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Psicologia da Educação

versão impressa ISSN 1414-6975

Psicol. educ.  no.33 São Paulo dez. 2011

 

Os sentidos do trabalho para o orientador pedagógico: contribuições da Psicologia Escolar

 

The meaning of pedagogical coordinator's work: contributions of Educational Psychology

 

Los significados de lo trabajo de lo orientador pedagógico: contribuciones de la Psicología Escolar

 

 

Lilian Aparecida Cruz DugnaniI; Vera Lúcia Trevisan de SouzaII

IPontifícia Universidade Católica de Campinas; Bolsista CNPq. lac.dugnani@hotmail.com
IIPontifícia Universidade Católica de Campinas; Bolsista CNPq Produtividade em Pesquisa Nível II

 

 


RESUMO

Este artigo apresenta parte dos resultados de uma pesquisa de Mestrado, que investigou os sentidos do trabalho para o orientador pedagógico e sua influência no papel de mediador das relações intra e extraescolares. Consoante aos pressupostos teórico-metodológicos da psicologia histórico-cultural utilizaram-se como instrumentos entrevistas semiestruturadas e registros de encontros realizados com a equipe gestora. Os resultados revelam que o trabalho de orientação pedagógica, configurado como missão, impede o estabelecimento de parcerias com os diversos agentes escolares, resultando em isolamento que provoca sofrimento e adoecimento desse profissional. Tal constatação reforça a importância do trabalho do psicólogo na escola, como um dos agentes que podem promover ações que viabilizem relações mais saudáveis neste espaço.

Palavras-chave: psicologia histórico-cultural; psicologia escolar, sentidos do trabalho; orientador pedagógico.


ABSTRACT

This article presents the results of a research which investigated the senses of work for the pedagogical advisor and its influence on the role of mediator in relations in the school. Assuming the theoretical-methodological assumptions of cultural-historical psychology, we used as semi structured interviews instruments and records of meetings held with the team manager. The results show that the tutoring job configured as mission prevents the establishment of partnerships with the various school officials, resulting in isolation that causes suffering and illness of this professional. This finding reinforces the importance of the work of psychologist in the school as one of the agents that can promote actions for healthier relationships in this space.

Keywords: cultural-historical psychology; school psychology, senses of work; Pedagogical Advisor.


RESUMEN

Este artículo presenta los resultados de una encuesta de maestros, que investigó los sentidos de trabajo para el asesor pedagógico y su influencia sobre el papel de mediador en las relaciones intra y extra escolar. Suponiendo que los supuestos teóricos metodológicos de la psicología histórico-cultural, utilizado como instrumentos semiestructuradas entrevistas y registros de las reuniones celebradas con el administradores del equipo. Los resultados muestran que el trabajo de tutoría configurado como misión impide el establecimiento de alianzas con los diversos funcionarios de la escuela, resultando en aislamiento que provoca sufrimiento y enfermedad de este profesional. Este hallazgo refuerza la importancia de la labor del psicólogo en la escuela como uno de los agentes que pueden promover acciones para relaciones saludables en este espacio.

Palabras clave: Psicología cultural histórico; escuela de psicología, instrucciones de trabajo; Asesor pedagógico.


 

 

Introdução

Este artigo apresenta alguns resultados de uma pesquisa de mestrado, que objetivou investigar os sentidos do trabalho para o orientador pedagógico e sua influência nas práticas desse profissional, em uma escola pública municipal, no interior de São Paulo.

Justifica o presente estudo o fato de se considerar como fundamental a compreensão dos modos de agir do orientador pedagógico nos diversos contextos em que atua e por se entender que uma de suas principais funções é a de articular as ações escolares rumo à superação dos problemas que habitam a escola. Dessa perspectiva, esse agente pode ter um papel central na promoção de parcerias com outros atores da escola, sobretudo com o psicólogo. Resultariam daí o apoio e a mediação do orientador pedagógico na inserção do psicólogo na escola, de modo a abrir espaços de atuação da psicologia. Isto porque, no processo de pesquisa e intervenção desenvolvido nessa escola ao longo dos últimos cinco anos, demonstrada-se que as diversas ações desse profissional visando ao desenvolvimento de alunos e professores, sobretudo no que se refere aos aspectos humanos, voltados à transformação da educação, têm surtido pouco efeito (Petroni e Souza, 2010).

O que se observa é que, via de regra, o trabalho do orientador é desvalorizado ou ignorado por boa parte dos professores, que transformam os espaços de reflexão em espaços de lamúrias, negando-se a aceitar as propostas vindas desse profissional, que acaba por sentir-se frustrado e impotente perante esse grupo.

Por outro lado, constata-se, também, que a aproximação do psicólogo da figura do orientador pedagógico, objetivando compreendê-lo e apoiá-lo, tem produzido alguns efeitos: ao mesmo tempo em que esse apoio possibilita ao orientador ações mais seguras e assertivas junto ao grupo de professores, também possibilita ao psicólogo atuar nos processos escolares, refletindo sobre as melhores formas de intervir.

 

O trabalho da perspectiva da Psicologia Histórico-cultural

Ao tentar explicar quais são as mediações realizadas pelo trabalho no processo de constituição do sujeito, Vigotski o coloca como um problema da psicologia, inserindo-o em uma categoria mais ampla: a da atividade humana, que como tal assume características específicas (Pino, 2005).

Embora em sua gênese o trabalho humano tenha sido orientado pela necessidade natural, inerente a todos os animais, a busca de alimentos para garantir a própria sobrevivência, em seu desenvolvimento histórico, se afastou cada vez mais desta orientação (Marx & Engels, [1933] 1989).

Os contextos sociais passaram a mediar as relações homem/natureza e social/sujeito, ao mesmo tempo em que possibilitaram ao homem agir concretamente nesse contexto, organizando seu modo de vida. Desse modo, explica-se o caráter histórico do trabalho, ao entender que o homem natural e o homem social, bem como a natureza, estão em constante relação dialética em um processo de construção permanente (Zanella, 2005).

Logo, a atividade humana diferencia-se de qualquer atividade animal, por ser uma atividade criativa, visto que o homem produz o mundo em que vive ao mesmo tempo em que este o produz (Marx & Engels, [1933] 1989).

A partir desse processo, o homem desenvolveu as capacidades de planejamento e abstração, tornando-se capaz de imaginar o trabalho antes de objetivá-lo por meio de ferramentas físicas e instrumentos psicológicos, conferindo-lhe intencionalidade. Aqui reside outra característica do trabalho humano, a duplicação da atividade, na medida em que é antes ação psicológica e somente depois ação física (Vigotski, [1925] 2004).

Contudo, esse duplo não ocorre de forma imediata, visto que, entre o planejamento e a ação resultante desse, há processos mediados pelo social e pela cultura, tanto do sujeito para o objeto quanto do objeto para o sujeito. Logo, o que se pensa, o que se faz e como se faz são produtos das mediações possibilitadas pelas ferramentas e instrumentos psicológicos, que interferirão nas formas de pensamento e, consequentemente, de planejamento, em um movimento dialético permanente. Aqui reside outra característica da atividade humana: ser mediada (Vigotski, [1925] 2004).

É por meio do uso dos signos, sobretudo a linguagem, que a atividade humana se torna mediada, pois ao utilizar os signos o homem significa algo para alguém que não seja ele mesmo. Essa apropriação pelo sujeito, por meio da ação de outros sobre ele e de si sobre si mesmo, de um sistema de signos produzidos pela cultura, lhe permite comunicar-se e ao mesmo tempo regular suas ações e as ações daqueles que o rodeiam. E é esse movimento, regulador do desenvolvimento humano, que possibilitará ao sujeito a construção de novas formas de ser, estar e agir no mundo (Vigotski, [1934] 2008; Vigotski, [1927] 2004).

Dessa perspectiva, o trabalho tem um papel crucial na produção dos modos materiais de existência, bem como na constituição psicológica do sujeito. Isto porque a atividade humana é determinada pelos meios de produção, que interferirão nas relações sociais que, por sua vez, condicionarão a vida social do homem , suas possibilidades de trabalho, em um sistema que se retroalimenta (Pino, 2005).

As interações com o mundo objetivo mediadas pela palavra como signo mediador possibilitam ao sujeito configurar significados e sentidos em relação às experiências vivenciadas, em um movimento dialético permanente. Acreditamos que esse processo é fundamental para o desenvolvimento da consciência de si e do outro nas práticas profissionais desenvolvidas na escola. O desenvolvimento qualitativo da consciência será determinado pelas condições históricas e sociais do sujeito, perpassadas pelas relações do social para o sujeito e do sujeito para o social. Nesse movimento, a palavra paulatinamente assume o papel de instrumento psicológico central neste processo (Aguiar, 2000).

Os sentidos, compreendidos aqui a partir de Vigotski ([1934], 2008a, p.181), como "a soma de todos os eventos psicológicos que a palavra desperta em nossa consciência", são configurados e reconfigurados a partir das vivências materiais do sujeito no mundo em que se insere.

Pode-se dizer que o sentido conferirá à consciência uma dimensão afetiva, além das dimensões cognitivas e intelectuais. Desse modo, a emoção revela-se como uma unidade indissociável do pensamento e da palavra. O autor afirma que os processos de pensamento possuem uma base afetivo-volitivo, na medida em que são as emoções e as necessidades que gerarão seus motivos (Vigotski, [1915] 2008a).

Então, o pensamento é sempre emocional, por ser motivado e constituído pelos sentimentos; assim como a linguagem, por objetivar a expressão ou não expressão das emoções e dos sentimentos. Essa expressão/não expressão da dimensão afetiva, por meio da fala, pode tanto desenvolver quanto fragmentar a consciência, na medida em que a dicotomia da mensagem fala/ação pode apresentar-se de maneira contraditória ao próprio sujeito (Aguiar, 2000).

Ao interessar-se pela consciência, Vigotski ([1925] 2008a) considera que as palavras são a materialização do pensamento, sem as quais esse sequer existirá. Contudo, não ignora a existência de tensões e contradições entre as dimensões intelectuais, cognitivas e afetivas no que se refere à objetivação dessas pela palavra.

É dessa perspectiva que decorre a afirmação do autor que uma palavra é tão carregada de sentidos que seriam necessárias muitas palavras para traduzi-los, pois os sentidos como zonas instáveis que são contêm as contradições dos motivos que constituem os modos de ser, pensar e agir no mundo.

São essas compreensões sobre o funcionamento psicológico do sujeito, sobretudo em relação às atribuições de sentidos e significados, que acreditamos plausíveis para a análise do trabalho do orientador pedagógico, já que compreender os sentidos configurados sobre sua prática profissional possibilita desvelar o que está na base de suas ações e refletir sobre as formas de transformá-las.

 

A profissão do orientador pedagógico: complexidade e desafios

Pode-se dizer que a diversidade constitui o complexo contexto escolar, pois a escola como microcosmo social que é reúne, em um mesmo espaço, diferenças e contradições, que por meio de um eixo comum devem conviver harmonicamente entre si. O aprendizado do aluno é esse eixo, uma vez que a escola só existe para e pelo aluno, e é por meio do seu aprendizado que se materializa a atividade dos agentes escolares (Souza, 2008).

Em um contexto tão complexo como o descrito, não raras vezes as ações e operações dos diversos atores envolvidos no trabalho escolar, a depender do ângulo que se focaliza, desvinculam-se da atividade principal da escola: o ensino (Leontiev, [1954] 1978; Souza, 2009).

Por isso, há um agente escolar, o orientador pedagógico, a quem, de modo análogo ao maestro de uma orquestra, outorga-se a regência das ações e operações de modo a orientá-las teleologicamente para a atividade, visto que esse deve promover espaços que possibilitem a atribuição de significados e a configuração de novos sentidos das ações, vinculando-as à atividade escolar (Placco & Souza, 2010).

O trabalho de orientar pedagogicamente as ações e operações vinculando-as ao ensino sustenta-se por três pilares: o de articulaçãodo coletivo da escola, respeitando as especificidades da mesma de modo a possibilitar desenvolvimentos reais de seus processos; o de formação continuada de professores de modo que as práticas docentes se coadunem com os objetivos da escola; e o de transformação da realidade, na medida em que questiona as práticas desenvolvidas na escola (Placco, Almeida & Souza, 2011).

Parece-nos que o trabalho, compreendido por nós como central na orientação pedagógica, é demasiadamente complexo, pois o sujeito atua em diversas dimensões de constituição dos outros e de si mesmo, a saber: afetiva, cognitiva e social, formando a partir do coletivo, a si e aos outros, ao mesmo tempo em que atua nesse mesmo coletivo, transformando a realidade. Realiza, assim, a complexa tarefa de gestar o que virá a partir do que é e do que já foi atribuindo significados e configurando sentidos para si ao mesmo tempo em que deve possibilitar esse processo para os outros (Placco, Almeida & Souza, 2011).

Logo, é por meio da apropriação de saberes específicos, do desenvolvimento de determinados processos psicológicos, que o orientador conseguirá manter uma atitude formativa no contexto escolar. Entre os processos psicológicos necessários, a subjetividade ganha destaque na medida em que permite ao orientador pedagógico ser ao mesmo tempo mediador e construtor de novos sentidos (Placco & Souza, 2006).

Ao exigir que o orientador cuide de uma equipe, é necessário que, ao mesmo tempo lhe sejam oferecidos cuidados, no sentido de propiciar condições materiais para que ele possa desenvolver o trabalho que lhe é atribuído (Almeida, 2011).

Quais são as reais condições de trabalho desse profissional e em que medida essas condições favorecem o desenvolvimento de suas atribuições?

Parece haver um consenso entre os autores sobre a necessidade de se garantir a formação continuada de professores dentro da escola, atribuindo esse papel ao orientador pedagógico. Assume-se que o primeiro passo para que se objetive esse trabalho é uma legislação que garanta condições básicas ao profissional que desempenha esse papel. Atualmente, nas cinco regiões do país, a função de orientador pedagógico, como um profissional alocado nas unidades escolares, está instituída via legislação e, ainda que cada região apresente suas especificidades, todas imputam uma ampla gama de atribuições a estes profissionais (Placco, Almeida & Souza, 2011).

O ponto de intersecção encontrado nas atribuições realizadas pelas diferentes leis municipais que regem a orientação pedagógica é a ampla gama de tarefas atribuídas à função, tanto no âmbito administrativo, quanto no âmbito pedagógico, assim como a falta de clareza na relação entre número de orientadores pedagógicos e número de professores e de alunos.

Evidencia-se, na visão dos profissionais que desempenham a orientação pedagógica, professores, diretores e pais, um superdimensionamento da função, visto que muitas atribuições imputadas a este profissional são idealizadas, tais como contribuir para a Educação, formar cidadãos melhores, ser parceiro e dar suporte aos professores. Ao observar um dia típico de trabalho do orientador pedagógico, verifica-se que sua rotina é permeada por urgências que o acometem quase todo o tempo, sobretudo aquelas que se referem a comportamentos de alunos em sala de aula e demandas da Secretaria de Educação. Resta-lhe, na verdade, pouco tempo para refletir ou preparar sua atuação na escola, ressaltando seu papel de "resolver problemas", principalmente os de relações interpessoais (Placco, Almeida & Souza, 2011).

Como revela a pesquisa de Placco, Almeida e Souza (2011), são muitos os problemas e desafios que permeiam essa atividade profissional, a começar pelas diferentes denominações da função, estendendo-se às formas de contratação e remuneração, o que caracteriza os contextos de trabalho desse profissional de modo muito diverso.

No município em que se desenvolveu esta pesquisa, pode-se constatar que são muitas as consonâncias entre as condições materiais de atuação do orientador pedagógico e as reveladas na pesquisa de Placco, Almeida e Souza (2011), o que nos faz destacar aqui apenas os aspectos mais relevantes encontrados no estudo.

 

O orientador pedagógico no município onde foi desenvolvida a pesquisa

O primeiro aspecto que nos chama a atenção refere-se à formação continuada dos orientadores pedagógicos no município pesquisado. Legalmente, podem ingressar nesse cargo licenciados, mestres e doutores na área da educação; contudo, como formação continuada, não são admitidos grupos de estudos, mas somente cursos formalizados que tenham controle de frequência, notas atribuídas e certificação ao seu final.

Ocorre que, como mencionado por Placco, Almeida e Souza (2011), não há atualmente no Brasil formações que contemplem as necessidades de desenvolvimento profissional dos orientadores. Parece-nos que os grupos de estudo, sobretudo aqueles voltados à reflexão, poderiam auxiliar o O.P. na construção de seu papel de formador na escola e no planejamento de suas ações. Entretanto, os orientadores, na maioria das vezes, acabam participando dos mesmos cursos destinados aos professores, tanto os oferecidos pela Secretaria de Educação, quanto aqueles realizados fora da rede.

Outro aspecto importante foi o de que o tempo do orientador para organização e planejamento de suas tarefas é exíguo, pois ele é requisitado pelo diretor, alunos e professores permanentemente. Assim, dentro da escola, a sensação é de que "o tempo escorre por entre os dedos", pois esse profissional acaba por "apagar os incêndios", sem descobrir e investigar a origem do fogo que volta a lançar chamas sucessivamente, passando a caracterizar o cotidiano escolar. Mesmo quando consegue planejar sua ação a médio ou longo prazo, normalmente em espaços fora de seu horário de trabalho na unidade escolar, como no caso da formação de professores, dificilmente consegue operacionalizá-la, pois corriqueiramente o espaço destinado à formação é solicitado pelo Núcleo de Ação Educativa Descentralizada (NAED), instância que faz sua formação e oferece elementos para que ele aplique na formação de professores na escola.

Diante dos dados apresentados, há indícios de que o papel do orientador pedagógico, também no município onde foi desenvolvida a pesquisa, caracteriza-se pela urgência em se resolver os problemas imediatos da escola, sejam burocráticos ou inter-relacionais. O espaço para a reflexão e construção de uma escola que direcione suas ações para a melhoria do ensino é preterido. E parece-nos evidente que um só profissional não conseguirá suprir uma gama tão variada de demandas, a não ser pela formação de parcerias com a equipe escolar e delegação de tarefas, e não pelo movimento de aceitação das atribuições imputadas pelos diversos atores escolares.

A nós parece importante a parceria com o psicólogo escolar, como profissional reconhecidamente mediador de conflitos e estudioso das relações, na medida em que esta parceria possibilitaria ao orientador pedagógico eleger suas prioridades e considerar a formação continuada como a primeira delas. Ocorre que a relação entre os profissionais da Educação e da Psicologia tem se estabelecido, no Brasil, permeada por tensões que necessitam ser superadas, embora se reconheçam avanços nessa relação.

 

Psicologia e educação no Brasil: parcerias (não) firmadas e relações tensionadas

As intersecções entre a Psicologia e a Educação têm suas marcas nos primórdios do processo educacional no Brasil; contudo, a relação entre os profissionais da Psicologia e os da Educação (nos mais diversos níveis: professores, gestores, equipes de apoio) é caracterizada, ao longo do tempo, por tensões que resultam em aproximações e afastamentos entre esses agentes (Marinho-Araújo, 2010).

Se, no início dos anos 60, a relação entre psicólogos e profissionais da Educação estabelecia-se em bases harmônicas; o mesmo não ocorreu nos anos 70 e 80. As constantes revisões da Psicologia sobre seus ideários, as interferências dessas reformulações nas práticas de atuação do psicólogo na escola e as contínuas críticas aos modelos utilizados até então fazem com que muitos educadores, mesmo atualmente, critiquem e muitas vezes repudiem a presença dos profissionais da Psicologia no contexto escolar (Gatti, 1997).

Atualmente, a (re)aproximação entre as duas áreas tem se dado pela adoção de novos paradigmas, que oferecem novos modos de compreensão dos fenômenos e processos educacionais, assim como permitem vislumbrar formas de atuação conjunta entre seus profissionais, e a psicologia histórico-cultural parece ser uma abordagem que sustentaria esse modelo de atuação (Marinho-Araújo, 2010).

A revisão dos paradigmas é sustentada pela necessidade de uma maior compreensão dos fenômenos que se manifestam na escola atualmente. As políticas públicas voltadas à educação nos últimos anos, como as relativas à inclusão escolar, aos direitos das crianças e dos adolescentes, à ampliação do tempo de permanência dos alunos na escola, só para citar algumas, têm demandado dos educadores modelos de atuação e organização de suas ações pedagógicas que nem sempre dão conta de responder. Do mesmo modo, também apresentam ao psicólogo grandes desafios no que concerne às ações interventivas de promoção de saúde e bem-estar na escola.

Dessa perspectiva, o estabelecimento de parcerias entre o psicólogo e o orientador pedagógico, sobretudo pelo acesso que esse profissional tem aos diversos atores escolares, mostra-se essencial: a entrada do O.P. na escola, apoiada e sustentada pelo orientador possibilita ao psicólogo aproximar-se dos diversos atores, podendo oferecer-lhes o apoio de que necessitam. Uma alijada de sua voz, amedrontada diante das contradições sociais que se revelam nos conflitos da relação aluno-professores, a escola parece viver uma guerra em que todos se tratam como inimigos (Guzzo, 2005).

Parece-nos que o psicólogo é um dos agentes que podem contribuir a esse contexto, de modo a promover o desenvolvimento de práticas e espaços favorecedores do desenvolvimento e aprendizagem de alunos e professores.

Outro fator de grande impacto nas relações entre psicólogos e educadores é a falta de uma política pública nacional que garanta a inserção do psicólogo no quadro funcional da escola. Em municípios nos quais o psicólogo escolar não é um profissional formalmente contratado, como no que se desenvolve este estudo, impõe-se a necessidade de se construir, continuamente, as relações, tendo o psicólogo de provar, permanentemente, a importância de sua atuação. Tal situação é extremamente desgastante e confere grande desafio à atuação de psicólogos na escola.

Contudo, as relações se dão permeadas por tensões de ambos os lados: os educadores ressentem-se em ver suas demandas não atendidas, e os psicólogos, reféns da boa vontade e disposição dos atores escolares, tentam abrir caminhos na construção de uma atuação crítica, comprometida social e politicamente com a qualidade do ensino prestado nessas escolas, sabendo, porém, que a qualquer momento seu trabalho pode ser interrompido, principalmente por não aceitar as demandas vinculadas ao "atendimento de famílias e alunos problemas". Nesse contexto, o psicólogo escolar está sujeito ao movimento de repulsa da escola, que o expulsa, culpando-o de inabilidade para resolver os conflitos que continuam fervilhando intra e extramuros.

 

Método

A pesquisa foi realizada em uma escola de Ensino Fundamental I e II de uma cidade no interior do Estado de São Paulo. E elegeu-se como sujeito um orientador pedagógico, cujo nome fictício é Ângelo. No início deste estudo, era o único responsável por coordenar ações nos quatro turnos de funcionamento da unidade escola. Ângelo é pedagogo e especialista em Educação Especial, atuando há dez anos como orientador pedagógico, e, deste período, quatro anos foram em uma escola particular e seis anos na escola pública onde se desenvolveu esta pesquisa.

Os instrumentos de coleta de informações utilizados foram: duas entrevistas semiestruturadas, discussões e debates promovidos em encontros realizados com a equipe gestora dos quais o orientador pedagógico participava. Esses encontros ocorreram semanalmente, ao longo de 10 meses, visando promover a reflexão dos gestores da escola sobre seu papel na promoção de um ensino de qualidade. Todos os encontros foram gravados e transcritos, e, ao seu final, foram produzidas sínteses dos principais conteúdos discutidos, as quais eram lidas no início do encontro seguinte. Para o propósito deste artigo, foram selecionados dois desses encontros, tomando-se por base os seguintes critérios: a participação do orientador pedagógico e os encontros em que ocorreram vivências que o conduziram à tomada de consciência sobre determinados aspectos de sua atuação profissional.

A escolha pelos instrumentos que permitiram a organização e construção dos dados desta pesquisa se justifica na medida em que as entrevistas revelam a visão de si do orientador pedagógico, em relação ao trabalho que desenvolve na escola, e as falas dos encontros, por sua vez, permitem analisar o confronto dessa visão de si nas relações estabelecidas com outros agentes escolares (Souza, 2010).

 

Procedimentos de análise das informações

Em um primeiro momento, foram realizadas várias leituras dos dados em busca de indicadores de sentidos do trabalho, e elaborou-se um quadro com trechos de falas do orientador pedagógico retiradas das entrevistas e das transcrições dos encontros selecionados. A partir destas leituras, foram identificadas três categorias, que, a nosso ver, sustentam a análise deste trabalho: Pulando de galho em galho, Busca de estabilidade e Vivências nas situações de trabalho, das quais derivaram 18 subcategorias.

 

 

Compreende-se que essas categorias se relacionam aos indicadores dos sentidos do trabalho configurados pelo orientador pedagógico, na medida em que revelam a um só tempo as necessidades, desejos e motivos que direcionam as ações do orientador e as tonalidades positivas e negativas que as relações com o trabalho podem assumir ora aproximando ora afastando o orientador pedagógico do exercício de suas funções.

 

Resultados e discussões

Elege-se a categoria "estabelecimento de parcerias dentro e fora da escola" para reflexão neste artigo, por compreender que, de certo modo, ela sintetiza os modos de funcionar do orientador pedagógico, por revelar os motivos e sentimentos que sustentam suas diversas ações na escola.

Um fator fundamental para que as funções de articulador, formador e transformador se efetivem é o estabelecimento de parcerias do orientador pedagógico com os diversos atores escolares. Parcerias nas quais ele se coloque como fonte de apoio para a busca da solução dos problemas que a escola enfrenta, assim como dos projetos pedagógicos e das articulações necessárias para que se caminhe rumo ao desenvolvimento saudável de seus atores (Placco & Souza, 2010).

Desse modo, é preciso reconhecer, diante da realidade concreta e complexa, o seu não saber e o não saber do outro, e a partir disso se colocar "ao lado de", e "não acima de", objetivando-se trilhar caminhos que não estão dados, visto o aumento das complexas transformações sociais que adentram a escola. O que se busca é a construção de um espaço no qual todos os envolvidos se desenvolvam: sobretudo que os professores, diante das dificuldades, ensinem, e os alunos, mesmo diante de adversidades, aprendam (Placco & Souza, 2010).

Torna-se necessário dizer que este caminho é árduo, complexo e sem resultados garantidos, pois lidar com a escola, tal qual ela se apresenta hoje, é conseguir enfrentar a incerteza e superar a frustração. É lidar com o risco de um investimento emocional enorme e o medo de não conseguir atingir seus objetivos. E somente por meio da parceria, dividindo responsabilidades e implicações, é que o orientador pedagógico conseguirá cumprir as demandas a ele atribuídas e voltar o seu olhar para o que é primordial na escola, o ensino do aluno (Placco & Souza, 2010).

Contudo, se, por um lado, no decorrer das análises realizadas neste estudo, revelaram-se sentidos que assumem nuances negativas, tais como: sentimentos de superioridade, inseguranças, medos, trabalho aquém das possibilidades, missão, solidão e desprezo, que dificultam o estabelecimento de parcerias, por outro, revelaram-se também sentidos que assumem nuances positivas, tais como: assumir desafios, satisfação e reconhecimento, que potencializam o estabelecimento de parcerias.

Cabe indagar de que modo esses sentidos do trabalho contribuem para o estabelecimento ou não de parcerias do orientador pedagógico com os atores de dentro e de fora da escola.

A análise realizada permite afirmar que o movimento de Ângelo oscila entre pular de galho em galho e buscar estabilidade. Ora se coloca ao lado da gestão, aderindo às atribuições de parceiro líder do processo pedagógico da escola. As falas abaixo expressam esse seu modo de funcionar:

É e aí a gente não pode cristalizar isso [referindo-se a não poder compactuar com o fato de os professores não se atualizarem quanto às concepções pedagógicas]. (2ª entrevista)

A gente [ele e a outra orientadora pedagógica da escola] foi tentando trabalhar para a gente não ficar grudado no livro didático e nós fomos tentando fazer isso [referindo-se ao trabalho desenvolvido junto às professoras para o aprimoramento das práticas pedagógicas].

Ora se coloca contra a gestão, aderindo às atribuições de parceiro dos professores:

Eles [os professores] conversaram no sentido de que a culpa não é minha, não é da outra orientadora pedagógica, não é do vice-diretor, a culpa é do diretor, que é o diretor. [...] Aí eu falei: só que vocês levam eu, a outra orientadora pedagógica, o vice-diretor, vocês levam tudo no mesmo bolo [referindo-se a uma reunião no qual eclodiram muitas queixas do grupo de professores. (2ª transcrição do encontro com os gestores)

Eu fui tentando fazer um trabalho, só que aquilo que você propõe nem sempre é aquilo que é executado. Por quê? Porque você não tem o acompanhamento da sala. Então eu trabalho na sala [referindo-se aos professores] com o que eu acho, e não com aquilo que deve ser [explicando o porquê das propostas pedagógicas oferecidas por ele não surtirem bons resultados na transformação das práticas docentes]. (2ª transcrição)

Ocorre que, nesta escola, não há parceria estabelecida entre a gestão e os professores; logo, estar do lado de um grupo implica estar contra o outro, e Ângelo aparentemente sobrevive a esta contradição oscilando ora para um grupo, ora para outro, a depender de quem são os agentes com quem está estabelecendo o diálogo.

O mesmo movimento aparece em relação à Secretaria de Educação, visto que, por um lado, coloca em dúvida os reais objetivos das propostas apresentadas pela rede de ensino e, por outro, tenta suprir as falhas dos projetos utilizando para isso seu tempo livre ou os espaços de trabalho docente coletivo (TDC's).

É. A ideia é ranquear sim, a ideia é saber em uma reunião e falar, ah! Mas a escola X , olha, conseguiu fazer esse movimento e hoje ele não tem mais aluno no segundo ano assim. E de onde saiu isso? Tá? Das avaliações... Dos documentos [referindo-se ao fato de a secretaria dizer que as avaliações externas não tem o intuito de ranquear as escolas, mas de promover o seu desenvolvimento, resultado pelo qual o orientador é cobrado. (2ª entrevista)

Então hoje existe uma preocupação com os ciclos três e quatro, que são os iniciais, mas não existe uma preocupação com os anos iniciais [...] Eu, por exemplo, para nós trabalharmos aqui, eu fui olhando o material de outro município e outros materiais, eu disse para as meninas [professoras]: nossa expectativa de trabalho é essa, para Língua Portuguesa é essa. O que nós vamos trabalhar de matemática é isso. (2ª entrevista)

E, contraditoriamente às suas queixas de solidão e abandono, não firma parceria também com as psicólogas, atores externos à escola. Esse modo de funcionar, no que se refere às relações estabelecidas com essas profissionais, evidencia a dissociação que há entre o discurso e as ações do orientador pedagógico. Se, por um lado, Ângelo, em sua fala, ressalta a importância do trabalho da psicologia na escola:

Eu também acho [que o trabalho das psicólogas é importante, concordando com a avaliação do vice-diretor], eu acho que essas outras possibilidades, que às vezes vocês falavam para a gente refletir sobre a coisa da gente que eu acho que são legais. Às vezes, é ouvir a música, discutir, é desenvolver o trabalho com a massinha. Eu acho que são coisas que a gente não se permite, a gente no dia a dia não tinha... [avaliação de Ângelo sobre o trabalho desenvolvido ao longo de um semestre pelas psicólogas].

Por outro, ausenta-se constantemente dos encontros com os gestores, apresentando as mais diversas justificativas, tais como reuniões com os professores e chamados da secretaria. Entre os diversos motivos apresentados por Ângelo para suas faltas, e registrados em diário de campo, um nos chama atenção, sobretudo por colocar em proeminência o sofrimento desse profissional. Trata-se dos recorrentes afastamentos da escola por motivos de saúde, que o distanciam não só dos encontros com o grupo de gestores, mas também da escola. O que, ao que nos parece, traz de algum modo alívio para as dores produzidas pelas relações estabelecidas no e pelo contexto escolar. Em outras palavras, pelas condições materiais a que está submetido e sob as quais deve exercer a orientação pedagógica.

Tal modo de funcionar inviabiliza o estabelecimento de parcerias, com os diversos atores escolares, e, sobretudo com o psicólogo, visto os seus constantes afastamentos do orientador pedagógico da escola comprometem a continuidade dos trabalhos propostos pelos profissionais da psicologia, dificultando as possibilidades de transformações, por meio das atividades realizadas no grupo, no seu modo de ser, pensar e agir na escola.

As parcerias não firmadas pelo orientador pedagógico parecem revelar seu medo de lidar com o seu não saber, e, desse modo, ele afasta de si todos que podem interpelar sobre a forma como desenvolve o seu trabalho.

Ocorre que as parcerias com esses atores podem provocar movimentos positivos, na medida em que, ao permitir que as emoções fossem faladas, ouvidas, compartilhadas, significadas e elaboradas, potencializando a sensação de domínio do meio, é possível que favoreçam a configuração de sentimentos positivos, tais como força e satisfação.

Contudo, há um grupo com o qual Ângelo consegue estabelecer parceria, os outros orientadores e profissionais que se alocam no NAED:

[Explicando em quem buscava apoio, quando seu trabalho não caminhava bem na escola - 2ª entrevista] Eu chorava sozinho ou para o meu grupo do NAED, com os orientadores de outras escolas. Porque, em muitos momentos, nós temos as mesmas angústias. Mesmo quando você tem uma direção que é um pouco mais participativa, mesmo assim, você percebia que, em alguns momentos, os orientadores pedagógicos também ficavam sós. Então, quando nós tínhamos a nossa formação no grupão dos orientadores pedagógicos, era muito isso, nós fazíamos terapia mesmo. Nós colocávamos os nossos problemas, nós discutíamos, nós fazíamos em conjunto a organização.

Parece-nos que, ao se reconhecer nos seus pares e compartilhar as mesmas queixas, Ângelo não sente sua identidade de orientador pedagógico ameaçada. Ao contrário, sente-se reconhecido pelo seu sofrimento, pela missão que cumpre no excesso de demandas que tem de dar conta. Então, o sentido de parceria para Ângelo é o de ser complacente. Parceiro é aquele que está fora do conflito, que não questiona e que ameniza o sofrimento. Como então estabelecer parcerias com os atores que atuam na unidade escolar, que o colocam o tempo todo em contato com as suas potências e impotências na orientação pedagógica?

De modo dialético, esses sentidos sustentam outro sentido, o trabalho de orientador pedagógico como aquele que controla os conflitos,de modo geral, afastando-os de si e da escola. Afasta desse modo a gestão, os professores e os alunos. No que se refere à gestão e aos professores, não os confronta, cede a eles como forma de não ter que vivenciar mais conflitos.

Eu sei que a gente [referindo-se à equipe gestora] acaba dando justificativas demais, mas eu acho que, quanto menos embate a gente criar com elas [referindo-se ao grupo de professores o qual coordena], nessas situações, fica mais tranquilo. [Explicando seu jeito de lidar com os professores - 2ª transcrição do encontro com os gestores]

Ocorre que as emoções não elaboradas não deixam de existir, mas, em situações de conflito, emergem e assumem a preponderância do sistema psicológico do sujeito, sendo prevalente no estabelecimento dos nexos. Desse modo, Ângelo funciona tomado pela emoção, tendo rompantes, apagando incêndios, adoecendo e fugindo da escola por qualquer motivo. A escola torna-se o palco de seu drama, no qual ora se vê como mártir, ora como herói.

Sabe por quê? Por que eles não querem ser os vilões? Eles não querem nada. A gente que tem que ser [referindo-se ao comentário da outra O.P. sobre os professores aumentarem os problemas e quando questionados esquivarem-se dizendo que não foi bem isso que queriam dizer - 2ª transcrição do encontro com os gestores].

Porque se um aluno quebra a cabeça, eu tenho que dar conta. Por que, é o diretor que eles procuram? Não, é a mim [referindo-se as diversas funções que tem que desempenhar na escola - 2ª Transcrição do encontro com os gestores].

Modo de funcionar que permite que ele se mantenha nesta escola, mas o afasta da complexa função de orientador, visto que não consegue lidar com suas emoções nem com as emoções que emergem o tempo todo no contexto escolar.

E desse modo, por meio da relação que estabelece entre a situação social de desenvolvimento, compreendida a partir de Vigotski ([1934] 2006) como as relações mediadas pelo social que possuem um conteúdo emocional, possibilitando ao sujeito estabelecer interações com o meio no qual está inserido, e as vivências que há nesse meio, compreendidas como experiências investidas de fortes emoções, o O.P. significa a escola como ameaçadora.

E, portanto, não consegue estabelecer parcerias que lhe permitam configurar novos sentidos e ressignificar os eventos cotidianos do contexto escolar, não formando, articulando ou transformando, somente produzindo e reproduzindo um sistema que, do mesmo modo que adoece, aliena e alija, faz com que esteja submetido a ele, sobretudo os alunos, elos mais fracos desta corrente (Vigotski, [1925] 2004).

 

Considerações finais

Em busca de compreender de que modo os sentidos configurados sobre o trabalho interferem no estabelecimento das parcerias dentro e fora da escola, sobretudo com o psicólogo, constatou-se que os sentidos configurados não permitem que o orientador pedagógico se identifique com os agentes que constroem as relações escolares, visto que, a depender dos atores com quem estabelece suas relações, ora predominam os sentimentos de superioridade ora de inferioridade.

Desse modo, não estabelece parceria com os gestores por não se sentir apoiado por eles em suas ações; não firma parceria com a Secretaria por se sentir, às vezes, enganado por ela. Quanto aos professores e pais, há um sentimento de superioridade permeando as relações, que impede aproximações e/ou parcerias. E, como decorrência, a parceria com o psicólogo escolar é inviável, pois o ponto de partida das ações deste profissional não coaduna com ações como diagnosticar, medicar ou "colocar" os problemas para fora da escola.

O contexto em que se realizou esta pesquisa contribui para o não estabelecimento destas parcerias, pois o psicólogo escolar inexiste na rede de ensino, os atendimentos psicológicos estão alocados na área da Saúde, e os trabalhos de psicólogos em escolas sustentam-se por um vínculo muito tênue, com sua inserção e permanência dependentes da permissão da direção, que muitas vezes se reveste de um sentido de favor ou concessão benevolente.

Fato é que o modo de ser orientador pedagógico, constatado nesta pesquisa, não transforma as relações escolares por não criar espaços que possibilitem a configuração de novos sentidos sobre o ato de ensinar e aprender pelos agentes escolares. Desse modo, o orientador produz e reproduz um sistema que o adoece, aliena e alija da possibilidade de desenvolvimento, ao mesmo tempo em que faz o mesmo com os demais atores da escola.

 

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