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Aletheia
versão impressa ISSN 1413-0394
Aletheia no.46 Canoas abr. 2015
ARTIGOS EMPÍRICOS
Vivências e estratégias de enfrentamento em acompanhantes de familiar hospitalizado em uma unidade hospitalar do município de Cacoal-RO
Experiences and strategies for coping in family companions of hospitalized in a hospital unit of Cacoal-RO
Aline Letícia da Vitória; Cleber Lizardo de AssisI
I Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal, FACIMED, RO
RESUMO
Objetivo: analisar as vivências e estratégias de enfrentamento (coping) utilizadas pelos acompanhantes durante o processo de hospitalização de um familiar em uma Unidade Hospitalar do Município de Cacoal-RO. Método: pesquisa qualitativa e exploratória, com 05 (cinco) acompanhantes de familiar internado, de ambos os sexos, com dados coletados em uma entrevista semiestruturada e tratada pela Análise de Conteúdo de L. Bardin. Resultados: os sujeitos classificaram as suas vivências como sendo, uma "carreira difícil" e "muito cansativo, desconfortável, difícil e obrigatório, embora necessária; As estratégias de enfrentamento mais adotadas foram a "Reavaliação Positiva" com destaque para o Coping Religioso, além da "Aceitação de Responsabilidade", a "Resolução de Problemas" e o "Suporte Social"; As estratégias menos utilizadas foram "Confronto", o "Afastamento", o "Autocontrole" e a "Fuga-Esquiva". Conclui-se que os acompanhantes vivenciam a experiência como sendo uma "carreira difícil", cansativa, desconfortável, difícil e obrigatório, embora necessária; e apresentaram como principal estratégia de enfrentamento a Reavaliação Positiva, em que apontaram a utilização da religião (coping religioso), seguida da estratégia Aceitação de Responsabilidade, Resolução de Problemas e Suporte Social.
Palavras-chave: Psicologia da saúde, Psicologia hospitalar, Hospitalização, Acompanhante, Estratégias de enfrentamento (coping).
ABSTRACT
Objective: To analyze the experiences and coping strategies (coping) used by companions during the hospitalization process of a family in a Hospital Unit in the Municipality of Cacoal-RO. Method: qualitative exploratory study with 05 (five) family escort hospitalized, from both sexes, with data collected on a semi-structured interview and treated by L. Bardin Content Analysis. Results: subjects rated their experiences as being a "difficult career" and "very tiring, uncomfortable, difficult and required, although necessary; Coping strategies adopted were the most "positive reappraisal" highlighting the Religious Coping, beyond the "Acceptance of Responsibility", the "Troubleshooting" and the "Social Support"; The strategies used were less "Confrontation", the retirement means the self control and "Escape-Dodge". We conclude that the accompanying experience as a "difficult career," tiring, uncomfortable, difficult and obligatory but necessary; and presented as the main positive reappraisal coping strategy, which pointed to the use of religion (religious coping), followed by Responsibility Acceptance strategy, Problem Solving and Social Support.
Keywords: Health psychology, Hospitalar psychology, Hospitalization, Accompanying, Coping strategies (coping).
Introdução
Diante do processo de hospitalização, o acompanhante passa por situações complicadas, como não poder se ausentar por muito tempo, pois é importante que o mesmo fique junto do paciente, sendo que este acompanhante encontra dificuldades por ter que largar a casa, o trabalho e a família para cuidar do outro. Dessa forma tem que apoiar-se em algumas estratégias para enfrentar esse momento como, por exemplo, ocupar-se fazendo alguma atividade que seja do seu interesse, como ler, fazer crochês, etc.
Muitas vezes esses acompanhantes acabam passando ao paciente a dificuldade por estar ali, fazendo este sentir-se como um fardo, ao mesmo tempo que este sujeito adoecido necessita desses acompanhantes para passar por esse processo. Dessa forma, tanto os acompanhantes como os pacientes permanecem fragilizados, tendo que apoiar-se em estratégias para enfrentar esse momento. Sendo assim, a pesquisa a seguir buscou identificar quais as estratégias elaboradas por esses acompanhantes para conseguir vencer esse processo de acompanhamento do paciente na hospitalização.
O interesse por esse tema surgiu durante os estágios institucionais na área de Psicologia Hospitalar, onde realizávamos Oficinas Terapêuticas com os acompanhantes, com o objetivo de oferecer suporte psicossocial a esses acompanhantes durante a permanência no ambiente hospitalar, onde tiveram a oportunidade de falar sobre as dificuldades de estar no hospital e o que eles faziam para amenizar a estadia nesse ambiente. Neste sentido, a presente pesquisa teve como objetivo analisar as vivências e estratégias de enfrentamento (coping) utilizadas pelos acompanhantes durante o processo de hospitalização de um familiar em uma Unidade Hospitalar do Município de Cacoal-RO.
Psicologia Hospitalar
De acordo com Castro e Bornholdt (2004, p.51), a Psicologia Hospitalar é o conjunto de contribuições científicas, educativas e profissionais que as diferentes disciplinas psicológicas fornecem para dar melhor assistência aos pacientes no hospital. Já segundo Miranda (2013, p.2), pode-se conceituar Psicologia Hospitalar como o ramo da Psicologia destinado ao atendimento de pacientes portadores de alguma alteração orgânico-física que seja responsável pelo desequilíbrio em uma das instâncias biopsicossocial, bem como uma Psicologia dirigida a pacientes internados em hospitais gerais sem deixar de se estender aos ambulatórios e consultórios, com sua atenção voltada para as questões emergenciais advindas da doença e/ou hospitalização, do processo do adoecer e do sofrimento causado por esta, visando o minimizar da dor emocional tanto do paciente quanto o de sua família.
Pode-se entender então, que na Psicologia Hospitalar o psicólogo atua segundo o modelo biopsicossocial, ou seja, observando o indivíduo em todos os sistemas que interage, seja, o familiar ou o social, o biológico e o psicológico, buscando sempre amenizar os problemas causados diante do adoecer e do processo de hospitalização.
Conforme Speroni (2006, p.90), diferente das concepções habituais, cristalizadas pelo modelo biomédico, a psicologia foi progressivamente entrando no contexto hospitalar, assinalando a necessidade de expansão do saber biopsicossocial na compreensão do fenômeno da doença. Já segundo Mosimann e Lustosa (2011, p.217), a Psicologia Hospitalar, por mérito próprio, ganhou reconhecimento da comunidade científica, além de inquestionável notoriedade junto a outras profissões, assim como contribuiu e contribui para a humanização da prática dos profissionais da saúde dentro do contexto hospitalar, sendo esta uma das determinantes da mudança da postura médica diante das patologias, de modo que aspectos emocionais passaram a ser considerados no quadro geral do paciente. Diante dos atendimentos realizados na prática, é possível fazer-se um atendimento mais humanizado, em que o que está em questão não é somente a doença do paciente, mais também os aspectos emocionais e os sentimentos vivenciados tanto pelos próprios pacientes como também pelo familiar acompanhante que o está ajudando a passar por esse processo.
A Psicologia Hospitalar é um determinante de novos modelos teóricos de atendimento, é o questionamento da prática, em uma atuação determinada pela própria realidade da conceituação de saúde, capaz de transformar tanto a realidade institucional quanto a realidade interior daquele que dela se aproxima e se apropria. Consiste ainda no renovar da esperança de que a dor seja entendida de uma forma mais humana, e de que os profissionais da saúde, sobretudo os médicos, possam aprender a escutar a angústia, o sofrimento, a ansiedade e o medo presentes em cada manifestação física de dor e sofrimento, sem temores, e com condições de lidarem com este lado do humano. A Psicologia Hospitalar é o renovar do coração que vibra em ânsia antes e após cada cirurgia; é o renovar da família que sofre junto do paciente, sua dor, medo e angústia; é o esclarecimento dos sentimentos do profissional de saúde que se envolve com a dor do paciente e que, igualmente, sofre em níveis organísmicos a dor desse envolvimento. (Mosimann & Lustosa, 2011, p.218)
A Psicologia Hospitalar preocupa-se em cuidar do paciente e dos outros fatores que influenciam nesse processo de hospitalização, tendo como técnica principal a escuta das angústias, do medo, do sofrimento que o paciente vivencia ao se deparar no hospital. Trata-se de uma forma de diminuir a pressão e aliviar a condição que a hospitalização causa no paciente e nos seus familiares.
Por fim, o interesse da Psicologia Hospitalar está em colaborar para que o paciente e o familiar acompanhante saibam como reagir diante do processo de hospitalização, por meio de orientações que visam amenizar o sofrimento causado pela doença, buscando sempre fazer um trabalho humanizado, tendo o interesse nos aspectos emocionais e trabalhando-se para que ambos lidem com menos angústia enquanto tiverem que permanecer no âmbito hospitalar.
A hospitalização
No processo de hospitalização, cada categoria de pessoas, sendo eles o paciente, o familiar e a equipe médica, todos têm um interesse diferenciado quanto a esse processo, mas que ao final todos possuem um mesmo objetivo, a recuperação do paciente internado. Como citado por Simonetti (2004), o paciente quer se livrar do sintoma, a família quer saber o prognóstico e o médico quer fazer o diagnóstico. É nesse desencontro de objetivos no qual precisa ser manejado que a Psicologia Hospitalar atua. A família presente no processo de hospitalização sente-se insegura, desabando, ansiando por um apoio efetivo, por uma compreensão profunda de sua situação, de um ambiente que lhe possa devolver o equilíbrio, a segurança, a força, enfim, a estabilidade (Lustosa, 2007).
Isso ocorre devido aos preceitos que a hospitalização traz para as pessoas, pois quando se fala em hospital, logo se pensa em doença, e por não ter uma compreensão do que realmente está acontecendo, o familiar permanece apreensivo, tendo dificuldade para lidar com esse processo, por isso a importância de informar o que se passa com o familiar internado, o que de fato está acontecendo, para que, assim o familiar acompanhante ajude na recuperação do familiar. É nesse momento que a presença do Psicólogo Hospitalar se torna fundamental e pode funcionar como o diferencial deste momento existencial familiar. Junto com a equipe multidisciplinar, a figura do psicólogo tem o intuito de escutar e acolher o sofrimento do indivíduo frente às suas principais dificuldades. Esse profissional deve prestar assistência ao paciente, bem como aos seus familiares e a equipe de serviço hospitalar, sendo que este deve levar em consideração um leque amplo de atuações, tendo em vista a pluralidade das demandas (Miranda, 2013).
No ambiente hospitalar, são vários os motivos das internações. Cabe ao psicólogo escutar tanto os pacientes como o familiar sobre como é estar nesse ambiente, acolhendo as angustias de ambos e assim os auxiliando nesse processo de internação. Segundo Miranda (2013), o psicólogo, no âmbito hospitalar, desenvolve as seguintes atividades: atendimentos psicoterapêuticos, psicoterapia de grupo, profilaxia e psicoeducação, atendimentos em ambulatórios, enfermarias e UTI, psicodiagnóstico, consultoria, interconsulta e realizando uma atuação multidisciplinar.
Sabendo-se da angústia sofrida pelo familiar acompanhante, o acompanhamento psicológico junto à família do paciente é muito importante, pois o mesmo vivencia um momento de crise acometido pelo sentimento de impotência frente à moléstia de seu ente querido, e também seu temor pelo falecimento; pela dificuldade em compreender o que se passa com o paciente; pela distância imposta pelo ambiente hospitalar (o que impossibilita o familiar de cuidar, ele mesmo do paciente); a dor da impotência diante o sofrimento do outro (Vieira, 2010). Já Lustosa (2007) apresenta que a tarefa fundamental do psicólogo hospitalar é a detecção de focos de ansiedade e de dúvidas entre o grupo familiar, levando à sua extinção ou diminuição. Além destas tarefas, deve-se também caber a aproximação do grupo familiar à equipe de saúde, facilitando a comunicação entre eles para que contribuam para o tratamento do membro necessitado.
Ou seja, o psicólogo, ao se deparar com as dificuldades e necessidades do familiar acompanhante, vai atuar como um intermediador, facilitando a aproximação entre as esferas existentes dentro do hospital (paciente, familiar e equipe médica), para que com isso surja uma colaboração entre as partes, tendo como principal objetivo contribuir para o tratamento do indivíduo necessitado. Neste sentido, Henriques e Cabana (2013) apontam que a crise desencadeada pela hospitalização e os sentimentos que essa crise pode gerar no sujeito precisa receber a atenção de toda a equipe de saúde, e sobre tudo do psicólogo que também deverá estender a assistência psicológica ao familiar que acompanha o processo de adoecer e de hospitalização do seu paciente.
Diante do exposto, pode-se perceber a importância da Psicologia Hospitalar na ajuda tanto para o paciente como para o familiar e a equipe médica multidisciplinar e não apenas médica. O psicólogo hospitalar acompanha esses indivíduos no processo de hospitalização facilitando e proporcionando a eles uma compreensão sobre o significado de estar, neste contexto intermediando as relações existentes neste mesmo ambiente e colaborando para a recuperação do paciente.
O cuidador e a hospitalização
Se a hospitalização geralmente não é tida como agradável tanto para o paciente quanto para o familiar, é comum que o paciente sinta-se impotente diante da situação, devido a ter que abandonar sua rotina, deixando para trás o papel de ser um indivíduo ativo para ser um paciente, tornando-se um sujeito dependente e que irá necessitar de cuidados. Desta forma, o familiar também encontra essas dificuldades, pois é necessário que ele abandone seu lar, seu trabalho e a família para poder cuidar do familiar internado. É provável que durante esse processo de hospitalização o paciente e o familiar acompanhante vivam momentos de crise que podem ser desencadeados pelos diversos fatores gerados pela internação, como sentir-se impotente sem ter o que fazer e ficar apenas à mercê do espaço limitado do hospital.
Segundo Henriques e Cabana (2013), o processo de hospitalização causa uma grande mudança no cotidiano tanto para o paciente como para o familiar que o acompanha, alterando o seu estado físico e psíquico, pois, ao encontrar-se hospitalizado, é frequente surgir sentimentos como medo e ansiedade, além da angústia e tristeza associadas ao estar doente. Destaca-se ainda, que esses sentimentos podem ser potencializados na hospitalização pela longa espera na definição do seu diagnóstico e por se verem submetidos a vários procedimentos invasivos.
A presença do acompanhante traz segurança ao paciente, que muitas vezes se sente sozinho e necessita do apoio de alguém que se encontre bem e possa ajudá-lo a superar o momento da hospitalização. Pensando nisso, a família mostra-se disposta a estar com o doente, seja qual for a situação. Segundo Silva e Bocchi (2005), a família quer permanecer junto ao doente no hospital pelos seguintes motivos: insegurança, interesse no paciente, sentimento de corresponsabilidade pela recuperação do paciente, oportunidade de aprender, obrigação, respeito e simplesmente para estar junto. Muitas vezes, percebe-se que existe um aproveitamento reduzido do familiar acompanhante, que acaba permanecendo restrito à prestação de cuidados tidos como simples pela equipe de enfermagem, como higiene e alimentação. É importante que se leve em conta que, além de envolver o cuidado ao paciente, a humanização estende-se a todos aqueles que estão envolvidos no processo saúde-doença, ou seja, envolve, além do doente, sua família (Silva & Bocchi, 2005).
Pode-se perceber que a presença do familiar acompanhante traz uma segurança para o paciente, pois este necessita de alguém em que ele possa confiar e que também possa ajudá-lo a passar por esse processo, de modo que o familiar acompanhante serve como apoio e fortalecimento para o paciente que se encontra necessitado.
Entende-se que isso ocorre porque é a família quem, geralmente, arca com a responsabilidade de cuidar da saúde de seus entes, independentemente da faixa etária deles. Quando se pensa em acolhimento no ambiente hospitalar, é importante refletir que o sujeito hospitalizado precisa de cuidados mais complexos, pois, além da doença, o mesmo se encontra mais vulnerável pela exposição a um ambiente tão hostil quanto o hospital (Henriques & Cabana, 2013).
Percebe-se então que quando esse acolhimento é dado por um familiar, por um acompanhante/cuidador que estabeleça com o paciente um bom vínculo afetivo, isso fará com que ele se sinta numa melhor condição emocional para poder passar pelo processo de adoecimento, que na maioria das vezes é doloroso. Isso acontece devido ao fato de o acompanhante proporcionar ao paciente uma melhor aproximação do seu cotidiano familiar e social, já que, através da hospitalização, o paciente se afasta de suas rotinas, dos seus amigos e familiares (Henriques & Cabana, 2013). A presença do acompanhante é de extrema importância para a recuperação do paciente, e os que não têm acompanhantes apresentam humor hostil, triste e pouco colaborativo com os procedimentos necessários. Refletindo sobre esse papel do acompanhante no hospital, pode-se perceber que o paciente quando se encontra na presença de uma pessoa do seu convívio se sente mais acolhida acarretando em uma melhora no seu humor e na crise que a hospitalização gera. (Szareski, Beuter & Brondani, 2010),
Segundo Lustosa (2007), a doença que leva a uma internação conta com aspectos como o medo, ansiedade, afastamento do ambiente social e mais o da internação, sobrepondo ainda elementos característicos do ambiente hospitalar. Quando a internação acontece, ocorre ao mesmo tempo uma desestruturação do desenho familiar costumeiro, além da desorganização do todo conhecido, instigados pela angústia de morte que costuma aparecer nesses momentos. Ao se ver internado, o paciente é acometido por uma série de sentimentos, sente-se angustiado por ter que se afastar de casa e abandonar a sua rotina, da mesma forma é o acompanhante que se vê na necessidade de estar com esse paciente, acompanhando-o e auxiliando-o enquanto estiver no ambiente hospitalar. Pode-se perceber então que, assim como o paciente, a família também se depara com dificuldades no enfrentamento da situação de adoecimento de um de seus membros. Lustosa (2007) afirma que a situação da família se constitui de estresse permanente, sofrimento interno, elevação de ansiedade, medos do desconhecido e apreensão quanto às decisões a tomar e situações a enfrentar.
Por meio das explanações, é evidente a importância que a presença do acompanhante tem para o familiar que se encontra internado, seja para auxiliar o familiar ou mesmo para servir de apoio nesse momento da hospitalização. Muitas vezes o acompanhante desenvolve uma série de sentimentos ao se deparar com a necessidade de ter que acompanhar esse familiar que está internado e para facilitar esse processo, o acompanhante utiliza-se de estratégias de enfrentamento que possam amenizar o período que deve permanecer no ambiente hospitalar, colaborando para o tratamento do familiar. Tais estratégias serão mais bem compreendidas no seguimento desse trabalho.
Estratégias de enfrentamento (coping) e o cuidador no hospital
Ao se deparar com o adoecimento, o indivíduo passa por situações que não são comuns as atividades diárias antes do adoecer. Uma dessas situações é a hospitalização, ao inserir-se no ambiente hospitalar, o indivíduo, seja o paciente ou o familiar acompanhante, vivencia momentos que não estão relacionados apenas à doença em si, mas também outros fatores ligados a esse processo. Um exemplo é o afastamento de casa, tendo que abandonar a família e emprego para poder permanecer no hospital auxiliando o familiar que necessita de ajuda.
Para lidar com o processo de hospitalização, tanto o paciente quanto o familiar acompanhante utilizam-se de estratégias de enfrentamento (coping) que favoreçam essa permanência no ambiente hospitalar, para que por meio dessas estratégias consiga vivenciar com menos angústia nesse processo.
Atualmente o coping tem sido definido como uma maneira que os indivíduos utilizam para lidar com mais facilidade com as situações estressantes no dia a dia. O coping é conceituado como: "[...] o conjunto de estratégias utilizadas pelas pessoas para adaptarem-se a circunstâncias adversas" (Antoniazzi, Dell'Aglio, & Bandeira, 1998, p.274 e 276). O coping centrado no problema refere-se aos esforços de administrar ou alterar os problemas, ou então melhorar o relacionamento entre as pessoas e o seu meio. São estratégias consideradas adaptativas mais voltadas para a realidade, na tentativa de remover ou abrandar a fonte estressora. Podem estar dirigidas ao ambiente na definição do problema, levantamento e avaliação de soluções, escolha de alternativas e ação (Lorencetti & Simonetti, 2005).
O coping centrado na emoção descreve a tentativa de substituir ou regular o impacto emocional do estresse no indivíduo, derivando principalmente de processos defensivos, o que faz com que as pessoas evitem confrontar conscientemente a realidade de ameaça (Lorencetti & Simonetti, 2005). Nessa descrição de coping, o objetivo é alterar o estado emocional do indivíduo. São exemplos: fumar um cigarro, tomar algum tranquilizante, sair para correr, essas estratégias tem como função reduzir a sensação física desagradável de um estado de estresse.
O modelo transacional de enfrentamento desenvolvido por Folkman & Lazarus (1980) é o modelo mais compreensivo dos modelos existentes e envolve quatro conceitos principais: 1) coping é um processo ou uma interação que se dá entre o indivíduo e o ambiente; 2) sua função é de administração da situação estressora, em vez de controle ou domínio da mesma; 3) os processos de coping pressupõem a noção de avaliação, ou seja, como o fenômeno é percebido, interpretado e cognitivamente representado na mente do indivíduo e; 4) o processo de coping constitui-se em uma mobilização de esforço, através da qual os indivíduos irão empreender esforços cognitivos e comportamentais para administrar (reduzir, minimizar ou tolerar) as demandas internas ou externas que surgem da sua interação com o ambiente. (Antoniazzi, Dell'Aglio, & Bandeira, 1998, p.276).
Os 8 (oito) fatores que compõem o inventário de estratégias de enfrentamento são definidos por Damião et al., (2009) como sendo: Fator 1 – Confronto: essa estratégia corresponde às estratégias ofensivas para o enfrentamento da situação, aqui as pessoas apresentam uma atitude ativa em relação ao estressor. Nem sempre as estratégias envolvidas no confronto levam a resultados positivos, como por exemplo fazer coisas que não são orientadas pela equipe médica para tentar solucionar alguns problemas; Fator 2 – Afastamento: são estratégias defensivas, em que o indivíduo evita confrontar-se com a ameaça, não modificando a situação; Fator 3 – Autocontrole: São os esforços da pessoa em buscar o controle das emoções frente ao estímulos estressantes; Fator 4 – Suporte Social: essa estratégia está relacionada ao apoio encontrado nas pessoas e no ambiente. Apresentam três aspectos diferentes, o primeiro refere-se à procura de apoio social para encontrar soluções, depois o apoio em amigos e familiares e por fim o apoio dos profissionais; Fator 5 – Aceitação de Responsabilidade: Aqui o sujeito aceita a realidade e engaja-se no processo de lidar com a situação estressante; Fator 6 – Fuga-esquiva: essa estratégia consiste em fantasiar sobre possíveis soluções para o problema sem, no entanto, tomar atitudes para de fato modificá-las. São os esforços para escapar e/ou evitar o fator estressante; Fator 7 – Resolução de Problemas: essa estratégia pressupõe o planejamento adequado para lidar com os estressores. Ao invés de anular ou afastar a situação estressante de seu cotidiano, o adolescente opta por resolver seu problema, modificar suas atitudes, sendo capaz de lidar com as pressões das pessoas e do ambiente ao seu redor, diminuindo ou eliminando a fonte geradora de estresse; Fator 8 – Reavaliação Positiva: essa estratégia é dirigida para o controle das emoções que estão relacionadas à tristeza como forma de reinterpretação, crescimento e mudança pessoal a partir da situação conflitante.
Em relação à família e estratégia de enfrentamento, segundo Lustosa (2007), diante do processo de adoecimento e internação de um membro também se depara com dificuldades no enfrentamento da situação, assim como o paciente. Ainda segundo a autora, o momento vivenciado por essa filiação constitui-se de estresse permanente, sofrimento interno, elevação de ansiedade, medo do desconhecido e apreensão quanto às decisões a tomar e situações a enfrentar.
No contexto do adoecer de um membro familiar, o sistema passa a utilizar tanto estratégias de coping com foco no problema quanto estratégias com foco na emoção, que podem, inclusive, ocorrer de forma simultânea. O tipo de estratégia a ser utilizado dependerá de como a família estrutura-se diante do diagnóstico da doença, o tipo da enfermidade e dos percursos que irá confrontar perante a hospitalização de seu familiar (Santos, 2013). No ambiente hospitalar os acompanhantes dos pacientes utilizam estratégias que lhes dão força para permanecerem neste ambiente e conseguirem assim, apoiar o paciente para que o mesmo possa dar continuidade no tratamento necessário para a sua recuperação.
É importante que se faça essa identificação, pois conforme os autores Lazarus e Folkman (1984), citado por Morais & Enumo (2008, p.222), alertando sobre a necessidade de se conhecer o que a pessoa, de fato, está enfrentando, uma vez que, quanto mais definido estiver o contexto da situação a ser enfrentada, mais fácil será articular o ato ou pensamento particular de enfrentamento com a demanda da situação. Neste caso, é importante conhecer o que o ambiente hospitalar desencadeia aos sujeitos envolvidos, sejam os pacientes e os acompanhantes, diversas reações diante do enfrentamento do processo de hospitalização.
Urizzi e Corrêa (2007) apresentam as vivências de familiares internados em uma Unidade Intensiva, com a intenção de contribuir para a humanização do cuidado nesse contexto, apontando o sofrimento que vivenciam ao ter um parente internado em UTI. São utilizadas palavras como: difícil, triste, sofrido e terrível para expressar os sentimentos; verificou-se ainda que há rompimento com o cotidiano familiar, o medo da morte do familiar, queixa em relação ao cuidado prestado pela equipe e a crença de que estar presente será valioso ao paciente e que auxiliará na sua recuperação. Já Santos (2013) apresenta que, ao deparar-se com o adoecimento e a hospitalização de um de seus membros, os familiares procuram formas de enfrentar esta situação. Esse processo incita uma série de mudanças na família, decorrente do adoecimento, onde necessita adaptar-se dentro da rotina hospitalar. Sabendo disso, Carvalho e Lustosa (2008) dizem que o adoecer e a consequente necessidade de cuidados são fatores potenciais de estresse para o sujeito e para a família. Finalmente, Santos (2013) discute a importância da utilização das estratégias de coping por familiares que possuem um de seus membros enfermo e/ou hospitalizado, pois ficou claro que estes se valem do enfrentamento como forma de manter processos autorregulatórios da dinâmica familiar.
Como pode ser observado, existem alguns tipos de estratégias que podem ser utilizadas para amenizar situações que possam ser estressantes para o indivíduo. Dessa forma, algumas dessas estratégias podem ser utilizadas pelos acompanhantes que possuem alguns familiares hospitalizados, de modo que a utilização dessas estratégias tornam o processo de hospitalização menos dificultoso de ser encarado também para o paciente, ou seja, o acompanhante procura meios que facilitem esse processo de hospitalização, por se encontrarem na responsabilidade de ajudar o familiar adoecido.
Método
No que se refere à abordagem, é uma pesquisa qualitativa, pois os dados coletados serão analisados considerando a relação dinâmica entre o mundo objetivo e a subjetividade dos sujeitos, interpretando seus fenômenos e a eles dando significados; Em se tratando de pesquisa qualitativa, também não se exige um grande quantitativo de sujeitos ou generalização dos resultados da pesquisa. Em relação aos seus objetivos trata-se de uma pesquisa exploratória, pois visa proporcionar maior familiaridade com o problema, tornando-o mais explícito para a construção de hipóteses, envolvendo para tanto o levantamento bibliográfico e entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema pesquisado. Já no que diz respeito aos procedimentos técnicos do trabalho, a pesquisa se enquadra, segundo o autor, em estudo de campo, pois utilizou de interrogação direta dos sujeitos envolvidos com o objetivo de ampliar o conhecimento acerca do tema tratado (Gil, 2002).
A coleta de dados foi realizada com 05 (cinco) acompanhantes adultos, de ambos os sexos, de pacientes internados numa Unidade Hospitalar do município de Cacoal-RO. A seleção dos sujeitos ocorreu de forma aleatória simples e ocorreu diante da identificação de acompanhantes que estavam cuidando de um ente familiar entre 01 (um) a 03 (três) dias.
A coleta de dados foi realizada tomando por base os relatos desses acompanhantes, durante o momento em que exercem essa função no hospital. Foi preparada uma sala onde o entrevistador pudesse ficar a sós com o acompanhante. Um lugar reservado, para que não houvesse interrupções.
Os acompanhantes escolhidos para a realização dessa pesquisa foram abordados nos leitos e convidados a participar dessa pesquisa e com o acordo do mesmo foram direcionados para um ambiente mais calmo do hospital, onde não houvesse interferências. Após o convite, foi utilizado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias, para serem assinados pelos sujeitos de pesquisa, sendo uma via do participante da pesquisa e outra dos pesquisadores.
A entrevista foi gravada em áudio e posteriormente transcrita para o formato word. Os dados coletados foram analisados qualitativamente através da Análise de Conteúdo de L. Bardin (1977). A Análise de Conteúdo é um instrumento de análise interpretativa utilizado para compreensão crítica do conteúdo das falas, reduzindo as informações obtidas a algumas características particulares e articulando com as categorias de enfrentamento propostas por Lazarus e Folkman (1984). A Análise de Conteúdo é constituída por três fases distintas: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados obtidos (inferência e interpretação).
As categorias e subcategorias relativas aos fenômenos encontrados foram analisadas de acordo com o Inventário de Estratégias de Enfrentamento de Folkman e Lazarus (1984), adaptado por Sávoia, Santana e Mejias (1996, p.183-201) dividido em 08 (oito) fatores, sendo eles: 1) confronto; 2) afastamento; 3) autocontrole; 4) suporte social; 5) aceitação de responsabilidade; 6) fuga-esquiva; 7) resolução de problemas; 8) reavaliação positiva.
A pesquisa teve ainda seu instrumento baseado em Damião et al., (2009), que tiveram como método uma pesquisa qualitativa, com entrevistas semiestruturadas com objetivo de identificar as estratégias de enfrentamento utilizadas por adolescentes na experiência de ter diabetes melitos tipo 1. Nesse sentido, foi aplicada a entrevista semiestruturada, tendo como questões norteadoras: Perguntas preliminares: 1- Qual a sua relação de parentesco com a pessoa internada? 2- Há quanto tempo está cuidando do familiar internado? Categoria enfrentamento: 3- O que você pensa em relação ao momento de hospitalização de seu familiar? 4- O que você sente em relação ao momento de hospitalização de seu familiar? 5- O que você faz para enfrentar o momento de hospitalização de seu familiar? Há algo mais que você gostaria de falar?
Resultados e discussão
Foram entrevistados um total de 05 (cinco) sujeitos, sendo de ambos os sexos, com idade entre 41 e 60 anos, todos os acompanhantes entrevistados possuem um grau de parentesco com o paciente internado, a maioria residindo no município de Cacoal-RO, conforme a tabela abaixo:
Os dados foram coletados no Hospital e Pronto-Socorro Unidade Mista de Cacoal/RO, do dia 21 de outubro de 2014 até o dia 5 de novembro de 2014, da seguinte maneira: foram apresentados aos sujeitos participantes o objetivo da pesquisa, apresentando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que depois de lido e concordado pelos voluntários, os mesmos assinaram e deu-se início à entrevista. As questões foram lidas pela pesquisadora e os voluntários iam respondendo de acordo com a ordem das questões, de forma que os participantes ficaram à vontade para responder as perguntas sem interferência externa.
Respeitando o sigilo aos sujeitos entrevistados, os mesmos foram nomeados como de 1 a 5, seguido do sexo e idade. A partir do problema e objetivos da pesquisa, apresentaremos abaixo os dados coletados e classificados de acordo com as categorias abaixo:
Vivências da hospitalização
Por "vivências" nos referimos à forma que o sujeito experimenta a hospitalização de seu familiar, em termos de sentimentos e pensamentos, tal como o define Urizzi e Corrêia (2007) como os modos como as famílias experienciam a internação de um familiar. Segundo o dicionário online de Português (Santos et al., 2008), "Vivências" significa "viver, ter vida; existência. Experiência de Vida. Processo psicológico consciente no qual o indivíduo adota uma posição valorizante, sintética, que não é apenas passiva e emocional, pois inclui também uma participação intelectual ativa".
O sujeito 1 (M, 60) classifica a sua experiência de estar no hospital como sendo uma "carreira difícil" (sic); já o Sujeito 2 (F, 49) como "é meu dever" (sic); o Sujeito 3 (F, 59) "Tem dia que é muito cansativo, não é confortável ficar aqui" (sic); Sujeito 4 (F, 35) "ter que estar aqui no hospital não é fácil pra mim" (sic); Sujeito 5 (F, 41). "Ficar aqui no hospital não é bom, mais penso que é o melhor" (sic).
Sentimentos vivenciados
Os sentimentos vivenciados pelos acompanhantes voltam-se para a esperança de melhora dos pacientes e também para a responsabilidade de cuidar do familiar internado, como verbalizado pelo Sujeito 1 (M, 60) "eu fico feliz porque eu gosto de cuidar da saúde dela e eu quero que ela fique bem né" (sic); o Sujeito 2 (F, 49) "eu me sinto na responsabilidade de cuidar dele" (sic); Sujeito 3 (F, 59) "eu me sinto bem cuidando dele, eu gosto do meu velho e eu preciso estar junto com ele" (sic); Sujeito 4 (F, 35) "se tivesse como, eu não viria no hospital, venho por causa da minha mãe porque eu sinto que ela precisa da minha ajuda e eu sei que eu tenho que ajudá-la. Mais eu fico aqui angustiada" (sic); Sujeito 5 (F, 41) "acho que não só eu, mais um monte de gente quando tem a necessidade de vir pro hospital, ficam preocupados, esse é o meu sentimento" (sic). Nota-se, portanto, uma ambiguidade de sentimentos tais como felicidade, responsabilidade, vontade de estar perto, mas também expressões de angústia, preocupação e obrigação de estar com o doente por exigência do vínculo familiar com o doente que demanda ajuda. Tais ambiguidades de sentimentos são apontados por Henriques e Cabana (2013) destacando que o processo de hospitalização causa tanto para o paciente como para o familiar que o acompanha uma grande mudança no seu cotidiano, alterando o seu estado físico e psíquico, pois, ao deparar-se com um familiar hospitalizado é frequente surgir sentimentos como medo e ansiedade, além da angústia e tristeza associadas ao estar doente, bem como a preocupação e a responsabilidade de estar ao lado desse familiar, ajudando-o a enfrentar esse processo de hospitalização. Sa (2012) considera que o cuidador assume um papel que lhe é imposto pela circunstância e por um desejo exorbitante de ajudar e estar ao lado da pessoa amada. Ele acredita que esta missão naturalmente seja sua e que deve permanecer ao lado do familiar que se encontra hospitalizado.
A família acredita que estar mais presente será valioso ao paciente, pois auxiliará na sua recuperação e conforme as falas em destaque pode-se perceber que os acompanhantes acreditam que estar ao lado de seus familiares, ajudando-os nesse processo de hospitalização, facilitarão na sua recuperação (Urizzi & Corrêia (2007). Rocha et al., (2013) acrescentam a importância do familiar ao lado do paciente, apoiando-o, tanto nas unidades de internação como nas ambulatoriais, de modo que tal prática vem sendo exigida pelos próprios hospitais, seja pelo conforto e bem-estar do paciente, ou mesmo para o auxílio do cuidado.
Pensamentos ocorridos
No que diz respeitos aos pensamentos ocorridos, o Sujeito 1 (M, 60) se dirige como: "E eu penso que ela estando aqui, através dessa ajuda ela pode melhorar" (sic); o Sujeito 2 (F, 49) "eu penso que é um momento que se deve dar atenção a ele né, mesmo ele não gostando de estar aqui, eu sempre digo que ele está aqui pra ser cuidado" (sic); Sujeito 3 (F, 59) "Tem dia que é muito cansativo, não é confortável ficar aqui, mais entendo que a minha presença é necessária" (sic); Sujeito 4 (F, 35) "ter que estar aqui no hospital não é fácil pra mim" (sic); Sujeito 5 (F, 41) "Ficar aqui no hospital não é bom, mais penso que é o melhor, aqui ele tem os cuidados que precisa pra se sentir bem" (sic).
Pode-se perceber que os pensamentos variam de um acompanhante para outro, como citado, percebe-se que para alguns acompanhantes estar no ambiente hospitalar vai ajudar o familiar a se recuperar mais rápido e acreditam que a sua companhia é favorável nessa recuperação do familiar, mesmo que para ele, o acompanhante, não seja fácil lidar e estar nesse ambiente, elementos que constituem seus pensamentos, no entanto, compreendem que a sua presença se faz necessária. Ou seja, mesmo diante das dificuldades de permanecer no ambiente hospitalar devido a estarem preocupados com suas outras obrigações e no qual devem abrir mão por alguns dias para poder acompanhar o familiar nesse processo, os acompanhantes, ao final, têm todos o mesmo objetivo, que é a recuperação do familiar internado.
Conforme Silva e Bocchi (2005) a família quer permanecer junto ao familiar hospitalizado, pelos seguintes motivos: insegurança, interesse no paciente, sentimento de corresponsabilidade pela recuperação do paciente, oportunidade de aprender, obrigação, respeito e simplesmente para estar junto. Tais elementos apontados se constituem, portanto, aqueles que ocupam a atividade de pensamento dos sujeitos acompanhantes.
Estratégias de enfrentamento à hospitalização
Assim como é difícil para o paciente lidar com a hospitalização, o acompanhante também passa por algumas dificuldades ao ter que permanecer nesse ambiente apoiando o outro a passar por esse momento. Dessa forma, o acompanhante utiliza de estratégias que possam facilitar o processo de estar no ambiente hospitalar acompanhando algum familiar.
Por meio dos resultados de sua pesquisa, Santos (2013) percebe a importância da utilização das estratégias de coping por familiares que possuem um de seus membros enfermo e/ou hospitalizado, pois ficou claro que estes se valem do enfrentamento como forma de manter processos autorregulatórios da dinâmica familiar. Analisando as respostas dos sujeitos aos oito fatores do Inventário de Estratégias de Enfrentamento de Folkman e Lazarus (1984), adaptado por Savóia e Mejias (1996, p.183-201), conclui-se que os acompanhantes dos familiares internados utilizaram algumas das subcategorias de estratégias para melhor lidar com o processo de hospitalização do familiar. As mais utilizadas foram Reavaliação Positiva, Aceitação de Responsabilidade, Resolução de Problemas e Suporte Social, como podemos perceber abaixo:
Uma das estratégias de enfrentamento mais utilizada pelos acompanhantes dessa pesquisa foi a Reavaliação Positiva, essa estratégia é dirigida para o controle das emoções que estão relacionadas à tristeza como forma de reinterpretação, crescimento e mudança pessoal a partir da situação conflitante, os indivíduos se apegam em alguma coisa para se fortalecerem no momento estressante. Isso pode ser observado nas seguintes falas: Sujeito 1 (M, 60) "eu peço a Deus para que ele me ajude" (sic); Sujeito 2 (F, 49) "Peço muito pra Deus. Busco força nele, na minha fé" (sic); Sujeito 3 (F, 59) "eu acredito muito em Deus, é dele que tiro forças pra passar por essa situação" (sic); Sujeito 4 (F, 35) "só Deus pra ajudar" (sic); Sujeito 5 (F, 41) "nós sempre fomos muito religiosos, e eu acredito que a força que eu tenho pra cuidar do meu pai, só vem de Deus, peço muito pra ele nos ajudar" (sic). Como podemos perceber, essa reavaliação volta-se para a religiosidade, bem como os pensamentos positivos, os acompanhantes utilizam esse recurso como forma de manter seu próprio equilíbrio e bem-estar, como também uma busca pelo tratamento do paciente (Dibai & Cade, 2009). De acordo com Panzini e Bandeira (2007) apud Pargament (1998 p.710-724) existem três meios pelos quais a religião pode estar envolvida no coping: pode ser parte, contribuir ou ser resultado/produto do processo de coping – os dois últimos exemplificando seu papel bidirecional no coping. Ainda segundo ele, quando as pessoas se voltam para a religião para lidar com o estresse, ocorre o coping religioso.
O uso do termo coping religioso/espiritual, é definido como o uso da religião, espiritualidade ou fé para lidar com o estresse e as consequências negativas dos problemas de vida, por meio de um conjunto de estratégias religiosas e/ou espirituais utilizadas para manejar o estresse diário e/ou advindo de crises existenciais ou circunstanciais que ocorrem ao longo da vida (Panzini & Bandeira, 2007). De acordo com o que foi citado por esses autores, percebe-se a relação do coping religioso com a utilização da estratégia de enfrentamento de "Reavaliação Positiva", no qual os acompanhantes buscam uma força em alguma coisa, neste caso em "Deus" para poderem aliviar a situação estressante, no caso, a hospitalização do familiar.
Também muito utilizada está a Aceitação de Responsabilidade, aqui o sujeito aceita a realidade e engaja-se no processo de lidar com a situação estressante, trata-se da aceitação da responsabilidade por parte do acompanhante em cuidar do familiar internado. Essa estratégia foi percebida na maioria das falas dos sujeitos, conforme descrito: Sujeito 1 (M, 60) "eu tenho que estar com ela, eu gosto de cuidar da saúde dela, eu não faço isso na marra" (sic); Sujeito 2 (F, 49) "eu sinto que é meu dever estar do lado dele; então eu me sinto na responsabilidade de cuidar dele" (sic); Sujeito 3 (F, 59) "Estou aqui por que ele precisa, e eu sei que devo estar com ele, eu preciso cuidar dele, já estamos juntos a tanto tempo que eu não poderia deixar ele sozinho agora que ele tem esses problemas" (sic); Sujeito 4 (F, 35) "eu sinto que ela precisa da minha ajuda e eu sei que eu tenho que ajudá-la" (sic); Sujeito 5 (F, 41) "Como não tem ninguém mais por ele a não ser eu, eu sinto na responsabilidade de cuidar dele."
Outra estratégia utilizada foi a Resolução de problemas, essa estratégia pressupõe o planejamento adequado para lidar com os estressores. Ao invés de anular ou afastar a situação estressante de seu cotidiano, o indivíduo opta por resolver seu problema, modificar suas atitudes, sendo capaz de lidar com as pressões das pessoas e do ambiente ao seu redor, diminuindo ou eliminando a fonte geradora de estresse, trata-se de focar-se no problema, ou seja, no tratamento adequado ao familiar internado: Sujeito 1 (M, 60) "Acredito que ela estando aqui no hospital, ela pode melhorar, e é isso que eu quero" (sic); Sujeito 3 (F, 59) "Eu penso que estando aqui ele vai estar bem cuidado" (sic); Sujeito 5 (F, 41) "Ficar aqui no hospital não é bom, mais penso que é o melhor, aqui ele tem os cuidados que precisa pra se sentir bem" (sic).
O Suporte Social que se trata da ajuda de terceiros, como os amigos, outros familiares, e até mesmo a equipe médica também aparece na fala dos acompanhantes como estratégias de enfrentamento: Sujeito 1 (M, 60) "E também através dos amigos que nos dão apoio quando necessário" (sic); Sujeito 2 (F, 49) "Eu busco a ajuda dos meus irmãos, dos amigos mais próximos pra me ajudarem lidar com essa situação" (sic); Sujeito 5 (F, 41) "então sempre precisa de cuidados médicos e eu sei que eles estão sempre dispostos a ajudar."
Já as estratégias menos utilizadas foram às seguintes: Confronto, essa estratégia corresponde às estratégias ofensivas para o enfrentamento da situação, aqui as pessoas apresentam uma atitude ativa em relação ao estressor. Nem sempre as estratégias envolvidas no confronto levam a resultados positivos, como por exemplo fazer coisas que não são orientadas pela equipe médica para tentar solucionar alguns problemas. Foi percebida na fala do Sujeito 4 (F, 35) "eu não tenho paciência com alguns enfermeiros, ontem mesmo, acabou o soro da minha mãe, ai eu fui chamar um dos enfermeiros pra vir trocar, eles demoraram tanto que eu acabei tirando o soro do braço da mãe, eles até acharam ruim que eu fiz isso, mais fiquei com raiva da demora deles e por isso tirei" (sic).
A estratégia Afastamento, que se trata de estratégias defensivas em que o indivíduo evita confrontar-se com a ameaça, não modificando a situação. Essa estratégia foi observada na fala do Sujeito 3 (F, 58) "Tem dia que dá vontade de tirar ele e ir logo embora, mais ai eu logo penso, não, é melhor ele ficar aqui, ele precisa melhorar." (sic).
A estratégia Autocontrole são os esforços da pessoa em buscar o controle das emoções frente aos estímulos estressantes, surgiu na fala do Sujeito 5 (F, 41) "quando estamos aqui no hospital mesmo, eu tenho o cuidado de sempre estar passando o carinho que sinto por ele, penso que fazendo isso ele possa se sentir melhor" (sic).
A estratégia Fuga-esquiva consiste em fantasiar sobre possíveis soluções para o problema sem, no entanto, tomar atitudes para de fato modificá-las. São os esforços para escapar e/ou evitar o fator estressante, sendo que essa estratégia não foi percebida nas falas dos acompanhantes entrevistados. Esse resultado pode significar grande participação e envolvimentos desses acompanhantes na internação de seu familiar. Segundo Santos (2013), as estratégias ativas nesses acompanhantes são as que contribuem para uma melhor percepção e, portanto, adaptação à situação doença.
As estratégias podem ser utilizadas de maneira conjunta, embora haja possibilidade de uma prevalecer sobre a outra em fases específicas da doença e de acordo com as necessidades (Ravagnani et al., 2007). No caso dos sujeitos analisados, as estratégias menos utilizadas, como as de "Confronto, Afastamento, Autocontrole e Fuga-Esquiva. Dentre essas estratégias, exceto a estratégia de Autocontrole, Martins et al., (2011) refere-se que essas estratégias fazem parte de um modo negativo de enfrentar a situação problema, talvez isso explique o fato dessas estratégias terem sido menos utilizadas por esses acompanhantes.
Como é possível perceber por meio das falas dos acompanhantes e sendo as estratégias mais utilizadas por estes, percebe-se que todos os acompanhantes entrevistados utilizam a estratégia de "Reavaliação Positiva", ou seja, se apegam em algo que possa ajudá-los a passar por esse momento, fortalecendo esse momento estressante. Bem como a "Aceitação de Responsabilidade", onde os sujeitos se apoiando nessa força da primeira estratégia, também se veem na responsabilidade de ajudar esse familiar, engajando-se para que o tratamento ocorra da melhor forma possível. Partindo disso, os acompanhantes entrevistados, ao invés de fugir do problema, optam por lidar com ele, modificando atitudes, resolvendo o problema, lidando com o ambiente que está inserido, diminuindo a fonte geradora de estresse, colaborando no tratamento adequado para o familiar hospitalizado. Alguns desses acompanhantes buscam a ajuda de terceiros, seja os outros familiares ou até mesmo a equipe médica, para facilitar a passagem por esse processo, caracteriza aqui uma outra estratégia que é a busca pelo "Suporte Social".
Estudos de Faria e Cardoso (2010), buscando aspectos sobre as estratégias de enfrentamento do acompanhante frente à situação de adoecimento do paciente familiar infantil obtiveram os seguintes resultados a partir das respostas dos cuidadores: os fatores "resolução de problemas" (que se refere a esforços na direção de solucionar a situação problemática vivida) e "fuga e esquiva" (indica uma tentativa de negar a situação vivida), foram os mais utilizados pelos participantes, seguidos por "reavaliação positiva". O fator menos utilizado foi o de "afastamento". Ainda nesse estudo, os cuidadores relataram que houve um enfrentamento da situação de diversas maneiras, sendo uma delas a crença em Deus, que se manifestava de duas diferentes formas: tendo fé em Deus, mas também o responsabilizando, ou seja, entregando a situação à vontade de Deus. Pode-se observar que existe uma similaridade quanto às estratégias utilizadas, que não seguem a mesma ordem de utilização, algumas mais utilizadas que outras. Mas o resultado deste estudo obtinha os mesmos objetivos da pesquisa em questão.
Conclusão
Conforme apontado no objetivo geral, buscou-se identificar as vivências e as estratégias de enfrentamento utilizadas pelos acompanhantes durante o processo de hospitalização de um familiar e como os cuidadores mobilizam forças para cuidar da recuperação de seus familiares, o que podemos caracterizar como estratégias de enfrentamento.
Em relação às vivências de estar cuidando de um familiar hospitalizado, os acompanhantes classificaram a sua experiência de estar no hospital como sendo uma "carreira difícil" e "muito cansativo, desconfortável, difícil e obrigatório, embora necessária. Quanto aos sentimentos vivenciados pelos acompanhantes, esses se voltaram para esperança de melhora dos pacientes e também para a responsabilidade de cuidar do familiar internado notando-se uma ambiguidade de sentimentos, tais como felicidade, responsabilidade, vontade de estar perto, mas também expressões de angústia, preocupação e obrigação de estar com o doente por exigência do vínculo familiar com o doente que demanda ajuda. E quanto aos pensamentos, estes variaram de um acompanhante para outro, percebendo que para alguns acompanhantes estar no ambiente hospitalar poderia ajudar o familiar a se recuperar mais rápido, acreditando que a sua companhia é favorável nessa recuperação do familiar, mesmo que para ele não seja fácil lidar e estar nesse ambiente, compreendendo por meio dos pensamentos destacados que a sua presença se faz necessária.
No presente estudo, os resultados mostraram que os acompanhantes utilizam de diversas estratégias de enfrentamento para cuidar dos familiares durante o processo de hospitalização, sendo: 1) "Estratégia de Reavaliação Positiva", em que todos os acompanhantes entrevistados utilizam dessa estratégia durante a hospitalização do familiar. Tal estratégia está voltada para o fato dos acompanhantes se apegarem a alguma coisa que acreditam dar-lhes força para superar o momento no qual se encontram, neste caso o coping religioso tem grande valia para todos os acompanhantes entrevistados, devido tratar-se do uso de crenças, comportamentos religiosos que facilitem a resolução da situação que se encontram. 2) Outra estratégia utilizada por todos os acompanhantes foi a "Estratégia de Aceitação de Responsabilidade", onde os acompanhantes ao lidar com o fato de ter um familiar internado, se veem na responsabilidade de ajudar, cuidar do familiar enquanto encontra-se no ambiente hospitalar. 3) Também muito utilizada foi a "Estratégia de Resolução de Problemas" onde os acompanhantes focam-se para resolver o problema, que neste caso é a melhora do familiar internado; 4) Como também a "Estratégia de Suporte Social", que trata-se da busca de ajuda por parte dos acompanhantes aos amigos, outros familiares e as vezes a própria equipe de saúde. Desse modo pode-se acreditar que a avaliação de estratégias de enfrentamento é um dos fatores que contribuem para a qualidade de vida dos acompanhantes e de seus familiares internados.
Já as estratégias menos utilizadas foram: 1) As "Estratégias de Confronto, que se trata de estratégias ofensivas, os sujeitos apresentam uma atitude mais ativa frente ao estressor, essa estratégia foi observada em um dos acompanhantes entrevistados; 2) "Estratégia de Afastamento", onde o indivíduo evita confrontar-se com a ameaça, não modificando a situação, também foi apresentada por um dos acompanhantes. Outra estratégia pouco utilizada foi 3) a "Estratégia de Autocontrole" que são os esforços da pessoa em buscar o controle das emoções frente aos estímulos estressantes, apresentada por um dos acompanhantes e por fim, 4) a "Estratégia de Fuga-Esquiva" que consiste em fantasiar sobre possíveis soluções para o problema sem, no entanto, tomar atitudes para de fato modificá-las, essa estratégia não foi utilizada por nenhum dos acompanhantes entrevistados.
Sem a pretensão de generalização, posto que é uma pesquisa qualitativa com uma pequena amostra de sujeitos, os resultados obtidos por meio dessa pesquisa podem servir para os profissionais em psicologia e de outras profissões hospitalares, especialmente na região de sua aplicação, para reforçar pontos que necessitam ser trabalhados: orientação aos acompanhantes sobre os procedimentos realizados com o paciente, atividades de distração como ler um livro ou fazer atividades que não atrapalhe o ambiente hospitalar; Além da compreensão sobre os sentimentos vivenciados e formas de enfrentamentos experimentados por estes sujeitos diante do acompanhamento hospitalar. Entretanto, considerando esta como uma pesquisa exploratória, defendemos a realização de mais pesquisas com desenho quantitativo e com uma maior amostragem, para verificar os mesmos fenômenos pesquisados.
Cabe, finalmente, ressaltar a importância da Psicologia Hospitalar no sentido de detecção e reforço de defesas adaptativas a este momento de crise familiar, com intuito de facilitar o enfrentamento de todos a este difícil momento vivido pelo seu membro.
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Endereço para contato
E-mail: kebelassis@yahoo.com.br
Recebido em maio de 2015
Aceito em abril de 2016
Aline Letícia da Vitória: Graduada em Psicologia, Faculdades Integradas de Cacoal, UNESC-RO.
Cleber Lizardo de Assis: Mestre em Psicologia/PUCMG, Doutor em Psicologia pela Universidad del Salvador – AR, Professor da Faculdade de Ciências Biomédicas de Cacoal, FACIMED, RO.