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Aletheia

versão impressa ISSN 1413-0394

Aletheia vol.53 no.2 Canoas jul./dez. 2020

https://doi.org/10.29327/226091.53.2-8 

10.29327/226091.53.2-8

ARTIGOS TEÓRICOS - PROMOÇÃO DA SAÚDE

 

Legislações e políticas de saúde na redução de vulnerabilidades e uso de drogas: Desafios a vencer

 

Health legislation and policies in reducing vulnerabilities and drug use: Challenges to be overcome

 

 

Luciano Aparecido Pereira Junior1 ;Regina Célia de Souza Beretta2

Universidade de Franca-SP/ UNIFRAN

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O uso de drogas é complexo e multicausal com impactos para as pessoas, famílias e sociedade. Este estudo investigou legislações, políticas públicas e estratégias, que possam diminuir vulnerabilidades e contribuir para os ODS. Foi realizado levantamento documental, em legislações e documentos, para análise da realidade social, a partir das experiências profissionais, e ainda levantamento bibliográfico, na BVS e LILACS, de 2016 a 2018. Observou-se que o Estado se mantém disciplinador e entre as políticas mais relevantes estão a Redução de Danos, os CAPS e o Consultório de Rua, marcadas pelo empirismo, obstáculos e desafios em relação à universalidade e equidade. Estratégias intersetoriais, podem ser utilizadas para se obter melhores condições de saúde e bem-estar, saneamento e água, educação, trabalho. A promoção da saúde corrobora na redução das vulnerabilidades e equidade, com maior sensibilização e qualificação dos profissionais das redes de atenção social, para acolher a população com competência e dignidade.

Palavras-chave: Políticas públicas; Vulnerabilidade; Drogas.


ABSTRACT

Drug use is complex and multicausal with impacts to people, families and society. This study investigated legislation, public policies and strategies that could reduce vulnerabilities and contribute to ODS. A documentary survey was carried out, in legislation and documents, to analyze the social reality, based on professional experiences, and also a bibliographical survey in the VHL and LILACS, from 2016 to 2018. It was observed that the State remains disciplinary and between policies more relevant are the Harm Reduction, the CAPS and the Street Office, marked by empiricism, obstacles and challenges in relation to universality and equity. Intersectoral strategies can be used to obtain better health and well-being, sanitation and water, education, work. The promotion of health corroborates in the reduction of vulnerabilities and equity, with greater awareness and qualification of professionals in social care networks, to welcome the population with competence and dignity.

Keywords: Public policy; Vulnerability; Drugs.


 

 

Introdução

O conceito de saúde vem do latim salus, entendido como "bom estado físico", porém a Organização Mundial de Saúde, em 1946, ampliou esse conceito considerando-o um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não, simplesmente, a ausência de doenças ou enfermidades (Portal da Educação, 2013).

Nos dias atuais a temática das drogas se constitui um dos problemas mais sérios, de difícil intervenção, significando uma ameaça para o bem-estar e qualidade de vida das pessoas, representando um desafio para a promoção da saúde e para os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, estabelecidos na Agenda 2030 (Secretariado Geral das Nações Unidas, 2015).

O uso abusivo de drogas altera o bem-estar físico, mental e social e está presente na existência humana como um construto sócio histórico, em determinados contextos e situações. É um fenômeno social, multidimensional e complexo, que pode resultar em graves consequências, para aqueles que fazem uso de drogas e suas famílias. Tornou-se uma questão de saúde pública, um problema sócio- econômico e social.

O consumo de drogas muitas vezes é entendido como uma resposta a uma carência pela falta de afeto, saúde, cultura, religião, escola, informação, dinheiro, família, trabalho, entre outros. As pessoas fazem uso de drogas em decorrência de variados motivos entre eles o hedonismo, a curiosidade ou alivio da dor e sofrimento, entre outros. O uso abusivo de drogas desencadeia o isolamento, a violência, o desprezo, as mudanças comportamentais (Scheiffer, Pasa & Almeida, 2010).

O Relatório Mundial sobre Drogas de 2018 nos apresenta o impacto das drogas para a saúde da população mundial e destaca vulnerabilidades de determinados grupos por idade e gênero. Segundo o documento o uso de opioides no mundo representa 76% de mortes envolvendo distúrbios relacionados ao uso de drogas. Entre as drogas mais consumidas está a Cannabis, sendo a droga preferida dos jovens, variando de acordo com o país e as condições sociais e econômicas. Os jovens são considerados grupos etários mais vulneráveis ao uso de drogas e danos, quando comparados aos mais velhos. Todavia, surpreendentemente, o relatório apontou que o uso de drogas vem aumentando mais rapidamente, entre os adultos com 40 anos, do que entre os mais jovens.

Verifica-se a correlação entre o fenômeno do uso drogas e os determinantes econômicos e sociais, que afetam as condições de saúde e qualidade de vida populacional. São fatores que influenciam, afetam e/ou determinam a saúde dos povos e cidadãos. Entre os determinantes econômicos destacam-se o desempenho económico do país, rendimento, situação de emprego, ocupação, habitação. Entre os determinantes sociais estão como a cultura, estilos de vida, género, etnia, grau de inclusão social, idade, comportamentos relacionados com a saúde, as condições de vida e condições de trabalho, educação (Carrapato, Correia & Garcia, 2017).

Os países capitalistas estão pautados na acumulação de riquezas, que retroalimenta a estratificação social, a desigualdade e o poder. Na América Latina há diversidade territorial e cultural e grande desigualdade social, com concentração de renda e políticas públicas insuficientes, o que produz exclusão social e dificuldades de acesso a condições dignas de moradia, saneamento, água e energia, ente outras (Barbar, 2018).

O Brasil a despeito da aprovação dos direitos sociais na Constituição Federal de 1988 tem vivenciado a contradição entre o desmonte da proteção social e as garantias e dos direitos essenciais à vida, como acesso a renda e trabalho, alimentação, à saúde e a moradia, entre outros, configurando-se em um aumento de fatores de risco e exposição ao uso de drogas.

O problema relacionado ao consumo de drogas tem se apresentado com variadas e complexas dimensões nas últimas décadas, exigindo respostas dos governos em âmbito nacional e internacional (Santos, Soares & Campo, 2012).

Este estudo objetiva investigar as políticas públicas de atenção ao uso de drogas no Brasil, identificando estratégias de promoção da saúde, que possam corroborar para a diminuição de vulnerabilidades em saúde, para o uso de drogas e para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, cujo compromisso é "assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades".

 

Método

Este trabalho resulta de um levantamento bibliográfico na base de dados Biblioteca Virtual de Saúde (BVS) e na Literatura científica e técnica da América Latina e Caribe (LILACS) de artigos publicados no período de 2016 a 2018, utilizando-se como descritor o termo "vulnerabilidades em saúde e drogas". Foram encontrados 100 artigos na BVS e selecionados inicialmente 10 artigos, já na base de dados Lilacs foram encontrados 295 artigos e selecionados 7 artigos. Realizou-se, ainda, um levantamento documental, baseado em legislações e documentos governamentais de atenção ao uso de drogas no país, para análise da realidade social, a partir das experiências profissionais da pesquisadora.

 

Resultados

Ao analisar a história sócio jurídica que envolve as drogas no Brasil, verificou-se que desde o Brasil colônia, se desenvolvia ações de repressão e punição ao tráfico. De acordo com Batista (1997) até o ano de 1914, não havia uma sistematização da legislação sobre o tema de drogas no Brasil, as primeiras normas remontam às Ordenações Filipinas de 1603 e previam penas de confisco de bens e degredo para os que portassem, usassem ou vendessem substâncias tóxicas.

No Brasil o uso e abuso de drogas, sempre foram tratados da via da penalização. Tornou-se caso de polícia e de justiça, com internação obrigatória em hospitais psiquiátricos, com tendência à segregação social, e judicialização da pobreza, sendo que o comércio e o uso de drogas eram penalizados da mesma forma (Decreto-Lei n. 891, 1938).

Em 1940, com o Código Penal reafirmou a opção de não criminalizar o consumo. Porém, o golpe militar de 1964 e a criação da Lei de Segurança Nacional deslocaram o foco do modelo sanitário, para o modelo bélico de política criminal, que equiparava os traficantes aos inimigos internos do regime. Nessa época o uso de drogas passou a representar a luta pela liberdade, associada às manifestações políticas democráticas, contra a ditadura (Pedrinha, 2011).

O governo autoritário chefiado por militares modificou o art. 281 do Código Penal e igualou o tratamento entre consumidor e traficante. A lei 6.368/76 aprovada posteriormente, declarou guerra as drogas, alinhando-se à Convenção de Viena de 1971, com repressão em detrimento da prevenção (Carvalho, 2016).

A criminalização das drogas no Brasil sempre esteve associada a conjuntura mundial, aos interesses financeiros que disputavam o monopólio da manipulação e comércio do ópio e da cocaína, assim como seus derivados e a política externa ditatorial dos Estados Unidos (Carvalho, 2016).

Nos anos 80 houve uma crescente insatisfação do povo brasileiro com o regime ditatorial. As lutas por liberdades democráticas se intensificam por meio dos movimentos sociais, que culminam com a transição democrática, marcada pelas reivindicações expressas na assembleia constituinte e a promulgação da Constituição Federal em 1988, que estabeleceu o tráfico de drogas, como crime inafiançável e sem anistia.

Em 2006 com o advento da Lei 11.343 o país deixou de punir o usuário com pena privativa de liberdade, impondo-lhe diversas medidas alternativas. A lei eliminou a pena de prisão para o usuário e o dependente, ou seja, para aquele que tem droga ou planta, para consumo pessoal. A legislação também distinguiu o traficante profissional do eventual, que trafica pela necessidade de obter a droga para consumo próprio, e que passou a ter direito a uma sensível redução de pena.

Segundo Carvalho (2016) apesar do avanço, o proibicionismo vigente desde os anos 70 reiterou os moldes latinos americano. Após 13 anos de vigência, ainda prevalece o tratamento desumano, dispensado as pessoas usuárias, com internações compulsórias e intervenções truculentas junto aos dependentes.

Entre as iniciativas governamentais mais recentes para o enfrentamento do uso de drogas, destaca-se a criação do Conselho Nacional Antidrogas em 2005, posteriormente renomeado Conselho Nacional Antidrogas (CONAD) em 2008. Além do estabelecimento da Política Nacional sobre Drogas, que pela primeira vez, se preocupou com a prevenção, o tratamento, recuperação e inserção social (Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas [SENAD], 2011).

Outro esforço governamental, que não se tornou uma política efetiva foi Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas (Ministério da Justiça, 2010) e seu desdobramento no Programa Crack, é Possível Vencer, lançado em 2011, previu ações, a partir de prevenção, cuidado e autoridade, envolvendo a segurança, saúde e educação. Entre as metas governamentais estabelecidas estava à ampliação do tratamento de saúde e atenção aos usuários de drogas, combate ao tráfico e fomento de atividades de prevenção (SENAD, 2011).

Em relação às políticas públicas de saúde voltadas ao atendimento do uso de drogas destacam-se a Redução de Danos e a implantação dos Centros De atenção Psicossocial no Brasil e os Consultórios de rua. A Política de Redução de Danos (RD) surgiu nos anos 80 como estratégia de intervenção e significou uma resposta à produção, ao comércio e ao consumo de drogas. Em 2002 o Ministério da Saúde instituiu normas e diretrizes para a organização de serviços que prestam assistência em saúde mental, como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) voltado ao atendimento de álcool e drogas (SENAD, 2011).

Passos e Souza (2011) afirmam que a RD significou uma nova forma de compreender e intervir nos problemas relacionados ao uso de drogas, apoiada na lógica da abstinência e diversidade de demandas, ampliando as ofertas em saúde. Incorporada pela saúde pública de vários países em diferentes contextos sociais, políticos e econômicos difundindo-se como nova forma de compreender e intervir nos problemas relacionados ao uso de drogas. Visa minimizar os danos e complicações associados às drogas (Dias, Ribeiro, Bastos & Page, 2014).

Pela via dos Centros de atenção Psicossocial para Álcool e Drogas (CAPS ad) na atenção primária, em regime ambulatorial, há oferta de tratamento para a dependênciaquímica e outras doenças, vacinação, preservativos e material educativos, acompanhamento familiar, entre outros.

Em 2012 surgiu o Consultório na Rua vinculado à atenção básica, a partir das experiências de Redução de Danos. O programa incorporou práticas de prevenção de doenças e promoção da saúde para populações que viviam nas ruas, voltado ao acesso aos serviços de saúde e tentativa de proteção da qualidade de vida (Ferreira, Rozendo, & Melo, 2016).

Os usuários do serviço entrevistados por Ferreira et al. (2016) apontaram como positivo além da melhoria no acesso aos serviços de saúde, compromisso da equipe e relação de respeito, o apoio social, afeto e oportunidade para mudar de vida.

Pesquisas realizadas por Pinho et al. (2017) apontam que o tratamento das incapacidades relacionadas as drogas representam em muitos países 1% a 2% do Produto Interno Bruto. Hoje estima-se que cinco milhões de usuários no mundo, carreguem outros riscos associados, como HIV e hepatites (Pinho et al., 2017).

No Brasil as pesquisas de Caro, González, Cabriales, Gómez & Hunter (2015), apontam para 7,3% do Produto Interno Bruto (PIB), no ano de 2010; de R$ 3.439,997 bilhões, o custo social referente a problemas devido ao abuso de álcool atingiu a cifra de R$ 251,119 bilhões por ano.

O custo estatal do tratamento e prevenção de uso de álcool e outras drogas representam apenas parte do problema. Há ônus social, em relação às famílias, ao absenteísmo e abandono do trabalho, acidentes, perda de produtividade, consequências para a saúde por conta do agravamento de outras doenças físicas, morte entre outras.

O uso de drogas é resultante da ineficiência do Estado e da própria sociedade em garantir os direitos às políticas públicas de saúde, educação, trabalho, moradia, entre outros. As ofertas de fatores protetivos pelo setor público ou privado podem diminuir a vulnerabilidade social de pessoas e grupos ao uso abusivo de drogas.

 

Discussão

Diferentes autores em diferentes áreas do conhecimento concordam que o fenômeno de uso de drogas é complexo e multicausal, com diferentes implicações para as pessoas, famílias e para a sociedade. Essa compreensão requer políticas capazes de articular amplos setores, da sociedade civil e órgãos governamentais para a promoção, proteção, prevenção, tratamento e inserção social, especialmente quando as pessoas se encontram em situação de violação de direitos, pela diversidade de fatores de vulnerabilidade e/ou riscos (Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 2016).

Entre as legislações estudadas a Lei 11.343/06, destaca-se como marco na história do Brasil, considerada pelos especialistas um avanço na área, pois se propôs a colocar fim à criminalização dos usuários, flagrados com pequenas porções de drogas. Houve uma preocupação quanto ao cuidado e saúde do usuário, pautada nos direitos humanos, porém a lei é ainda marcada pela subjetividade dos conceitos e falta de clareza na sua operacionalização.

Verificou-se os esforços de várias legislações para a construção de políticas públicas de saúde mental na área tem sido pontual e insuficiente para romper paradigmas e implementar ações de promoção, proteção e recuperação da saúde.

Parry, Rehm, Poznyak e Room (2009), citado por Macedo et al. (2018), em estudo realizado em âmbito mundial, assinalam que o uso abusivo de álcool e drogas têm maior impacto em estratos populacionais mais desfavorecidos socioeconomicamente, devido às situações de vulnerabilidade em que se encontram e aos poucos recursos sanitários com que contam.

O conceito de vulnerabilidade é delimitado por processos sociais dinâmicos e multigeracionais que envolvem pelo menos três dimensões: exposição a trajetórias de riscos; capacidades internas e externas de reação e possibilidades de adaptação baseada tanto na intensidade do risco quanto na resiliência das pessoas (Reis & Oliveira, 2017).

Segundo Ayres, França, Calazans e Saletti (2003) a vulnerabilidade refere-se aos aspectos biológicos, emocionais, cognitivos e relacionais. Este conceito se refere segundo o autor, aos indivíduos fragilizados quanto à garantia de proteção social. Já "o termo risco tem sido imperativo da proteção, apontando uma condição de falta, carência, perigo, conflito e tensão em que se há de proteger (Scheinvar, 2007).

A compreensão dos processos de vulnerabilidade em saúde é fundamental para a formulação de políticas públicas. A vulnerabilidade se configura em uma dinâmica de interdependências recíprocas que exprimem valores multidimensionais – biológicos, existenciais e sociais. Uma situação de vulnerabilidade restringe as capacidades relacionais de afirmação no mundo, incluídas as formas de agência social, gerando fragilização (Oviedo & Czeresnia, 2015).

De acordo com Macedo et al. (2018) o território onde se nasce, cresce, vive, trabalha e envelhece são determinantes para a promoção de saúde e bem-estar, e podem produzir impactos positivos e negativos na saúde mental.

A família é um grupo de sociabilidade primária, espaço privilegiado de atenção estatal, na atenção às demandas das famílias. As famílias têm sido afetadas e fragilizadas pelas mudanças sociais e econômicas que rebateram no mundo laboral, resultando em desemprego e precarização dos processos de trabalho. O tráfico e a comercialização de drogas podem ser uma fonte de renda e sustento (Feltran, 2014).

Essas pessoas e suas famílias têm direito à cidadania e precisam ser valorizados em suas singularidades, o que vai demandar um esforço do Estado, das equipes e de novas práticas de saúde. O Estado também tem responsabilização na sociabilidade secundária, na oferta de redes de atenção, suporte e apoio. Deve investir na capacidade protetiva da família, pois ela é a responsável por diferentes estratégias de sobrevivência e de inclusão social, além de ser mediadora das relações público e privado (Pedrosa, Reis, Gontijo, Teles & Medeiros, 2016).

Entre as políticas públicas voltadas ao uso de drogas é o programa para redução de danos que representou uma estratégia de redução da violência, prevenção e atendimento e suporte social para paciente com HIV/AIDS e outras doenças. Outro grande salto qualitativo foi a implantação dos CAPS, mas sem adesão normativa suficiente, que permitisse uma nova institucionalidade para a RD (Dias et al., 2014).

A RD se deu no País como um projeto piloto, mas não alcançou efetividade e universalidade como política de saúde, pois sua implantação esbarrou em problemas de operacionalização, implantação, normatização (Dias et al., 2014).

Verificou-se que a redução do fenômeno das drogas está intimamente ligada à promoção da saúde ao utilizar como estratégia, a identificação e a redução das vulnerabilidades e riscos, que fazem as pessoas adoecerem.

A PNPS (Ministério da Saúde, 2006) sugere para a redução da morbimortalidade em decorrência do uso abusivo de álcool e outras drogas: ações educativas e sensibilizadoras, distribuição de material educativo, campanhas sobre trânsito seguro; redução de danos, informações pela mídia sobre riscos e danos de acidentes e violências, restrição de acesso a bebidas dos segmentos vulneráveis.

Macedo et al. (2018) aponta que o desenvolvimento de programas de promoção da saúde e avaliação de sua efetividade são estratégias essenciais para a promoção da equidade e do direito à cidade. Sugere o fortalecimento das redes de informação, de interação e de vivências comunitárias, apoiadas nos recursos do próprio território, trabalhando para redução dos níveis de vulnerabilidade. Enfatiza as ações promocionais e preventivas em saúde da Estratégia Saúde da Família/ESF e Núcleo de Apoio à Saúde da Família/ NASF, além do fortalecimento de vínculos sócio familiares em serviços como Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) do Sistema Único da Assistência Social (SUAS).

Sem dúvida, a atenção básica, surge como importante mecanismo no enfrentamento das vulnerabilidades e riscos. Entretanto, o enfrentamento ao uso de drogas requer uma ação conjunta de todas as políticas públicas para obter maior melhores condições de vida e de saúde, rompendo com formas fragmentadas e pulverizadas de agir e pensar ações, serviços e programas.

A intersetorialidade abre um campo de possibilidades, pois possibilita uma maior abertura para a construção de intervenções em rede, ao estabelecer conexões, vínculos e relações de confiança, com o que faz sentido para os sujeitos e para as famílias.

Possíveis estratégias em práticas de saúde são as atividades que podem ser desenvolvidas em territórios de vulnerabilidade com crianças, adolescentes, adultos, famílias e comunidades. O envolvimento com atividades de lazer, esporte, cultura, saúde, educação, modificam hábitos e constroem atitudes mais saudáveis por meio de vivencias pessoais, diminuindo fatores de risco, que predispõem ao uso de drogas.

 

Considerações finais

A realidade social tem se mostrado cada vez mais complexa, heterogênea, e desigual evidenciando situações de exclusão e de grandes iniquidades, onde as oportunidades e acessos aos serviços de saúde são extremante distintas.

O problema das drogas vem se agravando no Brasil, com ações ainda orientadas no paradigma autoritário, na criminalização da pobreza, muitas vezes com uso de violência e a internação compulsória. O Estado se mantém conservador e disciplinador, porém algumas iniciativas podem ser elencadas como relevantes na saúde mental, como a aprovação de legislações, no campo do consumo abusivo de drogas, que deixou de ser pautado na abstinência.

A literatura nacional e internacional demonstra que os determinantes econômicos e sociais que afetam a qualidade de vida e bem-estar, muitas vezes não são considerados na formulação e execução das políticas de atenção ao uso de drogas.

A construção de políticas públicas eficazes é uma tarefa desafiadora. Aproximar-se da realidade social é uma estratégia para conhecer as necessidades concretas de indivíduos e famílias, bem como as características do território onde vivem e se relacionam.

A redução de danos e o consultório de rua, por exemplo, romperam paradigmas e se tornaram estratégias norteadoras do cuidado, reduzindo os prejuízos agregados em função do uso de drogas, prevenindo aqueles ainda não instalados. Porém, os programas precisam atingir a todos os usuários, de melhores condições de financiamento e de gestão do trabalho, especialmente nos territórios mais vulneráveis, para melhor implantação, execução e avaliação.

Outro destaque é para o atendimento ambulatorial nos CAPS que ao invés do encarceramento, objetiva a manutenção dos vínculos familiares e a introdução de cuidados com a saúde. O problema é que esses serviços não estão disponíveis em todos os municípios e na proporção da demanda do fenômeno. (Dias et al., 2014).

Esses autores afirmam que no Brasil essa política ainda tem sido marcada pelo empirismo, por lacunas e obstáculos. O país avança e retrocede, sem continuidade de políticas públicas na área com inúmeros desafios em relação à universalidade e equidade, dadas condições de vida e de saúde.

Se faz necessário uma busca continua de estratégias intersetoriais, para se obter melhores condições de saúde e bem-estar, saneamento e água, educação, trabalho, entre outros meios, para a superação das iniquidades sociais. Esse objetivo é recomendado pela ONU, quando da aprovação dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), que prevê o combate às desigualdades, a fome e a garantia de uma vida mais digna para todos, sem deixar ninguém para trás, especialmente os mais vulneráveis.

A promoção da saúde pode corroborar com para reduzir as desigualdades, com promovendo à equidade e o direito à cidade. Para acolher e atender a população usuária competência e dignidade é imprescindível maior sensibilização e melhor qualificação dos profissionais das redes de atenção social e de saúde.

A educação e a informação são importantes instrumentos de empoderamento. As pessoas e grupos precisam ter informações sobre as consequências das drogas na sua vida, e serem orientadas para a cultura da paz, dos direitos humanos, da justiça social, e da equidade no atendimento. É preciso uma ação educativa, para que se percebam como sujeitos de sua história e cidadãos, que enfrentem os desafios e assumam a luta por seus direitos.

Este estudo evidenciou a importância de ampliar as discussões e investigações sobre, sobre os fatores que contribuem para o uso de drogas, bem como vulnerabilidade, bem como os impactos na vida na social e possíveis estratégias em saúde, que possam reduzir as exposições às situações de risco.

 

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Endereço para correspondência
E-mail:regina.beretta@unifran.edu.br

Recebido em: janeiro de 2019
Aceito em: fevereiro de 2020

 

1 Luciano Aparecido Pereira Junior: Psicólogo. Filiação institucional: Universidade de Franca-SP/ UNIFRAN. Doutorando do Programa de Pós-graduação em Promoção de Saúde. Rua Antônio Roque Martins, 1077, Pq. São Judas Tadeu/ São Sebastião do Paraíso, MG, CEP 37950-000 – Brasil. Celular 35-98447-8458.
2 Regina Célia de Souza Beretta: Assistente social. Filiação institucional: Universidade de Franca-SP/ UNIFRAN. Docente/pesquisadora do Programa de Pós-graduação em Promoção de Saúde. Tel 55-16- 99129-9110. Endereço Postal: Rua Ouvidor Freire 2288, Centro, Franca-SP- CEP 14400630- Brasil. Celular 16-991299110.

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