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Estilos da Clinica
versão impressa ISSN 1415-7128versão On-line ISSN 1981-1624
Estilos clin. v.13 n.25 São Paulo dez. 2008
EDITORIAL
A revista Estilos da Clínica apresenta a segunda parte do dossiê 'Escritas'.
'Escritas' trabalha com a noção de escrita, neste e no volume 24, em duas ordens diferentes: a escrita inconsciente, psíquica, marca/cifra do acontecimento subjetivo; e a escrita alfabética, acontecimento lingüístico relativo ao ato de escrever. A intenção fundamental desse trabalho é a de marcar os pontos de convergência e divergência entre essas duas ordens de escrita.
Escrita alfabética e inconsciente se dão em planos topológicos diferentes. Se, para muitos ainda que não pra todos , a escrita alfabética é um objeto que deve ser apreendido na ordem do conhecimento, a escrita inconsciente, por sua vez, aproxima-se de uma cifragem que não se organiza como texto, é tecida na ordem da letra; letra que cifra o gozo, litoral entre Real e Simbólico.
Todavia, tais planos topológicos se relacionam. A escrita alfabética, fato de linguagem, pode apresentar-se como um plano de impacto do sujeito do inconsciente. Como se dá esse jogo? Alguns artigos vão discutir, a partir da clínica, a inibição e o sintoma na escrita, considerando, para tal, a escrita na ordem significante e pulsional. Nessa ordem, a escrita é ato.
Escrever pode assumir o caráter de ato na medida em que "tem lugar por um dizer, e pelo qual modifica o sujeito" (Lacan, 2003, p. 371)1. Na literatura há vários testemunhos de escritores que se entendem modificados por sua obra, no giro de sua confecção. Cito André Groz: "A magia da literatura: ela me dava acesso à existência na medida em que eu tinha me descrito, escrito, na minha recusa de existir. Aquele livro era o produto da minha recusa, era essa recusa, e por sua publicação, me impedia de perseverar nessa recusa" (p. 44)2.
E fora do fazer artístico, a escrita pode cumprir a função de instaurar diferença entre o antes e o depois daquele que escreve? Não seria essa a razão de seu funcionamento inibido?
Para desfazer o curto circuito simplista entre as duas ordens de escrita, a noção de letra apresenta-se como um operador conceitual fundamental. Desse modo, outros autores exercitam-se nessa discussão no eixo da teoria psicanalítica bem como na relação da psicanálise com a pesquisa e com a ciência. A tensão que se instala entre esses termos inscreve um campo para o trabalho.
Nesta edição, apresentamos os trabalhos de Claudemir Belintane, Sonia Borges, Eduardo Calil e Cristina Felipeto, Suzana Carielo da Fonseca e Lúcia Arantes, Luciano Elia, Ana Beatriz Coutinho Lerner, Mariana Soares Melão, Maria Cristina Poli, e um artigo de minha autoria.
Estilos recolhe diferentes abordagens da temática da escrita nos campos teórico e clínico, bem como em sua articulação ao discurso social. São artigos que avançam porque fazem trabalhar as noções de letra e escrita e, apostamos, ao encontrar com o leitor, sustentam um retorno rigoroso à clínica.
BOA LEITURA !
Ilana Katz Zagury Fragelli
Doutoranda da Faculdade de Educação
da Universidade de São Paulo
(Lepsi IP/FE-USP).
1 Lacan, J. (2003). O ato psicanalítico. In J. Lacan, Outros escritos (V. Ribeiro, trad., pp. 371379). São Paulo: Jorge Zahar Editor. [ Links ]
2 Groz, A. (2008). Carta a D.: História de um amor. (C. Azzan Jr., trad. e notas). São Paulo: Annablume/Cosac e Naify. [ Links ]