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Journal of Human Growth and Development
versão impressa ISSN 0104-1282versão On-line ISSN 2175-3598
Rev. bras. crescimento desenvolv. hum. v.18 n.1 São Paulo abr. 2008
PESQUISA ORIGINAL RESEARCH ORIGINAL
Rede de atenção à saúde mental de base comunitária: a experiência de Santo André
Community-based mental health care network: the Santo André experience
Elizabete Satie HennaI; Luiz Carlos de AbreuII; Marcos Luiz Ferreira NetoIII; Alberto Olavo Advíncula ReisIV
IEspecialista em Saúde Pública. Cientista Social da Associação De Volta Para Casa. Santo André, SP. e-mail: elizabete.henna@osdevoltaparacasa.org.br
IIPós-doutor em Saúde Pública. Professor do Departamento de Fisiologia da Faculdade de Medicina do ABC
IIIDoutor em Farmacologia. Professor Adjunto. Faculdade de Educação Física - FAEFI / Núcleo de Estudos e Pesquisa em Ciência do Exercício - NEPCE / Universidade Federal de Uberlândia - UFU
IVProfessor Doutor. Departamento de Saúde Materno-Infantil da Faculdade de Saúde Pública da USP. Coordenador do Laboratório de Saúde Mental Coletiva do HSM da FSP-USP
RESUMO
Os distúrbios psiquiátricos constituem um grave problema de saúde pública. Por muitos anos, a única terapêutica disponível ao portador de transtornos mentais era a internação em hospitais psiquiátricos. Hoje a Organização Mundial da Saúde recomenda os serviços de base comunitária como modelo de tratamento em saúde mental. Assim, o objetivo é descrever as características de uma rede de atenção à saúde mental de base comunitária no município de Santo André, SP. Foi realizado um estudo retrospectivo do tipo descritivo, em dados secundários do período de 1987 a 2006. O estudo incidiu sobre o histórico, a infra-estrutura, os recursos humanos, a produção, as práticas e processos de trabalho dos serviços de saúde mental de Santo André. Foram analisados documentos do Programa Municipal de Saúde Mental, da Secretaria Municipal de Saúde, da Prefeitura de Santo André, da Associação José Martins de Araújo Júnior/Organização Social De Volta Para Casa. A Secretaria Municipal de Saúde proveu meios para uma transformação dos serviços de saúde mental no período estudado, partindo de um atendimento exclusivamente manicomial para uma rede de serviços de saúde mental com modelo centrado na comunidade, focando a doença no aspecto psicossocial e com abordagem por equipe multiprofissional. Estas ações no município de Santo André forarm corroborativas aos esforços da sociedade civil e o pleno desenvolvimento da mudança do modelo hospitalocêntrico.
Palavras-chave: Saúde mental; psiquiatria comunitária; redes comunitárias.
ABSTRACT
Psychiatric impairments are a critical public health problem. For many years, the only therapy available to individuals with mental disorders was hospitalization at psychiatric institutions. Nowadays the World Health Organization recommends community-based services as a model of mental health treatment. Therefore, the aim of this study is to describe the characteristics of a community-based mental health care network in the city of Santo André, state of São Paulo. A descriptive and retrospective study was carried out, based on secondary data from the period between 1987 and 2006. The study investigated the history, infrastructure, human recourses, production, practices and work processes of the mental health services of Santo André. Documents of the Municipal Mental Health Program of the Municipal Health Department of Santo André, and of the José Martins de Araújo Júnior Association/Social Organization De Volta Para Casa were analyzed. The Municipal Health Department promoted the transformation of the mental health services in the studied period: from assistance provided exclusively at asylums to a network of mental health services whose model was based on the community, focusing on the psychosocial aspect of the disease and with multi-professional teams. These actions in Santo André corroborated the civil society's efforts and the development of changes in the hospital-centered model.
Keywords: Mental health; community-based psychiatry; community-based networks.
INTRODUÇÃO
Os distúrbios psiquiátricos constituem um grave problema de saúde pública. Estima-se que no mundo 450 milhões de pessoas sofram de algum transtorno mental ou de problemas psicossociais relacionados ao álcool ou outras drogas. Por muitos anos, a única terapêutica disponível ao portador de transtornos mentais era a internação em hospitais psiquiátricos. Hoje a Organização Mundial da Saúde recomenda os serviços de base comunitária como modelo de tratamento em saúde mental.1
A rede comunitária deve articular, além dos serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico, instituições, associações, cooperativas e outros espaços da cidade para oferecer um conjunto vivo e concreto de referências às pessoas em sofrimento mental.2
Em 1990 a Organização Panamericana de Saúde organizou uma Conferência que resultou na Declaração de Caracas, marco importante para o processo de Reforma Psiquiátrica nas Américas, pois declarou que as legislações dos países devem ajustar-se de modo a assegurar os direitos humanos dos portadores de transtornos mentais e a promover a organização de serviços comunitários de saúde mental.3
No Brasil, estima-se que 20 milhões de pessoas necessitam de cuidados contínuos ou eventuais em Saúde Mental.4 No contexto das lutas sociais pela redemocratização do país nos anos 80, ocorreram várias discussões que impulsionaram a Reforma Psiquiátrica brasileira. Em 1987 realizou-se o II Congresso Nacional dos Trabalhadores em Saúde Mental, que criou o lema "por uma sociedade sem manicômios". Aconteceram também a 8ª. Conferência Nacional da Saúde e Conferências Nacionais de Saúde Mental que contribuíram para a construção de um novo projeto de saúde mental para o país.5
No dia 6 de abril de 2001 foi aprovada a lei federal nº 10.216, que redirecionou o modelo assistencial brasileiro em saúde mental , prevendo cuidados integrais à clientela internada por longos anos nos hospitais psiquiátricos e punição para a internação involuntária arbitrária ou desnecessária.6
A Reforma Psiquiátrica em Santo André teve início bem antes da aprovação da lei federal nº 10.216, logrando instalar uma rede de serviços de base comunitária que hoje é referência do modelo antimanicomial.
Desta maneira, busca-se uma visão abrangente deste processo antimanicomial, que se posiciona como um marco na implementação de políticas de transformação na área da saúde mental na região do ABC Paulista. O objetivo é descrever as características de uma rede de atenção à saúde mental de base comunitária no município de Santo André, SP.
MÉTODO
Foi realizado um estudo retrospectivo do tipo descritivo, baseado em dados secundários no período de 1987 a 2006. O estudo incidiu sobre o histórico, a infra-estrutura, os recursos humanos, a produção, as práticas e processos de trabalho dos serviços de saúde mental de Santo André.
Foram analisados dados secundários por um método de tratamento e análise de informações, por meio da coleta de dados do Programa de Saúde Mental, da Secretaria de Saúde e da Prefeitura de Santo André, de 1992 a 2006, que faziam menção aos serviços desde 1987; relatório da Associação José Martins de Araújo Júnior/O.S. De Volta Para Casa (ONG que administra serviços de saúde mental em co-gestão com a prefeitura), dados de produção dos NAPSs e do hospital psiquiátrico de 1992 a 2006; leis federais e municipais. Foi realizada também consulta bibliográfica.
Devido ao fato da rede de serviços de saúde mental de Santo André ser ampla, foram focados os NAPSs (Núcleos de Atenção Psicossocial) e os serviços de base comunitária considerados novos, como os que garantem a moradia, o trabalho e o lazer, além do trabalho com usuários de drogas. Os ambulatórios, a emergência psiquiátrica e as mini-equipes de saúde mental em unidades básicas de saúde foram pouco detalhados.
RESULTADO E DISCUSSÃO
Realizou-se a distribuição das informações de maneira descritiva, em tabelas de 1 a 7. As tabelas 1 e 2 apresentam os dados referentes à estrutura física e aos recursos humanos disponíveis. Já a tabela 3 descreve a estrutura física das residências terapêuticas, do núcleo de projetos especiais (NPE) e da Associação José Martins de Araújo Júnior/O.S. De Volta Para Casa (ASSOCIAÇÃO). Na 4, complementa-se os dados descritivos com destaque aos recursos humanos, sendo que a tabela 5 aborda as internações hospitalares, via Sistema único de Saúde, sendo destacado na tabela 6 a média de permanência (em dias) das internações hospitalares. E por fim, a tabela 7 descreve a freqüência dos procedimentos realizados no Núcleo de Atenção Psicossocial II do município de Santo André.
No período anterior a 1987, a área da saúde mental de Santo André era coberta exclusivamente pelos hospitais psiquiátricos privados "Palmares", e "Clínica de Repouso Borda do Campo", que funcionaram até respectivamente 1990 e 1999.7
A partir de 1987 começaram a ser criados no município de Santo André, pela Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, três equipamentos de Saúde Mental: um Ambulatório de Saúde Mental, uma equipe mínima no CSII (Centro de Saúde II) e um Hospital-Dia.
Com as eleições municipais de 1988, foi eleito o prefeito Celso Daniel. Em sua gestão, os investimentos disponíveis foram direcionados prioritariamente para a área social. Na área da saúde, o investimento cresceu 110,8%; passando de 6,5% em 1987 para 14,36% do orçamento total do Município em 1992. Ele iniciou a implantação do SUS (Sistema Único de Saúde).
Na saúde mental, os serviços passaram para a responsabilidade do município e foram ampliados. Assim, na gestão 1989-1992, foram implantadas a Emergência de Psiquiatria no Hospital Municipal; equipes mínimas de saúde mental na Unidade Básica de Saúde (UBS) de Santa Terezinha, na UBS Vila Luzita e no Ambulatório Regional de Clínicas; o CPTRA (Centro de Prevenção, Tratamento e Reabilitação do Alcoolismo), duas equipes de Saúde Mental nas delegacias de ensino dos 1º e 2º subdistritos e os programas de atenção ao deficiente mental e ao deficiente auditivo.8
Em 1993, a gestão do Município voltou para setores mais conservadores e o avanço na área da saúde ficou estagnado. A visão de isolar o "doente mental" voltou a ser considerada, o que propiciou a criação da Associação José Martins de Araújo Júnior como forma encontrada pelos usuários, familiares e trabalhadores do setor de lutar por uma saúde mental mais humanizada. A conseqüência mais imediata da política conservadora transpareceu no fato de que, no período de 1993-1996, Santo André passou a deter o recorde entre as cidades do Grande ABC que mais internavam em leitos de longa duração. A Emergência Psiquiátrica do Hospital Municipal de Santo André funcionava como porta de entrada para os hospitais privados da região.9
Em 1997, a gestão Municipal volta às mãos do Prefeito Celso Daniel. E ele convidou vários profissionais de Santos para ajudarem a implantar um projeto de saúde mental baseado nas diretrizes da linha antimanicomial e psicossocial, pondo em linha de mira o fechamento do hospital psiquiátrico. Santos havia sido a primeira cidade do Brasil a fechar um manicômio e a implantar uma rede de serviços públicos substitutiva.
Neste período, Santo André entrou em gestão plena do SUS e passou a ser responsável pelo repasse da verba para o hospital psiquiátrico do município, denominado "Clínica Psiquiátrica Borda do Campo". Em 1998, o Colegiado de Saúde Mental, a Vigilância Sanitária e o Conselho Municipal de Saúde do município fizeram uma vistoria nesse hospital, recomendando o seu fechamento, haja vista que ele não se adequava às normas da portaria 224/92, MS.
A Secretaria de Saúde não fechou o hospital e o orientou a se adequar às normas da portaria 224/92, MS, renovando seu convênio com o SUS por um ano mais. Logo em seguida a direção do hospital emitiu um comunicado que dizia que se adequasse às normas, fecharia. Diante da relutância da Direção do Hospital em se conformar ao rezado na portaria 224/92 iniciou-se o processo de fechamento da "Clínica Psiquiátrica Borda do Campo".
Desde 1997, o movimento social fazia pressão para que a Câmara dos Vereadores aprovasse a lei municipal que cria o Programa Municipal de Atenção Psicossocial e proíbe a construção e/ou subvenção de manicômios no município. A Câmara aprovou e, em janeiro de 2001, a lei 8.162 foi sancionada pelo então Prefeito, Celso Daniel.10
A rede de serviços de saúde mental de Santo André é composta por dois (2) NAPS (Núcleos de Atenção Psicossocial) 24 horas, hum (1) NAPS AD (Núcleo de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas) 24 horas, hum (1) CAPS i (Centro de Atenção Psicossocial infantil) 12 horas, uma (1) Emergência Psiquiátrica no Hospital Geral Municipal, dois (2) ambulatórios em Centros de Especialidades, duas (2) equipes em Unidades Básicas de Saúde e os projetos em co-gestão com a Associação José Martins de Araújo Júnior por meio da Organização Social (OS) De Volta Para Casa: hum (1) Núcleo de Projetos Especiais (oficinas de geração de renda), três (3) Residências Terapêuticas e uma (1) Unidade de Redução de Danos.
As tabelas 1 e 2 apresentam os dados referentes à estrutura física e aos recursos humanos disponíveis para os NAPS/CAPS do município de Santo André, em 2006.
A portaria GM 336/02, de 19/02/02, MS11 não dispõe sobre o espaço físico dos CAPS, mas descreve as atividades: atendimento individual, em grupos, à família, oficinas terapêuticas, acolhimento noturno (leitos), refeições diárias, etc. O espaço físico deve suportar estas atividades, e observa-se, na tabela 1, que os serviços de saúde mental de Santo André estão adequados para atender a estas necessidades.
A tabela 2 mostra que, no que se refere aos recursos humanos, os NAPS (CAPS III) e o CAPS infantil II de Santo André atendem às exigências da portaria GM 336/02. O Ministério da Saúde ainda não estabeleceu uma portaria que regulamente o funcionamento do CAPS AD III. Assim, o NAPS AD de Santo André procura seguir as normas de um CAPS AD II, mas com a equipe ampliada para atender 24 horas.
O CAPS i está localizado na região III de Santo André, área onde é maior a população de crianças. Foi inaugurado em outubro de 2005. O horário de funcionamento é das 7h00 às 19h00. Trata-se de um serviço de atenção diária destinado ao atendimento de crianças gravemente comprometidas psiquicamente. Estão incluídos nessa categoria os portadores de autismo, psicoses, neuroses graves e todos aqueles que, por sua condição psíquica, estão impossibilitados de manter ou estabelecer laços sociais. A experiência acumulada em serviços que já funcionavam segundo a lógica da atenção diária indica que se ampliam as possibilidades do tratamento para crianças quando o atendimento tem início o mais cedo possível, devendo, portanto, os CAPS i estabelecerem as parcerias necessárias com a rede de saúde, educação e assistência social ligadas ao cuidado da população infanto-juvenil.12
O município de Santo André também procura atender necessidades de habitação, trabalho, lazer e cultura, etc.; eixos fundamentais para que se alcance a reabilitação psicossocial.13 Isto é concretizado por meio da parceria com uma organização não governamental (ONG), denominada Organização Social De Volta Para Casa, criada a partir da Associação José Martins de Araújo Júnior.
A Organização Social De Volta Para Casa administra, em co-gestão com a Secretaria de Saúde, em concordância com os princípios do SUS, os serviços descritos a seguir.
As tabelas 3 e 4 apresentam os dados referentes à estrutura física e aos recursos humanos das Residências Terapêuticas, do Núcleo de Projetos Especiais, da Unidade de Redução de Danos e da Associação José Martins de Araújo Júnior/Organização Social De Volta Para Casa.
As Residências Terapêuticas são regulamentadas pela Portaria GM 106/2000 MS.14 Quanto à estrutura física, o primeiro item da portaria diz que a Residência deve estar situada fora dos limites de unidades hospitalares gerais ou especializadas. As Residências de Santo André se adequam a este quesito, pois se situam em bairros residenciais comuns. A portaria preconiza também que a Residência deve apresentar dimensões compatíveis para abrigar um número de no máximo 8 usuários na proporção de até 3 por dormitório. Além disso, que a sala de estar deve conter mobiliário adequado para o conforto e boa comodidade dos usuários, os dormitórios devem ser devidamente equipados com cama e armário e a cozinha deve conter todos os equipamentos para atividades domésticas (fogão, cozinha, etc.). Quanto aos recursos humanos, a portaria diz que a Residência deve estar vinculada a um serviço ambulatorial especializado em saúde mental que contenha no mínimo um profissional médico e dois profissionais de nível médio com capacitação ou experiência em reabilitação. As Residências de Santo André estão vinculadas ao NAPS II. A portaria diz ainda que, a critério do gestor local, as Residências podem funcionar em parceria com organizações não governamentais (ONGs) de saúde. É o que ocorre em Santo André. Pelo que foi observado, as Residências Terapêuticas de Santo André atendem a todas as determinações da portaria.
O modelo hospitalocêntrico foi visto como um local de impossibilidades, de regras. A Residência Terapêutica mostrou-se como um local para o reinício, a ressocialização e a aproximação da família e sociedade, trazendo benefícios para os portadores de transtornos mentais. As Residências Terapêuticas de Santo André são entendidas como um local de moradia que procura viabilizar o reencontro de identidades e a inserção social.15
O Núcleo de Projetos Especiais é um equipamento novo, que não foi regulamentado pelo Ministério da Saúde, e visa à inserção no trabalho. A estrutura física e os recursos humanos visam à promoção da reinserção sócio-educativo-comunitária e de trabalho e geração de renda aos usuários da Rede de Atenção Psicossocial do município de Santo André.
A Unidade de Redução de Danos também não é regulamentada pelo Ministério da Saúde, mas segue todas as diretrizes do Programas Nacionais de DST/AIDS e de Saúde Mental. Trata-se de um trabalho de campo, no território, e não tem estrutura física própria. É ligado ao NAPS AD, portanto utiliza-se de suas instalações para reuniões de equipe. Utiliza-se também de um veículo cedido pela prefeitura. Conta também com a parceria do Programa Municipal de DST/AIDS de Santo André e da ONG Saúde e Cidadania. A equipe, formada por redutores de danos e supervisores, atende no território pessoas em situação de vulnerabilidade, que necessitam de cuidados, mas em geral não têm acesso ao suporte da rede pública sócio-assistencial. Os campos ocorrem à tarde e à noite, nos seguintes pontos: favelas, pontes, viadutos, casas de shows eróticos, ruas e praças, dentre outros. Seu objetivo é contribuir para a redução de danos e riscos sociais e à saúde de populações em situação de maior vulnerabilidades individuais, sociais e programáticas, quais sejam: crianças e adolescentes em situação de exploração sexual, profissionais do sexo, travestis, usuários de drogas ilícitas (cocaína injetável e inalada, crack, maconha) e lícitas (álcool, solvente. etc.). No campo, a equipe distribui preservativos, seringas, folhetos explicativos, etc.; e estabelece vínculo com a população atendida. Realiza também campanhas de vacinação e serve de porta de entrada para serviços de saúde em geral e outros serviços sócio-assistenciais.16
É importante ressaltar que alguns redutores de danos são do próprio campo, ou seja, são usuários ou ex-usuários de drogas e/ou profissionais do sexo, contratados pelas ONG's Saúde e Cidadania e De Volta Para Casa. Isso ampliou o acesso ao público e elevou a qualidade dos atendimentos.
A Associação José Martins de Araújo Júnior foi fundada em 1992, por usuários, familiares e trabalhadores da Saúde Mental. Entre seus objetivos estão a garantia dos direitos constitucionais, individuais e coletivos e difusos e promover trabalhos de assistência e integração a usuários dos serviços de Saúde Mental.17 A Organização Social De Volta Para Casa foi criada para firmar a parceria com o poder público.
Além dos projetos realizados em parceria com a Secretaria de Saúde, a associação capta recursos para outros projetos, como: atendimento jurídico (parceria com a 38ª. Subseção da OAB/Santo André), Jornal Vozes da Saúde Mental (parceria com o Núcleo de Jornalismo Social da Universidade Metodista de São Paulo), MOVA (Movimento de Alfabetização - parceria com a Secretaria de Educação), Mostra de Música (parceria com a Secretaria de Cultura), entre outros. A associação também é importante ponto de mobilização social.
As tabelas 5, 6 e 7 apresentam dados de produção: número de internações hospitalares, tempo de internação e procedimentos dos NAPSs.
Nas tabelas 5 e 6 observa-se uma sensível queda no número de internações e no tempo de internação à medida que esta rede de serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico foi instalada.
Nota-se também um aumento na freqüência de procedimentos dos NAPSs de Santo André. A tabela 7 apresenta os procedimentos do NAPS II. Os NAPSs oferecem uma diversidade de ações que se diferenciam do modelo tradicional de internação.
Os NAPSs de Santo André são orientados pelos princípios e diretrizes fundamentais do SUS: universalidade, equidade, integralidade, regionalização, territorialização, acesso e acolhida, responsabilização, controle social, resolutibilidade, além do acesso às informações sobre doença e tratamento, reinserção social, reinserção ao trabalho e resgate da cidadania. Funciona em regime aberto, atendendo o usuário de sua área de abrangência em qualquer momento evolutivo da doença (em crise ou fora dela). Então, dependendo da necessidade, o usuário freqüenta o serviço ambulatorialmente ou em regime dia de atenção (mais ou menos intensivo). Os usuários em crise grave permanecem no serviço todos os dias, recebendo medicação assistida, consultas médicas, psicológicas individuais ou em grupo, atenção em grupos operativos (oficinas), atenção individual ou em grupo em terapia ocupacional, atenção nas áreas social e laborativa.18
Assim, a análise das tabelas 5, 6 e 7 demonstra que o município de Santo André transformou seu modelo de assistência em Saúde Mental nos últimos 20 anos, partindo de um estado inicial em que se ofertava exclusivamente a internação em hospital psiquiátrico privado (conveniado ao SUS) para uma rede de serviços públicos de base territorial comunitária.
O município de Santo André possui uma rede psicossocial de base territorial com modelo centrado na comunidade, focando a doença no aspecto psicossocial e com abordagem por equipe multiprofissional, sendo desta forma um substituto ao isolamento asilar.19
Em outubro/dezembro de 2003 a Rede de Atenção Psicossocial de Santo André contava com 14.800 usuários referenciados, destes 3.570 em tratamento nos NAPSs e 8.686 em ambulatórios de psiquiatria.20
Observa-se no entanto que outros investimentos são necessários para garantir ao munícipe um atendimento pleno e ao município a atenção à demanda na área de Saúde Mental. O Ministério da Saúde recomenda que cada CAPS III referencie uma população de 200 mil habitantes. O município de Santo André possui 649.331 habitantes (IBGE, 2000), portanto carece de mais um CAPS III adulto.
Usuários, familiares e trabalhadores da Saúde Mental sempre tiveram uma atuação política significativa na cidade, e já reivindicaram na última Conferência Municipal de Saúde a implantação de mais um CAPS III adulto, um CAPS adolescente e a ampliação de equipes de Saúde Mental em Unidades Básicas de Saúde.21
Estas ações no município de Santo André, SP somente foram possíveis graças à mobilização da Sociedade Civil, sempre contrária ao modelo hospitalocêntrico. Ademais, o Programa Nacional de Saúde Mental é uma realidade neste município, sendo uma experiência positiva no campo da saúde mental.
Esta pesquisa demonstrou que existe em Santo André uma rede comunitária de cuidados em saúde mental que abrange, além dos serviços de assistência em saúde mental, outras referências capazes de acolher o indivíduo com distúrbios mentais, sendo distribuídas em associações, projetos sociais de inserção à geração de renda, de educação, cultura e lazer. Esta rede é capaz de reinserir o indivíduo com transtornos mentais na sociedade, sendo uma opção ao modelo hospitalocêntrico vigente em nosso meio.
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Recebido em: 10/11/2007
Modificado em: 25/02/2008
Aprovado em: 18/03/2008