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Aletheia
versão impressa ISSN 1413-0394
Aletheia n.22 Canoas dez. 2005
ARTIGOS DE PESQUISA
Condutas anti-sociais e delitivas e relações familiares em duas áreas urbanas na cidade de Palmas-TO
Delictive and anti-social conduct and family relations in two urban areas of the city of Palmas (Brazil)
Nilton S. Formiga 1
RESUMO
Este trabalho investigou a relação entre as condutas anti-sociais e delitivas e os indicadores da relação familiar em duas áreas urbanas na cidade de Palmas-TO. Participaram do estudo 921 sujeitos de ambos os sexos e idades entre 10 e 21 anos. Os resultados revelaram que não houve diferença na relação entre as variáveis nas duas áreas urbanas. Desta forma, a dinâmica interna da família pode inibir condutas relacionadas à delinqüência entre os jovens, independentemente da condição sócio-econômica destes.
Palavras-chaves: Delinqüência, Relação familiar, Jovens.
ABSTRACT
This study investigated the relation between antisocial and criminal behaviors and the descriptors of family relationships in two urban areas in the city of Palmas-TO. The subjects were 921 citizens from both sexes and ages ranging from 10 to 21 years. The results showed no differences related to urban areas between the considered variables. Thus the internal dynamics of the family can inhibit delinquent behaviors of the youngsters independent of their social-economic condition.
Keywords: Delinquency, Familiar relation, Teenagers.
Introdução
Os estudos sobre a função e estrutura da família têm trazido reflexões sobre a sua influência nos comportamentos dos jovens. Tal fato se deve por ser ela o primeiro lugar socializador vivido por eles. Porém, independentemente do processo psicossocial que a família esteja passando, seja em relação a sua manutenção original ou a reconstituição familiar, ela ainda é um reflexo das normas e tradições culturais para o desenvolvimento das novas gerações.
As mudanças nas configurações familiares, segundo Wagner, Falcke e Meza (1997), vêm promover uma visão menos dogmática desta instituição e trazem expectativas quanto ao seu funcionamento a partir das novas organizações assumidas. Sugere-se que a relação familiar, mesmo com todas as suas fissuras, ainda pode ser enfatizada como elo tanto na construção da realidade social e desenvolvimento psicológico quanto um sistema intermediário entre a sociedade e os comportamentos individuais.
Dessa maneira, essas transformações, tanto no conjunto família quanto nos membros que a congregam, têm fomentado em estudiosos e leigos, questionamentos no que diz respeito às formas educativas adequadas para a formação de condutas socialmente desejáveis entre os jovens (Bolsoni-Silva & Marturano, 2002; Brenner & Fox, 1998; Costa, Teixeira & Gomes, 2000; Outeiral, 1994). Essa condição, a partir da interação no seio desta, permite refletir na produção tanto para os pais quanto os filhos de um bem-estar social, físico e mental (Papalia & Olds, 2000; Wagner, Ferreira & Rodrigues, 1998).
Pesquisas sobre as relações entre práticas parentais e variáveis sociais, psicológicas e educacionais (por exemplo, condutas desviantes, traços de personalidade, rendimento acadêmico e valores) encontraram relações importantes entre estas variáveis. Os estudos desenvolvidos por Formiga e cols. (2003a; Formiga & cols., 2003b; Formiga & cols., 2003c; Formiga & cols., 2003d) tem revelado que o estilo parental adequado é capaz de fomentar valores normativos de interação social no jovem, desenvolver traços de sociabilidade e conscienciosidade, bem como inibir as condutas anti-sociais e delitivas.
Gouveia, Coelho Junior, Gontiès, Andrade e Andrade (2003) encontraram que quanto maior for a identificação com os grupos primários (pais, mãe, irmãos, parentes) menor será o risco ao uso de drogas; da mesma maneira, os grupos secundários (especialmente os professores e amigos) também parecem capazes de inibir tais condutas de risco. Formiga e Fachini (2003) revelaram a relação entre apoio social (pais, irmãos, professores, etc.) e condutas desviantes em jovens. Os autores compararam jovens residentes em diferentes zonas urbanas, uma melhor estruturada no plano sócio-educacional, e a outra com dificuldades neste sentido. Em ambos os contextos, quanto maior a identificação dos jovens com pais, irmãos e professores, menor a probabilidade de apresentarem esse tipo de conduta. Estes resultados foram semelhantes aos de Formiga (2004) e Gouveia e cols. (2003).
Mesmo considerando as pesquisas citadas acima, poucos estudos brasileiros têm investigado quais os indicadores relevantes para a manutenção de uma boa convivência familiar, isto é, identificar fatores de proteção de comportamentos desviantes. Peçanha e Pérez-Ramos (1999) enfocaram esta questão numa perspectiva da funcionalidade atitudinal e comunicativa, importando-se apenas como diagnóstico psicológico.
Os problemas de conduta dos adolescentes têm sido objeto de interesse de pesquisadores e leigos. Os pais têm manifestado preocupação intensa com as companhias de seus filhos e a influência destas sobre seus comportamentos. Estas preocupações visam a estabilidade de regras familiares, preservação da saúde física, psíquica e social e os fatores de risco associados (Alsinet, Pérez & Agulló, 2000), especialmente, no que diz respeito aos eventos disciplinares, seja da quebra de regra social ou do cumprimento dela.
A compreensão dessas condutas requer considerar que os jovens e a sociedade sempre viveram conflitos associados a condutas desviantes. Nestes episódios, freqüentemente curtos e passageiros, que tem lugar o despertar de uma consciência social e moral, ainda pouco organizada. Considerar que um jovem apresenta condutas anti-sociais e delitivas é fazer referência ao seu comportamento transgressor como uma tendência generalizada desta fase evolutiva à quebra de normas.
Desta forma, uma conduta anti-social se refere a não conscientização das normas que devem ser respeitadas. Sabe-se da norma de limpeza das ruas ou do respeito com os colegas no que se refere a certas brincadeiras, porém estas condutas não são praticadas por alguns jovens. Neste sentido, uma das características das condutas anti-sociais é o fato de incomodarem, mas sem que causem necessariamente danos físicos a outras pessoas; elas dizem respeito apenas às travessuras dos jovens ou simplesmente à busca de romper com algumas leis sociais. Em relação às condutas delitivas, estas podem ser concebidas como merecedoras de punição, capazes de causar danos graves, morais e/ou físicos (Espinosa, 2000; Molina & Gómez, 1997). Portanto, tais condutas podem ser consideradas mais severas que as anteriores, representando uma ameaça eminente à ordem social vigente.
O que a conduta anti-social e delitiva têm em comum é que ambas interferem nos direitos e deveres das pessoas, ameaçando o seu bem-estar. Não obstante, também podem ser diferenciadas em função da gravidade das conseqüências oriundas. Possivelmente todo jovem pratica ou já praticou algum tipo de conduta anti-social. Provavelmente faz parte do repertório do jovem o desafio dos padrões tradicionais da sociedade, pondo em evidência as normas da geração dos seus pais. No caso da conduta delitiva, estas podem implicar algo mais que um desafio às normas vigentes, refletindo distúrbios psicológicos mais graves (Formiga, 2002; Gattaz 1998; Vermeiren, De Clippele & Deboutte, 2000). Porém, pouco se sabe sobre a relação entre estas condutas e variáveis extra e intra-familiares (Formiga & Fachini, 2003; Formiga & cols., 2003a).
Assim, o objetivo desse trabalho trata-se de avaliar a relação entre os indicadores da relação familiar e condutas anti-sociais e delitivas em jovens. Para tanto, foram consideradas duas áreas urbanas na cidade de Palmas-TO. Uma área caracteriza-se por bom atendimento sócio-educacional (por exemplo, saneamento, segurança policial, construções modernas de moradia, transporte público constante), ser próxima ao centro comercial e bancário da cidade. A outra área mostra dificuldades nestes mesmos aspectos (por exemplo, difícil acesso a transporte urbano, estrutura de moradia e ambiental precária). Tomando a família como uma categoria universal, independentemente da condição sócio-econômica dos sujeitos, e pressupondo que ela é um fator de proteção para as condutas transgressoras entre os jovens, o presente estudo examinou relações entre variáveis sócio-demográficas, indicadores das relações familiares e critérios de comportamento anti-social e delitivo. Desta maneira, espera-se que os indicadores da relação familiar – compreensão, disposição ao perdão, confiança, afeto e carinho, coesão e satisfação conjugal – se relacionem inversamente com as condutas anti-sociais e delitivas. Por outro lado, espera-se que os indicadores liberdade e condição econômica não apresentem correlação com as condutas anti-sociais e delitivas.
Método
Amostra
O presente estudo foi composto por uma amostra total de 921 sujeitos; desta a primeira (N1) com 417 jovens, com idades entre 11 a 21 anos (M = 13,5, DP = 0,50), de ambos os sexos, sendo 62% predominantemente do sexo feminino, e com uma renda econômica de R$ 384,00. Essa amostra – N1 – foi coletada na área residencial norte (ARNO), a qual apresentava um desenvolvimento sócio-demográfico precário; nesta área, a segurança policial era intensa, o sistema escolar tanto em sua estrutura física quanto humana, a organização e transporte urbano eram bem desestruturados. Constatou-se baixo êxito e freqüência escolar dos jovens, história de criminalidade e de condição sócio-humana com grande dificuldade, bem como, a arquitetura ambiental e construção das casas ainda não finalizadas.
Na segunda amostra (N2) 504 jovens, também, de ambos os sexos, predominando, ligeiramente, a participação das mulheres (52%), com idades entre 14 a 21 anos (M = 14,9, DP = 1,58), tendo uma renda econômica de, aproximadamente, R$ 635,00. A presente amostra foi coletada na área residencial sudeste (ARSE) a qual tinha, em comparação com a anterior, uma perspectiva sócio-econômica e humana bem melhor. Tanto sua estrutura urbana (residências, iluminação, etc.) quanto educacional (com escolas públicas e privadas) bem organizado e desenvolvido. Nesta área foi observado um cotidiano humano e social bem harmônico e com boas relações entre as pessoas. Apesar de se encontrar segurança policial na região, foram constatadas poucas histórias de violência grave (assassinato, formação de gangues, etc.). Ambas estão inseridas na região urbana da cidade.
Tanto a amostra N1 quanto a N2, foram distribuídos igualmente nos níveis escolares fundamental e médios, da rede privada e pública de educação de Palmas-TO. A amostragem foi intencional, a fim de garantir a validade interna dos resultados da pesquisa.
Instrumento
Os participantes responderam um questionário composto das seguintes medidas:
Escala de Condutas Anti-sociais e Delitiva – Este instrumento, proposto por Seisdedos (1988) e validado por Formiga (2002) para o contexto brasileiro, compreende uma medida comportamental em relação às Condutas Anti-Sociais e Delitivas. Tal medida é composta por quarenta elementos, distribuídos em dois fatores, como segue: o primeiro envolve as condutas anti-sociais, em que seus elementos não expressam delitos, mas comportamentos que desafiam a ordem social e infringem normas sociais (por exemplo, jogar lixo no chão mesmo quando há perto um cesto de lixo; tocar a campainha na casa de alguém e sair correndo). O segundo fator relaciona-se às condutas delitivas. Estas incorporam comportamentos delitivos que estão fora da lei, caracterizando uma infração ou uma conduta faltosa e prejudicial a alguém ou mesmo à sociedade como um todo (por exemplo, roubar objetos dos carros; conseguir dinheiro ameaçando pessoas mais fracas). Para cada elemento, os participantes deveriam indicar o quanto apresentava o comportamento assinalado no seu dia-a-dia. Para isso, utilizavam uma escala de resposta com dez pontos, tendo os seguintes extremos: 0 = Nunca e 9 = Sempre. A escala revelou qualidades psicométricas satisfatórias, a saber: para a Conduta Anti-social foi encontrado um alpha de Crombach de 0,86 e para a Conduta Delitiva ou Delinqüente, 0,92. Considerando a análise fatorial confirmatória, realizada com o Lisrel 8.0, comprovou-se essas dimensões previamente encontradas (c²/gl = 1,35; AGFI = 0,89; PHI (f) = 0,79, p > .05) na análise dos principais componentes (Formiga & Gouveia, 2003).
Indicadores da relação familiar – Este instrumento, construído e validado por Formiga, Fachini, Curado e Teixeira (2005), é composto de oito itens. Para cada indicador, os participantes deveriam informar o quanto ele era importante para a sua boa relação em família (relação com pais, irmãos, etc.). Para isso utilizou-se uma escala de resposta com seis pontos tendo os seguintes extremos: 0 = Nada e 5 = Totalmente. A análise fatorial confirmatória mostrou saturações dos itens estatisticamente diferentes de zero (t > 1,96, p < 0,05). A solução unifatorial, obtida através do estimador ML (Máxima Verossimilhança), revelou-se adequada: c² (739) = 3328,89; p < 0,001; c² / Graus de Liberdade = 1,78; GFI = 0,96, AGFI = 0,92; e RMR padronizado = 0,04. Considerando o conjunto do 08 itens para o único fator, foram calculados os índices de consistência interna, tendo sido obtido um alpha de Crombach de 0,82 (Formiga, Coelho, Prates, Albuquerque & Pahim, 2005).
Procedimentos
Procurou-se definir um mesmo procedimento padrão que consistia em aplicar os instrumentos coletivamente em sala de aula, em escolas de ambas as áreas urbanas da cidade de Palmas-TO. Desta forma, colaboradores com experiência metodológica e ética, ficaram responsáveis pela coleta dos dados. Após conseguir a autorização tanto da diretoria da escola quanto de professores responsáveis pela disciplina, os aplicadores se apresentavam em sala de aula como interessado em conhecer as opiniões e os comportamentos das pessoas no dia-a-dia, solicitando a colaboração voluntária dos estudantes no sentido de responderem um questionário breve. Para isso, foi-lhes dito que não havia respostas certas ou erradas, e que respondessem individualmente, bem como, quanto a sua não obrigação para respondê-los, e que mesmo ao pegar o instrumento e ao iniciar sua leitura e resposta, se quisesse devolvê-lo não teria nenhum problema. A todos era assegurado o anonimato das suas respostas, que seriam tratadas em seu conjunto, apesar de o questionário ser auto-aplicável, contando com as instruções necessárias para que possam ser respondidos, os colaboradores estiveram presentes durante toda a aplicação para retirar eventuais dúvidas ou realizar esclarecimentos que se fizessem indispensáveis. Um tempo médio de 40 minutos foi suficiente para concluir essa atividade. Foram realizadas análises de estatísticas descritivas e verificados os coeficientes de correlação r de Pearson.
Resultados e discussão
Partindo dos dados coletados, procurou-se atender o objetivo principal: comparar as relações entre condutas anti-sociais e delitivas e indicadores da relação familiar em diferentes contextos sócio-demográficos.
Sendo assim, a partir de uma correlação de Pearson (Tabela 1) foram obtidos os seguintes resultados em relação a amostra N1 (área residencial norte – ARNO): a maioria dos indicadores da relação familiar relacionou nversamente com as condutas anti-sociais, delitivas e os comportamentos desviantes (CAD). Assim, os indicadores da relação familiar – compreensão, disposição ao perdão, confiança, afeto e carinho, união entre toda a família e boa relação conjugal dos pais – correlacionaram negativamente com comportamentos de delinqüência, revelando que estes indicadores são capazes de contribuir para inibição desses comportamentos.
Em relação à amostra N2 (área residencial norte – ARSE), os resultados foram bem semelhantes para as condutas anti-sociais, delitivas e os comportamentos desviantes comparados aos da amostra N1. Os coeficientes da correlação de Pearson se apresentaram inversamente relacionados com os indicadores da relação familiar. Porém, é válido destacar a observação de um resultado novo para ambas as amostras: o indicador liberdade relacionou-se diretamente com as condutas anti-sociais, o que não ocorreu no estudo anterior realizado por Formiga, Coelho, Prates, Albuquerque e Pahim (2005), levando-nos a direcionar esse item a uma avaliação semântica em estudos posteriores. Mas todos os outros indicadores podem ser comparados ao estudo desses autores, considerando assim sua consistência correlacional entre as variáveis tratadas em ambas as amostras (N1 e N2) independentemente da condição sócio-demográfica.
A partir desses resultados, ao considerar a dinâmica interna da família, parece que as condutas permeadoras da quebra da norma social entre os jovens sejam capazes de inibi-las, a partir da manipulação desses indicadores. Para isso, é possível pensar na seguinte direção: considerando o estudo anterior de Formiga e cols. (2005), relacionando as mesmas variáveis, no estudo vigente, além de convergir para os resultados da primeira pesquisa destacados no princípio do parágrafo, observo-se uma consistência entre os resultados em ambos os trabalhos. Assim não somente pode ser enfatizada a influência entre as variáveis, bem como, a precisão das mesmas na busca de um fator de proteção para esses jovens.
Esses resultados confirmam a hipótese proposta, tornando assim consistente a perspectiva abordada pelo autor. Desta maneira, é possível destacar uma explicação dos comportamentos que antecedem a violência a partir da defasagem sócio-afetiva e dialógica na dinâmica familiar. Considerar uma ação de engajamento vem contribuir para uma formação e manutenção do comportamento socialmente desejável do cotidiano juvenil.
Enfatizar a demanda ante as exigências do grupo familiar entre os jovens quanto ao favorecimento das oportunidades para autodeterminação e participação na tomada de decisões, vem ajudar na compreensão e interiorização das regras sociais, principalmente as conseqüentes da interação grupal da família. O desenvolvimento social e individual do jovem poderá ser mais efetivo em relação às oportunidades de crescimento ocorridas no ambiente psicossocial desse grupo, os quais trazem garantias de suportes emocionais e interpessoais para a relação familiar (Bee, 1997), porém, se e somente se, considerar, com bases nesses resultados, sua configuração intrínseca (Osório, 1996).
Assim, a instituição família cumpre o papel de função integrativa, embasando com isso a solidariedade social; ela contribui para uma ajuda mútua e suporte material e emocional capaz de nutrir e criar as gerações futuras (Domingues, 2002). A importância que se tem ao estudar a relação familiar, seja na sua dinâmica interna ou psicossocial, é destacá-la enquanto espaço de produção da identidade social (Arpini & Quintana, 2003; Outeiral, 1994), saúde psíquica (Oliveira, Marin, Ravanello & Rossato, 2002), bem como amenizar as dificuldades sócio-afetivas que venham ocorrer internamente nela, já que a mesma é composta de uma interdependência entre os membros que a compõem, capaz de promover o estresse familiar e conjugal ou inibi-lo a partir da administração da interação do grupo (Brigas & Paquette, 2000).
Diante dessa perspectiva, o processo da socialização e seus agentes (por exemplo, pais, amigos, professores, etc.) (Jacinto & Ortiz,1997; Mussen, Conger, Kagan & Huston 1995) não se preocupam apenas com o ser socializado, mas também com a formação e internalização dos valores, crenças e atitudes familiares e sociais (Molpeceres, Llinares & Musitu, 2001). Desta maneira, segundo Domingues (2002), a família, mesmo com a sua fragmentação na sociedade atual, ainda tem um poder nuclear organizador no acompanhamento das condutas dos jovens. Segundo Kreppner (2000), apesar da diversidade das habilidades sociais e individuais que as famílias venham apresentar neste processo de mudança, o exame de indicadores da relação familiar vem contribuir na compreensão de sistemas comunicativos necessários ao desenvolvimento e bem-estar de todos.
Neste estudo, observou-se que uma dinâmica familiar que vise uma relação mais expressiva do que instrumental tem maior probabilidade de inibir as condutas desviantes (anti-social e delitivas).
Neste contexto, parece evidente que os comportamentos de delinqüência apontam para uma debilidade das convenções internalizadas no contexto familiar, revelando o confronto entre prioridades de pais e filhos na manutenção de uma ordem intrafamiliar, consecutivamente, ordem social. Os jovens que se sentem engajados na sua família não somente teriam apoio emocional, mas também social, sendo assim, capazes de internalizar valores e comportamentos socialmente desejáveis.
Por fim, explicar os comportamentos desviantes a partir de indicadores da dinâmica familiar permite refletir os seguintes elementos na compreensão do fenômeno da delinqüência: (a) a importância da família para a formação de estratégias comportamentais dos jovens, (b) a interação social na família tem conseqüências na capacidade do jovem para atender normas sociais, e (c) reconhecer limites e possibilidades de negociação frente às demandas da convivência social.
Algumas limitações deste estudo podem ser destacadas visando pesquisas posteriores. Sugere-se a sua replicação em outros estados, considerando fatores sócio-demográficos e culturais, principalmente subculturais (por exemplo, comparar áreas urbanas e rurais). Outro ponto merecedor de destaque é quanto ao exame comparativo das relações estudas em famílias com história de agressão e delinqüência e outras sem registro destes comportamentos.
Outras informações sociais e demográficas também podem ser contempladas. Por exemplo, o gerenciamento do capital sócio-cultural familiar e sua influência nos comportamentos juvenis (Omar, Uribe & Formiga, 2003). Esta seria uma análise mais completa, considerando fatores micro, meso e macrosistêmicos (Bronfenbrenner, 1994).
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Endereço para correspondência
E-mail: nsformiga@yahoo.com
Recebido em junho de 2004
Aceito em maio de 2005
Autor: 1 Nilton Formiga – Mestre em Psicologia Social (Universidade Federal da Paraíba).