou avaliar o estresse ocupacional (sintomas e fontes) e as estratégias de coping adotadas por professores moçambicanos da educação inclusiva. Com este objetivo, foram levantadas as seguintes questões de pesquisa: i) Que aspectos do trabalho docente propiciam a ocorrência de estresse em professores? ii) Quais são as manifestações de estresse e que estratégias de coping os professores recorrem para minimizar os efeitos negativos do estresse percebido?

 

MÉTODO

PARTICIPANTES

Foi investigada uma amostra não probabilística por acessibilidade de 15 professores de um Centro de Recursos de Educação Inclusiva localizado na região norte de Moçambique, Província de Nampula. Em termos de perfil sociodemográfico e profissional dos participantes, 10 eram do sexo feminino e cinco do sexo masculino. Em relação ao estado civil, oito foram solteiros e sete declararam ser casados. Quanto à idade dos participantes, a média de idade foi de 33 anos, numa variância de 24 a 51 anos. No que diz respeito ao nível acadêmico, 11 participantes tinham nível superior completo e quatro possuíam o nível médio de escolaridade. No que refere ao vínculo contratual, oito foram nomeados ou possuíam vínculo estável e, sete eram contratados. Quanto ao tempo de serviço, essa variável variou entre dois a 20 anos de experiência profissional.

INSTRUMENTOS

A coleta de dados foi efetuada por meio de três questionários: o questionário de dados sociodemográficos e laborais que visava coletar algumas variáveis pessoais e profissionais dos participantes (e.g., idade, sexo, anos de experiência profissional, carreira, nível de escolaridade); o Inventário de Sintomas de Estresse para Adultos de Lipp (ISSL) extraído em Servilha (2005) que pretendia identificar os sintomas do estresse mais regulares e questionário com quatro perguntas abertas. O ISSL analisa e classifica os sintomas do estresse em níveis físicos e psicológicos, permitindo a identificação da sintomatologia dominante, o físico ou o psicológico (Faiad, Souza, Matsunaga, Rodrigues, & Rosa, 2018).

O ISSL busca identificar a sintomatologia que o indivíduo apresenta, bem como em qual fase de estresse se encontra, de acordo com o modelo quadrifásico do estresse de Lipp (alerta, resistência, quase-exaustão e exaustão). O ISSL é composto de três quadros que se referem às quatro fases do estresse. Os sintomas listados são típicos de cada fase. No primeiro quadro, composto de 12 sintomas físicos e três psicológicos referentes à primeira fase do estresse (alerta), o respondente (professor/a) assinala os sintomas físicos e psicológicos que tenha experimentado nas últimas 24 horas. No segundo quadro, composto de 10 sintomas físicos e cinco psicológicos, que se referem à segunda e a terceira fase do estresse (resistência e quase - exaustão), o respondente assinala os sintomas que tenha experimentado na última semana. No último e terceiro quadro, composto de 12 sintomas físicos e 11 psicológicos, referentes à fase quatro do estresse (exaustão), o sujeito assinala os sintomas que tenha experimentado no último mês. Apesar de, o ISSL ser composto por três partes, neste estudo foi utilizada somente à primeira parte, pois na ótica de Lipp (2016), é a que apresenta os sintomas mais regulares ou frequentes em pessoas estressadas.

A avaliação das respostas dadas pelos indivíduos é feita por meio do uso de tabelas do próprio manual ISSL, que transformam os dados brutos em porcentagem (Lipp et al., 2017; Souza et al., 2015). A presença de estresse pode ser constatada se qualquer um dos escores brutos atingir os limites determinados (maior que seis no Q1- parte um, ou seja a soma de quantidade de sintomas de F1 e P1; maior que três no Q2- parte dois, soma de F2 e P2 e; maior que oito no Q3-parte três, soma de F3 e P3). Caso os escores obtidos estejam acima dos limites nos três quadros é identificado o processo de agravamento do estresse. Para definição da fase de estresse em que o indivíduo se encontra, deve-se considerar o quadro em que o indivíduo mais pontuou, em termos porcentuais, sendo que seus resultados permitem saber em qual fase do estresse a pessoa se encontra e se os sintomas que prevalecem são mais físicos ou psicológicos (Faiad et al., 2018).

Na sua versão original com amostras diversificadas, o ISSL apresentou alfa de Cronbach de 0.91 para a escala geral, portanto, os itens refletem um alto valor para o conceito intencional, qual seja: medir o nível de estresse (Chaves et al., 2016; Lipp et al., 2017). Além de o instrumento revelar uma boa consistência interna, a sua escolha para uso neste trabalho justifica-se também por ser uma ferramenta mais utilizada na medição de sintomas de estresse (Souza et al., 2015), bem como ser um instrumento redigido em língua portuguesa.

O terceiro questionário era composto por quatro perguntas abertas. A primeira questão procurava saber como os professores percebiam seu oficio; a segunda buscava identificar os aspectos relacionados ao trabalho que consideravam ser mais estressantes (em ordem decrescente); a terceira pergunta pretendia saber o que é que os participantes têm feito quando se sentem estressados e a quarta solicitava aos participantes ações sugestivas para prevenir e/ou combater o estresse no trabalho.

PROCEDIMENTOS

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê Institucional de Bioética para a Saúde da Universidade Lúrio (UniLúrio) em Nampula - Moçambique (Refa 30/Maio/CBISUL/18). Posteriormente, foi solicitada a autorização de coleta de dados junto da direção do Centro investigado por meio de uma carta endereçada, onde constavam os objetivos da pesquisa e os procedimentos metodológicos de participação dos professores, que foi respondida positivamente. Em seguida, foram mantidos os primeiros contatos com os professores para pedir a colaboração destes e explicar as intenções da pesquisa e forma de como cada professor iria participar da mesma. Os questionários foram respondidos pelos professores (participantes) por escrito e de forma individual. Foi garantido o anonimato, o sigilo, a confidencialidade e a proteção de imagem e danos dos participantes.

TÉCNICAS DE ANÁLISE DE DADOS

O tratamento de dados obtidos no campo foi antecedido por uma triagem dos questionários com vista a verificar os possíveis erros e omissões. Para análise dos dados do ISSL e do questionário de dados sociodemográficos utilizou-se a estatística descritiva (frequências das respostas) por meio do software estatístico SPSS (Statistical Package for Social Sciences), versão 22. Os dados do questionário com as perguntas abertas foram analisados com o recurso à técnica de análise de conteúdo-categorial (Bardin, 2011), através da qual as palavras e frases proferidas pelos participantes foram organizadas em vista dos significados a elas atribuídos, possibilitando agrupamentos segundo as semelhanças, às condições de produção ou recepção dessas mensagens. A análise de conteúdo apoia-se na técnica de categorização, que consiste na classificação de elementos que formam um conjunto, através da diferenciação e reagrupamento de acordo com a analogia e critérios previamente definidos (Bardin, 2011).

A análise das respostas permitiu definir quatro categorias, com base nos objetivos pretendidos. A primeira categoria é referente aos sintomas/consequências do estresse, dividida em duas subcategorias que são sintomas físicos e psicológicos. A segunda categoria é sobre fontes de estresse, subdividida em três subcategorias (fatores do trabalho, fatores do aluno, e fatores extra-escolares). A terceira categoria é de estratégias de coping, que foi dividida em duas subcategorias (coping focalizado no problema e coping focalizado na emoção). E a quarta categoria compreende as sugestões dos professores sobre os aspectos do trabalho docente a serem melhorados a nível do Centro (direção do Centro), do Governo ou Ministério da Educação e Desenvolvimento Humano. Os resultados foram agrupados em tabelas de frequências tendo em conta o objetivo norteador da pesquisa.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A apresentação e discussão dos resultados foram feitas em função das quatro categorias de análise, nomeadamente: sintomas de estresse, fontes de estresse ocupacional, estratégias de coping e aspectos a serem melhorados para minimizar o estresse no trabalho. É importante salientar que devido à escassez de estudos sobre estresse ocupacional em professores da educação especial ou inclusiva, a discussão de resultados é também feita com os achados de pesquisas com amostra de professores do ensino básico.

SINTOMAS DO ESTRESSE NOS PROFESSORES

Para identificar os sintomas de estresse mais frequentes nos professores pesquisados foi aplicado o Inventário de Sintomas de Estresse para Adultos de Lipp (ISSL). Os resultados obtidos se resumem na Tabela 1.

De acordo com a Tabela 1, em ordem decrescente de frequência, os sintomas físicos mais apontados pelos participantes foram: mal-estar generalizado sem causa específica, mudança no apetite, cansaço constante e nó no estomago. Na área psicológica, destacam-se: pensar e falar constantemente num único assunto e vontade súbita de iniciar novos projetos. Estes resultados corroboram parcialmente com os de um estudo feito com professores brasileiros do ensino básico que relatou que as consequências mais predominantes eram sintomas psicológicos, na qual se apresentavam como mais significativos: irritabilidade excessiva, pensar constantemente em um só assunto e sensibilidade emotiva excessiva. Na área física, os sintomas mais presentes foram: cansaço constante, sensação de desgaste físico constante e problemas com a memória (Silveira, Enumo, & Kotroni, 2014).

Importa salientar que o estresse excessivo pode interferir na qualidade de vida do ser humano, levando-o a uma série de prejuízos: problemas de interação social, familiar, falta de motivação para as atividades em geral, doenças físicas e psicológicas, além de problemas no trabalho (Lipp, 2004). Estes resultados mostram claramente que o estresse no trabalho tem efeitos negativos na vida dos professores e provavelmente pode afetar, igualmente, a qualidade do trabalho docente.

FONTES DE ESTRESSE OCUPACIONAL NOS PROFESSORES

Com intuito de explorar os aspectos relacionados ao trabalho docente percebidos como fontes de estresse ocupacional em professores, solicitou-se aos participantes a enumerar por escrito os elementos que consideram de mais estressantes. Os resultados achados estão organizados na Tabela 2.

Com base na Tabela 2, as principais fontes de estresse ocupacional em professores pesquisados são: a) limitadas oportunidades de desenvolvimento e crescimento profissional (mudança de carreira, progressões e promoções);b) longas distâncias percorridas de casa-trabalho e vice-versa; c) baixos salários e remunerações;e d) falta de recursos materiais e didáticos. Alguns aspectos identificados neste estudo têm sido recorrentemente apontados como fontes de estresse ocupacional em professores do ensino básico e da educação inclusiva tanto em Moçambique (e.g., Abacar, Roazzi, & Bueno, 2017; Aliante & Abacar, 2019a, 2019b; Aliante & Tittoni, 2017; 2018) como a nível internacional (e.g., Antoniou, Polychroni, & Kotroni, 2009; Carlotto et al., 2018; Silveira, Enumo, Pozzatto, & Paula, 2014).

A título de exemplo, um estudo de Abacar et al. (2017) realizado com uma amostra de professores moçambicanos e brasileiros que lecionam no ensino básico apontou que baixos salários; comportamento de alunos e inadequadas condições de trabalho como principais aspectos estressantes. Resultados similares foram encontrados no estudo de Aliante e Abacar (2019a) em que baixos salários, problemas de carreira profissional; a quantidade de alunos nas salas, comportamento de alunos (barulho); as más relações interpessoais; fraca aprendizagem dos alunos e falta de acompanhamento de pais e encarregados de educação foram apontados como potencias estressores ocupacionais. Igualmente, a pesquisa de Aliante e Abacar (2019b) revelou a falta de oportunidades para continuação de estudo; salários baixos; limitadas oportunidades de desenvolvimento profissional;distância a percorrer entre escola-casa e vice-versa; atribuição de culpa pelo fracasso dos alunos; falta de recursos materiais para o trabalho; falta de apoio social; falta de planos de benefícios sociais;mudanças ou atualizações regulares dos currículos, maior quantidade de alunos por turma; oscilação de datas de pagamento de salários, e precárias condições físicas de trabalho como sendo os principais estressores. Num outro estudo, Aliante e Tittoni (2017) apontaram a sobrecarga no trabalho; a pressão de tempo; a desmotivação de alunos e as transferências involuntárias como estressores na atividade docente em Moçambique.

Alguns estressores identificados neste estudo corroboram com achados de Antoniou et al. (2009) numa pesquisa com uma amostra de professores na Grécia que lecionam alunos com NEE, em que foram identificados os seguintes itens como principais fontes de estresse: a falta de recursos e equipamentos nas escolas; responsabilidade pelos alunos; falta de apoio de governo; pressão de tempo na escola; e o favoritismo no trabalho, em que a promoção é percebida como baseada em contatos sociais e não no desempenho profissional. De igual modo, cabe mencionar os resultados do estudo de Duek (2007) ao realçar que as condições em que o trabalho escolar se realiza (carência de recursos, turmas numerosas, espaço não adaptado) e a inexistência de um momento de troca de experiências entre os professores, constituem desafios enfrentados entre professores brasileiros estudados diante da política da educação inclusiva. Similarmente, a grande quantidade de alunos na sala; problemas comportamentais dos alunos; atitude pública de incompreensão sobre a carga de trabalho do professor; falta de motivação dos alunos; e falta de recursos suficientes para o ensino; foram considerados como fatores de estresse em professores brasileiros de ensino especial (Silveira et al., 2014). Já Carlotto et al. (2018) apontaram a relação professor-aluno; a falta de apoio de familiares de alunos; a sobrecarga de papéis e; os conflitos trabalho-família e família-trabalho como principais estressores em professores brasileiros.

ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO DE ESTRESSE USADAS PELOS PROFESSORES

Em situações de estresse os professores recorrem às estratégias de coping focadas na emoção. A Tabela 3 ilustra os diversos modos de controle das emoções usados pelos professores.

Mediante os resultados da Tabela 3, pode se depreender que as estratégias mais utilizadas pelos professores estudados foram: conversar com outras pessoas; assistir televisão; e ler livros, revistas, jornais, ou seja, os professores recorrem essencialmente em estratégias paliativas ou baseadas na emoção. Estes resultados são similares com os encontrados numa investigação com professores que lecionam o ensino básico na Argélia, em que, em termos de estratégias de coping utilizadas, 62% (n=125) dos professores disseram que assistiam programas televisivos; 59% (n=125) conversam com seus amigos e 54% (n=125) rezavam e faziam oração (Mokdad, 2005).

Um estudo de Silva (2017) com amostra de professores brasileiros apontou que quanto às estratégias de enfrentamento, 59,0% (n=1.952) procuram manter o controle da situação, 36,1% buscam auxílio e conselhos de terceiros (apoio social), 31,4% (n=1.952) apresentam estratégias negativas de isolamento e 41,9% (n = 1.952) estratégias negativas de recusa, na qual os sujeitos tendem a adotar uma atitude de indiferença diante das dificuldades, ou ignoram as situações.

Outros resultados similares foram obtidos nas pesquisas anteriores com professores brasileiros (Ribeiro, 2015), moçambicanos (Abacar, 2011) e nigerianos (Olaitan, 2009), todos do ensino básico, onde se observou que as conversas com os colegas de trabalho e familiares constituíram as principais estratégias de enfrentamento de estresse no trabalho. Botou, Mylonakou-Keke, Kalouri e Tsergas (2007) evidenciaram que a resiliência do professor grego se correlacionou positivamente com o bom relacionamento com a família e com os colegas. Os resultados deste estudo estão na mesma direção com os anteriores e demonstram que, independente do país, os professores tendem a utilizar a estratégia paliativa (i.e., conversar) enquanto alternativa para lidar com o estresse.

Tem-se verificado que o coping focado na emoção é a estratégia de enfrentamento mais preferida por professores (Abacar, 2011; Botou et al., 2007). Todavia, algumas das formas de enfrentamento de estresse identificadas neste estudo (e.g., assistir televisão; ler livros, revistas ou jornais) podem agravar os níveis da doença, como defende um pesquisador indiano, que entende que, se a maneira de enfrentar o estresse for tomar um café ou ligar a televisão, por exemplo, os problemas se agravam (Sowmya, 2010). As estratégias de coping encontradas neste estudo divergem com os achados de um estudo anterior cuja amostra foi composta por professores brasileiros que lidam com crianças com NEE (Silveira et al., 2014). Neste estudo verificou-se a predominância de estratégias de enfrentamento baseadas na solução de problemas, seguidas de busca de práticas religiosas e de suporte social.

ASPECTOS A SEREM MELHORADOS PARA REDUZIR O ESTRESSE NOS PROFESSORES

Por fim, procurou-se compreender dos inquiridos os aspectos que devem ser melhorados para prevenir, reduzir e/ou combater o estresse no trabalho. As informações obtidas nesta questão estão agrupadas na Tabela 4.

Com base na Tabela 4, os professores pesquisados entendem que alguns aspectos devem ser melhorados e/ou disponibilizados tais como: condições de trabalho, transporte público para os funcionários e aumento dos salários. Este achado sugere ser crucial a melhoria destes aspectos percebidos como estressores, pois podem contribuir para inibir iniciativas de professores mais envolvidos com o seu trabalho, que passam a sentirem-se insatisfeitos e desestimulados para com o trabalho. Neste caso, geralmente, o professor passa a ver a escola e suas atividades como um fardo pesado e sem gratificação pessoal (Botou et al., 2007). Como resultado poder-se-á ter a queda de desempenho, frustração, alteração de humor, além de consequências físicas e mentais como a depressão, o estresse e o burnout (Silveira et al., 2014).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve como objetivo avaliar o estresse ocupacional (sintomas e fontes) e estratégias de coping em professores da Educação Inclusiva. Para a concretização do objetivo geral foram levantadas as seguintes questões de pesquisa: i) Que aspectos do trabalho propiciam a ocorrência de estresse nos professores? e ii) Quais são as manifestações de estresse e estratégias de coping utilizadas pelos professores da educação especial para minimizar os efeitos negativos do estresse percebido?

O maior mérito desta pesquisa é de ser pioneira no estudo da temática de estresse tendo como amostra professores moçambicanos da educação especial. Os resultados alcançados permitem assinalar que a situação de trabalho dos professores não é a ideal, pois estes sentem-se estressados pelo seu trabalho, com sintomatologia tanto psicológica como física. Esse cenário ressalta a necessidade de intervenção com políticas de saúde específicas para esses profissionais, visto que podem ser vulneráveis ao surgimento de patologias ocupacionais.

O estresse enquanto fenômeno que afeta a saúde dos professores não está dissociado com a sua atividade profissional. O estresse ocupacional dos professores pesquisados é derivado, predominantemente, das situações de trabalho a que estes estão sujeitos. Assim, de modo a evitar a cronicidade dos estressores e a preservar a saúde dos professores, as situações de estresse identificadas neste estudo podem ser amenizadas ou, preferencialmente, eliminadas, pela melhoria dos aspectos estressores e por meio de informações sobre o estresse, bem-estarem ações de formação continuada do professor. Poder-se-á constituir uma forma de conscientização para que se busquem meios de lidar com diferentes obrigações e diversidades culturais, sociais e comportamentais a que todos estão sujeitos no dia-a-dia (Bastos & Sancevero, 2014; Naujorks, 2002).

Apesar de ser um estudo com professores que lidam com alunos com necessidades educativas especiais (NEE), as questões mais pontuadas constituem aspectos estressores que podem ser encontrados no sistema de ensino regular. Assim, os achados da pesquisa sugerem que é preciso realizar ajustes no setor da educação em si, e não apenas (ou focando simplesmente) na educação inclusiva. Ou seja, evidenciam a necessidade de redesenho do trabalho docente, o que pressupõe, de acordo com Mark e Smith (2008), que as atitudes dos trabalhadores, competências, habilidades e recursos respondam às necessidades do seu trabalho, e que às exigências de trabalho devem atender às necessidades dos trabalhadores, dos seus conhecimentos e das potenciais habilidades.

O estresse dos professores traz consequências adversas na saúde desses profissionais, podendo afetar a nível individual e familiar, sendo que as estratégias paliativas por estes usadas podem ser ineficazes no enfrentamento desse fenômeno psicossocial. Na verdade, tais estratégias visam apenas diminuir ou atenuar a sensação de estresse (Kyriacou, 2001).

Este estudo apresenta algumas limitações que devem ser levadas em consideração. Uma delas tem a ver com o tamanho da amostra e pelo fato de envolver apenas amostra não probabilística de professores de um Centro de Educação Inclusiva em Moçambique, o que não permite a generalização dos resultados. Ainda assim, os resultados obtidos podem permitir à instituição pesquisada a desenvolver ações preventivas de modo a promover à saúde mental no trabalho docente e melhorar a qualidade de vida destes profissionais da educação.

Em função dos achados da pesquisa, sugere-se a melhoria das condições de trabalho apontadas pelos professores como estressoras, de forma a garantir o bem-estar físico e psíquico dos mesmos. Além do mais, é importante desenvolver futuras investigações envolvendo amostras probabilísticas maiores e em diferentes escolas moçambicanas da educação inclusiva para melhor compreensão da realidade vivida pelos professores. Estudos quantitativos e descritivos visando verificar as possíveis correlações entre o nível de estresse, as estratégias de coping e dados sociodemográficos e laborais também são necessários, já que neste estudo não foram examinadas essas associações.

Igualmente, é fundamental a capacitação dos professores em matéria de gestão de estresse, de modo a despertar atitudes de boas práticas de saúde mental e física, com vista a promover o bem-estar destes profissionais. Ademais, é necessário a implementação de serviços de atenção à saúde do trabalhador a serem liderados por psicólogos com vista a fazer o devido acompanhamento psicossocial aos professores, particularmente os que se encontram com um quadro de estresse instalado.

 

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Recebido em: 19/05/2019
1ª revisão em: 29/09/2019
Aceito em: 28/11/2019

 

 

CONFLITOS DE INTERESSES
Não há conflitos de interesses.
SOBRE OS AUTORES
Gildo Aliante é Mestre em Psicologia Social e Institucional e Doutorando do PPG em Psicologia Social e Institucional no Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio do Grande do Sul -Brasil. Bolsista de CAPES.
E-mail: aliantegildo@yahoo.com.br
Mussa Abacar é Doutor em Psicologia Cognitiva pela Universidade Federal de Pernambuco - Brasil. Docente da Faculdade de Educação e Psicologia na Universidade Rovuma-Nampula, Moçambique.
E-mail: abacarmussa@yahoo.com.br
Angelina Mualaquia Pereira é Mestre em Educação em Ciências de Saúde pela Universidade Lúrio -Moçambique. Enfermeira do Hospital Central de Nampula- Moçambique.
E-mail: angelinamualaquia@gmail.com

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